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Diferença entre o crime de furto qualificado mediante fraude e o crime de estelionato


Autoria:

Luiz Henrique Cauper Pereira


Estudante de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina

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Resumo:

A diferença entre o crime de furto qualificado mediante fraude e o crime de estelionato e seu tratamento pela doutrina e jurisprudência.

Texto enviado ao JurisWay em 13/07/2012.



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Apresentação

Este presente trabalho fora proposto pelo Prof. Aldo Nunes, o qual leciona a disciplina de Direito Penal III na Universidade do Sul de Santa Catarina, cujo objetivo é propiciar ao acadêmico do curso de direito subsídios suficientes para uma correta compreensão da diferença entre os dois crimes expostos no título do trabalho. Ambos os crimes agridem um dos mais relevantes objetos jurídicos tutelados pelo nosso ordenamento, que neste caso é o patrimônio, o que torna necessário sua tutela pelo direito penal.

A diferença entre o crime de furto qualificado pela fraude e estelionato deve ser esclarecido ao fim deste trabalho, uma vez que tem por seu escopo trazer ao âmbito da academia tais diferenças e desenvolver definições capazes de fomentar um adequado entendimento dos crimes tipificados pelo código de direito penal, além de verificar sua abordagem pela doutrina pátria e sua exegese manifesta pela jurisprudência produzidas pelos Tribunais de Justiças.

Espera-se que o nobre leitor, ao ler o presente trabalho, conclua o estudo compreendendo estes crimes de forma segura e contundente.

 

Noções Preliminares

Antes de adentrarmos no âmago do estudo proposto, faz-se mister discorrer sobre os crimes patrimoniais e sua exata definição.

Crime é uma conduta, omissiva ou comissiva, o qual incide no tipo penal cominado com determinada punição, previamente descrita em lei. A conduta criminosa é repreendida pelo direito penal por ser relevante sua coibição, cuja observância acarreta em uma harmoniosa convivência em sociedade. Qualquer desrespeito à norma, que é o comando advindo do enunciado legislativo, implica na energética atuação do Estado para que seja apurada a conduta, e se comprovado sua materialidade e autoria, pune-se o criminoso.

Melhor esclarecimento dos fatos relevantes ao direito penal é exposto pelo eminente autor André Estefam, que afirma o seguinte: “O Direito Penal é o ramo do direito que se encarrega de regular os fatos humanos mais perturbadores da vida social, definindo-os quanto à sua extensão e consequências, de modo a assegurar, por meio da aplicação efetiva de prescrições, a garantia da vigência da norma e as suas expectativas normativas.”1

Ademais, é pertinente trazer a lume a definição de patrimônio no âmbito jurídico, uma vez que é contra este que se atenta quando cometidos os crime de furto e estelionato.

No âmbito do Direito Civil, o patrimônio é conjunto de relações de cunho econômico de determinada pessoa, física ou jurídica, conforme o disposto no art. 91, do codex civilis, “Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico”.

Porém, mesmo sendo uma universalidade de direitos, nem todos eles entram nesta esfera, como, por exemplo, os direitos advindos de direito obrigacional não apreciáveis economicamente, direito a honra, a vida, a honra, a liberdade, de família, políticos e direitos referentes a pessoa.

Em aula ministrada na academia, o professor Aldo afirma que “o direito penal não protege o objeto material, mas sim a relação entre o sujeito e a coisa, caracterizado como patrimônio.”2, denotando-se a importância de seu esclarecimento.

Necessário é distinguir o patrimônio de propriedade. O patrimônio, como vimos, é o complexo de relações de cunho econômico de uma determinada pessoa. Propriedade é um direito real, jus in re, (art.1225, inc. I, CC), sendo este um direito mais abrangente que aquele. É a plena potestas dos jurisconsultos romanos. Este pleno poder confere ao seu titular o direito de posse, gozo, dispor e de reavê-los com quem estiver (erga omnes), conforme o art. 1228, do CC.

Porém, há de se advertir que não se coincide o conceito de patrimônio do Direito Penal. A coisa que integra o conjunto patrimonial pode ser destituído de valor econômico, por exemplo aqueles objetos infungíveis devido a alto estima por seu possuidor. “Incumbe assinalar, por sua relevância no direito penal que se inclui no patrimônio a posse, para alguns direitos reais também e para outros uma qualidade dos direito reais, por ser a visibilidade do direito real a exteriorização da propriedade”3.

No mais, os crimes contra o patrimônio são os crimes que interrompem o vínculo existente entre o sujeito e o objeto. O direito penal não protege a res furtiva (objeto material), mas sim este vínculo existente, que é o objeto jurídico. Isto é demonstrado com clareza quando se observa a rubrica do título II, o enunciado “crimes contra o patrimônio”.

 

Crime de furto qualificado pela fraude

Vejamos o que dispõe o Código Penal atinente ao crime supracitado.

“Art.155. subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel.

Pena: reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

[...]

§ 4ᵒ. A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) ano, e multa, se o crime é cometido.

[...]

II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza.”

O crime de furto ocorre quando o agente ativo (aquele quem comete o ato ilícito) subtrai (subtrair no sentido de retirar algo do patrimônio de alguém) coisa alheia móvel quando não o está sob vigilância de seu proprietário/posseiro.

Em outras palavras “No furto a coisa (“res furtiva”) é retirada do âmbito de vigilância e disponibilidade da vítima, de forma que esta não perceba. É necessário que o agente tenha a posse tranquila da coisa, ainda que por pouco tempo” 4.

Para que o sujeito incida na circunstancia descrita no inciso II do parágrafo 4ᵒ é necessário que se tenha em mente as circunstâncias em que age o sujeito.

O sujeito, de forma fraudulenta e vil reduz a atenção do sujeito passivo do crime (em regra o proprietário, podendo ser também a pessoa que detém a posse da coisa) para subtrair com certa “facilidade” o objeto. Nota-se que para reduzir a atenção do sujeito passivo do crime, torna-se evidente que anteriormente a vítima tinha sua atenção voltada ao objeto, que através de um ato vil reduz a vigilância da vítima e obtém a res furtiva.

 

Crime de Estelionato

Vejamos o que dispõe o Código Penal atinente ao crime supracitado.

“Art.171: Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.”

O crime de estelionato ocorre o agente ativo obtém a vantagem ilícita, causando prejuízo ao patrimônio do agente passivo, fazendo este acreditar numa falsa realidade mediante algum engodo.

Nota-se que o dispositivo penal visa, em especial, reprimir a fraude causadora de dano ao patrimônio do indivíduo.

No ensinamento de Magalhães Noronha, “o crime de estelionato não é considerado um fato limitado à agressão do patrimônio de Tício ou de Caio, mas antes como manifestação de delinquência que violou o preceito legislativo, o qual veda o servir-se da fraude para conseguir proveito injusto com dano alheio, quem quer que seja a pessoa prejudicada em concreto. O estelionatário é sempre um criminoso, mesmo que tenha fraudado em relações que, por si mesmas, não merecem proteção jurídica, porque sua ação é, em qualquer caso, moral e juridicamente ilícita.”5

O elemento principal deste tipo penal é o verbo “obter”, cuja semântica nos remete ao sentido de “conseguir”. É importante atentar-se ao verbo, uma vez que ele descreve o ato reprimido pelo ordenamento jurídico pátrio. O agente ativo consegue a vantagem por meio da participação do agente passivo do tipo penal, motivada pela possibilidade de obter alguma vantagem, não se pode olvidar que o agente passivo do crime age em erro devido a falsa realidade que lhe é apresentada pelo agente ativo.

Vantagem ilícita é todo benefício contrário ao direito e que, ao ser obtido, cause prejuízo ao patrimônio alheio. Esta vantagem tem der injusta, ilegal, indevida.

 

Diferença entre os crimes

A correta compreensão dos dois crimes e suas diferenças é de suma importância para que não ocorra nenhum vício processual e haja adequação típica (conduta x norma).

Para melhor desenvolvimento do trabalho, apontamos duas diferenças entre os dois crimes. a) Verbal: o verbo “subtrair” e “obter”, cuja semiótica é distinta entre os dois vernáculos. No primeiro é retratada uma conduta positiva do agente ativo, ele realmente age para pratica da “subtração” do objeto material, retirando-o da relação patrimonial de seu proprietário ou de quem possua a posse, o que configura o crime de furto. No segundo vernáculo, denota-se uma conduta negativa, o agente ativo  “ganha” o bem material de quem é o proprietário ou de quem detém sua posse, configurando-se crime de estelionato. b) Estado do agente passivo: No crime de furto qualificado pela fraude, o agente ativo do crime reduz a atenção da vítima sobre o objeto material para que seja subtraído o bem. No crime de Estelionato, o agente ativo induz a vítima ao erro criando uma falsa realidade, fazendo que esta o entregue o bem material.

Seguindo esta linha de pensamento, o exímio doutrinador Fernando Capez, “difere o estelionato do furto mediante emprego de fraude. No furto mediante fraude, há a retirada do bem contra a vontade da vítima, que tem a sua vigilância sobre o bem desviada em face do ardil empregado pelo agente. Este, então utiliza-se da fraude para reduzir a vigilância do dono do bem e, com isso, facilitar a subtração. No estelionato, a vítima, iludida com o ardil empregado pelo agente, entrega-lhe o bem voluntariamente. A fraude não é empregada para reduzir a vigilância da vítima, mas, sim, para obter a entrega voluntária do próprio bem pelo proprietário”6.

Não há divergente entendimento os eminentes doutrinadores Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini, que tratam a diferença entre os crimes da seguinte maneira: “Distingue-se o furto com fraude, em que o engodo possibilita a subtração, do estelionato, em que o agente obtém a posse da coisa que lhe é transferida pela vítima por ter sido induzida em erro. Na Jurisprudência, aponta-se as seguintes diferenças: no primeiro há retirada contra a vontade da vítima; no segundo , a entrega é procedida livremente; no primeiro há discordância da vítima; no segundo o consentimento; no furto há amortecimento da vigilância; no estelionato, engodo; naquele, o engano é concomitante com a subtração; neste é antecedente à entrega; a conduta do furto é de tirar, no estelionato é enganar para que a vítima entregue a coisa.”7

Ademais, o Prof. Aldo Nunes trabalhou em sala de aula a diferença entre os crimes, conforme suas palavras “No furto qualificado pela fraude, esta é empregada como forma de diminuir a vigilância da vítima sobre seu objeto, facilitando assim a retirada (subtração) da coisa alheia móvel. No estelionato, a fraude é utilizada para que a vítima enganada entregue o objeto ao agente, que por essa razão o obtém.”8

No sentido de esclarecer as diferenças entre os crimes de que trata este trabalho, se manifestou o Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

“ESTELIONATO - RECURSO MINISTERIAL OBJETIVANDO A CONDENAÇÃO POR FURTO QUALIFICADOMEDIANTE FRAUDE - ARDIL UTILIZADO PELO AGENTE PARA ILUDIR A VÍTIMA A ENTREGAR-LHE O BEM VOLUNTARIAMENTE, E NÃO PARA RETIRÁ-LO DE SUA ESFERA DE VIGILÂNCIA - CONDUTA NARRADA NA DENÚNCIA CARACTERIZADORA DO TIPO PENAL DESCRITO NO ART. 171 DO CÓDEX REPRESSIVO - DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA PELO MAGISTRADO A QUO IRRETOCÁVEL - SENTENÇA MANTIDA - APELO DESPROVIDO”9

Na ementa supracitada, tem-se a clara distinção entre o crime de furto qualificado mediante fraude e estelionato, eis que o parquet recorreu da sentença que condenava o réu pelo crime de estelionato, visando a condenação por crime de furto qualificado. A ementa é clara e sucinta quando descreve o comportamento da vítima “ARDIL UTILIZADO PELO AGENTE PARA ILUDIR A VÍTIMA”, ou seja, o engodo ou isca utilizado para obter o bem material por meio de erro da vítima.

Um outro caso em que há evidente diferença entre os crimes tratados pelo presente trabalho chegou ao Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

“FURTO QUALIFICADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA ESTELIONATO. OCORRÊNCIA.

Desclassifica-se o fato criminoso de furto qualificado para estelionato, porque, como bem afirmou o Procurador de Justiça: “pelo que consta dos autos, especialmente do depoimento da senhora proprietária do estabelecimento prejudicado, aos réus foram servidos lanches, bebidas, cigarros, além de consentido pegar sorvetes do freezer existente no salão do restaurante. Depois de haverem consumido as bebidas, sorvetes e demais gêneros, foram embora sem pagar. Isso não é furto, porque não houve a tomada da coisa. Foi estelionato, como prática que visou a obtenção de vantagem indevida, em prejuízo alheio, mediante fraude.”

DECISÃO: Apelos defensivos parcialmente providos. Por maioria.”10

No caso em tela, torna-se evidente a tipificação da conduta no crime de estelionato pelo fato do objeto material do crime, que seria a vantagem ilícita por meio da indução da proprietária do restaurante ao erro.

 

Referências

1 Estefam, André. Direito Penal I, São Paulo: saraiva 2010.

2 Anotações tomadas na aula ministrada pelo Prof. Aldo Nunes, na Universidade do Sul de Santa Catarina.

3 Direito Penal. V 2, e.Magalhães Noronha, Saraiva, 2003.

4 http://www.ufsm.br/direito/artigos/penal/furto-roubo.htm

5 Direito Penal. V 2, e.Magalhães Noronha, Saraiva, 2003.

6 Curso de Direito Penal. V 2,Fernando Capez, Saraiva, 2004.

7 Manual de Direito Penal, V.2, Julio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini, Aditora Atlas, 2009.

8 Aldo Nunes, em aula ministrada na Universidade do Sul de Santa Catarina, Fpolis/SC.

9 Apelação Criminal n. 2009.050172-9, de Içara Relator: Des. Moacyr de Moraes Lima Filho.

10 A. Crime, N 70035041730, de Vacaria, Rel. Aramis Nassif.

 

 

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