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Resumo:
O presente trabalho analisa como a desregulamentação da economia contribui com a crescente marginalização nos grandes centros urbanos, inferindo no incremento cada vez mais elevado da população carcerária brasileira.
Texto enviado ao JurisWay em 08/06/2015.
Última edição/atualização em 10/06/2015.
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I - INTRODUÇÃO
Longe de ser uma narrativa histórica e descritiva, no que concerne o sistema prisional, todavia, insta-se imperioso uma genealogia desta variável com seus corolários ao longo do tempo, sem claudicar, é claro, de uma crítica necessária ao sistema prisional, mormente, o brasileiro, aliando a pena privativa de liberdade do apenado, a tratativas indignas como exasperação de sua sanção penal.
Tal lógica, de encarceramento do indivíduo, para que este ressurja sem os vícios que fez com a sociedade o catapultasse para longe dela, deve-se ao múnus contraproducente do Estado, pois, tendo seu poder reflexo das bases determinantes da economia nacional e de seus medalhões instados nos governos locais e nacionais, tem como intuito ontológico em seu telospunitivo, criminalizar, exclusivamente, a pobreza e os miseráveis de uma lógica plutocrática e mendaz.
Com efeito, que o estatuto ontológico da população carcerária brasileira, tem seus antecedentes na miséria existencial de seus consortes, em que a condição de ser é referência imediata para a aplicação de uma pena privativa de liberdade, com suas variáveis nefastas e desumanas, onde, os moribundos da ordem societal burguesa, são severamente castigados, no corpo e na alma[1].
Antes o exposto, cabe-nos suscitar uma pergunta nodal. Por que o modelo produtivo influencia no etiquetamento dos apenados, atraindo-os para seu centro de gravidade penal, e, como se mantêm essa manobra ideológica, ou acordo tácito[2], sob o véu de maia dos conclames sociais, de publicidade e transparência na modernidade afluente?
Ademais, o presente trabalho tenta analisar ainda, os contornos punitivos do apenado no sistema penal brasileiro, com seus expedientes espúrios, quando este, entregue ao Estado, tem sua liberdade tutelada pelo aparelho estatal, com o escopo de alinhá-lo ao um projeto homogêneo com os “valores” sociais constituídos.
Neste supedâneo, de decomposição dos direitos não alcançados com a sanção penal condenatória, torna-se angular para a execução da pena com seus auspícios, onde o acervo moral do apenado, e sua dignidade de ser humano, são aviltados em nome de um castigo-penal niilista, alinhavado com um paradigma social excludente e descrente da transcendência humana, quando este, sobretudo, oriundo de classes sociais subalternas.
II – DESENVOLVIMENTO
2.1 - Um atavismo punitivo: A pena e o modo de produção como vetor de uma sanção penal condenatória, sob o manto da ideologia oficial confessada na batuta dos profanadores da informação.
Não há como fugir de uma discussão ideológica acerca do Direito em si mesmo, tendo em vista, ser ele o resultado do expediente dos vencedores sociais, para assim, conseguir garantir sua regência social, através dos signos normativos impresso no imaginário da sociedade.
De modo, assim entendido, que o Direito, mormente, o Direito Penal, dizia Althusser (1999, p. 87), “(...) é, por essência, em última instância, desigualitário e burguês”. De sorte, que “(...) nosso sistema de justiça criminal, em seu conjunto, e as policias, em particular, tradicionalmente vêm violando os princípios de equidade e aplicando as leis com filtro social e racista” (SOARES, 2006, p. 112).
Portanto, dentro desta perspectiva, podemos encontrar na obra Vigia e punir [3]de Michel Foucault uma enorme contribuição para um estudo acurado da pena e suas entrelações com o sistema político e econômico das sociedades, bem como esta, subsidiou, como uma bússola de entendimento para os sucedâneos da pena como variável de correção e alinhamento com o paradigma social vigente.
Antes, não se pode vilipendiar também, o que trouxera Cesare Beccaria, em sua brochura, Dos Delitos e das Penas de 1764, como protocrítica de um sistema penal estribado em valores escolásticos e imerso em expedientes desumanos. Beccaria aduzia que a pena deveria ser produto da lei, e como esta resguardaria em seu lócus os ditames lógicos da razão, não caberia, portanto, ao arbítrio discricionário do aplicador da lei acomodá-la sem tal intervenção racional, originária dos debates legislativos.
A primeira conseqüência destes princípios é que somente as leis podem decretar as penas relativas aos delitos; e esta autoridade não pode residir senão no legislador, que representa toda a sociedade unida por um contrato social. Nenhum magistrado – que também é parte da sociedade – pode com justiça infligir penas a outro membro da mesma sociedade. Porém a pena, acrescida além do limite fixado pelas leis, é uma pena injusta, uma pena a mais; não pode, pois, o magistrado, sob qualquer pretexto de zelo ou bem público, aumentar a pena estabelecida ao cidadão delinqüente. (BECCARIA, 2004, p. 40).
Outrossim, as leis modificaram-se, para revestir as penas de racionalidades quebrando com a vil forma de castigo sobre o apenado em meio aos Séculos das Luzes, com as difamantes penas corporais. Nesse baldrame, Foucault deixou consignado como a alma[4] passou a ser o foco de castigo para os transgressores da ordem estabelecida, sendo datado entre o século XVIII e começo do XIX[5], o fim dos festejos punitivos sobre o corpo, dando, por sua vez, uma carapaça de “humanidade” sobre as sanções penais.
Com isso, não mais o corpo em meio ao sofrimento medievo é objeto de castigo penal pelos regentes sociais, que via, nas limitações dos direitos, um viés sancionatório de se castigar o infrator da lei, de modo “indolor”, aos olhos da opinião pública constituída à época.
Conforme Foucault (2011, p. 16) “(...) o corpo é colocado num sistema de coação e de privação, de obrigação e de interdições. O sofrimento físico, as dores do corpo não são mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte de sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos”.
Tais variações punitivas são frutos das direções dadas pela economia política, que de uma forma ou de outra, estrutura o sistema penal, e remodela as formas de penalizar os infratores da lei, assim como, lhes instrui com os horizontes de sua finalidade social, repercutindo, desta maneira, na referida mudança de paradigma punitivo[6].
Se bem observado, isto já tinha sido consubstanciado por Ferdinand Lassalle, em sua A essência da constituição, mostrando que os fatores reais de poder é o estatuto ontológico das Constituições, na qual sem eles, nada mais seria que uma folha de papel em branco. Entendido, portanto, que os sistemas normativos, por conseguinte, os coercitivos, como o cárcere, por exemplo, deve guardar em seu núcleo, um liame lógico e social com o sistema político-econômico em voga.
Assim, por seu turno, “os fatores reais do poder que atuam no seio de cada sociedade são essa força ativa e eficaz que informa todas as lei e instituições jurídicas vigentes, determinando que não possam ser, em substância, a não ser tal como elas são” (LASSALLE, 2000, p. 10/11 Grifo nosso).
Desta forma, justificam-se como os sistemas jurídicos, que nada mais é que apregoações simbólicas apreendida das interações sociais e econômicas são subsumidas num documento legal para resguardar sua aventura histórica, demonstrando como o modelo de produção canaliza os infratores da lei à sua pena por uma determinação de seus desideratos econômico-sociais.
Foi o que ocorrera com a era industrial, por exemplo, que especificamente, “(...) exigia um mercado de mão de obra livre, a parte do trabalho obrigatório diminuiria no século XIX nos mecanismos de punição, e seria substituída por uma detenção com fim corretivo” (FOUCAULT, 2011, p. 28).
Com efeito, para se analisar o sistema punitivo, deve-se, portanto, “estudá-los como fenômenos sociais que não podem ser explicados unicamente pela armadura jurídica da sociedade nem por suas opções éticas fundamentais” (FOUCAULT, 2011, p. 27).
Ilustrativamente, ainda nesse baldrame, podemos observar que “assim, numa economia servil, os mecanismos punitivos teriam como papel trazer mão de obra suplementar – e constituir uma escravidão ‘civil’ ao lado da que é fornecida pelas guerras ou pelo comércio” (FOUCAULT, 2011, p. 28). Por isso que:
(...) O corpo também está diretamente mergulhado num campo político; as relações de poder têm alcance imediato sobre ele; elas o investem, o marcam, o dirigem, o suplicam, sujeitam-no a trabalhos, obrigam-no a cerimônias, exigem-lhe sinais. Este investimento político do corpo está ligado, segundo relações complexas e recíprocas, à sua utilização econômica; é numa boa proporção, como força de produção que o corpo é investido por relações de poder e de dominação; mas em compensação sua constituição como força de trabalho só é possível se ele está preso num sistema de sujeição (onde necessidade é também um instrumento político cuidadosamente organizado, calculado e utilizado); o corpo se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo submisso. (FOUCAULT, 2011, p. 28/29 Grifo nosso).
Finca-se, desta forma, o elo entre sistema punitivo e modelo econômico de produção na qual enreda o apenado com suas interações inexoráveis com o status quo constituído, que longe de ser um contrato social, como asseverava os pensadores da ilustração, a exemplo de Rousseau, constituindo, nesse viés, uma microfísica do poder, imantada por uma cortina de fumaça peculiar[7].
Conseguintemente, a genealogia penal deve ser escavada da base produtiva da sociedade, que indica os tipos penais conveniente com sua lógica, e os atores sociais para serem acolmatados ao seu conjunto de normas jurídicas repressoras, para um fortuito adestramento com os desideratos sociais constituídos.
Deve-se ter em mente, que não só as determinações econômicas são indicativas do sistema jurídico e seu conglomerado de regras, exclusivamente, bem como, os valores constituídos socialmente ao longo do tempo, bem verdade, reflexo este, da base produtiva da sociedade.
Seu telos é servir de padrão para homogeneizar os atores sociais, aos cânones referendados socialmente através da ideologia oficial – de uma profunda divisão social, em que os subalternos, deverão anuir silenciosamente ao sofrimento social que lhe é imposto.
Conquanto, os sistemas de representações, devem ser entendidos como ligações de comunicação com o mundo material, sendo ele uma interpretação do conjunto das relações socialmente constituída, auxiliando como vetor imagético dos padrões a serem seguidos pelo tecido social, e reproduzidos em sua existência ordinária[8].
Não há grandes esforços teóricos para se depreender tal postulado, tendo em vista ser ele – os padrões de representação – as visões de mundo dos vencedores da narrativa social, como dito acima, instados nas diversas instituições, seja ela pública ou privada, amalgamadas com seus objetivos econômico-sociais.
Por isso, que “a arte de punir deve, portanto repousar sobre toda uma tecnologia da representação. A empresa só pode ser bem-sucedida se estiver inscrita numa mecânica natural” (FOUCAULT. 2011, p. 100), onde os signos jurídicos, atuam como agentes das fronteiras mentais influindo de modo imediato no comportamento humano, sob o esteio da ideologia oficial confessada.
Impende-se suscitar ainda, por sua vez, que, através desta trama social, na qual mistura a busca desenfreada pelo controle social pelas minorias amilhardadas, e o arfam de conter os miseráveis em suas ilhotas de sofrimento, teve como sucedâneo, a deteriorização do Estado social para emergir um Estado penal e criminalizador de sua eleita escória social.
O professor Loic Wacquant (2011, p. 12), contribuiu com uma análise proficiente sobre a temática em voga, mostrando, em nossa atualidade, como o Estado penal e classificador fora constituído, sob a batuta da economia de mercado, em detrimento, de um Estado de bem-estar social[9], como seu refugo direto.
Sob sua perspectiva, o Estado penal surgiu como uma resposta dos apetites sociais, incrementado pela desestruturação da economia de mercado, transferindo seu expediente político-econômico para uma manobra social de marginalização de determinados setores da sociedade, como forma de apaziguar as tensões sociais, na flâmula da Lei e Ordem. Nesse sentido, infere Loic que:
Em tais condições, desenvolver o Estado penal para responder às desordens suscitadas pela desregulamentação da economia, pela dessocialização do trabalho assalariado e pela pauperização relativa e absoluta de amplos contingentes do proletariado urbano, aumentando os meios, a amplitude e a intensidade da intervenção do aparelho policial e judiciário, equivale a (r) estabelecer uma verdadeira ditadura sobre os pobres.
Assim, o sistema penal, sobretudo, o brasileiro, com seu ranço atávico[10], têm definidos seus tipos penais ideais, para engrossar, ainda mais, sua população carcerária, sob o discurso ideológico de dissuasão da criminalidade, tendo em seu escopo, ontologicamente, criminalizar os miseráveis ao invés de represar a miséria através de expedientes político-econômicos[11].
Tudo isso não pode ser vilipendiado do enorme clamor social, amplificado de modo grandiloqüente em nossos meios de comunicação de massa, de que o enfrentamento bélico, encapado pelas forças de segurança pública, deva ser a instância primeira de nossa política de repressão social, agudizando, mais ainda, as tensões sociais.
O professor Rogério Greco (2011, p. 109), aduzindo o declínio dos direitos humanos sob a égide midiática, pontua que os profanadores da informação travestidos de comunicadores da sociedade, ofuscam os direitos e garantias constitucionais, que reveste, inclusive, os custodiados pelo Estado, com o recrudescimento da lei penal. Assim:
Apregoam que o sistema é demasiado brando com aqueles que praticam uma infração penal, e por isso, pugnam por uma punição mais severa dos criminosos. A mídia, como afirma com precisão Giovane Santin, em virtude de suas rotineiras intervenções, conjugadas com suas distorções da realidade têm produzido uma evidente mudança comportamental nos cidadãos, que pretendem fazer da lei penal a salvação da sociedade contra os criminosos.
Como corolário disto, é o que resulta de uma política de tolerância zero, onde os moribundos de uma sociedade carcomida em sua gênese social e produtiva ficam com ônus de todo esse modus operandis de nossa política de segurança pública, que visa, tão somente, não a pacificação da sociedade e, por conseguinte, a ressocialização destes, mais uma limpeza étnica social.
É o que se depreende “(...) quando o ideal ressocializador da prisão já entrava em declínio em boa parte das nações de capitalismo avançado (Garland, 2005), encontraria ainda no Brasil do início dos anos 80 seu último – e breve- sopro de existência”, onde toda “as razões para essa defasagem precisam ser entendidas no âmbito da história das práticas de controle e repressão, das instituições totais e do tratamento da questão social no país” (TEIXEIRA, 2009, p.70.).
Portanto, amparada nas oportunidades de demência mental do tecido social, que tem seus déficits inscritos nas políticas públicas de educação, a mídia coopta o monopólio dos conteúdos simbólicos, disseminando na sociedade brasileira, com a rúbrica dos inimigos da sociedade, forma pela qual a política de segurança pública etiqueta tais adversários, concentrado nos guetos e vielas de nosso Estado.
Desta forma, fica ossificado que a finalidade estatal está reduzida a segregar os miseráveis de uma possível “redenção moral”, e instruí-lo em seu retorno social imune dos vícios que lhe causou tal afastamento social. Sua práxis – do Estado - reside neste pêndulo de falácia politicamente correta e manobras ideológicas, capaz de silenciar todo o conglomerado da sociedade em sua paz social sublimada. Goffman (2013, p. 69/70), ao tratar deste expediente penalógico estatal ratifica seu caráter contraproducente quando aduz que:
Quase sempre, muitas instituições totais parecem funcionar apenas como depósitos de internados, mas, como já foi antes sugerido, usualmente se apresentam ao público como organizações racionais, conscientemente planejadas como máquinas eficientes para atingir determinadas finalidades, oficialmente confessadas e aprovadas. Já se sugeriu também que um freqüente objetivo oficial é a reforma dos internados na direção de algum padrão ideal. Esta contradição, entre o que a instituição realmente faz e aquilo que oficialmente deve dizer que faz, constitui o contexto básico da atividade diária da equipe dirigente.
Nesse diapasão, ficam corroboradas as observações foucaultiana, aduzida mais acima, de que a finalidade estatal converge para os conclames das estruturas econômicas da sociedade, que impele seus dejetos sociais para os submundos do sistema prisional, escamoteada pela ideologia oficial confessada.
De sorte, que o padrão ideal de Justiça e de Direito, são vislumbrada na carapaça do capitalismo avançado, sendo essas, nuance, de uma fraude jurídica sob o conjunto das relações sociais e o sistema de propriedade, ontologia da sistemática em voga.
Com as novas formas de acumulação de capital, de relações de produção e de estatuto jurídico da propriedade, todas as práticas populares que se classificavam, sejam numa silenciosa, cotidiana, tolerada, seja numa forma violenta, na ilegalidade dos direitos, são desviadas à força para a ilegalidade dos bens (FOUCAULT, 2011, p. 83)
Por derradeiro, foi com tal auspício estribado na torpeza da sociedade de modo geral, sobretudo, dos subalternos, que “a economia das ilegalidades se reestruturou com o desenvolvimento da sociedade capitalista” (FOUCAULT, 2011, p. 84), criminalizando seus antípodas sociais.
2.2 – O sistema punitivo brasileiro como justificação da desregulamentação da economia e a ressignificação do apenado em proletário útil.
Como dito acima, o sistema punitivo surgiu na Europa Ocidental, estudada eficazmente por Foucault, como resposta ao modelo de produção da sociedade, que sistematicamente, vinha marginalizando sua contradição ontológica, para com isso, entronizar a regência social através da burguesia educada. Algo, que acontecera de modo perpendicular com o Brasil, como bem pontificou Loic Wacquant em sua obra As prisões da miséria.[12]
Na obra supracitada, o autor deixou consignado que a desregulamentação dos mercados conduziu os governos a suplantar o Estado de bem-estar social[13], para sufragar o Estado penal, e com isso, enclausurar suas anomalias sociais, inscrita, no grande proletariado, agora, desvalido em decorrência da precarização do emprego, do subemprego e do ócio.
Tal expediente é impelido pela profusão da concorrência entre os mercados, debitando ao trabalhador, seu arfam malfadado, para com isso perpetrar uma campanha de perseguição aos “corruptores” de uma sociedade “harmoniosa”, petrificados em camadas sociais bestializadas.
Percebe-se, por sua vez, que o enfrentamento policial passa ser, como conseqüência desta moldura social, a nota dominante vista em nossa sociedade, como resposta a má gestão dos recursos públicos, para atender, tão somente, a uma política evasiva e contraproducente.
Raciocínio este, bastante óbvio, visto de um ângulo sem as místicas inerente de um sistema que se erigiu através desta, pois com a premente exigência das corporações em aumentar seus rendimentos, a parte variável[14] do processo produtivo sofre uma profunda estigmatização e neutralização de sua força de trabalho, recaindo no fosso da marginalização e precarização.
O professor Ricardo Antunes (2005, p. 143), ao analisar o vórtice da crise mundial, com a derrocada do socialismo soviético no final da década de 1980, que, inevitavelmente, respingou no Brasil, deixou pontificado que “vivemos numa época marcada por uma aguda crise e inúmeras mistificações. Valores, concepções, ideários, todos eles moldados por manipulações que penetram com enorme intensidade em milhões de consciências e cuja finalidade é mascarar a dimensão aguda da crise contemporânea”.
Conquanto, todo discurso estatal, de justificação de suas investidas econômico-sociais, canaliza-se para a proteção da tão propalada liberdade, frise-se, liberdade formal, erigida como um dos pilares da revolução liberal francesa e, amealhada pelos barões de nossa economia global contemporânea, sendo esta, obliterada como fito corretivo dos desvios que a esta lógica é-lhe inerente.
Pois, por toda parte onde chega a se tornar realidade, a utopia neoliberal carrega em seu bojo, para os mais pobres mas também para todos aqueles que cedo ou tarde são forçados a deixar o setor do emprego protegido, não um acréscimo de liberdade, como chamam seus arautos, mas a redução e até a supressão dessa liberdade, ao cabo de um retrocesso para um paternalismo repressivo de outra época, a do capitalismo selvagem, mas acrescido dessa vez de um Estado punitivo onisciente e onipresente. A “mão invisível” tão cara a Adam Smith certamente voltou, mas dessa vez vestida com uma “luva de ferro” (WACQUANT, 2011, p. 158/159).
Por isso, que os padrões seletistas do sistema penal convergem para aqueles, que de qualquer modo, possa obstar a jornada triunfalista dos medalhões da economia global, e proporcionar uma reviravolta no interior das sociedades constituídas. Entende-se, desta forma, que:
As classes sociais despossuídas constituem, assim, o objetivo principal das instituições penais. A história dos sistemas punitivos é, nessa perspectiva, uma história das ‘duas nações’, isto é, das diversas estratégias repressivas de que as classes dominantes lançaram mão através dos séculos para evitar as ameaças à ordem social provenientes dos subordinados. (GIORGI, 2006, p. 39).
Por conseguinte, que “são a decadência econômica e a segregação perene que alimentam os distúrbios de rua, desestabilizando a estrutura social local e minando as oportunidades de vida das populações” (WACQUANT, 2011, p. 68). De modo, que a saída encontrada pelos regentes sociais, para essa desregulamentação da economia com suas variáveis nefastas, foi à segregação dos incômodos sociais materializado no proletariado ocioso.
Neste esteio, Alessandro De Giorgi (2006, p. 39), já tinha alertado que “numa economia capitalista, isso significa que será a condição do proletariado marginal que determinará os rumos da política criminal e, por conseguinte, o regime de ‘sofrimento legal’ imposto àqueles que forem punidos por desrespeito às leis”.
Todavia, não se trata de toda a fatia da massa de desempregado que seria alvo do sistema punitivo da sociedade, mas somente aqueles, que de fato invocasse perigo à ordem social constituída com seus apanágios, impedindo sua afluência plácida[15].
Porque, “o incremento do encarceramento não está, portanto, ligado genericamente ao desemprego, mas sim ao desemprego que atinge alguns estratos sociais considerados perigosos à ordem constituída: minorias étnicas, imigrantes, jovens marginais” (GIORGI, 2006, p. 51). Até porque, aqueles, por sua vez, já tinha introjetado a resiliência com as desventuras do capital na sociedade atual.
Com efeito, é desta maneira que surge o cárcere com suas peculiaridades, capaz de fazer o alinhamento do indivíduo hostil com os desideratos de uma sociedade sob o controle do capital. Neste supedâneo, o apenado é catequizado com o ritual da disciplina proletária, suscitando-lhe a moral do trabalho assalariado[16] para ser submetida a sua lógica de subordinação e dominação[17].
Esta moralização do apenado consiste em torná-lo útil, mesmo dentro do sistema prisional, na qual este é imantado com uma legislação que vincula sua atividade laborativa sob a tutela estatal, regrada, especificamente, pela Lei de Execuções Penais, dispensando aos recalcitrantes do labor, uma punição consentânea.
A limitação ao exercício de atividades com qualquer potencial criativo como o artesanato, a previsão de uma remuneração meramente simbólica ao trabalho prestado e a classificação de sua recusa como falta disciplinar grave forma algumas disposições que conformariam o trabalho carcerário à função de mais um dispositivo na engrenagem disciplinar da prisão, como um elemento de docilização da força de trabalho e de correção moral. (TEIXEIRA, 2009, p. 87) [18].
Melossi e Pavarini (2006, p. 232) nos dão uma descrição fulcral desta fenomenologia do apenado, entregue aos desideratos do Estado convergente com a lógica de acumulação de capital, no seu fito de resignificar o apenado em proletário desviado de sua essência social, sedento de uma redenção moral com os valores sociais constituídos. Assim, descreve-os:
Porém, uma vez reduzido o interno a sujeito abstrato, uma vez “anulada” a sua diversidade (até ao desaparecimento que acompanha a solidão do sujeito que não se relaciona com o social), uma vez colocado de frente às necessidades materiais que não pode mais satisfazer autonomamente, tornado, assim, completamente dependente da/à soberania administrativa, a este produto, enfim, da máquina disciplinar, é imposta a única possível alternativa à própria destruição, à própria loucura: a forma moral da sujeição, isto é, a forma moral do status de proletário. Em outras palavras, a forma moral de proletário é aqui imposta como única condição existencial, no sentido de única condição para a sobrevivência do não-proletário.
Adequadamente, resta provado, o fatalismo ontológico ao qual o apenado está submetido sob a chancela estatal, convertido em “sujeito abstrato” para reverter-se em proletário, derrear em sua moral ou na obliteração de seu psiquismo dentro do sistema prisional.
Para lograr resultados satisfatórios, toda essa narrativa social de controle dessas minorias silenciosa deveria ter um manto, não só de legalidade, como, também, de uma ideologia em defesa da sociedade com seus valores auferidos historicamente, velada, tão somente, pela profusão falaciosa da higidez institucional.
Para tanto, os governos, investido do monopólio do poder, e da verdade oficial, vaticinam discursos moralistas e de exaltação ao Estado de Direito Constitucional, para apaziguar as relações sociais desestruturadas. No entanto, o que se via na prática era:
A retórica liberal, republicana e de respeito ao Estado de direito que os líderes destes novos Estados independentes professavam era quase sempre neutralizada por discursos e práticas que enfatizavam a necessidade de controlar as massas indisciplinadas e imorais por meio de mecanismos severos de punição. (AGUIRRE, 2009, p. 39).
De sorte, que o escopo estatal nunca convergiria para uma possível redenção dos indivíduos desviantes do sistema legal, porém, com o desiderato ontológico de controlá-los para reverter sua moral criminosa em útil ao sistema produtivo em voga.
Assim “a prisão e as demais instituições disciplinares materializam uma nova concepção do espaço e do tempo aplicada aos corpos e à população” onde “as tecnologias do controle disciplinar exprimem esta racionalidade, traduzindo-a em modalidades específicas do punir” (GIORGI, 2006, p. 88).
Por outro lado, cabe-nos invocar, ainda, um questionamento impresso, ao longo de muitos anos, a cerca da “natureza” da conduta criminosa, ou da essência do criminoso, caso este tenha alguma, como forma de justificação de seu encarceramento.
Livremo-nos, pois, das quimeras pseudocientíficas, para fincar, mais ainda, as estruturas materiais da sociedade como vetor do comportamento humano, não exclusivamente, mas, precipuamente, e com isso suplantar as ideologias naturalistas que adornam como pano de fundo a perseguição aos miseráveis da ordem estabelecida.
Há em nossa sociedade brasileira, uma crendice, calcada em ideologias, é claro, de que o criminoso teria uma natureza com predisposições desviante ao sistema normativo, mesmo que de modo escamoteado ou sob o vulto de outro sistema de crença[19], ainda assim, fincado, inevitavelmente, na discriminação em suas várias formas.
Dentro deste sistema de crença, acreditava-se, cotejando, por exemplo, as idéias lombrosiana, que “entre os indicativos de degeneração nos indivíduos, destacaram-se os estigmas físicos”, no qual, “ (...) o pauperismo, a ignorância, o alcoolismo, a epilepsia e a sífilis eram agentes que predispunham os indivíduos à degeneração, sendo responsáveis por uma elevada taxa de criminalidade, delinqüência e loucura” (MIRANDA, 2009, p. 283).
Com este pano de fundo, Gunther Jakobs e Meliá, apoiado em alguns pensadores modernos, a exemplo de Rousseau e Fichte[20], demonizou o infrator da lei, devendo este ter sustado todos os seus direitos inerentes de cidadão, instados à correção moral.
Assim, o infrator da lei deveria ser encarado como um inimigo sem as reservas de ter suas garantias constitucionais preservadas, onde sua normatização estaria a cargo do que ficou consignado, pelos autores ora citados, de Direito Penal do inimigo.
No esteio destes autores, ficou definida uma dicotomia legal para controle social, na qual aos malfeitores contumazes, restava-lhes a impetuosa falência de seus direitos de cidadão[21], revestindo-os de inimigo do Estado.
Igualmente, com esse ranço de endurecimento do sistema penal, com o justo de suplantar a criminalidade, inscrita, não na ingerência estatal, mas precisamente, no que tange suas políticas públicas, mas na ontologia dos criminosos, o autor definia o que seria sua tese jusfilosófica. “O Direito Penal do cidadão é o Direito de todos, o Direito Penal do inimigo é daqueles que o constituem contra o inimigo: frente ao inimigo, é só coação física, até chegar à guerra” (JAKOBS, 2010, p. 28).
Por outro lado, como forma de infirmar o que ora fora aludido pelos endurecedores da Lei Penal, instam-se as palavras grandiloqüente de Loic Wacquant que propugnava que o sistema legal era uma resposta aos desvios de conduta, desalinhada com o sistema político-social em voga, em que sua ontologia era refugo dos imperativos malfadados dos governos.
Assim como o trabalho assalariado precário, a inflação carcerária não é uma fatalidade natural ou uma calamidade ordenada por alguma divindade longínqua e intocável: ela é resultado de preferências culturais e de decisões políticas que exigem ser submetidas a um amplo debate democrático. Como todo fenômeno social, segundo Mauss, ela é “obra de vontade coletiva”, e quem diz vontade humana diz escolha entre diferentes opções possíveis (WACQUANT, 2011, p. 158 Grifo nosso).
Por derradeiro, suscita-nos uma pergunta, cedida pelo professor Rogério Greco (2011, p.443), em sua obra Direitos humanos, sistema prisional e alternativa à privação da liberdade, para demarcar a dialética desta discussão. “Haveria interesse, efetivamente, por parte do Estado em promover a reinserção do egresso ao convício social?”, e mais ainda, continua Greco, “a sociedade está preparada para recebê-lo?”.
De sorte, que o anelo de nossa política de segurança pública, deverá ser atrelado às políticas públicas, e encarado com seriedade, probidade e vontade política, pois, sem este conglomerado de atributo, solução efetiva e razoável seria inviável e falacioso.
2.3 - O inchaço do sistema prisional brasileiro: em foco o “principio da indignidade da pessoa humana”.
Malogrado a narrativa econômica tomada pelos regentes sociais, tendo como finalidade, tão somente, entronizar a burguesia educada nas diretrizes da política econômica, teve secularmente como sucedâneo, infelizmente, uma extrema dissonância social.
Os resultados podem ser vistos a longo alcance nos países periféricos, como o Brasil, por exemplo, com o incremento de diversas perversões sociais no bojo da sociedade brasileira, causando-lhe inúmeros constrangimentos sociais.
O patamar da violência urbana subiu sensivelmente com a ascensão neoliberal no final dos anos de 1980, deixando a sociedade refém dos expedientes estatais com a consignação de um endurecimento da política de segurança pública, com a repressão recrudescida aos pauperizados.
Isto fora uma reprodução, diametralmente malsucedida, do movimento Lei e Ordem, ou Tolerância Zero[22], que tomou conta dos Estados Unidos nos anos de 1980, com um discurso de esvaziamento dos direitos humanos do cenário mundial, como forma de efetivação da pacificação social, ante a dissuasão da criminalidade através desta política cada vez mais criminalizante.
Uma maximização do Direito Penal tem sido à saída dos governos – criminalizando, ainda mais, os miseráveis - para debelar com a escala da delinqüência nos grandes centros urbanos, como corolário desta implementação de tolerância zero do movimento Lei e Ordem. Nesse diapasão, isso tudo deve ser entendido:
Assim, resumindo o pensamento de Lei e Ordem, o Direito Penal deve preocupar-se com todo e qualquer bem, não importando o seu valor: Deve ser utilizado como prima ratio, e não como última ratio da intervenção do Estado perante os cidadãos, cumprindo um papel de cunho eminentemente educador e repressor, não permitindo que as condutas socialmente intoleráveis, por menor que sejam, deixem de ser reprimidas. (GRECO, 2011, p. 16).
Permitindo, desta forma, que “nesse raciocínio, procura-se educar a sociedade sob a ótica do Direito Penal, fazendo com que comportamentos de pouca monta, irrelevantes, sofram as conseqüências graves desse ramo de ordenamento jurídico”, porém, “não se educa a sociedade por intermédio do Direito. O raciocínio do Penal Máximo nos conduz, obrigatoriamente, à sua falta de credibilidade”(GRECO, 2011, P. 15).
Todavia, como o foco do incêndio não está sendo aplacado na forma de políticas públicas, seu nascedouro, tal desiderato não está sendo auferido consetaneamente. Desta forma, “para resolver o problema da segurança é preciso transformar as estruturas sociais brasileiras, porque, enquanto nosso país for como é hoje, qualquer iniciativa na segurança será apenas um paliativo, sem nenhum valor” (SOARES, 2006, p. 13).
Neste baldrame, Loic Wacquant (2006, p. 82) infere que “à ‘terrível miséria’ dos bairros deserdados, o Estado responderá não com um fortalecimento de seu compromisso social, mas com um endurecimento de sua intervenção penal. À violência da exclusão econômica, ele oporá a violência da exclusão carcerária” (Grifo nosso).
Conquanto, longe de contribuir para construção de uma sociedade igualitária, justa e pacífica, tais políticas, calcada na Lei e Ordem “(...) contribui para a construção política de uma penalização reforçada e ostensiva, encarregada de conter as desordens causadas pela generalização do desemprego, do subemprego e do trabalho precário” (WACQUANT, 2006, p. 81), com o encarceramento do malfadado exercito de reserva estiolado pela sombra negra do desemprego, corolário da má gestão pública.
Mutatis mutadis, a escatologia de todo este expediente, diga-se de passagem, malogrado, de gestão da economia pelos governos, inevitavelmente, é o inchaço da população carcerária, por perpetrar o robustecimento da lei penal contra seus infortúnios sociais, defenestrado do mercado de trabalho formal, pela regência obliqua de sua política econômica-social.
Repise-se, que, em nossa atualidade, os direitos humanos, sobretudo, dos apenados, devem ser tratados como afronta aos direitos da sociedade de modo geral - de manter-se incólume ante a escalada da violência nos grandes centros urbanos. Por isso, “os direitos dos presos passaram a ser tratados com repúdio” (GRECO, 2011, p.109) por toda a sociedade, pela influência nefasta que a mídia mantém sobre o tecido social.
Sem embargo, “a expressão direitos humanos começou a ser entendida de forma equivocada; a mídia se encarregou de perverter o seu real significado”, provocando esse mal-estar no interior da sociedade. “Assim, quando a população em geral ouve dizer que os direitos humanos devem ser preservados, automaticamente faz ligação entre direitos humanos e direitos dos presos e, conseqüentemente, passa a questionar a sua necessidade” (GRECO, 2011, p. 109).
O imaginário social está petrificado com a idéia de crucificar aqueles que, de uma forma, ou de outra, violou as normas reguladoras da sociedade. Sabendo-se, que não é qualquer constrangedor da lei que deve pagar com sua dignidade de ser humano recluso ao cárcere com suas variáveis estigmatizante, mas a escória da sociedade, alocadas nos guetos dos grandes centros urbanos e, causadora de espanto aos barões da economia nacional.
E desta forma, como bem apontou Greco (2011, p. 226), “nos países da América Latina, principalmente, os presídios transformaram-se em verdadeiras ‘fábricas de presos’, que ali são jogados pelo Estado, que não lhes permite um cumprimento de pena de forma digna, que não afete outros direitos que lhe são inerentes”.
Conseqüentemente, essas vicissitudes estatais tende a uma recrudescida relativização dos direitos humanos, sob o subterfúgio de defesa social, fazendo com que o apenado internalize tais maus-tratos, como expediente pedagógico capaz de dissuadi-lo na contumácia delitiva.
De forma que, os limites do jus puniendi estatal devem ser perfectibilizado pelo próprio Estado, figura angular na condução da aplicação da pena ante ao condenado. Conquanto, a ele – Estado- deve ficar constrito na legalidade, para obstar rasura nesta, e com isso, suplantar princípios caro ao Estado Democrático de Direito, a exemplo do da dignidade da pessoa humana.
Todavia, como bem acentuou Foucault, o Estado está imerso na gerência da ilegalidade, originária de sua própria odisséia regencial. Razão pela qual, pontifica Greco (2011, p. 73) no esteio foucaultiano, que:
Assim, uma coisa é permitir que alguém, que praticou uma infração penal de natureza grave, se veja privado da sua liberdade pelo próprio Estado, encarregado de proteger, em última instância, os bens jurídicos; outra coisa é permitir que esse mesmo condenado a uma privação de liberdade cumpra sua pena em local degradante de sua personalidade; que seja torturado por agentes do governo com a finalidade de arrancar-lhe alguma confissão; que seus parentes sejam impedidos de visitar-lhe; que não tenha uma ocupação ressocializante no cárcere etc. A sua dignidade deverá ser preservada, pois que o Estado foi permitido somente privar-lhe da liberdade, ficando resguardados, entretanto, os demais direitos que dizem respeito diretamente à sua dignidade como pessoa. (Grifo nosso).
Por mais que pareça estranho, tal evocação, o Estado deve ser represado em sua administração estribada nas violações dos direitos humanos, frente ao apenado, e sua clientela preferida: o proletariado ocioso. O que torna preocupante, pois o primogênito da legalidade sucumbe com esta como expressão de uma ilegalidade necessária, para castigar sem os ditames legais, o suposto inimigo do Estado.
Com tal expediente posto como fato ordinário na condução da política penitenciária brasileira, esta inflexão tende-se a inclinar mais ainda na direção da ilegalidade de seus agentes e servidores, incluindo, os de alta patente. O que acaba sendo auferido com este estigma daninho, ante a estrutura estatal, é a violência com suas variáveis filiada a corrupção[23] incrustada na administração pública.
A corrupção, como já foi detectada, começa a partir dos servidores públicos que exercem cargos superiores, aqueles que ocupam cargos de direção, e que detêm, efetivamente, algum poder, razão pela qual “vendem” suas decisões em beneficio de presos que podem pagar por elas, por exemplo, permitindo, ilegalmente, a saída do sistema prisional, a mudança de cela ou mesmo de presídio, a possibilidade de visitas íntimas, o ingresso de drogas e de armas etc. (GRECO, 2011, p. 243).
Disto tudo, o que resulta, são os diversos problemas enfrentados pelo sistema carcerário brasileiro, com suas anomalias capazes de sucumbir com seu próprio auspício político-social, que é a ressocialização do apenado, por um lado, e a defesa da legalidade como primado de sua política regencial, por outro.
Sem demasiadas preocupações, o inchaço populacional ao qual está fadado a coexistir no sistema prisional brasileiro, por exemplo, é uma amostra do descaso da condução da política econômica, que esmigalhou com as forças produtivas da sociedade, impelindo-os, a práticas delitivas que lhe canalizasse ao cárcere fétido de nossas penitenciárias.
Constatação esta corroborada por Greco (2011, p. 244), aduzindo que “a superlotação carcerária parece não preocupar as autoridades competentes, sobretudo a classe político, que não vislumbra nenhuma ‘vantagem’ como o preso”, já que, a estes, não podem ser amealhado seus dividendos eleitoral.
Toda problemática de nossos cárceres não está adstrita à superlotação, pois, “também foi identificado que era comum no sistema carcerário brasileiro que presos ficassem isolados, por anos, em celas próprias, sem ter contato com o mundo exterior[24], ficando impedidos de receber visitas, ou mesmo de tomar banho de sol” (GRECO, 2011, p. 240).
Adrede, os presos são colocados amontoados, indiscriminadamente, sem a devida classificação, para com isso, evitar o estrangulamento, por exemplo, daqueles que cometem crimes sexuais, sendo-os sacrificados como objetivação do padrão ético-moral dos custodiados dentro do sistema prisional[25].
Aliado a isso, há também, os presos infectados com doenças contagiosas imiscuídos com os sadios, propiciando, assim, a proliferação destas, a exemplo, da AIDS[26]. Assim, o cenário draconiano está configurado para assentar um ambiente de intranqüilidade e revoltas, sedimentadas nas rebeliões, que tem como conseqüência, a morte de presos e agentes prisionais, quando, não, deságua num profundo massacre como o do Carandiru em 1997, pondo fim com a vida de 111 custodiados.
Isto ocorre, porque a pena tornou-se algo insuportável como se apresenta em nossa modernidade, fazendo com que o apenado desacredite de sua própria redenção social, quando de fato, esta deveria concorrer para o reestabelecimento social-moral do apenado, gratificando a sociedade com sua incolumidade.
Ocorre que, “a pena deve consistir, pois, em algo que restrinja a liberdade do delinqüente e seja sentida pelo delinqüente como coerção, e coerção derivada do Direito” (PESSINA, 2006, p. 172), não se consentindo, com isso, que o apenado seja obliterado em seus direitos essenciais, na qual, a dignidade da pessoa humana, tronco fundamental de nosso ordenamento jurídico, seja ofuscado pela insensatez governamental, retirando-lhe, deste, a legitimidade de seu jus puniendi.
Contudo, essa eficiência indutora da dor no delinqüente deve ter um limite. Não deve atacar a integridade da personalidade humana, pois, se com a pena fosse negado o direito da personalidade do delinqüente, estaria sendo negado, também, seu dever jurídico de ser submetido à pena, já que o direito da personalidade representa aptidão indelével do homem para ser sujeito, não apenas de Direito, mas também de obrigações jurídicas. (PESSINA, 2006, p. 173).
Ademais, com a célere variação de infortúnios ao qual os presos estão fadados a interagir, no malgrado cumprimento de sua pena, assistimos, tristemente, a dignidade da pessoa humana ser obliterada, em pleno albor de nossa contemporaneidade, quando mais que nunca seu núcleo ontológico[27] deveria ser protegido incansavelmente.
Mirabete (1992, p. 125) tinha consignado que a sanção penal, por se tratar de um poder-dever do Estado quando sua pretensão punitiva fora satisfeita, deveria ter o seu alcance prescrito na lei, ficando vedado, portanto, de dirimir os direitos não alcançados pela sentença penal condenatória.
Por estar privado de liberdade, o preso encontra-se em uma situação especial que condiciona uma limitação dos direitos previstos na Constituição Federal e nas leis, mas isso não quer dizer que perde, além da liberdade, sua condição de pessoa humana e a titularidade dos direitos não atingidos pela condenação.
E mesmo se tratando de um apenado, “como qualquer dos direitos humanos, os direitos do preso são invioláveis, imprescritíveis e irrenunciáveis” (MIRABETE, 1992, p. 128), pois, é sobre esta rubrica, que o Estado deve propugnar na preservação destes direitos, sob pena dele – Estado – cair no obscurantismo medieval com seus corolários destrutivos.
Por tudo quanto exposto, e exaustivamente debatido, a única constatação em que, logicamente, se depreende, é que o sistema carcerário está cansado, com um palmo de línguas para fora, de modo que, “(...) o sistema penitenciário brasileiro necessita, urgentemente, de uma solução. Pois, na realidade, estamos diante de um verdadeiro ‘barril de pólvora’, prestes a explodir” (GRECO, 2011, p. 243), e isso ocorre porque, “(...) o sistema prisional ainda é um fardo pesado e, ao que parece, é melhor ser deixado de lado do que ser carregado pelo Estado” (GRECO, 2011, p. 245).
III – CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Toda esta inflexão regencial deve-se ao compromisso inquinado fincado entre a burguesia educada e seus consortes alocados nos gabinetes estatais, empurrando a sociedade para o abismo social, pela fenda instaurada em seu bojo. Assim, a solução encontrada por estes, foi o controle dos imorais e depravados da ordem estabelecida através do sistema repressor, escamoteando os problemas reais, vinculado às políticas públicas.
Portanto, a sociedade, de modo geral, deve propugnar por uma resolução substantiva desta problemática, consolidada na concentração de riqueza, propiciando, com isso a escalada da marginalização do proletariado ocioso, na qual a higidez das instituições, sobretudo, a penitenciária, deve ser alçada ao patamar prioritário.
Saliente-se, que cogitar uma saída concreta, desta trama social, que transforma as mentiras oficiais, em verdades obliterante da existência humana em seu todo, é projetá-la para os confins da cultura afirmativa. Esta, por sua vez, nas observações de Marcuse, pautar-se-ia em desfigurar o plano concreto da existência humana, para a elevação, sublimada, dos indivíduos em seus casulos sociais.
Assim, cultura afirmativa deve ser entendida como “(...) aquela cultura pertencente à época burguesa que no curso de seu desenvolvimento levaria a distinguir e elevar o mundo espiritual anímico, nos termos de uma esfera de valores autônomos, em relação à civilização” (MARCUSE, 1997, p. 95/96).
Com isso, fica consignada que a sociedade consubstanciada pela produção de mercadoria com seus desideratos disformes do interesse social-real regaria, substancialmente, a desregulamentação das economias, fazendo do proletariado, suas vítimas preferidas. Nesse viés, estes, seriam as figuras centrais dos discursos Lei e Ordem, após seu flagelo social, transformando-se na clientela fundamental do sistema prisional.
Doravante, sua sorte, agora, está entregue ao aparelho estatal repressor, que em seu “múnus institucional”, não poupará esforços para lhe impingir sofrimentos cruéis e desumanos, em suas várias formas, que prescinde de uma fenomenologia ilustrativa.
Sem embargos, como se mostrou patente, com as argumentações tombadas acima, para se discutir as variáveis da segurança pública e do sistema prisional como um todo, mister se faz, uma análise de todo processo de produção e distribuição das riquezas da sociedade, caso queira lograr com resultados satisfatório, no enfretamento, não pelo belicismo crasso, mas pelo recrudescimento das políticas públicas inerente à formação de uma boa sociedade.
Por que do contrário, cediço, todos estão, de que “no fundo, política, tribunais e cárceres ainda constituem, praticamente em toda parte, as instituições fundamentais do controle social” (GIORGI, 2006, p. 83), hodiernamente, como forma cínica de regulação dos desvios sociais, sob o invólucro ideológico de defesa social e restabelecimento da paz pública.
NOTAS
[1] “(...) Alimentam uma geografia social totalmente independente dos comportamentos individuais (ausência de uma norma), preparada para a segregação e a contenção de classes de indivíduos definidas pelo status” (GIORGI, De Alessandro. A miséria governada através do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 103).
[3] É de bom alvitre suscitar as palavras do professor Rogério Greco ao tratar desta obra monumental de Michel Foucault, mostrando sua importância no curso da história do pensamento ocidental. Assim escreve Greco “Vigiar e Punir, fundamentalmente, um grito de alerta. Um grito que se fez ecoar pelos bancos das universidades, entre os acadêmicos, nos meios de comunicação de massa, entre a classe política, encarregada da construção legislativa, entre a Justiça, de uma forma geral. Vigiar e Punir é como se fosse um museu de horrores, onde percorremos seus corredores virando o rosto para as pinturas que são expostas nas suas paredes, que nos chocam, nos agridem, desagradam nossas vistas, mas que, infelizmente, retratam, com fidelidade, fatos da vida real” (GRECO, Rogério.Direitos humanos, sistema prisional e alternativas à privação da liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011, P, 182).
[4] “Pois não é mais o corpo, é a alma. À expiação que tripudia sobre o corpo deve suceder um castigo que atue, profundamente, sobre o coração, o intelecto, a vontade, as disposições” (FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópoles, RJ: Vozes, 2011, p. 21).
[5] “No fim do século XVIII e começo do XIX, a despeito de algumas grandes fogueiras, a melancólica festa de punição vai-se extinguindo” (FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópoles, RJ: Vozes, 2011, p. 13).
[6] Mostrando a importância de Foucault no processo de interpretação dos dispositivos punitivos ao longo do século, Alessandro De Giorgi pontifica que “o pensamento volta-se quase que instintivamente para Vigiar e Punir. É aqui, na realidade, que Foucault se ocupa especificamente da penalidade e das suas transformações, revelando uma atenção constante aos processos de transformação da economia capitalista e aos seus efeitos sobre o universo da punição” (GIORGI, De Alessandro. A miséria governada através do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 84).
[7] “Ora, o estudo desta microfísica supõe que o poder nela exercido não seja concebido como uma propriedade, mas como uma estratégia, que seus efeitos de dominação não sejam atribuídos a uma ‘apropriação’, mas a disposições, a manobras, a táticas, a técnicas, a funcionamentos; que se desvende nele antes uma rede de relações sempre tensas, sempre em atividade, que um privilégio que se pudesse deter; que lhe seja dado como modelo antes a batalha perpétua que o contrato faz uma cessão ou a conquista que se apodera de um domínio” (FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópoles, RJ: Vozes, 2011, p. 21).
[8] Quando Marx profetizou que a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante, não estava apenas a discutir questões eminentemente econômicas, mas, mostrar como se opera tais imperativos no espírito humano, fazendo com que os mesmos reproduzissem tais inferências em sua existência concreta, através da economia política. De sorte que “(...) por meio da reprodução de um imaginário social que legitima a ordem existente, elas contribuem para ocultar as contradições internas ao sistema de produção capitalista” (GIORGI, De Alessandro. A miséria governada através do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 36).
[9] Toda essa trama forjada hodiernamente foi para justamente “(...) desmantelar o Estado de bem-estar, antes de ser exportado para a Europa ocidental e o resto do mundo, junto com a ideologia econômica neoliberal que ele traduz e aplica ao domínio da ‘justiça’. E revela como a transição do estado social para o Estado penal, conduzida pela guinada dos estados unidos para o hiperencarceramento como uma estranha política antipobreza, pressagia o advento de um novo governo de insegurança social, que une a ‘mão invisível’ do mercado de trabalho desregulado ao ‘punho de ferro’ de um aparato punitivo, onipresente e instrutivo” (WACQUANT, Loic. Miséria. Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p. 12).
[10] Analisando nossa Democracia constitucional, Loic impende para um discurso cético pontificando que “(...) a despeito do retorno à democracia constitucional, o Brasil nem sempre construiu uma Estado de direito digno do nome. As duas décadas de ditadura militar continuam a pesar bastante tanto sobre o funcionamento do Estado como sobre as mentalidades coletivas, o que fez com que o conjunto das classes sociais tendam a identificar a defesa dos direitos do homem com a tolerância à bandidagem” (WACQUANT, Loic. Miséria. Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p. 12).
[11] “Uma última razão, de simples bom senso, milita contra um recurso acrescido ao sistema carcerário para conter a escalada da miséria e dos distúrbios urbanos no Brasil” (WACQUANT, Loic. Miséria. Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p. 12).
[13] “A crise do Estado de bem-estar social pode ser descrita, muito a grosso modo, como uma ‘interrupção de trajetória, nos dizeres de Castel (1999), trajetória essa representada por alguns anos de estabilidade da norma salarial, amplitude da rede de proteção social do estado e a conseqüente segurança social” (TEIXEIRA, Alessandra. Prisões da Exceção: Política penal e penitenciária no Brasil contemporâneo. Curitiba: Juruá Editora, 2009, p. 51) .
[14] A parte variável no processo produtivo, conforme os pensadores da economia clássica e, inclusive Marx, é o trabalhador.
[15] “O recrutamento da população carcerária ocorre com base na identificação (mas melhor seria dizer ‘invenção’) das classes de sujeitos consideradas produtoras de risco, potencialmente desviantes e perigosas para a ordem constituída” (GIORGI, De Alessandro. A miséria governada através do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 98).
[16] Melossi e Pavarini distinguem que não se trata de qualquer época que o cárcere surge com seus apanágios, mas está adstrita à época contemporânea com a afluência da burguesia, mostrando a correlação entre tempo de trabalho e trabalho assalariado. “Por conseguinte, na presença de um sistema socioeconômico como o feudal, no qual ainda não se historicizara completamente a idéia do ‘trabalho humano medido no tempo’ (leia-se, trabalho assalariado), a pena-retribuição, como troca medida pelo valor, não estava em condições de encontrar na privação do tempo o equivalente do delito” (MELOSSI e PAVARINI. Cárcere e fábrica: As origens do sistema penitenciário (século XVI – XIX). Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 22).
[17] Melossi e Pavarini descrevem com propriedade como tal fenômeno se compôs ao longo da história, para acolmatar os insurgentes da ordem estabelecida ao seu paradigma sócio-reprodutor. Por isso, “a instituição tinha base celular, porém em cada cela conviviam diversos detidos. O trabalho era praticado na cela ou no grande pátio central, segundo a estação do ano. Tratava-se de uma aplicação do modelo produtivo então dominante: a manufatura” (MELOSSI e PAVARINI. Cárcere e fábrica: As origens do sistema penitenciário (século XVI – XIX). Rio de Janeiro: Revan, 2006, p. 43).
[18] Nossa lei de execução penal nos dá uma dicotomia de direitos e deveres do apenado, elencando-os entre os artigos 38 usque 43 e no artigo 50, inciso VI para àqueles que se recusarem a inobservar os deveres na execução das tarefas impostas.
[19] Negros e periféricos são tidos, aos olhos da polícia repressiva, como possíveis imorais a ponto de cometer mais um delito, pois o status da pobreza já canaliza a comportamento desviante.
[20] “Para Rousseau e Fichte, todo delinqüente é, de per si, um inimigo” (JAKOBS e MELIÁ. Direito penal do inimigo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 26).
[21] A dicotomia colacionada ao texto refere-se ao que os autores configuraram como “o Direito Penal do cidadão é o Direito também no que se refere ao criminoso. Este segue sendo pessoa. Mas o, Direito Penal do inimigo é Direito em outro sentido. Certamente, o Estado tem direito de procurar a segurança frente a indivíduos que reincidem persistentemente na comissão de delitos” ( JAKOBS e MELIÁ. Direito penal do inimigo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 28).
[22] “De Nova York, a doutrina da ‘tolerância zero’, instrumento de legitimação da gestão policial e judiciária da pobreza que incomoda – a que se vê, a que causa incidentes e desordens no espaço público, alimentando, por conseguinte, uma difusa sensação de insegurança, ou simplesmente de incômodo tenaz e de inconveniência -, propagou-se através do globo a uma velocidade alucinante. E com ela a retórica militar de ‘guerra’ ao crime e da ‘reconquista’ do espaço público, que assimila os delinqüentes (reais ou imaginários), sem-teto, mendigos e outros marginais a invasores estrangeiros – o que facilita o amálgama com a imigração, sempre rendoso eleitoralmente” . E como sublinhou Loic, esta política “propagou-se pelo globo a uma velocidade alucinante” que “(...) o novo governador de Brasília, Joaquim Roriz, anunciou a aplicação da ‘tolerância zero’ mediante a contratação imediata de 800 policiais civis e militares suplementares, em resposta a uma onda de crimes de sangue do tipo que a capital brasileira conhece periodicamente” (WACQUANT, Loic. Miséria. Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p. 12).
[23] “A corrupção existente no sistema carcerário, conjugada com o tratamento indigno dispensado aos detentos (aqui incluída, obviamente, a superlotação carcerária), tornou-se uma marca registrada do sistema penitenciário do século XX, bem como do início do século XXI” (GRECO, Rogério. Direitos humanos, sistema prisional e alternativa à privação da liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011, P, 182).
[24] Mesmo com a reserva legal, esculpida na lei de execução penal, do apenado de ter contato com o mundo exterior, especificamente, no artigo, 41, inciso XV.
[25] “Há, ainda, por falta de uma classificação adequada dos presos no início do cumprimento de sua pena, outro indevido contato, que gera sérios problemas para a administração carcerária: os presos, hipocritamente, diga-se de passagem, possuem um ‘código ético’ próprio, segundo o qual não toleram aqueles que tenham praticado, por exemplo, crimes sexuais, como é o caso do estupro” (GRECO, Rogério. Direitos humanos, sistema prisional e alternativa à privação da liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011, P, 182).
[26] “Como, também, em regra, tinham uma vida promíscua fora do cárcere, muitos deles são portadores do vírus HIV ou de outras doenças sexualmente transmissíveis. Assim, quando mantêm relações sexuais com os demais presos, passam a contaminar todo o sistema prisional” (GRECO, Rogério. Direitos humanos, sistema prisional e alternativa à privação da liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011, P, 182).
[27] Mesmo que de difícil conceituação, o princípio da dignidade da pessoa humana, é uma qualidade essencial ao ser humano, lhe sendo irrenunciável e inalienável, confluindo com isso, que todos, ao ser portador deste, são iguais e pertencentes à mesma comunidade: Ser Humano.
BIBLIOGRAFIA
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LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.
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MIRABETE, Julio Fabrini. Execução Penal. São Paulo: Atlas, 1992.
MIRANDA, Carlos Alberto Cunha. A Fatalidade Biológica: A medição dos corpos, de Lombroso aos Biotipologistas.. In: História das Prisões no Brasil (Org). Clarissa Nunes; Flávio de Sá Neto; Marcos Costa e Marcos Luiz Bretas. Rio de Janeiro: Rocco, 2009 (Vol. II).
PESSINA, Enrico. Teoria do Delito e da Pena. São Paulo: Rideel, 2006.
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TEIXEIRA, Alessandra. Prisões da Exceção: Política penal e penitenciária no Brasil contemporâneo. Curitiba: Juruá Editora, 2009.
WACQUANT, Loic. Miséria. Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
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