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VIA ADMINISTRATIVA: a redução da judicialização do direito na saúde pública


Autoria:

Kadja Nobel Sousa Braga


UNICEUMA Comunicação Social - Habilitação: Publicidade e Propaganda Faculdade São Luís Pós Graduação em Assessoria de Comunicação: Política, Setor Público e Organizações Faculdade Vale do Itapecuru-FAI Direito Complexo de Comunicação Damásio de Jesus Pós Graduação: Direito Previdenciário Escola Superior Verbo Jurídico Pós Graduação: Direito Médico

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Resumo:

O presente estudo objetivo abordar "via administrativa: redução da Judicialização do direito na saúde pública", bem como a realidade da judicialização na área de saúde com base em seus fenômenos atuais.

Texto enviado ao JurisWay em 25/10/2018.

Última edição/atualização em 28/10/2018.



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VIA ADMINISTRATIVA: a redução da judicialização do direito na saúde pública*

 

Kadja Nobel Sousa Braga*

 

RESUMO:

O presente estudo objetivo abordar “via administrativa: redução da Judicialização do direito na saúde pública”, bem como a realidade da judicialização na área de saúde com base em seus fenômenos. O direito social da saúde foi elevado pela Constituição Federal de 1988 à categoria de direito fundamental devendo ter aplicabilidade imediata, conforme determina o § 1º do artigo 5º do referido texto constitucional. Contudo, apesar do direito à saúde ter status de direito fundamental, por vezes, não é implementado de forma efetiva pelos entes competentes, fazendo com que aqueles que necessitam de tratamento imediato, mas que não conseguem ver seus anseios atendidos pelo administrador público, passem a buscar tal direito via demanda judicial. Em suma, pondera-se que a judicialização muitas vezes se faz necessária, pois o Estado não cumpre o seu papel de garantir serviços de saúde a todos os cidadãos de forma igualitária e universal, como preceitua a Norma Constitucional. O estudo ora apresentado trata de uma pesquisa realizada através de um levantamento bibliográfico, contendo literatura inerente ao tema.

 

Palavras-chaves: Direito a saúde. Saúde pública. Via administrativa da Saúde. Judicialização da Saúde.

 

1 INTRODUÇÃO

 

A demanda judicial relacionada a procedimentos e insumos de saúde contra entes públicos teve um crescimento exponencial nos últimos anos. A reivindicação judicial passou a ser largamente utilizada como mecanismo de garantia de direitos e ampliação de políticas públicas, distendendo, inclusive, a atuação do Ministério Público neste âmbito. Também, constatou-se a inclusão do recurso judicial no "itinerário terapêutico".

Os processos judiciais da saúde têm crescido em ritmo acelerado nos últimos anos e vem gerando debates sobre os deveres dos entes federativos e planos quanto ao direito à saúde prevista pela Constituição Federal a todos os brasileiros.

O fato é que, a Integralidade em saúde é frequentemente associada ao tratamento digno, respeitoso, com qualidade e acolhimento sem descriminação para qualquer usuário. Por isso, este princípio paira como uma orientação geral nos serviços de saúde, já que o Estado tem o dever de oferecer um “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”, como preceitua a Constituição Federal.

As demandas judiciais são crescentes em decorrência da ausência de oferta de medicamentos e de certos tratamentos de saúde pelo governo. São reivindicados desde produtos em falta nos hospitais públicos e terapias de alto custo não incorporadas ao SUS até medicamentos experimentais sem eficácia e segurança devidamente comprovadas.

O presente artigo busca problematizar a redução da judicialização do direito na saúde pública, numa perspectiva bioética no ambiente Judiciário. Ocorre que a precariedade da saúde pública no Brasil é notória, pois, o Estado, com o argumento da carência de recursos orçamentários, muita das vezes, omite-se de seu papel de fornecer saúde pública aos cidadãos. Entretanto, nos últimos tempos, tem ocorrido no Brasil, com bastante frequência o controle judicial de políticas públicas, como forma de garantir à efetivação do direito fundamental a saúde.

Com relação aos meios utilizados, trata-se de uma pesquisa bibliográfica, com base na revisão de literatura, para fundamentação teórico-empírica, e desenvolvida a partir da consulta de material já publicado como: artigos, livros especializados, periódicos, endereços eletrônicos e outras publicações.

Através desta revisão de literatura será possível um maior conhecimento, envolvimento e melhor compreensão do tema. Neste estudo a pesquisa será balizada com o objetivo de aprofundar conhecimento da temática “Via Administrativa: a redução da judicialização do direito na saúde pública”. Possibilitando, assim, o conhecimento e análise das contribuições mais relevantes sobre esse assunto.

O estudo surgiu no interesse de melhor compreender não só o objeto da ciência jurídica, como também no âmbito social, diferenciando seus procedimentos e relacionando os conhecimentos adquiridos com a realidade e a prática. Assim, considera-se que o tema em questão apresenta ampla relevância social, científica e pessoal, pois é um tema atual e pode trazer contribuições tanto para comunidade acadêmica como para sociedade, representando ainda um grande aprendizado para a pesquisadora.

 

2 O ACESSO A SAÚDE PÚBLICA VIA JUDICIAL

 

A Constituição Federal de 1988 estabelece no rol dos Direitos Fundamentais a acessibilidade à justiça através da normatização de diversos artigos que visam garantir o cumprimento da premissa que não poderá ser negado amparo judicial gratuito àquele que não tiver os recursos necessários para arcar com as demandas processuais.

Dessa forma, ter acesso à justiça foi colocado em nível de princípio constitucional, tendo como um dos princípios a inafastabilidade da Jurisdição, contido no artigo 5°, inciso XXXV da Constituição Federal, no qual consta que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, através do qual os litígios, uma vez tendo-se ingressado com ação, não poderão deixar ser sanados, pois, mesmo que não existam leis específicas, o conflito deverá ser solucionado.

De acordo com Schwartz (2001, p. 52) “A saúde é um dos principais componentes da vida, seja como pressuposto indispensável para a sua existência, seja como elemento agregado à sua qualidade. Assim a saúde se conecta ao direito à vida”. Portanto, o Direito Fundamental à Saúde, encontra-se assegurado no rol constitucional de Direitos Fundamentais preconizados na Constituição Brasileira de 1988.

O artigo 197 Carta Magna de 1988, preconiza que é de relevância pública “as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de Direito Privado”.

O jurista José Afonso da Silva (2011, p.833) leciona que,

O Sistema único de Saúde, integrado de uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços de saúde, constitui o meio pelo qual o Poder Público cumpre seu dever na relação jurídica de saúde que tem no pólo ativo qualquer pessoa e a comunidade, já que o direito à promoção e à proteção da saúde é também um direito coletivo.

 

Tratando-se da incumbência dos entes públicos, relativo à prestatividade do direito fundamental à saúde, o artigo 23 dispõe a competência comum da União, Estados, do Distrito Federal e Municípios, cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. Nesse sentido, inicialmente, é interessante ressaltar que a doutrina aponta que o Direito Fundamental à Saúde encontra-se dividido em duas vertentes, segundo (SILVA, 2011, p. 308).

[...] uma, de natureza negativa, que consiste no Direito a exigir do estado (ou de terceiros) que se abstenha de qualquer ato que prejudique a saúde; outra de natureza positiva, que significa o direito as medidas e prestações estaduais visando a prevenção das doenças e tratamento delas [...].

 

Dessa forma, por ser caracterizada como uma prestação positiva necessita de ações por parte do Estado, a fim de garantir o acesso a uma universalidade de pessoas, consequentemente deverá ser implementado por meio de políticas públicas, nos termos da Constituição Federal de 1988.

Dresch (2015, p. 28) enfatiza que:

O Brasil ainda está longe de assegurar a plenitude de acesso e tratamento integral à saúde, o que tem levado a um exponencial crescimento de demandas judiciais por meio das quais a população tenta obter o acesso a tratamentos, internações, exames e medicamentos que lhe são negados administrativamente.

 

Apesar do direito à saúde ter status de direito fundamental, muita vezes, não é implementado de forma efetiva pelos entes competentes, fazendo com que aqueles que necessitam de tratamento imediato, mas que não conseguem ver seus anseios atendidos pelo administrador público, passem a buscar tal direito via demanda judicial.

Nesse sentido (Dresch, 2015, p. 19) enfatiza que:

O Poder Judiciário tem sido protagonista em garantir o acesso aos serviços de saúde da população, contudo a falta de um conhecimento mais apurado dos magistrados acerca da técnica médica e a regulação administrativa do Sistema Único de Saúde tem levado a alguns equívocos, sobretudo quando salvaguarda o acesso a medicamentos e terapias que não possuem evidência científica da sua eficácia, eficiência e efetividade.

 

O protagonismo do Poder Judiciário tem seus aspectos positivos, porque tem levado à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) a analisar a conveniência da incorporação das novas tecnologias em relação a medicamentos e procedimentos mais judicializadas. Por outro lado, causa repercussão na gestão do SUS, pois o fato de o Poder Judiciário, em sua grande maioria, insistir na aplicação irrestrita e absoluta da regra de solidariedade, fundamentando as suas decisões no artigo 23, II, da Constituição Federal, sem atentar ao regramento administrativo infraconstitucional e infra legal.

Ocorre que a solidariedade constitucional do artigo 23, II, tem natureza apenas sistêmica ou institucional, pois se limita a impor aos entes federados (União, estados, Distrito Federal e municípios), a responsabilidade de organizar e instituir as políticas públicas da saúde para atendimento da população. (DRESCH, 2015).

Para que haja a individualização de um direito fundamental e seu reconhecimento como tal, é necessário que seja regulamentado no bojo constitucional, e que esse amparo tenha o formato de um direito subjetivo. Assim, o acesso a saúde pública seja de maneira palpável um direito objetivo como forma de assistência.

Silva (2013, p.181) pontua que os “[...] direitos fundamentais do homem são situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana”.

Para se entender os impactos da judicialização dos serviços de saúde do indivíduo frente ao Estado, é imprescindível verificar a eficácia jurídica das normas constitucionais que estabelecem o direito social à saúde como direito fundamental. Não obstante, é recomendado avaliar a historicidade constitucional das dimensões dos direitos fundamentais, evidenciando a positivação do Estado Brasileiro à constitucionalização do direito ao acesso universal e gratuito a saúde para todos os jurisdicionados.

Ramos (2017) defende que é relevante analisar como o Estado poderá garantir o acesso universal e gratuito a saúde diante da escassez de recursos, uma vez que a demanda por esse serviço é cada vez maior, considerando ainda o fato de que a expectativa de vida dos brasileiros está aumentando e, a cada dia surgem novas doenças, as quais têm impactado de forma incisiva o sistema público de saúde, tudo isso deve ser analisado sob uma visão neoconstitucionalista, onde o poder público deve colocar à disposição da população serviços públicos essenciais à garantia do mínimo existencial, resguardando a dignidade da pessoa humana, garantido assim a eficácia do direito fundamental de acesso à saúde, sobretudo pelo fato de estar intimamente vinculado ao direito à vida.

Dresch (2015) ressalta que:

A regra de solidariedade como vem sendo entendida, ao invés de amenizar a situação do SUS, agrava ainda mais os problemas de gestão, impactando o orçamento dos entes federativos, sobretudo dos municípios de menor porte, que são obrigados a redirecionar recursos para ações não planejadas, acentuando com isso a ineficiência dos serviços públicos.

 

Para melhor compreender o direito ao acesso à saúde pública como um direito fundamental, necessita-se definir o conteúdo do direito social à saúde e sua evolução histórica no direito constitucional brasileiro, considerando que a norma constitucional assegura tal direito, definindo inclusive meios para efetivação de políticas públicas que alcancem a todos os cidadãos, garantindo acesso universal, igualitário e gratuito.

 

3 O DIREITO CONSTITUCIONAL A SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL

 

A analogia entre direito e saúde surgi a partir da Constituição Federal de 1988. De acordo com Maia (2017, p. 17) “a progressiva constitucionalização que os direitos sociais passaram na década de 1980, associada aos desafios de implementação efetiva por parte do Estado, ” consagrando o direito à saúde como um direito social, fundamental e humano.

A Constituição Federal de 1988, instituiu a responsabilidade comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios para implementarem as políticas públicas que assegurem o acesso universal e igualitário, com atendimento integral, qualificando assim a saúde como um direito de todos e dever do Estado.

A Constituição trata o direito à saúde como um direito humano fundamental e social de natureza pública subjetiva, com característica híbrida, constituída ao mesmo tempo de um direito individual e social, com efeito concreto que exige uma prestação positiva do “Estado” e da sociedade impondo a sua inserção nas políticas públicas (LEDUR, 2009. p. 89).

 

Todas as garantias de acesso á saúde foram reafirmadas pelo pela Lei Orgânica da Saúde (Lei n. 8.080/1990), afiançando ao Estado o dever de prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, bem como, responsável pela formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos.

Como assegurado pela Constituição, o artigo 196 da CF/1988 dispõe que “à saúde é um direito de todos e dever do Estado, que deve ser garantido mediante políticas sociais e econômicas que, além de reduzir o risco de doenças, assegurem o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Dresch (2015, p. 29) ressalta que:

O acesso universal deve ser compreendido no sentido de que se assegure à universalidade de pessoas o acesso aos serviços de saúde, garantida a igualdade de oportunidades para tratamento, dentro do contexto da equidade, ou seja, de que a cobertura regulada ocorra de modo a permitir que todos sejam atendidos.

 

Silva (2013, p.181) enfatiza que “[...] os direitos fundamentais do homem são situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana”.

O direito à saúde é primordial para que se efetivem os demais direitos, tendo em vista se tratar de um direito fundamental inerente a própria vida. É por meio deste que coexistem outros direitos a saber - o direito à vida, liberdade, e os diversos existentes, uma vez que ausente o bem-estar físico e mental, não há dignidade.

Dresch (2015, p. 4) ressalva que:

Quanto ao acesso igualitário à saúde, parte da doutrina entende que esta se destina apenas aos pobres. A ponderação é de que somente as atividades preventivas geram o direito ao atendimento integral e gratuito, beneficiando tanto ricos como pobres. Quanto à medicina curativa, entende que deva ser remunerada, exceto quando se tratasse de indigentes e pobres

 

Assim, à expressão acesso universal e igualitário deve ser dado a interpretação mais ampla possível, de modo que seja assegurado o acesso à saúde, tanto preventiva como curativa, a todos, sem privilégio, discriminação, não se permitindo a instituição de políticas públicas baseadas no critério da hipossuficiência, ou seja, deve ser assegurado tratamento igual e garantido o acesso tanto ao pobre quanto ao rico.

O entendimento prevalente é de que a igualdade de acesso à saúde visa ao atendimento a todos, independentemente de sua situação econômica, sob pena de não ter muito valor sua consignação em normas constitucionais, até porque se trata de um direito social fundamental ao qual não cabe fazer distinções de classe social), pois a titularidade do direito à saúde a toda e qualquer pessoa, inclusive ao estrangeiro (SILVA, 2007, p. 767).

 

Tais Políticas Públicas devem ter como escopo não somente o tratamento da doença em si, e sim a redução de seus riscos e de outros agravos, por meio de ações e serviços que promovam, protejam e recuperem o estado de bem-estar físico, mental e social do indivíduo e da coletividade, já que além de um direito de caráter individual, a saúde é também um direito coletivo, o qual deve ser acessível a todos de maneira igualitária e universal. As normas de regulação das redes de saúde que repartem a competência e distribuem as atribuições entre os gestores (União, estados, Distrito Federal e municípios), fracionando a solidariedade institucional ou sistêmica introduzida no artigo 23, da Constituição Federal, devem ser observadas por ocasião da propositura das demandas judiciais.

O artigo 198, II, da Constituição Federal adentrou entre as suas diretrizes o atendimento integral à saúde, e, embora sejam priorizadas as atividades preventivas, isso deve ser realizado sem prejuízo dos serviços assistenciais, ou seja, não constitui uma regra restritiva, tratando-se de norma de eficácia plena.

Dresch (2015) aduz que a integralidade é tratada na Constituição Federal como uma diretriz para a organização do sistema único, elevada pelo artigo 7º, I, da Lei n. 8.080/1990 (Lei Orgânica da Saúde) à categoria de princípio orientador do Sistema Único de Saúde. A especificidade e o detalhamento das disposições constitucionais que asseguram o acesso amplo à saúde pública constituem-se de normas com efeito concreto quanto à integralidade do atendimento.

As alterações que a Lei nº 12.401/2011 introduziu na Lei nº 8.080/1990 disciplinam a incorporação de novas tecnologias no SUS, estabelecendo as regras que definem a cobertura integral, com a padronização da incorporação de novas tecnologias (artigo 19-M), contudo no artigo 19-O foi incluído como critério o custo-efetividade para a sua incorporação. Os produtos com eficácia comprovada que não vieram a ser incorporados em razão do custo-efetividade fatalmente terão proteção judicial, porque o critério de integralidade introduzido no artigo 198, II, da Constituição Federal não permite essa interpretação restritiva.

Segundo Dresch (2015) o fato de o artigo 197 da Constituição Federal ter delegado à lei a regulação da saúde não admite a possibilidade de restrição dessa garantia constitucional, sob pena de fraudar as expectativas constitucionais, segundo assinalou o Ministro Celso Mello.

O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. (BRASIL. RE-AGR N. 393175/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 12-12-2006).

 

Como visto, entende-se que o Supremo Tribunal Federal adota uma postura tendente à possibilidade da intervenção judicial no âmbito das políticas públicas em saúde.

Ressalta-se que, embora seja matéria de relevância pública, a efetivação do direito à Saúde não trata de atividade exclusivamente pública, uma vez que a própria Constituição Federal, em seu artigo 199, dispõe que sua assistência será livre a iniciativa privada.

 

4 A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO A SAÚDE NA ESFERA PÚBLICA

 

Neste estudo será abordado o termo judicialização do direito a saúde na esfera pública, entende-se que a judicialização do direito a saúde significa a expansão do Poder Judiciário no controle de questões que envolvem direitos fundamentais que devem ser garantidos por meio de políticas públicas elaboradas pelo Estado.

Segundo Maciel e Koerner (2002) a judicialização é um fenômeno que tem influenciando diretamente na vida social das pessoas. Relaciona-se com a transformação constitucional após 1988, que permitiu o maior protagonismo dos tribunais em virtude da ampliação dos direitos fundamentais, da democracia, da cidadania e do Estado de bem-estar social.

A judicialização a saúde, tem se direcionado a diversos serviços públicos e privados, tais como o fornecimento de medicamentos, a disposição de exames e a cobertura de tratamento para doenças. E o resultado destes processos são as intensificações do protagonismo do judiciário na efetivação da saúde. O judiciário tem sido chamado para decidir sobre esse tipo de demandas, o que o alçou a ator privilegiado e que deve ser considerado quando o assunto é política de saúde. (BRASIL, 2015).

Apesar da Carta Magna de 1988 ter alavancado o direito à saúde ao status de direito fundamental e dever do Estado, mister se faz admitir a realidade fático social, que é a insuficiência de estrutura do sistema adotado pela Constituição e administrado pelos nossos gestores. Tal realidade gerou uma certa legitimidade do Poder Judiciário em suprir as demandas urgentes e peculiares as quais o Poder Executivo, com sua “infraestrutura” e “sistematização” não pode tutelar de forma efetiva.

Uma vez que o fenômeno jurídico da judicialização da saúde é notoriamente reconhecido e acolhido pelo ordenamento jurídico, é evidente a razão de ser deste “instituto” é pautada na urgência de efetivação do direito, cuja satisfação reside nas técnicas processuais cabíveis e instrumentas que tornam o mesmo concreto no plano fático. Ao admitir a necessidade de efetivação da prestação jurisdicional, que já se encontra como atividade “compensatória”, o Poder Judiciário fez-se valer da simplicidade de atos processuais sumários que se coadunam com a natureza peculiar do direito à saúde, pautada na urgência e satisfação imediata que não se comprometem pela morosidade do Poder Judiciário.

Sobre tal efetivação, ensina o Zavaski (2009 apud KIRCHHOFF, 2011) que a efetividade do processo, enquanto direito fundamental que também é conhecido como direito de acesso à justiça, consiste simplesmente não na mera avocação da atuação do Estado por meio da atividade jurisdicional, mas também de adquirir, em prazo adequado, uma decisão justa com eficácia no plano fático.

Para garantir o direito à saúde, não sendo o mesmo efetivado através de uma política pública e prestação de serviço regular pelo Estado, o caminho exercido pela cidadania tem sido o de recorrer ao poder Judiciário, o que tem ocorrido de maneira frequente seja ela individual ou coletiva.

Apoliano (2013) aduz que problemas na área da saúde são frequentes e muitas vezes, médicos se encontram em situações com pacientes que apresentam diagnósticos de doenças graves que necessitam de tratamentos caros e imediatos sendo tal tratamento impossibilitado pela saúde pública. O Estado através do Sistema Único de Saúde tem o dever de fornecer medicamentos e tratamentos adequados em postos de saúde e hospitais, porém as verbas por serem má distribuídas fazem a população por essa razão recorrer para ter seu direito à saúde garantido ao processo de judicialização. Diante desse fato o poder Judiciário vem sendo procurado para que o mesmo efetue decisões de reconhecimento e a concretização de direito, sendo uma demanda que vem apresentando amplo crescimento, uma vez que o sistema público de saúde tem se mostrado ineficiente por não ter políticas públicas adequada.

[...] o Poder Judiciário, conforme aqui defendido, vem enfrentando verdadeiro dilema, frente a cada demanda que lhe é encaminhada, seja individual, seja coletiva, que pugna por prestação do Estado, bem como ainda da iniciativa privada, no caso de a decisão ser referente à instituição que de forma complementar ao Sistema Único de Saúde. (SILVA, 2010, p. 94).

 

O Estado deve criar meios para prover serviços médicos hospitalares e fornecimento de medicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê de os entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementação das mesmas (artigos 23, II e 199, § 1°, da Constituição Federal) (BRASIL, 1988).

Apoliano (2013) ressalta que a judicialização do direito à saúde consiste na busca que o cidadão vem solicitar a efetivação do direito à saúde junto ao Poder Judiciário favorecendo o fornecimento de fármacos, tratamentos e procedimentos cirúrgicos. Nesse cenário há de se apontar, também, o crescimento da consciência dos cidadãos, acerca dos seus direitos, como motivo inerente a judicialização. Desta forma a atuação do Poder Judiciário se revela quando se verifica a omissão dos demais Poderes da República em concretizar o direito à saúde assegurada pelo texto constitucional.

No entendimento de Nunes (2011, p. 57)

No âmbito do direito à saúde, são em grande número as decisões de Tribunais de Justiça reconhecimento o dever do Estado de fornecer gratuitamente medicamentos ou tratamentos a pessoas doentes e, condenando o Estado ao pagamento de multas diárias para o não cumprimento deste dever. Em matéria de saúde, constitui-se em atitudes mais gravosas, pois este guarda estrita relação com os direitos fundamentais, diga-se o principal, de direito à vida.

 

Assim, Apoliano (2013) é efusivo em afirmar que o judiciário no efetivo dever de zelar pelo direito a saúde tem que reconhecer sua relevância e seus limites, para que possa prever as consequências de suas atuações. Por vezes negar providência a um pedido individual mostra-se incoerente com o direito à saúde, à vida e a dignidade humana. É necessário, mais que bom senso, nesses parâmetros de atuação. A questão da saúde pública ainda não foi assumida com a devida prioridade dada pela Constituição, pois se há muitas demandas no Judiciário, significa uma ineficiência da Administração na prestação dessa assistência.

Desta forma, observa-se uma grande demanda de ações judiciais acerca de acesso de procedimentos cirúrgicos, terapêuticos, leitos de UTI, fornecimento de medicamentos e outras prestações positivam de saúde pelo Estado representando um significativo avanço no exercício da cidadania. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao tratar de difícil equacionamento entre a reserva do possível e o limite orçamentário, com o mínimo existencial a ser garantindo pelo ser humano, em regra, tem optado por garantir o direito à saúde (SILVA, 2010).

O poder Judiciário atua com dever que intervém em situações específicas para corrigir defeitos isolados garantindo ao cidadão através de decisões que permitam o seu acesso à saúde diante da omissão do Estado. O direito à saúde é um direito fundamental de eficácia plena, diante de um crescente e cruciante processo de judicialização do direito à saúde.

Apoliano (2013) enfatiza que não cabe outro entendimento senão a tutela aos direitos de saúde que compreende direto subjetivo do cidadão, instransponível e que se dispõe à frente de critérios de ordem financeira. Assim, o Estado não pode se eximir de prestar os medicamentos ou tratamentos necessários, devendo ser um facilitador, ou seja, concedendo os insumos suficientes ao tratamento do enfermo sem que este tenha de recorrer ao Judiciário.

Nesse sentido (Davies, 2012, p.93) apregoa que:

As ações judiciais que têm como objetivo fornecimento de medicamentos ou tratamentos que muitas vezes geram o descompasso do sistema público de saúde, ficando demonstrado a concessão individual excessiva e desorientada de medidas, que obrigam o Estado a fornecer medicamentos e efeitos multiplicador resultante inviabilizador de um próprio sistema proposto pelo constituinte.

 

A judicialização do direito à saúde no Brasil aparece permitindo a determinados indivíduos muitas vezes, provenientes de classes economicamente abastadas a ter acesso a prestações que não são oferecidas para toda população, prejudicando a equidade e a eficiência do sistema público. Na raiz dessas dificuldades encontra-se uma compreensão imperfeita dos princípios que regem as políticas de saúde do Brasil, o que faz com que as demandas nessa área sejam tratadas como problemas (NUNES, 2011).

 

[...] Deve-se buscar junto ao Poder Judiciário controlar as lacunas na prestação de ações de saúde e visando corrigi-las e atualizá-las de acordo com a ciência e a técnica médica, e de conformidade com os recursos públicos que venham ser disponibilizados. Para tanto sempre de forma progressiva a fim de atender as necessidades de toda população.  Na formulação das políticas públicas de Saúde, e não em sua busca individualizada de medicamentos ou de outras ações de correlatas. Para fazer isso, com direito prestacional que é o direito à saúde, deve-se perseguir na formulação dos protocolos pela administração pública sejam estabelecidas as ações adequadas e compatíveis com os recursos públicos disponibilizados pela sociedade para esta finalidade. (NUNES, 2011, p. 130).

 

A judicialização da saúde é arrazoada uma vez que, há omissão das políticas públicas para que o Sistema Único de Saúde tenha atuação eficaz garantindo assim o direito do cidadão. Assim, o poder judiciário, intervém obrigando o Estado a disponibilizar medicamentos e (ou) tratamentos imediato arcado pelo SUS, com os custos em estabelecimento particular se não houver vaga em estabelecimentos públicos.

Infelizmente, muitos são obrigados a recorrer a judiciários para ter direito à saúde, embora, esse seja o último recurso para ter seu direito efetivado. O poder judiciário tem a preocupação de parecer eficaz na fiscalização da atenção aos direitos fundamentais pelo Estado, no campo do direito à saúde a sociedade busca obter do Estado uma prestação capaz de permitir o acesso a determinado serviço, garantindo o seu direito à saúde, que, por sua vez precisam de imediato atendimento, sob pena de perecimento da vida.

 

5 A VIA ADMINISTRATIVA DA SAÚDE

 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) conceitua a saúde como "um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades". A Constituição Federal positiva esse direito como norma de eficácia plena e imediata, de direito público subjetivo que garante ao cidadão o direito de exigir do Estado à promoção da saúde, não apenas na prevenção, mas o tratamento das doenças garantindo condições mínimas para assegurar uma existência digna.

O Sistema Único de Saúde é composto de ações e serviços públicos que fazem parte de uma rede regionalizada e hierarquizada e organizado de forma descentralizada, dirigido por cada esfera de governo, com atendimento integral, priorizadas as atividades preventivas, garantidos os serviços assistenciais.

Esse acesso total e igualitário no atendimento a saúde pelo setor público, tem com princípio norteador a garantia de tratamento e fornecimento de medicamentos que integra o mínimo existencial do indivíduo que dele necessite para sobreviver, mas que não possua recursos suficientes para adquiri-lo.

A jusfundamentalidade do mínimo existencial ou do princípio da dignidade da pessoa humana representar um subconjunto, dentro dos direitos que é efetivamente exigível do Estado. Este núcleo seria associado ao estabelecimento de prioridades orçamentárias, porém, o fornecimento desses itens fica restrito àqueles relacionados às listas dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas oficiais, que são elaboradas pelo próprio Estado, o que dá margem para atuação judicial, quando o tratamento ou medicamento não se incluem nessa lista.

Não são claros os limites da interferência judicial sobre o conteúdo das decisões dos governos no tocante à utilização dos recursos públicos na saúde e muitas das decisões ofendem diretamente o princípio democrático, já que é de competência das três esferas de governo, de maneira conjunta, definir esses mecanismos de controle e avaliação dos serviços de saúde.

O Estado tem a incumbência de gerenciar e aplicar os recursos orçamentários, financeiros e realizar o planejamento de curto e médio prazo para promover a articulação de políticas de saúde. Assim como, também para financiar, adquirir e distribuir os medicamentos, bem como, para realização de procedimentos para o tratamento de patologias complexas, raras e crônicas.

Tendo como base constitucional que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, sendo conferido livre acesso ao Poder Judiciário como forma de garantia de direitos, hoje o cidadão que necessita de tratamento clínico ou o uso de determinado produto farmacêutico não incorporado pelo SUS, apesar de formular um pedido administrativo escrito, nem sempre aguarda a resposta negativa à pretensão, mas ingressar imediatamente com uma ação liminar pleiteando o recebimento da medicação ou tratamento prescrito pelo médico, apenas tendo como base jurídica o receituário médico.

Contudo, além da Constituição Federal, existem inúmeras outras normas, nos âmbitos estadual e municipal, que tratam sobre o direito à saúde, algumas delas criando regras e procedimentos para garantir o tratamento e o fornecimento gratuito de medicamentos pelo Sistema Único de Saúde, porém, nenhuma estabelece a obrigatoriedade da formulação de pedido administrativo anterior, por escrito, para conseguir direito tutelado, antes de adentrar o mérito judicial.

A obrigatoriedade de o pedido administrativo ser nega para depois para buscar tutela jurisdicional fere diretamente toda a sistemática de proteção à saúde e à vida do cidadão, visto que, é de evidente a situação calamitosa na qual se encontra a saúde pública brasileira, exigindo que o cidadão doente percorra um longo e atribulado caminho para conseguir tratamento que deveria ser fornecido de forma digna pelo Estado, conforme previsto na Constituição Federal.

Em função da conjunção econômica-social, nem sempre o Estado poderá atender aos anseios dos cidadãos, o que traz um amplo debate acerca das atuais políticas públicas adotadas pelo Sistema Único de Saúde na distribuição de medicamentos e tratamentos clínicos e dos meios utilizados para sua efetivação. O que abre espaço para intervenção judicial como forma de hipotética na promessa constitucional de prestação universalizada do direito à saúde.

Quando o Estado não institui políticas públicas suficientes para corresponder aos anseios da sociedade, o cidadão busca no Poder Judiciário respostas para suas necessidades. A demanda judicial relacionada a procedimentos e insumos de saúde contra entes públicos tem crescido exponencialmente nos últimos anos. (VENTURA, 2010).

O judiciário vem assumindo o papel de protagonista na implementação dessas políticas sociais, pois as decisões começaram a efetivar os direitos sociais, em especial, o direito à saúde, por meio da concessão de medicamentos e de tratamentos médicos, inclusive experimentais e de elevado custo financeiro.

Essa interferência nas políticas públicas do Estado, por meio da judicialização se tornou um grande problema no direito à saúde, pois é excessiva e sem critérios. Observa-se, desta feita, uma ausência de parâmetros normativos no momento de se definir a concessão de medicamentos e tratamentos de saúde, fato que pode revelar-se problemático para ordem democrática brasileira, pois ao se garantir o direito à saúde ao litigante de um processo, estará, ao mesmo tempo, atropelando os demais cidadãos que não ingressaram com a ação.

Ao determinar a entrega imediata do objeto tutelado ao cidadão que recorreu à justiça, o Judiciário modifica o processo decisório de alocação de recursos do SUS, individualizando questões que deveriam ser tratadas sob os parâmetros coletivos.

Dessa forma, a judicialização tem causado grandes prejuízos ao Sistema Público de Saúde, pois impacta o orçamento dos entes federativos, sobretudo dos municípios de menor porte, que são obrigados a desviar recursos para ações não planejadas, exacerbando com isso a ineficiência dos serviços públicos.

É razoável e indispensável que as decisões considerem os limites e possibilidades do próprio Estado. Além do mais, que as intervenções judiciais tenham parâmetros como forma de evitar o caos na saúde pública. Por isso, o fortalecimento da via administrativa é um meio adequado para reduzir a tensão entre os poderes e garantir a redução do número de demandas.

O forte impacto financeiro das demandas judicias compromete o orçamento e afeta as políticas públicas de saúde que são previamente planejadas pelo Poder Executivo, gerando assim uma escassez de recursos e sendo imprescindível a reformulação das políticas para alocação compatível com os princípios de universalidade, integralidade, igualdade e equidade do sistema.

O descompasso entre as necessidades sociais e as possibilidades do Estado produz um grande imbróglio, principalmente no âmbito jurídico que engloba o direito a saúde. Essas considerações podem ser confrontadas como causa da situação de criação de normas pelo Poder Judiciário, como bem destaca André Rufino do Vale:

A deficiente estrutura e a forte carga axiológica das normas que os asseguram têm o poder de fazer imergir o processo de sua interpretação/ aplicação numa dimensão argumentativa simultaneamente jurídica e moral, emprestando à atividade judicial um caráter inevitavelmente criativo. Nesse contexto, a aparente invasão do direito por técnicas próprias da argumentação moral e o consequente desequilíbrio causado na configuração institucional dos Poderes no Estado Constitucional tornam-se alvos fáceis dos críticos que enxergam em tal realidade um risco incalculável para a democracia e para a proteção dos direitos individuais (VALE, 2009, p.3).

 

Cabe ao poder público zelar pela saúde da população, minimizando os riscos de uso acrítico de tecnologias, especialmente o relacionado às novas incorporações tecnológicas que, mesmo tendo passado pela avaliação de sua eficácia, ainda devem ser submetidas a um monitoramento para a avaliação de sua segurança. Pois há diversos exemplos de medicamentos "inovadores" que são retirados do mercado após algum tempo de uso, o que tem reforçado a necessidade de se ter uma conduta cautelosa.

Para o fortalecimento da via administrativa é imprescindível o planejamento envolvendo as três esferas de governo, pois é importante o trabalho em conjunto como forma de fortalecimento das organizações desse sistema e a oferta dos serviços à população.

Como consequência, os gestores do SUS estão sentindo cada vez mais a necessidade de organizar, internamente as secretarias de saúde, vislumbrando a possibilidade de julgar a crescente demanda de processos, trabalhando de forma descentralização as tarefas, bem como a formação de equipes para as questões de planejamento, acompanhamento, monitoramento e avaliação.

A doutrina tem entendido que apenas o Legislativo e Executivo possuem poder de decisão em relação às escolhas político-jurídicas do Estado, pois são os detentores legitimo desse poder. Eduardo Appio se posiciona sobre o controle judicial das políticas pública dispondo que:

Existe, portanto, um conflito direto entre o direito à vida de um cidadão, o qual busca através do Poder Judiciário, a sua sobrevivência, e o direito à vida de outros cidadãos, os quais dependem do orçamento público para sobreviver. A decisão acerca das prioridades a serem conferidas pelo Estado nesta área é essencialmente uma decisão política e moral, que refoge do âmbito do controle judicial, motivo pelo qual as ações individuais em face do Estado não podem implicar a substituição da atividade administrativa. (APPIO, 2013, p. 6).

 

Para a legitimidade da Via Administrativa devem ser estabelecidos limites ou parâmetros para essa atuação ativista, que deve ficar apenas no plano de concretização e efetivação dos princípios consagrados pelo texto constitucional. Por isso, o Poder Judiciário deve ter conhecimento da forma de atuação e assim, respeitar as medidas adotadas pelo administrador público quando estiverem dentro da legalidade e da razoabilidade, cabendo ao judiciário somente analisarem a legitimidade das ações em face dos critérios legais e, não sobre o aspecto do mérito, pois tal atitude seria uma interferência abusiva, diante do fato de que os demais poderes têm as suas próprias funções e prerrogativas estabelecidas pelo ordenamento jurídico e que devem ser respeitadas.

Por fim, as decisões judiciais devem ser pautas sobre a ótica da racionalidade, sendo razoável não se estruturar em juízos subjetivos de valores e mérito, pois a buscar pela fundamentação dentro dos critérios legais, deve ser respeitada, sempre dentro da esfera de competência, não extrapolando os limites Constitucionais, pois é fundamental importância à troca de informações com os órgãos do Poder Executivos responsáveis, permanecendo assim, inteiramente ligada à atuação institucional na efetivação dos direitos e garantias fundamentais no que tange a buscar do direito à saúde.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A Constituição Federal de 1988 enfatizou a Saúde como direito fundamental de manifesta essencialidade, realçada nos inúmeros dispositivos destinados a esse instituto. Conforme o artigo 196 da Carta Magna, a Saúde passou a ser contemplada como direito de todos e dever precípuo do Estado. Igualmente, em que pese a legislação infraconstitucional, os serviços e ações deliberados a otimizar a prestação do serviço público, no âmbito da Saúde e distribuição de fármacos, são eles dispostos, com precisão, no texto da lei.

Entretanto, não são poucos os meios previstos pela Constituição e demais leis que coagem o Poder Público na realização do Direito à Saúde, ressaltando, o fornecimento de medicamentos, internação para procedimentos cirúrgicos e tratamentos diversos. Indubitavelmente o Judiciário Brasileiro está sobrecarregado de processos em que a Saúde tem se apresentado com muita evidência, pleiteando processos cirúrgicos, remédios ou leitos em hospitais.

Baseado nesses fundamentos é que houve a expansão da atuação judicial, fazendo nascer a judicialização de políticas públicas na área da saúde, mas conhecida como “judicialização da saúde”, pois diante das omissões do Estado na garantia do direito fundamental à saúde, o cidadão viu-se obrigado a buscar tutela judicial.

Para entender os impactos da judicialização dos serviços de saúde do cidadão frente ao Estado é necessário verificar a eficácia jurídica das normas constitucionais que estabelecem o direito social à saúde como direito fundamental, convém evidenciar a positivação no Estado Brasileiro quanto à constitucionalização do direito ao acesso universal e gratuito de tratamentos de saúde para todos os indivíduos.

Ocorre que, diante do processo de judicialização da saúde, a doutrina e o próprio STF descreveram limites à atuação judicial, para que nem o Estado, nem o cidadão tivessem seus direitos desrespeitados. O STF defende a ideia de que o juiz diante do caso concreto, deve aplicar em suas decisões o Princípio da Razoabilidade.

Destaca-se que, a solução seria que o Estado atuasse com qualidade na concretização dos direitos fundamentais e, com comprometimento, conseguissem oferecer um serviço de saúde digno a todos, independentemente de qualquer interferência do Poder Judiciário. Como essa situação é uma realidade apenas hipotética, se faz necessária o fortalecimento da Via Administrativa como meio adequado para reduzir a tensão entre os poderes e garantir a redução da judicialização, para que pelo menos aqueles que buscam tutela judicial possam usufruir, na mínima dimensão desejável, o direito conferido pela Norma Constitucional de forma mais célere.

 

 

REFERÊNCIAS

 

APPIO, Eduardo. Controle judicial das políticas públicas no Brasil. Curitiba: Juruá.2013.

APOLIANO, Patrícia Rita Moraes. Acesso a saúde como direito fundamental e aplicação do princípio da reserva do possível na saúde pública. Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade Santa Terezinha – CEST. 57 fl. 2013. São Luís.

 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília (DF): Senado Federal, 1988.

 _______. Judicialização da saúde no Brasil: dados e experiência. Coordenadores: Felipe Dutra Asensi e Roseni Pinheiro. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2015.

 _______. Supremo Tribunal Federal. Re 393175/RS. Rel. Min. Celso de Melo, julgamento em 12-12-2006. Disponível em: . Acesso em: 15 mai. 2018.

 DAVIES, Ana Carolina Izórios. Saúde pública e seus limites constitucionais. São Paulo: Editora Verbatim, 2012.

 DRESCH. R.L. O acesso à saúde pública e a eficácia das normas de regulação do Sistema Único de Saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS: Para entender a gestão do SUS. 1ª ed. 2015.

 KIRCHHOFF, Katiane. A efetividade da tutela antecipada nas ações de medicamentos. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 90, jul. 2011. Disponível em: . Acesso em: 20 fev. 2016.

 LEDUR, José Felipe. Os direitos fundamentais sociais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.

 MACIEL, Débora Alves; KOERNER, Andrei. Sentidos da judicialização da política: duas análises. Lua nova. nº 57. 2002.

 MAIA, Thaís Duque. A judicialização da saúde sob a ótica da proporcionalidade. Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal de Lavras. 36f. Lavras-MG. 2017.

NUNES, Jose Antônio Avelãs. Os tribunais e o direito a saúde. Porto Alegre: ed, Letras, 2011.

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 SCHWARTZ, Germano André D. Direito a Saúde: efetivação em uma Perspectiva Sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 35. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

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 _______. Comentário contextual à Constituição. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

 SILVA, Ricardo Augusto Dias. Direito fundamental à saúde: o dilema entre o mínimo existencial e a reserva do possível. Belo Horizonte: Fórum, 2010.

 VALE, André Rufino do. Estrutura das normas de direitos fundamentais: repensando a distinção entre regras, princípios e valores. São Paulo: Saraiva, 2009.

 VENTURA, Miriam. Judicialização da saúde, acesso à justiça e a efetividade do direito à saúde. Physis, vol.20 no.1. Rio de Janeiro. 2010.



* Artigo de pós-graduação apresentado ao Verbo Jurídico.

* Pós-graduanda em Direito Médico.

 

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