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Resumo:
O dano moral não é instituto novo para a seara jurídica e vem sendo largamente usado na proteção dos direitos de personalidade. No primeiro momento parece estranho o confronto de filhos e pais, como autor e réu, respectivamente.
Texto enviado ao JurisWay em 26/08/2009.
Última edição/atualização em 31/08/2009.
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O assunto refere-se exatamente a esta difícil e delicada questão: podem um pai ou uma mãe ser responsabilizados civilmente – e por isso, condenados a indenização – pelo abandono afetivo perpetrado contra o filho? A procura pelo fundamento da resposta a essa pergunta levaria à seguinte indagação: a denominada responsabilidade paterno-filial resume-se ao dever de sustento, ao provimento material do necessário ou do imprescindível para manter a prole, ou vai além dessa singela fronteira, por situar-se no campo do dever de convívio, a significar uma participação mais integral na vida e na criação dos filhos, de forma a contribuir em sua formação e subsistência emocionais.
Muitos julgaram – e o século anterior esteve a dar respaldo a esta convicção – que a assunção da responsabilidade pela mantença material dos filhos seria o suficiente a ser feito em prol de alguém a quem não se deseja por perto. Certamente, essa meia-responsabilidade não foi jamais suficiente, mas o paradigma de outrora não abria chance para tal análise, porque a importância da vontade e do querer adulto sempre foi significativamente mais importante que a necessidade e a carência infantil.
Foi o caso, por exemplo, da menina judaica[1] abandonada afetivamente por seu pai logo após o nascimento, quando ele se separou de sua mãe e, em seguida, casou-se com outra mulher, com quem teve outros três filhos. Por serem todos membros da comunidade judaica, o pai e sua nova família encontravam-se freqüentemente com a menina abandonada, e nessas ocasiões o pai fingia não conhecê-la, de modo a desprezá-la reiteradamente. O interesse do pai em formar nova família, completamente desvinculada da família anterior – independente de quais tenham sido as razões que o levaram a assim agir – foi mais importante e imperativo que o interesse da menina. Essa situação provocou, desde logo, os sentimentos de rejeição e de humilhação, os quais se transformaram em causas de danos importantes, como significativo complexo de inferioridade, demandando cuidados médicos e psicológicos por longo tempo. Só bem mais tarde, na verdade, essa criança encontrou guarida na resposta jurisdicional para os anseios, as frustrações e os traumas que a acompanharam por toda a vida.
Foi assim também o caso do menino, igualmente abandonado por seu pai,[2] que, por razões semelhantes, deixou-o desprovido de sua presença, de seu carinho, de seu interesse por sua criação e por seu desenvolvimento, o que lhe causou significativo déficit psicológico e emocional. Pela produção de tal dano moral a seu jovem filho, o pai foi condenado pelo Poder Judiciário, em segunda instância, a reparar a falha praticada, a omissão perpetrada e a responsabilidade por tantos anos ignorada.
Com sua sensibilidade e inteligência ímpares, além do invejável conhecimento específico – em razão dos casos reais que trata, na advocacia –, Rolf Madaleno escreve: “justamente por conta das separações e dos ressentimentos que remanescem na ruptura da sociedade conjugal, não é nada incomum deparar com casais apartados, usando os filhos como moeda de troca, agindo na contramão de sua função parental e pouco se importando com os nefastos efeitos de suas ausências, suas omissões e propositadas inadimplências dos seus deveres. Terminam os filhos, experimentando vivências de abandono, mutilações psíquicas e emocionais, causadas pela rejeição de um dos pais e que só servem para magoar o genitor guardião. Como bombástico e suplementar efeito, baixa a níveis irrecuperáveis a auto-estima e o amor próprio do filho enjeitado pela incompreensão dos pais”.[3]
A ausência injustificada do pai, como se observa, origina evidente dor psíquica e conseqüente prejuízo à formação da criança, decorrente da falta não só do afeto, mas do cuidado e da proteção – função psicopedagógica – que a presença paterna representa na vida do filho, mormente quando entre eles já se estabeleceu um vínculo de afetividade. Além da inquestionável concretização do dano, também se configura, na conduta omissiva do pai, a infração aos deveres jurídicos de assistência imaterial e proteção que lhe são impostos como decorrência do poder familiar.[4]
Nesta vertente da relação paterno-filial em conjugação com a responsabilidade – há o viés naturalmente jurídico, mas essencialmente justo, de buscar-se indenização compensatória em face de danos que os pais possam causar a seus filhos por força de uma conduta imprópria, especialmente quando a eles são negados a convivência, o amparo afetivo, moral e psíquico, bem como a referência paterna ou materna concretas, o que acarretaria a violação de direitos próprios da personalidade humana, de forma a magoar seus mais sublimes valores e garantias, como a honra, o nome, a dignidade, a moral, a reputação social; isso, por si só, é profundamente grave.[5]
Por outro lado – é invencível e imprescindível esta menção – outros casos considerados como assemelhados não foram recepcionados pelo Poder Judiciário[6] –e de modo acertado, exatamente porque as decisões não reconheceram, nos casos concretos, a existência de danos morais indenizáveis decorrentes do fato de um eventual abandono afetivo, ou porque não houve dano, ou porque não houve abandono, ou porque não estava estabelecida a relação paterno-filial da qual decorre a responsabilidade em apreço, ou, finalmente, porque não se estabeleceu o imprescindível nexo de causalidade, causa eficiente da responsabilização civil in casu.
[1] Esse caso é o relatado na decisão do juiz Luiz Fernando Cirillo, da 31ª Vara Cível Central de São Paulo (Processo n. 01.36747-0, j. 26/06/04).
[2] Esse segundo caso é o relatado pelo acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (Ap. Cível n. 408.550-5, relator desembargador Unias Silva, 7ª Câmara Cível, TJMG, j. DJMG 29/04/04)
[3] Rolf Madaleno. O preço do afeto. In Tânia da Silva Pereira e Rodrigo da Cunha Pereira (Coord.). A ética da convivência familiar: questões polêmicas no cotidiano dos tribunais.
[4] Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. Aspectos jurídicos da relação paterno-filial. Carta Forense São Paulo, ano III, n. 22, p. 3, março, 2005.
[5] Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. Aspectos jurídicos da relação paterno-filial, cit.
[6] São casos assim, por exemplo, aqueles mencionados pelas decisões do mesmo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (julgado não disponibilizado pelo TJMG por correr em segredo de justiça, do qual foram desembargadores Luciano Pinto, Márcia Paoli Balbino e Irmar Ferreira Campos – relator,) e pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Ap. Cível n. 2004.001.13664, rel. desembargador Mário dos Santos Paulo – juiz a quo André Veras de Oliveira, 4ª Câmara Cível, TJRJ.)
Comentários e Opiniões
1) Jorge Antonio (30/09/2009 às 11:33:46) Olha ,achei interesante como ponto de vista. A materia envolvendo danos moraes em abandonos dos pais. | |
2) Keila (17/10/2009 às 17:16:58) ola´. muito interessante a matéria.porém, acrredito que deve existir uma lei específica para pais que abandonem seus filhos afetivamente. | |
3) Wellison (19/10/2009 às 04:52:14) Aos pais q cometem esses tipos de irresponsábilidades deveria haver uma punição pelo fato de agirem egoistamente,prezando somente seu bem estar deixando a merce a criança,assim propício a danos irreversíveis. | |
4) Maria (09/12/2010 às 23:52:45) Gente, a maior dor de uma mãe é ver o filho sofrer pala falta do amor e presença do pai,e não puder fazer nada, um filho que ama seu pai de verdade, prefere a atenção, o amor e o carinho do que 1 bilhão de dolares, falo por experiência, o pior pai é aquele que abandona em todas as areas, por favor vamos criar uma lei para que estes tipos de Homens, possam amadurecer e passar a ser presente na vida dos filhos. | |
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