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Procedimento na ordem jurídica processual brasileira


Autoria:

Gisele Leite


Professora universitária com mais de uma década de experiência em magistério superior, mestre em direito, mestre em filosofia, graduação em direito pela FND-UFRJ, graduada em Pedagogia pela UERJ, conselheira do INPJ.

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Resumo:

De Büllow à Fazzalari, deixamos de encarar o processo como relação jurídica para procedimento em contraditório.

Texto enviado ao JurisWay em 02/03/2018.



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Desde Von Büllow o processo tem sido considerado por muitos doutrinadores como sendo essencialmente uma relação jurídica. Trata-se de uma relação jurídica que se desenvolve segundo determinado procedimento.

 

 

 

Em Cândido Rangel Dinamarco aponta-se que o processo é a soma da relação jurídica processual e procedimento. Nessa relação jurídica se estabelecem direitos, poderes, deveres, faculdades entre os sujeitos do processo.

 

 

 

O procedimento é o que dita o ritmo a velocidade e o modo de como o processo se desenvolve. O processo representa uma relação jurídica dinâmica e se movimenta em direção a um fim.

 

 

 

Há no processo desde de sua etimologia uma nítida vocação finalística e dinâmica.

 

 

 

Procedimento é entendido como modelo de sequência de atos, ou o esquema a ser observado para atingir um determinado fim. Enfim, o procedimento é o caminho percorrido pelos sujeitos do processo.

 

 

 

O procedimento é a face palpável do processo, mostrando uma sequência de atos que são praticados coordenadamente. A relação jurídica se desenvolve e envolve o demandante, juiz e demandado.

 


Alguns doutrinadores não fazem distinção entre norma de processo e norma de procedimento pois se referem a uma mesma realidade. Alterar um prazo processual repercute nos poderes das partes e no direito de defesa.

 


Apesar da CF/1988 estabeleça ser privativo da União legislar sobre matéria processual (art. 22) prevê competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal a respeito de procedimentos em matéria processual (art. 24, IX).

 

 

 

Pelo mesmo dispositivo, caberia à União estabelecer normas gerais na matéria processual, sem prejuízo da competência suplementar dos Estados (e o Distrito Federal). Quais seriam nesse contexto, as normas procedimentais?

 

 

 

Enfim, a questão é controvertida e Vicente Greco Filho entende que não é possível separar procedimento de direito processual. O doutrinador então, defende que competência concorrente estabelecida no artigo 24, IX limita-se a procedimentos administrativos de apoio ao processo.

 

 

 

Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini reconhecem a dificuldade em separar e destacam que os temas relacionados a jurisdição, ação, defesa, contraditório, condições da ação, decisões judiciais e pressupostos processuais estão fora da competência estadual para legislar.

 

 

 

Aliás, a difícil distinção diante da descoberta do caráter público do processo. O processo tem sua natureza peculiar em um primeiro momento por servir à jurisdição, já que através dele, o Estado se manifesta o objetivo de fazer valer o ordenamento jurídico.

 

 

 

O processo requer o interesse das partes, mas a jurisdição que nele é fundamental ao Estado. Ao argumentar que o processo é uma unidade jurídica ou uma relação jurídica, afirmou Chiovenda: “Antes de julgar, um pedido de atuação da lei, há de examiná-lo, isso produz um estado de pendência, no qual se ignora se o pedido é fundado ou não, mas se envida o necessário para sabe-lo”.

 

 

 

Durante a pendência, as partes devem se valer de suas passíveis razões, por isso, competem-lhes direitos e deveres. A ideia conforme Marinoni e Arenhart elucidaram vislumbrada por Hegel positivada por Benthamnn-Helweg e, depois explanada por Büllow e, mais tarde por Kohler e muitos outros concluindo que o processo civil contém uma relação jurídica.

 

 

 

É verdade que origem dessa tese surgiu na pandectística alemã apesar da firme influência italiana e, no final do século XIX, recebeu a influência do direito francês ou chamado direito liberal clássico.

 

 

 

Relembremos que o sistema francês tinha características jusnaturalista-racionalista, considerando os direitos naturais inalienáveis.

 


Mas o Código Napoleônico tratava a partir de valores dominantes na época, como um homem abstrato ou sem rosto reconhecido mais tarde como burguês já devorado pelas suas possessões (o homem que resume todos os seus direitos a possuir e a saber como possuir).

 

 

 

O pandectismo alemão não se fundou no jusnaturalismo, dotado de discurso científico, por isso, descrevia um direito dotado maior pureza e abstração, em seu maior isolamento em referência aos problemas reais.

 

 

 

A diferença entre o pensamento francês e o alemão reside nos estilos pois ambas doutrinas possuíam a mesma trajetória histórica, pois procurava servir a uma única classe social, sem preocupação com os excluídos.

 

 

 

A crise do conceito da relação jurídica processual é resultante do seu caráter geral abstrato que neutraliza a substância da própria relação em vida.

 


Assim, a teoria de Büllow não escapou incólume do conceitualismo ou cientificismo neutro tão peculiar à pandectística alemã.  Se a tese da relação jurídica é capaz de evidenciar o que acontece quando o litigante (o autor) que vai em busca em juiz em face daquele réu que resiste à sua pretensão, por outro lado, encobre, as intenções do Estado ou de quem exerce o poder estatal, além de ignorar as reais necessidades das partes bem como ignora também as situações de direito material e as diferentes realidades dos casos concretos.

 

 

 

A pretensa neutralidade da relação jurídica processual esconde a realidade concreta, e se distancia do direito material e da vida real.

 

 

 

O direito alemão contemporâneo revela a influência do conceitualismo sobre o processo civil do Estado Liberal Clássico, o ZPO exprime o pensamento liberal do Estado de Direito burguês, o que determinou o seu elevado grau de abstração.

 

 

 

O ZPO é uma legislação extremamente formal bem como aquela que depois formou o BGB (Código Civil Alemão). Toda a criação jurídica deve ser abstrata.

 

 

 

Assim, para o direito processual a parte somente é existente em seu rol processual.

 

 

 

Desta forma, o postulado da justiça limitava-se à igualdade formal perante a lei e, raramente, como no caso da assistência judiciária gratuita aos hipossuficientes é aberta uma brecha no sistema extremamente formal, que se traduz como uma parcial ligação com a realidade sociopolítica.

 

 

 

Evidente é que no esquema da relação jurídica processual a principal instituição é a jurisdição, assim ao ignorar a realidade concreta de seus sujeitos pode admitir e acolher qualquer forma de exercício de poder.

 

 

 

A neutralidade abstrata da relação jurídica processual é suficiente e eficaz para ocultar qualquer vontade política estatal. Porém, é cediço que nenhum Estado é neutro posto que tenha fins e projetos e que são realizados a partir de seus valores.

 

 

 

Entretanto, tal evidência era desconsiderada pelo conceito pandectístico da relação jurídica processual. Nessa época nem era possível ajustar o procedimento devido ao princípio da supremacia da lei que tende a escamotear qualquer intenção de poder.

 

 

 

Com a cientificidade do conceito de relação jurídica processual oculta a face da parte, ignorando-se que o processo civil incide sobre uma realidade social, a partir da participação das partes na formação da decisão judicial.

 

 

 

No fundo, a noção de relação jurídica é avessa a de legitimidade, seja pela participação no procedimento e de legitimidade da decisão.

 

 

 

A neutralidade da relação jurídica processual imuniza o processo em relação à legitimidade do exercício do poder à legitimidade da tutela dos direitos e dos direitos fundamentais.

 

 

 

A principal crítica à teoria da relação jurídica processual é a sua postura neutra e descompromissada com realidade social do homem, isto é, da parte e à sua transparência em relação à legitimidade do poder, do procedimento e da própria decisão judicial.

 

Trata-se de uma crítica ideológica- cultural. Através do processo, o Estado se desincumbe do seu dever de prestar tutela aos direitos deve ser focalizado sob diversos ângulos, todos eles imprescindíveis à concretização do processo adequado ao Estado contemporâneo notadamente ao Estado Constitucional.

 

A legitimação pela participação das partes e sua influência na formação da decisão confirma que o processo requer a legitimidade do exercício da jurisdição.

 

 

 

Somente a participação das partes é insuficiente da jurisdição além de participar, a parte tem direito ao procedimento adequado à tutela do direito material.

 

 

 

 

 

Assim tal direito se dirige ao legislador, obrigando-a a instituir o procedimento idôneo e, também sobre o juiz, especialmente em razão de normas processuais abertas.

 

 

 

Tais normas outorgam à parte o poder de estruturar o procedimento segundo as necessidades do direito material e do caso concreto.

 

 

 

O processo requer a legitimidade do procedimento diante dos direitos fundamentais. A legitimidade material dos procedimentos diferenciados, particularmente dos procedimentos delineados pela lei mediante restrições às afirmações que o réu poderia fundar no direito material sendo dependente dos direitos fundamentais materiais.

 

 

 

A legitimidade da decisão judicial para alguns doutrinadores, como a teoria de Luhmann, não apresenta a questão autônoma. Sendo viável apenas debater o problema da legitimação da jurisdição, já que não existe objetividade possível nas questões normativas.

 

 

 

Dessa forma, a legitimidade da decisão judicial é consumida pela legitimidade provida através do procedimento. Inegável para teoria contemporânea do processo é o caso da legitimidade da decisão judicial, especialmente quando se depara com a lei infraconstitucional diante dos direitos fundamentais (sendo missão indispensável ao Estado Constitucional).

 

 

 

A afirmação jurisdicional dos direitos fundamentais serve para controlar as leis editadas pelo parlamento. É sobre o tema controvertem pelo menos três grandes correntes doutrinárias, a saber: os textualistas, os procedimentalistas e os substancialistas[1].

 

 

 

Cada uma das correntes dá uma solução ao problema da legitimidade da decisão, mas é correto entender que a legitimidade da jurisdição é, assim do processo, não pode descartar ou dispensar a necessidade de que a decisão esteja legitimada pelos direitos fundamentais.

 

 

 

É certo que a decisão é considerada como ato máximo de positivação do poder jurisdicional, pois é, a razão do seu acontecimento e desenvolvimento.

 

 

 

O processo precisa atender aos fins de grande importância para a democracia e, ipso facto, deve ser legítimo. O conceito de processo não considera o procedimento, negando uma parcela importante da realidade a ser compreendida.

 

 

 

O procedimento, em abstrato, previsto em lei ou módulo legal ou no plano dinâmico (como sequência de atos) possui evidente compromisso com os fins do processo e da jurisdição, e, portanto, com a tutela dos direitos.

 

 

 

A definição clássica do processo ao ignorar o procedimento, tem íntima relação com os valores do Estado Liberal e com fundamentos da doutrina que se encarregou da demonstrar as bases do direito processual.

 

 

 

No Estado Liberal, cabia ao juiz dizer apenas as palavras da lei (jude bouche de la loi). Para o desenvolvimento da sociedade aspirava0se a um direito previsível ou à chamada certeza do direito, entendida como certeza de um hipotético significado prévio do texto normativo.

 

 

 

Almejava-se uma lei abstrata e genérica capaz de disciplinar situações concretas futuras e, assim, eliminar a edição de novas leis e especialmente a possibilidade de o juiz, ao aplicá0la, ser levado a tomar em contas as peculiaridades específicas de uma determinada decisão.

 

 

 

A generalidade e a abstração da lei, desejadas pelo Estado Liberal, impediam o juiz de considerar as circunstâncias concretas. Tal possibilidade inviabilizaria a previsibilidade e a certeza do direito, entendidas como indispensáveis para a manutenção da liberdade dos cidadãos o que era indispensável para o Estado Liberal.

 

 

 

Segundo Montesquieu, o poder de julgar era um poder nulo (en quelquer façon nulle), já que fora concebido para reafirmar o fruto do exercício do poder do legislador.

 

 

 

O processo na acepção liberal, serve para o Estado atue no ordenamento jurídico, evidenciando a noção de jurisdição do Estado Liberal.

 

 

 

O processo revela a cultura onde está imerso. Assim como também a jurisdição, a ação e a defesa obviamente se comprometem com os valores históricos do seu momento histórico.

 

 

 

Repare que a jurisdição no Estado Constitucional se caracteriza a partir do dever estatal de dar tutela aos direitos, especialmente os direitos fundamentais. Já no Estado contemporâneo tem o dever de proteger todas as espécies de direitos, como isso se querendo evidenciar que o juiz, muito mais do que simplesmente aplicar a lei, tem o dever de também compreendê-la a partir dos direitos fundamentais no caso concreto.

 

No Estado Liberal tínhamos uma sociedade legalmente igualizada, as relações têm características definida como homogêneas, portanto, não faz sentido aplicar a lei conforme o caso concreto.

 

 

 

Não se imaginava que um dia o juiz teria que atribuir sentido do texto da lei, a elementos não textuais da ordem jurídica e aos casos concretos.

 

 

 

A verdade que a sentença ao interpretar confere características ao caso, mas é impossível ignorar que, na atualidade, diante do pluralismo da sociedade e da constante transformação dos fatos sociais, é necessário muito mais que isso, uma vez que a interpretação da lei, ou da norma formulada pelo juiz, depende do sentido outorgado ao texto e ao caso concreto.

 

 

 

A segunda revolução provocada pelo constitucionalismo contemporâneo substitui o princípio da legalidade formal pelo princípio da estrita legalidade ou legalidade substancial.

 

 

 

A transformação do princípio da legalidade não significa apenas que da antiga subordinação à lei se passou ao domínio da Constituição, o que gerou grande transformação da própria noção de direito.

 


Afetou a metodologia jurídica a partir da qual a Constituição e a legislação são interpretadas redimensionado o papel da legislação, da jurisdição e da doutrina.

 

 

 

O processo necessita de um procedimento que seja adequado à tutela de direitos e na sua dupla dimensão, sendo capaz e eficaz para obter a observância dos direitos fundamentais processuais, sendo um legítimo instrumento ao exercício do poder estatal.

 

 

 

Concluímos que o processo é o procedimento adequado à tutela de direitos e confere legitimidade democrático ao exercício do poder jurisdicional.

 

 

 

Significado do contraditório

 

 

 

Contemporaneamente o contraditório é diferente daquele existente à época do Estado Liberal. Nesse contexto, no direito liberal, o Estado estava proibido de tratar de forma distinta as diferentes posições sociais em que o próprio direito de ação era visto como direito formal de propor a demanda, o contraditório era visto como mera garantia de conteúdo formal como a simples bilateralidade da instância.

 

 

 

Não se cogitava na realização efetiva do contraditório mediante a possibilidade de influência na decisão judicial e o dever de diálogo público do juiz, nem muito menos em obstáculos sociais capazes de impedir a participação em contraditório.

 

 

 

O legislador e o magistrado são obrigados a estabelecer as discriminações necessárias para garantir e preservar a participação igualitária das partes, seja considerando as dificuldades econômicas que obstaculizaram a participação, seja atentando para as peculiaridades do direito material e do caso litigioso.

 

 

 

Por essa razão, que se exige a participação em igualdade de condições, parte da doutrina italiana cogita em paridade de armas. Observou Mario Chiavario essa paridade de armas não implica em identidade absoluta entre os poderes reconhecido às partes de um processo nem necessariamente uma simetria perfeita entre os direitos e obrigações.

 

Há diferenças racionais no tratamento, à luz de critérios de reciprocidade, e de modo a evitar como for, que haja um desequilíbrio global em prejuízo de uma delas.

 

 

 

Frise-se que o artigo 6º, VIII do CDC constitui direito básico do consumidor obter a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a previsão de inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for este hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.

 

 

 

Por exemplo, quando o autor alega defeito do freio no veículo automotor adquirido que lhe acarretou grave acidente automobilístico provocando danos materiais e pessoais, e, o fabricante não comprova a inexistência do defeito.

 

 

 

A grande dificuldade no devido esclarecimento sobre o nexo da causalidade diante do risco probatório assumindo pelo fabricante, o que deve ser imputada a ele.

 

 

 

Por essa razão, basta o juízo de verossimilhança, ou então, a inversão do ônus probatório, em qualquer caso, deve ser cumprido o exercício do direito ao contraditório e do direito à prova antes do julgamento do mérito da demanda.

 

 

 

O mesmo ocorre diante da proba diabólica que é impossível ou de difícil realização, pois sempre é mais fácil ao fabricante ou ao fornecedor quando há hipossuficiência, técnica para a produção de prova, quando se transfere ao réu o ônus de produzir a prova que, a princípio, incumbiria ao autor, ou a quem alegar.

 

 

 

Novamente deve ser oportunizado o contraditório antes do julgamento do mérito da demanda, o que significa cumprir o devido processo legal.

 

 

 

A norma que distribui o ônus da prova, conforme o fato seja constitutivo ou impeditivo, modificativo ou extintivo não precisaria obrigatoriamente ser prevista pois decorre da natureza do fato que se encontra à base da norma alegada, que requer a presença de certos pressupostos de fato, alguns de interesse do autor da ação e outro daquele que não desejaria que fosse efetivada.

 

 

 

O ordenamento alemão não contém previsão legal do artigo 373 CPC e, por isso, que a doutrina alemã construiu normentheorie. A suposição de que a modificação do ônus da prova deve estar expressa em lei, conforme a situação de direito material está atrelada à ideia de que qualquer incremento do poder do juiz deve estar definido na lei, pois do contrário seria arbitrariedade.

 

 

 

Contemporaneamente, porém, não se deve limitar o poder do juiz, mas sim, controlá-lo efetivamente pelo legislador. É impossível que a lei possa prever todas as possíveis situações a informar quando o juiz possa atuar ou o que deve fazer para prestar adequada a tutela jurisdicional.

 

 

 

O referido controle pode ser obtido por adequada justificativa racional de decisões (art. 373, §1º CPC). O problema que paira sobre a justificação das sentenças jurídicas, propostas por Robert Alexy, se coaduna em um grande número de casos, do qual a afirmação normativa singular trazida pelo doutrinar e que visa expressar um julgamento envolvendo uma questão legal que na visão do mesmo não deve ser considerada como uma conclusão lógica derivada de formulações de normas pressupostamente válidas, tomadas junto com afirmações de fatos comprovadas ou pressupostamente verdadeiros.

 

 

 

O embasamento deve permear pelo menos quatro motivos: a imprecisão da linguagem do direito, a possibilidade fluída de conflitos entre normas, o fato de que é possível haver casos que requeiram uma regulamentação jurídica, que não cabem sob nenhuma norma válida existente, bem como a possibilidade, em casos especiais, de uma decisão que contraria textualmente um estatuto.

 

 

 

Segundo Alexy a metodologia jurídica solucione o problema de como justificar um julgamento jurídico, através da teoria da argumentação.

 

 

 

Entende-se que a Teoria da Argumentação Jurídica de Robert Alexy bem se presta ao desiderato, sendo desta, que este começa pela constatação de que o silogismo judicial não esgota todo o raciocínio jurídico, ou seja, nem toda decisão jurídica é uma questão de mera subsunção do caso particular a uma norma geral pressuposta.

 

 

 

Tal modelo rigorosamente dedutivo se mostrou insuficiente em quatro situações. A primeira quando a linguagem jurídica é imprecisa, a segunda na existência de dúvida sobre a norma a aplicar, a terceira quando o caso não esteja coberto por nenhuma norma, e a quarta e última situação, que compreende a decisão que contraria a norma pressuposta.

 

 

 

As três soluções propostas apelam para os cânones da interpretação, já na segunda situação, se apela para as proposições da dogmática jurídica, e a terceira, por derradeiro, se caracteriza em apelar para os princípios.

 

 

 

Mas, nenhuma destas soluções, contudo, consegue satisfazer, somente seria conclusivo, se os cânones[2] fossem em número definido, e contasse com mais apurada precisão e estivessem hierarquizados numa ordem justificada, somente seria satisfatório se as proposições juscientíficas pudessem apresentar uma justificação conclusiva, e somente seria conclusivo se os princípios tivessem significado, conteúdo e limites bastante precisos.

 

 

 

Conclui-se que nenhum dos recursos da metodologia do Direito é capaz de eliminar a margem de alternativas que ainda se abrem para o julgador, é inevitável que este se sirva de juízos de valor. Surge, então, o problema de como tais juízos de valor podem ser racionalmente justificados.

 

 

 

E, dentro desse contexto, três também foram as soluções propostas, baseadas no apelo, sendo esta para os valores da comunidade ou de grupos determinados, para os valores extraídos doo próprio ordenamento jurídico e, para os valores de uma ordem objetiva.

 

 

 

Alexy e outros teóricos, nenhuma destas respostas satisfaz em face de que se expõe a indeterminação, contradição e preconceitos; seria indefinido ou contraditório toda vez que as normas o fossem, e sofre de dois graves problemas: a pressuposição de uma ordem independente de valores e a derivação, a partir dela, de parâmetros normativos dotados de obrigatoriedade jurídica.

 

 

 

A negação dessas alternativas não precisa significar cair no subjetivismo, que comprometeria o caráter científico da jurisprudência. Há uma outra saída, socorrendo-se de uma teoria da argumentação jurídica.

 

 

 

Foi a evolução gradativa e dinâmica do Direito trouxe no século XXI os chamados pós-positivistas, contrapondo-se à teoria kelseniana, entretanto, dela sempre usufruindo de seus conceitos balizares à Teoria Pura do Direito, mister na problemática do juiz político, porque verificada no jusnaturalismo a incompletude do texto legal já sanada por Kelsen quando do conceito estabelecido da diferenciação entre a lei e norma, tida como qualquer regramento de natureza jurídica, desde que emanada de uma autoridade competente tornando-se gênero da qual a lei seria espécie.

 

 

 

Surgem correntes como a axiologia e o realismo jurídico, que contextualizam o direito alternativo, emergindo assim na crítica com base argumentativa dentro de valores sociais comuns e a ideologia política, respectivamente.

 

 

 

Porém, a necessidade de dinaminzar a elaboração e aplicação correta da norma bem como a ação do juiz quando da vivificação de uma sentença com métodos de interpretação de tal forma à prática efetiva da justiça, dentro dos moldes do Estado Democrático de Direito, o que trouxe acesos debates, vencida, evidentemente como precursora da Escola da Exegese[3] e Histórica (Savigny) cujo conteúdo enfrentava a impossibilidade de o texto legal ser o imperativo e absoluto.

 

 

 

Os chamados pós-positivistas buscam através da Teoria da Argumentação Jurídica da integração e da Tópica Jurídica[4], respectivamente Alexy, Dworkin e Perelman as respostas à adequação da melhor interpretação tendo como fulcro o equilíbrio entre a segurança jurídica e a justiça, considerando os princípios constitucionais como chave para esta exegese.

 

 

 

Entretanto, tal pesquisa consiste somente na abordagem do contexto que envolve toda a argumentação jurídica proposta por Alexy.

 

 

 

A premissa inicial fora a identificação no texto constitucional a relevância dos princípios mesmo que não inseridos expressamente, mesmo os que dormitam implicitamente na Carta Magna, precisamente no artigo quinto, segundo parágrafo da CF/1988.

 

 

 

Então a proporcionalidade surge na teoria de Alexy, e apesar de se negar a escala hierárquica entre os princípios gerais de direito e até mesmo entre estes, a analogia e os costumes, como o mais importante princípio desafiando à solução dos conflitos entre os institutos principiológicos.

 

 

 

É nesse sentido, considerando a tese de argumentação jurídica de Alexy que passamos a discutir uma decisão judicial, tendo em vista que este estudioso entende que um conflito entre as regras somente pode ser resolvido se uma cláusula de exceção, que remova o conflito, for introduzida numa regra ou pelo menos se uma das regras for declarada nula, possíveis dentro da doutrina jurídica mundial, não se fazendo, portanto, a aplicação do princípio da proporcionalidade.

 

 

 

Compreende-se, portanto, que Alexy adentra em sua tese, essencialmente apoiado, no postulado da proporcionalidade, na qual acredita que a máxima está na verificação de meios utilizados para a adequação do caso concreto ao fim, utilizando a ponderação.

 

 

 

Para Alexy, na medida em que exista a colisão entre direitos fundamentais, deve-se primeiramente, buscar a solução de conflito de acordo com meio adequado, valendo-se da adequação de meios disponíveis, posteriormente, deve ser verificada a exigibilidade do meio escolhido e, finaliza ainda, afirmando que, nos casos em que não se tenha ainda a solucionado a colisão, o procedimento a ser utilizado é o da ponderação.

 

 

 

Na ponderação[5] existe o sopesamento que consiste na definição racional de quais os princípios em conflito deverá ter o maior peso no caso concreto em tela. Assim, a decisão sob o ângulo axiológico, diz respeito às valorações presentes na fundamentação da decisão judicial.

 

 

 

A doutrina contemporânea conclui que não é possível ao legislador prover toda situação fática possível de modo fechado, perfeito e pleno. Há um fetiche pela lei conforme aconteceu nos primórdios do positivismo (Escola da Exegese) conduz à injustiça na solução conferida à certos casos concretos e, frequentemente, ao impasse decorrente da ausência de previsão normativa expressa.

 

 

 

Lembremos que o ponto crucial para distinguir entre regras e princípios, é que os princípios são normas que ordem que algo seja realizado na melhor medida que possível, dentro das possibilidades jurídicas e as realidades existentes.

 

 

 

Portanto, os princípios são mandados de otimização que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferente grau e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais sendo também das jurídicas. Assim, o âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostos.

 

 

 

Referências

 

ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica. São Paulo: Landy Editora, 2001.

 

______________ Direito, razão, discurso: estudos para a filosofia do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010.

 

FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 6ª edição. São Paulo: Atlas, 2008.

 

BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito (O Triunfo Tardio do Direito Constitucional do Brasil). In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel (Organizadores). A Constitucionalização do Direito, Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

 

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil 3ª edição. Volume 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

 

BARCELLOS, Ana Paula de. Alguns parâmetros normativos para a ponderação constitucional. In: A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Luís Roberto Barroso (Org.). 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

 

STRECK, Lenio Luiz. Dicionário de Hermenêutica. Quarenta Temas fundamentais da Teoria do Direito à luz da Crítica Hermenêutica do Direito. Belo Horizonte: Letramento: Casa do Direito, 2012.

 

 

 



[1] Os substancialistas valorizam o conteúdo material das Constituições, atribuindo-lhes um papel diretivo, cabendo à lei operacionalizar a concretização de valores axiológicos que contemplam (por exemplo: direitos sociais). De sorte que o Judiciário assume relevante papel na efetivação da Constituição. Os procedimentalistas acentuam o papel instrumental da Constituição que estaria primordialmente voltada à garantia de instrumentos de participação democrática e à regulação do processo de tomada de decisões, com a consequente valorização da liberdade política inerente à concepção democrática. Ao Judiciário caberia somente assegurar a observância desse processo, cabendo a cada geração estabelecer as bases axiológicas sobre as quais se desenvolverá.

O desdobramento da discussão entre procedimentalismo e substancialismo é enorme.  Com efeito, não se pretende esgotar o tema nesta breve reflexão, notadamente em razão da amplitude e complexidade. O objetivo é demonstrar os fundamentos de cada uma das correntes, para ao final alinhavar tais eixos analíticos e concebê-las, frente a Constituição Federal de 1988, como concepções que se complementam. Importa dizer, de como a dicotomia de aludidas correntes de interpretação filosófica implicam numa dialética possível e salutar frente uma leitura hermeneuticamente correta da norma constitucional. O procedimentalismo pode ser encarado como um método ou forma de análise e fundamentação de pretensões normativas, sendo que tais procedimentos são totalmente isentos de conteúdo axiológico.

[2] Há quatro cânones hermenêuticos de Emilio Betti que sustentava, tal como fizeram tanto Heck como Maximiliano, que a interpretação do direito deveria agregar a um momento inicial de entendimento, um momento posterior de correção, que adaptasse o entendimento inicial às necessidades sociais contemporâneas do momento da aplicação. O primeiro cânone visa basicamente a garantir a segurança jurídica contra a manipulação ideológica dos intérpretes e determina que o sentido é algo que não se deve sub-repticiamente introduzir, mas sim, extrair das formas representativas. Concluiu Betti que a atividade interpretativa envolve a descoberta do sentido da norma e não uma atribuição autônoma de sentido à norma. O segundo cânone ratifica a regra hermenêutica tradicional de que as partes devem ser interpretadas em função do todo e de que o todo deve ser descrito a partir da combinação harmônica das partes. Este cânone representa o reconhecimento da importância dos critérios sistemáticos de interpretação e, combinado ao primeiro, retoma a proposta típica de Savigny e dos pandectistas de construir uma ciência jurídica simultaneamente histórica (voltada a descrever e não a criar o direito positivo) e sistemática.  O terceiro cânone introduz propriamente a ideia de entendimento, pois exige que o intérprete reconstrua, no interior de sua subjetividade, o pensamento original do autor, em uma atitude ao mesmo tempo ética e reflexiva que deve ser feita com humildade e abnegação de si e ser reconhecida em um honesto e resoluto prescindir dos próprios preconceitos e hábitos mentais obstativos. E, por derradeiro, o quarto cânone introduz a ideia de correção, por meio da qual o intérprete deve não apenas entender o sentido original do texto, mas compreender o seu sentido de maneira tal que possa reconstruí-lo de forma que se adapte às novas necessidades sociais.

 

[3] A Escola Exegética firmou conceitos e princípios ainda usados na Dogmática Jurídica contemporânea. Foi derivada do positivismo jurídico teve seu apogeu no século XIX, principalmente após a codificação francesa. Foi o Código Napoleônico de 1804, que impulsionou a ascensão da escola exegética. A idolatria ao referido code levou aos juristas a darem grande valor ao texto legislativo do código, partindo de pressupostos de completude da lei, isto é, um texto legislativo sem lacunas, como era vislumbrado o Code Napoleônico, redundando na criação de um método de interpretação limitada ao texto legal e a intenção do legislador, relegando o hermeneuta a mero aplicador da lei sob forma mecânica do silogismo.

[4] A tópica jurídica surge através da obra de Theodor Viehweg, sobretudo com a publicação de Topik und Jurisprudenz, em 1953. Resgatando ensino que remonta a Aristóteles, Viehweg defendeu que o pensamento jurídico é tópico, o que revolucionou a discussão acerca da metodologia do direito à época.

Da tópica clássica, concebida como técnica de argumentação, a corrente restauradora, encabeçada por aquele jurista de Mogúncia compôs um método fecundo de tratar e conhecer o problema por via do debate e da descoberta de argumentos ou formas de argumentação que possam, de maneira relevante e persuasiva, contribuir para solucioná-lo satisfatoriamente. Trata-se de uma técnica de chegar ao problema "onde ele se encontra", elegendo o critério ou os critérios recomendáveis a uma solução adequada. A tópica influenciou autores como Peter Härbele, Konrad Hesse e Friedrich Müller, servindo de fundamento para suas construções teóricas. Assim, consagrava-se como ponto de partida necessário para a formulação de um novo método de interpretação/decisão/aplicação do direito no segundo pós-guerra.

[5] A ponderação é construída para a resolução de casos concretos e difíceis, nos quais há tensão entre princípios jurídicos, dependendo do acervo probatório dos autos para se aferir qual princípio deva prevalecer. Sobre o conceito de ponderação, confira-se a lição de Barcellos:  “[...] a ponderação pode ser descrita como uma técnica de decisão própria para casos difíceis (do inglês ‘hard cases’), em relação aos quais o raciocínio tradicional da subsunção não é adequado. A estrutura geral da subsunção pode ser descrita da seguinte forma: premissa maior – enunciado normativo – incidindo sobre premissa menor – fatos – e produzindo como consequência a aplicação da norma ao caso concreto. O que ocorre comumente nos casos difíceis, porém, é que convivem, postulando aplicação, diversas premissas maiores igualmente válidas e de mesma hierarquia que, todavia, indicam soluções normativas diversas e muitas vezes contraditórias.  A subsunção não tem instrumentos para produzir uma conclusão que seja capaz de considerar todos os elementos normativos pertinentes; sua lógica tentará isolar uma única norma para o caso”.

 

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