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A Constituição de 1988 e a expansão do jornalismo jurídico


Autoria:

Rodrigo Daniel Silva


Bacharelando em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo, pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). É integrante dos grupos de pesquisa Comunicação, Economia Política e Sociedade (CEPOS) Capítulo Cachoeira. Desenvolve pesquisas sobre Jornalismo Jurídico.

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Resumo:

O objetivo deste artigo é mostrar como dois processos, a Constituição de 1988 e o advento das novas tecnologias, foram importantes para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil. Para isto, recorrermos a uma revisão bibliográfica e entrevistas.

Texto enviado ao JurisWay em 08/02/2014.



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A história do Brasil pode ser dividida entre antes e depois da Constituição de 1988. Se com o Plano Real conquistamos a estabilidade econômica, é com a Carta de 1988 que conseguimos uma estabilidade democrática. O Plano Real e a nova Constituição são dois marcos importantes na historiografia recente do nosso país. O constitucionalista e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, assinala que é com a Carta Magna, promulgada no fim dos anos 80, que alcançamos uma “maturidade institucional” (2013, p.26). Prossegue ele:

 

A Constituição de 1988 foi o marco zero de um recomeço, da perspectiva de uma nova história. Sem as velhas utopias, sem certezas ambiciosas, com o caminho a ser feito ao andar. Mas com uma carga de esperança e um lastro de legitimidade sem precedentes, desde que tudo começou. E uma novidade. Tardiamente, o povo ingressou na trajetória política brasileira, como protagonista do processo, ao lado da velha aristocracia e da burguesia emergente (2013, p.140).


Em outubro de 2013, a Constituição brasileira completou 25 anos, neste entrementes, lembra Barroso que “destitui-se por impeachment um Presidente da República, houve um grave escândalo envolvendo a Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, foram afastados Senadores importantes no esquema de poder da República”. Continua Barroso: “Foi eleito um presidente de oposição e do Partido dos Trabalhadores, surgiram denúncias estridentes envolvendo esquemas de financiamento eleitoral e de vantagens para parlamentares”. Ademais, uma mulher chegou à presidência, acompanhamos ao julgamento de um dos maiores escândalos políticos da nossa história, dentre outros fatos. Em nenhum desses momentos houve “a cogitação de qualquer solução que não fosse o respeito à legalidade constitucional” (BARROSO, 2013, p.191).

É com a Constituição de 1988 que passamos a ter assegurados o nosso direito de opinar, de manifestar, em suma, o direito de liberdade. Deixamos um Estado autoritário para trás e iniciamos a fase de um Estado democrático de Direito. Isto é essencial para a atividade jornalista, como nos lembra Nelson Traquina, “jornalismo sem liberdade ou é farsa ou é tragédia”. Ainda segundo Traquina, o vínculo “entre jornalismo e democracia é uma relação simbiótica”, isto é, não há imprensa sem democracia e vice-versa (2005, p.23).

Um segmento do jornalismo, em especial, que muito se beneficiou com a Carta de 1988 foi o jornalismo jurídico, como iremos ver mais adiante. Todavia, não tão-só a Constituição Cidadã, como ficou conhecida, outro fator fundamental para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil foi o advento das novas tecnologias.

É com o propósito de evidenciar como esses dois processos foram importantes para a área do jornalismo jurídico no Brasil que surge este trabalho. É imprescindível, contudo, que se faça aqui uma brevíssima viagem pela história das Cartas Magnas brasileiras. Ao passear pelos textos constitucionais brasileiros daremos ênfase ao que aconteceu, nesses períodos, no Poder Judiciário e na imprensa do Brasil. Para concretizar este artigo, vale pontuar, recorrermos a uma revisão bibliográfica e entrevistas com jornalistas que cobrem a área jurídica, são eles: Carolina Brígido, repórter do jornal O Globo, Juliano Basile, repórter do Valor Econômico e Frederico Vasconcelos, repórter especial da Folha de S.Paulo e do blog Interesse Público.

As Constituições brasileiras

Ao longo da sua história, o Brasil teve sete Constituições. Uma durante a fase Imperial e as demais na Republicana. Há ainda quem veja a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 também como uma Carta Magna, tamanha as “alterações realizadas na Constituição de 1967” (VILLA, 2011, p.10).

Era março de 1824, quando o imperador D. Pedro outorgou a nossa primeira Constituição. Antes, contudo, segundo o jornalista Laurentino Gomes (2010), houve um grande impasse na Constituinte para decidir qual o papel exerceria o imperador, a saída encontrada foi instituir o denominado Poder Moderador cujo idealizador foi o francês-suíço Benjamin Constant. O Poder Moderador era “exercido pelo imperador, constituía-se na prática como um quarto poder, que se sobrepunha aos outros três poderes – executivo, legislativo e judiciário – e arbitrava eventuais divergências” (GOMES, 2010, p.219-220).

A Carta de 1824 foi a que mais tempo vigorou na nossa história, quase setenta anos. Segundo Gomes, a Constituição “assegurava plena liberdade de imprensa e de opinião” (2010, p.219). Mas, na verdade, não era bem assim. O historiador Marco Antonio Villa (2011) conta que neste período os jornalistas foram perseguidos, ameaçados e presos. Isto demonstra como a realidade era bem diferente do que havia no texto constitucional. Todavia, não era o único paradoxo deste da Constituição imperial, Barroso lembra que “a Carta de 1824 estabelecia que a ‘lei será igual para todos’, dispositivo que conviveu, sem que se assinalassem perplexidade ou constrangimento, com os privilégios da nobreza, o voto censitário e o regime escravocrata” (2013, p. 28).

No que concerne ao Poder Judiciário, a Constituição de 1824 dedicou 14 dos 179 artigos constitucionais. Villa salienta que “o imperador [...] restringiu o quanto pôde a autonomia dos juízes. Mesmo afirmando que o ‘poder judicial é independente’” (2011, p.19). Eis aí mais uma contradição desta Carta Magna.

A segunda Constituição brasileira foi promulgada em 1891, já na fase Republicana. Conforme Villa (2011) é neste momento que é criado o Supremo Tribunal Federal, última instância do Poder Judiciário. Cabe relembrar aqui, o que disse o jurista baiano João Mangabeira: “o Judiciário é o poder que mais falhou na República” (apud VILLA, 2011). Esta citação nos dá uma vaga noção de como foi o comportamento da Justiça ao longo desses anos. O historiador Villa nos traz à memória fatos importantes que aconteceram neste período. Diz ele:

O STF começou mal: dois dos indicados (Barão de Lucena que era ministro da Justiça e elaborou a lista – e Alencar Araripe), eram, ao mesmo tempo, membros do STF e ministros do governo. Não era possível tal acúmulo. Sempre pródiga com os poderes a República resolveu o problema: os juízes foram aposentados sem que tivessem participado de nenhum julgamento (VILLA, 2011, p. 132).

Os absurdos não terminaram por aqui. Villa prossegue:

O segundo presidente da República, o marechal Floriano Peixoto, designou para o STF um médico (Barata Ribeiro) e dois generais (Ewerton Quadros e Inocêncio Galvão de Queiroz). [...] Os dois chegaram a exercer por alguns meses a função de juízes. O Senado, porém, não confirmou nenhum dos dois nomes [de acordo com a reportagem, ‘Barata Ribeiro foi um dos cinco casos de indicação para o STF vetada’, do portal do jornal O Globo,‘dos quase 300 ministros que ocuparam as cadeiras do Supremo, apenas cinco foram vetados pelo Legislativo, e literalmente, há mais um século’. São eles: Barata Ribeiro, ‘Ewerton Quadros e Innocêncio Galvão de Queiroz, ambos generais, escolhidos por Floriano, Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Siveira Lobo, indicados durante o mesmo governo’.Diferentemente do que assinalou Villa, durante o governo de Floriano Peixoto, cinco nomes foram vetados pelo Senado, segundo a matéria do O Globo, e não dois como escreveu o historiador]. Durante os três anos de mandato, Floriano Peixoto deu várias demonstrações desprezo pelo STF (VILLA, 2011, p. 132).

As menções de Villa evidenciam como o Poder Judiciário brasileiro sucumbiu ao Poder Executivo enquanto ficou em vigência a Carta de 1891. “Um ponto importante da Constituição – e que será muito utilizado pela oposição, nem sempre com sucesso – foi o instituto do habeas corpus”, diz o historiador, “que não estava presente na Constituição imperial, mas sim no Código de Processo Criminal de 1832” (2011, p.33).

Se em 1889 tivemos um “golpe militar republicano”, como assegura Villa (2011, p.13), não poderíamos deixar de ter uma imprensa vendada, amordaçada e amarrada, características das ditaduras. E foi o que ocorreu nesta época.

Na década de 1930, mais precisamente em 1934, foi promulgada a nossa terceira Carta Magna. Tivemos novidades nesta Lei Maior, como, por exemplo, o direito das mulheres de votar, a criação da Justiça Eleitoral, o voto secreto, o reconhecimento dos sindicatos, e, ademais, os indígenas foram citados no texto constitucional. A Justiça, mais uma vez, fora controlada. “O governo achava que tudo podia, não tinha limites. Por meio de um decreto, aposentou seis ministros do Supremo Tribunal Federal”, ressalta Villa (2011, p.44). Isto só para demonstrar brevemente como ainda, nesta ocasião, o Poder Judiciário estava aos pés do Executivo.

A imprensa brasileira não escapou das censuras neste tempo. “O estado de sítio [garantido pela Carta de 1934] concedia ao Executivo amplos poderes e a suspensão das garantias individuais, além da imposição da censura” (VILLA, 2011, p.50). Todas as publicações – livros, jornais, revistas – tinham que passar pela vista grossa do governo.

Três anos após a promulgação da Constituição de 1934, “Getúlio Vargas revogou [...], dissolveu o Congresso e outorgou ao país, sem qualquer consulta prévia, a Carta Constitucional do Estado Novo”, segundo informações do portal do Senado Federal. Estávamos no ano de 1937, iniciava um novo golpe, a história se repetia, como uma farsa. E o governo estendeu ainda mais a sua censura. Ainda de acordo com o portal do Senado, as medidas adotadas pelo governo que mais se destacaram foram a: instituição da pena de morte; supressão da liberdade partidária e da liberdade de imprensa; anulação da independência dos Poderes Legislativo e Judiciário; restrição das prerrogativas do Congresso Nacional; permissão para suspensão da imunidade parlamentar; prisão e exílio de opositores do governo; e eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis ano

Para Villa (2011), a Alta Corte do país ficou humilhada no tempo em que estava em vigor a Carta de 1937. “A nomeação do presidente e do vice da Corte seria da alçada não mais dos próprios pares, mas do presidente da República. A idade máxima para a permanência como ministro caiu dos 75 anos [...] para 68”. Segue Villa: “nenhum habeas corpus [foi deferido], durante oito anos, que pudesse prejudicar a repressão governo” (2011, p.139). Em suma, não foi o melhor dos tempos da nossa história.

Após a ditadura do Estado Novo, o sol da democracia voltou a raiar. Em 18 de setembro 1946 foi promulgada a quinta Carta brasileira, a quarta da República. As nuvens ditatoriais, contudo, não se dissiparam totalmente. Marco Antonio Villa (2011) ressalta que “foi garantida a liberdade de expressão, porém [...] com ressalva” (p.86). Era vedada qualquer “propaganda de guerra, de processos violentos para subverter a ordem política e social, ou de preconceito de raça ou classe”, assinalava o artigo 141, § 5º do texto constitucional (apud VILLA, 2011, p.86). Além disso, “oito meses após a promulgação da Constituição, em maio de 1947, o partido [comunista] teve seu registro cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral” (p. 86). Ou seja, não era possível dizer que se vivia numa democracia plena.

Apesar de ter perdurado por 21 anos, na prática, a Carta de 1946 “foi extremamente distinta” (VILLA, 2011, p.93), após o golpe militar de 1964. Durante o regime militar foram editados 17 atos institucionais (AIs), alguns antes de ser promulgada a Constituição de 1967. O AI-5 foi o que mais marcou, pela sua arbitrariedade, o ato “deu ao regime poderes absolutos e cuja primeira consequência foi o fechamento do Congresso Nacional”. Ademais suspendeu “qualquer reunião de cunho político; [...] suspensão do habeas corpus para os chamados crimes políticos; decretação do estado de sítio pelo presidente da República [...] e autorização para intervenção em estados e municípios”, informa o portal do Senado. Ainda de acordo com o portal, “o Judiciário também sofreu mudanças, e foram suspensas as garantias dos magistrados”.

A oposição e a imprensa símbolos de uma democracia foram silenciadas no período. Em 1969, a Junta Militar divulgou “a Emenda Constitucional nº 1. Na prática era uma nova Constituição, tendo em vista o número de alterações que efetuou na Constituição de 1967” (VILLA, 2011, p.104). Luís Roberto Barroso observa que “a Carta de 1969, outorgada pelo Ministro da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, assegurava um amplo elenco de liberdades públicas inexistentes e prometia aos trabalhadores um pitoresco rol de direitos sociais não desfrutáveis” (2013, p.28).

Ao afirmar que: “em vários momentos da nossa história vivemos sob regimes ditatórias. As liberdades democráticas vigoram por períodos muitos restritos” (2011, p.19), o historiador Marco Antonio Villa sintetiza o tópico “As Constituições brasileiras”, deste artigo. Segundo ele, “não é exagero afirmar que os últimos 200 anos da nossa história têm como ponto central a luta do cidadão contra o Estado arbitrário” (p.10). No entendimento de Villa, “só teríamos democracia plena após a promulgação da Constituição de 1988” (p.9). No próximo tópico, iremos ver como a Carta de 1988 foi fundamental para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil.

A Constituição de 1988

Pelo prisma da economia, a década de 80 foi perdida no Brasil. Do ponto de vista político, é neste período que damos o primeiro passo para a estabilidade democrática em que presenciamos. A promulgação, em 1988, da Constituição Cidadã, como carinhosamente a chamou o presidente da Câmara dos Deputados, o deputado federal Ulysses Guimarães, nos permitiu avançar em questões sociais e políticas. Para Luís Roberto Barroso “a Constituição de 1988 é o símbolo maior de uma história de sucesso: a transição de um Estado autoritário, intolerante e muitas vezes violento, para um Estado democrático de direito” (2013, p.26).

É com a Carta Magna de 1988 que o Poder Judiciário passa a ter maior independência em relação aos demais poderes. A nova Constituição reservou “novas e mais complexas atribuições” (VILLA, 2011, p.144) ao Supremo Tribunal Federal, que passou a decidir sobre assuntos econômicos e políticos. “Cabe aos três Poderes interpretar a Constituição e pautar sua atuação com base nela”, averba Barroso, “mas, em caso de divergência, a palavra final é do Judiciário” (2013, p.248).

O jornalista Juliano Basile diz que o tribunal passou a ser essencial para a economia, pois julgou os planos econômicos dos anos 80 e 90, as medidas de ajuste fiscal de FHC e os programas do governo Lula e Dilma. Além disso, os temas que não são resolvidos no Congresso passaram a ser levados ao STF de maneira que o tribunal tornou-se um ator político fundamental. Para completar, os institutos criados a partir de 2004, como a súmula vinculante e a repercussão geral, concentraram poder no STF.”

Continua Basile: “O STF passou a concentrar poderes de julgar as Adins, as ADCs e as ADPFs (ações de controle concentrado de constitucionalidade). O regime de 88 conferiu papel essencial ao STF e o jornalismo jurídico passou a acompanhar esse movimento.”

O Supremo Tribunal Federal é considerado, pelo constitucionalista português José Joaquim Gomes Canotilho, como um “dos tribunais com maios poderes no mundo”. Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, Canotilho disse que o STF “não é só um tribunal constitucional, é um tribunal de recursos, o que o torna mais visível”.

Contudo, não somente o STF que ganhou poderes e notoriedade com a Constituição de 1988, o Ministério Público também se beneficiou. Com a nova Carta, o MP passou a ter “autonomia para trabalhar, independência financeira e institucional e abertura do campo de atuação, a instituição ganhou força e cresceu de tamanho e de importância”, assevera a repórter do Consultor Jurídico, Lilian Matssura (2008).

Ainda segundo ela,o Ministério Público vivia [antes da Constituição] em estado permanente de esquizofrenia: de um lado, atuava como advogado do Estado; de outro, como fiscal da atuação de prefeitos, governadores e do presidente da República. Com a Constituição de 1988, essa disritmia acabou. Nasce um novo poder no Estado. Um Ministério Público autônomo, independente do Executivo, Legislativo ou do Judiciário. A instituição passa a ser fiscal da lei, defensora da democracia e dos direitos sociais e individuais indisponíveis.

No entendimento da jornalista Carolina Brígido, que cobre desde 2001 o Poder Judiciário, a ascensão do Ministério Público, que sucedeu pela Carta de 1988, foi importante para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil.

Para ela, o fato do Ministério Público estar mais atuante, em virtude das atribuições dadas a ele pela Constituição de 1988, deixou o órgão mais em evidência no sentido do combate à corrupção. Essa notoriedade acaba gerando mais interesse da mídia pelos processos desse tipo – que, sem dúvida, hoje são mais numerosos.

Na visão de Brígido, houve uma mudança no perfil do Ministério Público, que “passou a denunciar parlamentares e ministros de Estado ao STF. Com isso a área [do jornalismo jurídico] ganhou mais notoriedade”. Ainda segundo a jornalista, “a judicialização de temas políticos, [...] jogou os holofotes para o Judiciário, especialmente para o STF”.

O constitucionalista Barroso dá aval as palavras da jornalista ao asseverar que “nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem ocupado um espaço relevante no cenário político e no imaginário social” (2013, p.38). Luís Roberto Barroso, no entanto, averba que isto não é uma exclusividade da Alta Corte brasileira, “em diversas partes do mundo, [...] tribunais constitucionais tornaram-se protagonistas de discussões políticas ou morais em temas controvertidos” (p.38).

O constitucionalista relembra que – só para citar um episódio – a Suprema Corte nos Estados Unidos foi quem decidiu as eleições de 2000. No Brasil, diz Barroso, “apenas em 2011 e 2012, o STF decidiu acerca de uniões homoafetivas, interrupção da gestão de fetos anencefálicos e cotas raciais” (2013, p.13), questões essas que deveriam ter sido decididas no âmbito do Legislativo.

O jornalista Frederico Vasconcelos (2013) pontua que “há uma maior abertura do Judiciário à imprensa. Na verdade, a abertura do Judiciário não resultou [...] de maior empenho da imprensa. Surgiu do próprio Judiciário, tendo importância, [...], a criação do CNJ”. Calha relembrar que, em 2004, as suspeitas de que magistrados estavam desviando de sua conduta, levou a criação do Conselho Nacional de Justiça instituído pela Emenda Constitucional nº 45. Isto permitiu que “por meios de inspeções nos tribunais [viesse] à tona revelações que a imprensa, por si só, não conseguiria obter”, assinala Vasconcelos.

O CNJ é pauta frequente nos meios de comunicação, agora vemos como mais assiduidade reportagens sobre uma investigação de juízes suspeitos de corrupção, ou divulgação de estíticas com informações dos tribunais, de pesquisas ou ainda de eventos jurídicos.

Como pudemos observar, a Constituição de 1988 teve grande valor para ascensão do Poder Judiciário e o crescimento do jornalismo jurídico no Brasil. A Suprema Corte que outrora sucumbia ao Poder Executivo, agora, tem um poder que há quem avalie até mesmo como discricionária. O novo perfil do Ministério e a criação do CNJ também foram fundamentais para que a Justiça passasse a ser pautada na grande mídia. Em nosso tempo, “não é raro lermos matérias sobre uma investigação do MP, assistirmos uma sentença do Supremo Tribunal Federal (STF), ou ainda ouvirmos dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)” (SILVA, 2013).

Não é demasia dizer, ainda, que a nova Carta deu liberdade de opinião e de imprensa, passamos a ter uma democracia plena, o que é imprescindível para a atividade jornalista. Como lembra o teórico Nelson Traquina, “a relação entre democracia e jornalismo é fundamentalmente uma relação simbiótica” (2005, p.42)

As novas tecnologias

Desde o século 19, o jornalismo é impactado com o surgimento de novas tecnologias [na obra Teorias do Jornalismo: porque as notícias são como são, Nelson Traquina diz que: “O impacto tecnológico marcou o jornalismo do século 19 como iria marcar toda a história do jornalismo ao longo do século 20 até o presente, apertando cada vez mais a pressão das horas-de-fechamento, permitindo a realização de um valor central da cultura jornalística – o imediatismo” (2013, p.53)]. Do final do século 20 até o presente, os meios de comunicação tradicionais têm enfrentado um duro embate com as novas mídias, em especial, a internetSegundo Sérgio Mattos (2013), presenciamos a chamada Era Digital, que tem mudado o modo de fazer jornalismo e até mesmo o trabalho e a formação dos profissionais da Comunicação (2013). O advento das novas mídias tem contribuído também para dar voz às minorias e, ademais, criar conteúdos para um público segmentado. As mídias tradicionais, cabe pontuar, tendem a buscar assuntos que atendam a uma maior quantidade de pessoas e pôr, em segundo plano, temas que sejam de interesse de um público menor.

O segmento do jornalismo jurídico muito se favoreceu das tecnologias digitais. Por duas razões, em primeiro lugar, porque, como já assinalado, as novas mídias permitiram criar espaços – sites, blogs, grupos e comunidades em redes sociais – para um público que ansiava por notícias jurídicas.

Outro ensejo para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil, provocado pelas novas tecnologias, foi a possibilidade dos poderes do Estado – entre eles, o Poder Judiciário – tornar público as suas ações. Em outras palavras, as novas tecnologias permitiram uma maior transparência dos Poderes. O jornalista Frederico Vasconcelos observa que a “informatização tem permitido um maior acesso aos processos, há ferramentas que facilitam o acompanhamento rápido do andamento dos processos”. Juliano Basile endossa as palavras de Vasconcelos, ao dizer que “antes, saber qual era a pauta do Supremo já rendia matéria. Hoje, a pauta está no site do tribunal na internet. Antes, era mais difícil ter acesso a decisões que, hoje, os tribunais veiculam em suas páginas na rede.”

A passagem de Juliano Basile reforça que houve um aumento da transparência do Poder Judiciário com o surgimento das tecnologias digitais e também uma mudança na atividade jornalística. “Se o acesso à informação ficou mais fácil, o trabalho do jornalista se tornou mais difícil, pois ele tem que atuar em tempo real. Trabalhe-se muito mais!”, analisa Basile. Além disso, mais assuntos passaram a ter visibilidade, o que demanda um maior conhecimento do jornalista e rigor na seleção dos fatos.

Podemos verificar que, em grande medida, as notícias relacionadas à Justiça – por exemplo, decisões de magistrados, pareceres de promotores – são divulgadas por portais jurídicos. Dentre eles, podemos citar, o Consultor Jurídico (o Conjur), o Migalhas, o Última Instância, o blog Interesse Público, entre outros.

O ex-editor do Consultor Jurídico Rodrigo Haidar, lembra no artigo “Da internet discada à banda larga, criando notícia jurídica”, que, no início, o site do Conjur era hospedado no UOL, isto contribuiu para o crescimento do portal, podemos assegurar que também foi importante para a própria expansão do jornalismo jurídico, uma vez notícias produzidas pelo Conjur passaram a ter destaque na pagina principal do provedor de conteúdo. Em outras palavras, as notícias jurídicas ganharam destaque na grande mídia.

Haidar recorda ainda os desafios que precisaram ser suplantados:

não havia banda larga. A internet era discada e a conta, calculada por minutos de acesso, costumava ser absurdamente alta. Pouco antes de 1999, lembro que, para continuar com o trabalho, nós acessávamos a internet para checar e-mails, publicar as notícias e, em seguida, desconectávamos. Era inviável economicamente para um site pequeno, mantido quase que num esforço pro bono, pagar o preço cobrado pela conexão ininterrupta.

Além das dificuldades com as tecnologias, Haidar rememora que havia também o desafio de transformar as decisões judiciais em notícias. Rodrigo Haidar aponta ainda no artigo um ponto positivo da mídia digital: “a falta de limitação de espaço”. “Não tínhamos de contar linhas ou palavras para explicar ao leitor o impacto de determinada decisão sobre sua vida ou seu trabalho”.

Frederico Vasconcelos, quando criou o blog Interesse Público em 2007, salientou, em entrevista ao Consultor Jurídico, a importância das novas mídias: “o espaço do blog permite abrigar ao mesmo tempo notas curtas e textos mais extensos. Além disso, o repórter afirma que os textos podem ser veiculados a qualquer momento”.

Como pudemos constatar o advento das novas mídias colaborou para o crescimento do jornalismo jurídico no Brasil, pois permitiram uma transparência do Poder Judiciário e uma difusão das informações jurídicas.

Conclusão

Como assentamos ao longo deste artigo, dois processos foram fundamentais para a expansão do jornalismo jurídico no Brasil: a Constituição de 1988 e o advento das novas mídias.

A Carta de 1988 garantiu uma independência ao Poder Judiciário, que antes, muitas vezes, foi submisso ao Poder Executivo. Demais disso, deu novas competências ao Supremo Tribunal Federal, que é agora um tribunal constitucional e recursal. A Lei Maior de 1988 mudou também a conduta do Ministério Público, que se tornou combativo em relação à corrupção e na luta pelos direitos fundamentais. A nova Carta possibilitou ainda a criação do Conselho Nacional de Justiça, que como vimos tem sido essencial para a transparência do Poder Judiciário.

Diante do exposto, notamos que estes três fatores gerados pela Constituição de 1988 fez com que houvesse mais informações sobre a Justiça no Brasil, e por decorrência um crescimento do jornalismo jurídico.

O surgimento das novas tecnologias, em especial, a internet, foi outro ensejo para o avanço do segmento do jornalismo jurídico no Brasil, pois possibilitou ao Poder Judiciário maior transparência, uma vez que agora tem um meio para a divulgação de suas ações. Observamos que já é possível encontrar as decisões dos magistrados dos Tribunais Superiores na internet. É, a bem verdade, ainda há certa dificuldade de acesso às informações das ações dos juízes de primeira instância, mas a tendência é de que isto também mude. As novas mídias possibilitaram ainda a criação de espaços – portais, blogs – destinados à cobertura da Justiça.

Outros aspectos podem ter influenciado a expansão do jornalismo jurídico no Brasil, mas esses dois processos assinalados aqui, sem dúvida, foram fundamentais. A “caixa-preta” como, certa vez, se referiu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Poder Judiciário brasileiro, está cada vez mais se abrindo a sociedade e a imprensa tem sido importante para que isto ocorra.

É verdade que a mídia ainda precisa suplantar alguns desafios como a dificuldade na tradução da linguagem jurídica, a falta de especialização dos profissionais e ausência de cadernos nos grandes jornais destinados à cobertura do Poder Judiciário, por exemplo. Temos a percepção de que caminhamos para a suplantação destes obstáculos, pois o Judiciário está mais presente na sociedade, que tem formado, cada vez mais, o sentimento de Justiça.

Referências

BARROSO, Luís Roberto. O novo direito constitucional brasileiro: contribuições para a construção teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil. 2ª reimpressão. – Belo Horizonte: Fórum, 2013.

BASILE, Juliano. “A Constituição de 1988 e a expansão do jornalismo jurídico no Brasil”. Entrevistador: Rodrigo Daniel Silva. Entrevista concedida por e-mail, 28 de outubro de 2013.

BRÍGIDO, Carolina. “A Constituição de 1988 e a expansão do jornalismo jurídico no Brasil”. Entrevistador: Rodrigo Daniel Silva. Entrevista concedida por e-mail, 28 de outubro de 2013.

DA REDAÇÃO. “Jornalista Frederico Vasconcelos cria blog sobre Judiciário”. In Conjur. Disponível:http://www.conjur.com.br/2007-nov-01/frederico_vasconcelos_cria_blog_judiciario. Acesso: 05/12/13.

GOMES, Laurentino. 1822: como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram D. Pedro a criar o Brasil um país que tinha tudo para dar errado. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.

HAIDAR, Rodrigo. “Da internet discada à banda larga, criando notícia jurídica”. In Conjur. Disponível:http://www.conjur.com.br/2012-ago-02/conjur-ano-xv-internet-discada-banda-larga-criando-noticia-juridica. Acesso: 05/12/2013.

MATSUURA, Lilian. “Constituição de 1988 colocou o MP na vida do brasileiro”. In Conjur: Disponível:http://www.conjur.com.br/2008-out-06/constituicao_1988_colocou_mp_vida_brasileiro. Acesso: 05/12/13.

MATTOS, Sérgio Augusto Soares. “A revolução digital e os desafios da comunicação”. – Cruz das Almas/BA: UFRB, 2013.

MENDONÇA, Ricardo. “‘Os réus do mensalão têm alguma razão’, diz jurista guru dos ministros do STF”. InFolha de São Paulo. Disponível: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/11/1375636-os-reus-do-mensalao-tem-alguma-razao-diz-jurista-guru-dos-ministros-do-stf.shtml

PORTAL DE NOTÍCIAS SENADO FEDERAL. “Constituições brasileiras”. Disponívelhttp://www12.senado.gov.br/noticias/entenda-o-assunto/constituicoes-brasileiras. Acesso em: 06/12/2013.

SILVA, Rodrigo Daniel. “Um panorama do jornalismo jurídico no Brasil”. Observatório da Imprensa, São Paulo, p. 1 – 10, 01 out. 2013.

TABAK, Flávio. “Barata Ribeiro foi um dos cinco casos de indicação para o STF vetada”. In O Globo.Disponível: http://oglobo.globo.com/pais/barata-ribeiro-foi-um-dos-cinco-casos-de-indicacao-para-stf-vetada-6189868 Acesso em: 23/01/2014.

TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo: por que as notícias são como são. Volume I. – Florianópolis: Insular, 2ª ed., 2005.

VASCONCELOS, Frederico. “A Constituição de 1988 e a expansão do jornalismo jurídico no Brasil”. Entrevistador: Rodrigo Daniel Silva. Entrevista concedida por e-mail, 29 de outubro de 2013.

VILLA, Marco Antonio. A história das constituições brasileiras. – São Paulo: Leya, 2011.

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