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Habeas Corpus Substitutivo de Recurso Ordinário Constitucional: as divergências em sua admissibilidade


Autoria:

Felipe Novais Zacarias


Graduando em Direito, na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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Resumo:

A presente pesquisa tem o objetivo de apresentar a possibilidade de impetração de Habeas Corpus em substituição ao Recurso Ordinário Constitucional (ROC), de modo a permitir uma maior celeridade e viabilizar o direito de maior valia do paciente, a li

Texto enviado ao JurisWay em 16/08/2022.



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HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL: AS DIVERGÊNCIAS EM SUA ADMISSIBILIDADE.

Felipe Novais Zacarias

Otavio Boscolo Azevedo

RESUMO

A presente pesquisa tem o objetivo de apresentar a possibilidade de impetração de Habeas Corpus em substituição ao Recurso Ordinário Constitucional (ROC), de modo a permitir uma maior celeridade e viabilizar o direito de maior valia do paciente, a liberdade. A priori será apresentado o Habeas Corpus e seu surgimento, demonstrando a sua importância para o Direito, bem como para a ordem social e o resguardo de direitos fundamentais. Posteriormente, será analisado o ROC, suas formalidades e as dificuldades quando comparado ao writ, de modo a clarear a viabilidade de impetrar o remédio constitucional como uma medida alternativa. Propõe a pesquisa elucidar o tema a partir de uma análise doutrinária, tanto a respeito da relevância do writ, bem como da previsão legal pela necessidade de oferecimento do recurso próprio após a decisão denegatória do Habeas Corpus. Será abordado o conflito jurisprudencial na sua aceitação, demonstrando os diversos entendimentos, por meio da apresentação de alguns julgados e ainda da análise das decisões proferidas no decorrer dos últimos anos. Todas as abordagens realizadas suscitarão os direitos constitucionais, por óbvio, o de maior relevância ao presente estudo terá um tratamento especial, a liberdade. A pesquisa ostenta uma metodologia exploratória representada por meio de pesquisa qualitativa e minuciosa, valendo-se de doutrinas, legislações e jurisprudências que abordem tanto o Direito Processual Penal, bem como o Direito Constitucional.

Palavras-chave: Direito Processual Penal; Liberdade; Recurso Ordinário Constitucional; Habeas Corpus Substituto.


1. INTRODUÇÃO

Pode-se afirmar que a Constituição Federal de 1988 assegura aos brasileiros e estrangeiros um grande leque de direitos e garantias. Dentre tais prerrogativas destaca-se a liberdade de locomoção, um dos mais sagrados direitos fundamentais, compreendo a liberdade de ir, vir e permanecer. Contudo, o direito que se referimos poderá sofrer limitações, desde que não haja arbitrariedade estatal.

Há quem diga que o habeas corpus está presente na sociedade desde a época do Direito Romano, portanto, há tempos o presente remédio constitucional é utilizado para garantir a liberdade de indivíduos que estejam presos ou que estejam na iminência da prisão. No Brasil esse instituto surge em 1821, contudo sofre limitações nos períodos ditatórias, felizmente com a redemocratização esse instrumento fora reestabelecido, de modo que até mesmo em estado de defesa ou estado de sítio ele estará presente.

Contra a ordem que denegar o habeas corpus é possível a interposição de recurso ordinário constitucional, esse recurso acaba tendo que seguir as regras dispostas no Código de Processo Penal, sua interposição deve observar o prazo de 5 dias, em razão desse pequeno espaço de tempo notou-se na praxe forense a opção pela interposição de um novo habeas corpus perante os Tribunais Superiores.

Ocorre que na prática existe divergência jurisprudencial acerca da possibilidade da admissão do habeas corpus como substituto de recurso ordinário. Ainda que o Superior Tribunal Federal tenha permitido tal flexibilização, o Superior Tribunal de Justiça, especialmente a 5ª Turma, não adota o entendimento da Suprema Corte.

Assim, este tema causa debate entre os especialistas na área e ao examinar o posicionamento dos autores, nota-se que a flexibilização deve ser admitida, especialmente nas hipóteses em que haja réu preso, vez que o habeas corpus tem como finalidade a proteção à liberdade de locomoção.


2. DESENVOLVIMENTO DO ARGUMENTO

2.1. ORIGEM DO HABEAS CORPUS

Necessário ao regular desenvolvimento do presente trabalho e para uma melhor elucidação sobre a temática objeto do estudo, uma breve análise do contexto histórico do habeas corpus em nosso país e a sua devida importância para garantia dos direitos fundamentais e ao processo penal.

A origem do Habeas Corpus é conferida ao Direito Romano, se constituía em uma ação privilegiada pela qual se pleiteava a liberdade de alguém preso irregularmente, recebia a denominação de interdictum de libero homine exhibendo. (MIRANDA, 2007)

Há outros autores que apontam o seu surgimento a partir da Magna Carta, na Inglaterra, ou ainda ao Reinado de Carlos II e a Petition of Rights, dando origem ao famigerado Habeas Corpus Act de 1679. (MIRANDA, 2007)

Até este momento, o habeas corpus era utilizado apenas em casos de pessoas acusadas de crime, excluindo-se as demais hipóteses. Somente no ano de 1816, com o Habeas Corpus Act inglês é que fora ampliada a aplicação do writ, com o fito de proteger a liberdade rapidamente e de forma eficaz.

O surgimento deste instituto em nosso país está relacionado ao Decreto de D. João VI, datado de 23 de maio de 1821 e implícita na Constituição Imperial de 1824, impossibilitando todas as prisões arbitrárias. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, através de seu art. 8º, prevê que todos devem ter uma espécie de recurso efetivo para inibir os atos que constrinjam direitos fundamentais. (BUSANA, 2009)

Apesar destas previsões anteriores, somente a partir do Código de Processo Criminal, no ano de 1832, é que passou a ser efetivamente disciplinado o habeas corpus no direito brasileiro, precisamente em seu artigo 340:

“Todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor”.

No mesmo dispositivo restou estabelecido a autonomia do habeas corpus, devendo o mesmo ser feito por meio de petição própria, sem a necessidade de fundamentação, mas tão somente demonstrar a ilegalidade da prisão.

Nesta senda, é possível dissertar que a garantia constitucional do habeas corpus assegura a liberdade dos cidadãos, sendo instrumento fundamental ao Estado Democrático de Direito. Por óbvio, sempre é excluído nos governos ditatoriais, no Brasil, por exemplo, o Ato Institucional n.º 5 (AI-5) cessou a sua garantia. (MASSAÚ, 2008)

Somente fora restabelecida a sua plenitude com a Constituição Federal de 1988 que, extinguiu todas as restrições impostas pelo regime militar, e estabeleceu o instrumento como uma garantia fundamental individual, se perfazendo em cláusula pétrea.

A liberdade se constitui em um dos direitos fundamentais previstos pela Constituição Federal, cumprindo ao Estado zelar pela sua garantia, nos termos de seu art. 5º. Ademais, a concessão de habeas corpus é assegurada no mesmo artigo, precisamente em seu inciso LXVIII.

Pelos dispositivos supra, configurada a restrição ao direito de ir, vir e ficar, previsto como direito fundamental, por uma ilegalidade ou abuso de poder, o writ é o instrumento constitucional capaz de sanar esta coação ou sua eventual ameaça. O habeas corpus se constitui em uma garantia individual ao direito de locomoção, através de uma ordem judicial proferida por um magistrado ou Tribunal ao coator, de modo a findar esta ameaça ou efetiva coação à liberdade de locomoção. (MORAES, 2020)

Imperioso consignar que não somente nos casos de restrição à liberdade realizada pelo Poder Público mediante ordem ilegal se admite o writ, sendo possível até mesmo entre particulares ou em punições disciplinares. A ilegalidade pode ser praticada por qualquer pessoa, configurado o chamado ato ilegal de particular será possível impetrar o writ, vez que a Constituição Federal não limita o conceito de ilegalidade. (SMANIO, 2007)

Há ainda entendimento firmado pela jurisprudência das cortes superiores que é inadmissível a interposição de habeas corpus contra decisão condenatória a pena pecuniária ou em processo onde somente ela se admite como castigo (Súmulas 693 e 694 do Supremo Tribunal Federal).

De igual maneira, não são admitidos os writs impetrados contra punições disciplinares no âmbito militar. Nestes casos, devemos analisar com maior cautela, pois apesar de ser admitido nas hipóteses de punição disciplinar, as militares são excluídas.

A exclusão não é uma medida arbitrária, tendo de ser encarada à luz dos princípios hierárquicos e disciplinares das organizações militares, a restrição ao habeas corpus é um meio de evitar que as punições impostas por superiores sejam impugnadas por seus subordinados. (GRINOVER, 2011)

O Código de Processo Penal Militar leciona que a vedação somente deve ocorrer quando a punição estiver sendo aplicada nos moldes dos regulamentos disciplinares das Forças Armadas, o que não permitiria nenhuma discussão a respeito de sua ilegalidade.

Ackel Filho e Pinto Ferreira sustentam não ser tal vedação absoluta, passível quando alicerçada em incompetência da autoridade, falta de previsão legal, descumprimento das formalidades legais ou perdurar por tempo excessivo. Afinal o completo afastamento desta garantia constitucional permitiria grandes abusos de poder.

Após a extinção da pena privativa de liberdade também não é possível interpor habeas corpus, onde não é verificada a iminência ou ameaça de restrição à liberdade, vez que a mesma já ocorreu e fora cessada com o integral cumprimento da pena (Súmula 695 do STF).

Pontes de Miranda confere ainda a este instrumento um outro viés, destacando que se perfaz em um meio de garantir o atendimento a todos os direitos do acusado ligados à sua liberdade de locomoção. (MIRANDA, 2007)

Pode ser classificado como uma ação constitucional de caráter penal e com rito especial, que busca cessar a ameaça ou restrição da liberdade de locomoção baseada em uma ilegalidade. Pela sua natureza constitucional, imperioso salientar que não se constitui em uma espécie de recurso processual, mas sim em um instrumento próprio e com regras próprias, devidamente previstas no Código de Processo Penal.

Nosso ordenamento prevê ainda duas hipóteses de impetração do writ, podendo ser classificado como repressivo ou preventivo. O preventivo deve ser impetrado quando verificada a ameaça de restrição à liberdade, enquanto o repressivo é cabível quando já verificada essa restrição.

De acordo com Gustavo Badaró (2020, p. 1.080): “Outra classificação importante distingue o habeas corpus liberatório, utilizado quando já há lesão à liberdade de locomoção (por exemplo, o paciente já está preso) e o habeas corpus preventivo, utilizado quando o paciente está ameaçado de sofrer restrição ilegal em sua liberdade de locomoção (por exemplo, houve expedição de um mandado de prisão por juiz incompetente)”.

A irregularidade da restrição de liberdade é verificada quando ausentes os pressupostos para decretação de tal medida. No caso da prisão, mister verificar o fumus commissi delicti, indícios da prática do crime e o periculum libertatis, perigo trazido pela liberdade do agente. Não estando presentes tais requisitos, a prisão não possui justa causa e deve ser classificada como ilegal.

Imperioso salientar que em sede de habeas corpus não se discute matéria probatória, mas tão somente a ilegalidade da constrição de liberdade, de modo que as provas devem ser analisadas na instrução processual.

Tamanha é a importância conferida a este instrumento que nem mesmo no estado de defesa ou no estado de sítio pode ser suspensa a sua garantia, tão somente é possível reduzir a sua abrangência, vez que as medidas impostas por esses estados permitem uma restrição à liberdade de locomoção. (AMARAL JUNIOR, 2020)

O estado de defesa e o estado de sítio são medidas extraordinárias que se forem empregadas sem o devido rigor podem banalizar o caráter excepcional da medida e ainda comprometer o Estado Democrático de Direito. (AMARAL JUNIOR, 2020) Contudo, tais instrumentos garantem o funcionamento da Constituição Federal nas situações de crise política ou institucional, vale dizer que se e quando forem utilizados eles seguem a lógica do sistema de feios e contrapesos, de modo a evitar eventual arroubo autoritário.1

No artigo 136 da Constituição Federal de 1988 está insculpido o procedimento, as hipóteses e as restrições que são impostas em eventual decretação de estado de defesa. Por outro giro, no artigo seguinte também está estabelecido as mesmas situações na hipótese de estado de sítio.

Em que pese a relevância desses instrumentos, o estado de sítio já foi decretado sem o devido rigor durante a República Velha, tal situação banalizou e vulgarizou o instrumento. Ocorre que, felizmente, com a Constituição Federal em vigor jamais fora decretado tais medidas. Além disso, ainda que o Estado esteja diante de uma situação extremamente dramática, os “remédios” a serem introjetados para controle da adversidade não podem sem contrário aos Direitos Fundamentais. (AMARAL JUNIOR, 2020)

Desse modo, se eventualmente o Estado brasileiro vier a se deparar com alguma dessas situações o Habeas Corpus não poderá ser suprimido, vez que ele é utilizado para garantir o maior direito do cidadão.

1 De acordo com José Levi Mello do Amaral Junior, estado de defesa é uma medida excepcional e consiste na possibilidade de ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, bem como em hipóteses de realização de prisões por crime contra o Estado. Essa medida extraordinária é decretada pelo Presidente da República (competência privativa, nos ditames do art. 84, IX, da CF), nesses casos os decretos são submetidos ao controle do Congresso Nacional, que decidirá acerca da decretação ou prorrogação, por maioria absoluta. Vejamos que sua decretação não depende de solicitação aos parlamentares, o Chefe do Executivo expede o decreto e, posteriormente, o Congresso Nacional realiza juízo de conveniência. Ainda, vale dizer que o tempo de duração do estado de defesa não é superior a 30 dias, permitida uma única prorrogação, desde que as razões para sua decretação persistam.

Alexandre de Moraes, por seu turno, salienta que estado de sítio corresponde as hipóteses de suspensão temporária de garantias constitucionais, trata-se de outra atividade de competência privativa do Presidente da República. Ocorre que, nesses casos, o Chefe do Executivo, antes de eventual decretação, deve solicitar aprovação ao Congresso Nacional. Impõe-se o estado de sítio nos casos de declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira e nos casos de grande comoção de repercussão nacional, ou ineficácia do estado de defesa. Na primeira possibilidade o decreto poderá perdurar por todo tempo em que houver guerra ou agressão, contudo, na segunda situação a medida poderá durar por até 30 dias, prorrogável, por igual período.

Por fim, é forçoso e necessário mencionar que em ambas as hipóteses é necessário a manifestação do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional.

Como dito acima, o Habeas Corpus é um dos principais remédios constitucionais presente no ordenamento jurídico brasileiro. Esse instrumento pode ser manejado desde antes do período pré-processual até depois do trânsito em julgado da decisão judicial, possuindo tanto o caráter preventivo quanto repressivo.

Essa ação autônoma é fundamental para proteger o direito à liberdade de locomoção, trata-se de procedimento sumário, na medida em que deve será analisado com prioridade em relação as demandas judiciais. Sua relevância decorre da importância do bem jurídico protegido.

O Brasil, apesar de ser um dos países conhecidos pela ampla receptividade e solidariedade, está imerso em injustiças, não é incomum que homens e mulheres sejam detidos inocentemente. Além disso, a situação agrava-se com o abandono ao sistema criminal, fazendo com que os encarcerados fiquem “esquecidos” nas penitenciárias. (Zackseski, 2010)

No sistema de justiça criminal brasileiro não é incomum se deparar com duas situações: i) pessoas presas inocentemente 2 e ii) pessoas cumprindo pena superior ao patamar fixado 3.

Sendo assim, diante do cenário narrado o Habeas Corpus assume considerável papel na sociedade brasileira, objetivando resguardar um dos principais (senão o maior) direito do cidadão (TAVARES, 2016). Tanto é a relevância do direito à locomoção que o Código de Processo Penal, em seu artigo 654, estabelece que qualquer pessoa, independentemente de capacidade postulatória, poderá impetrar habeas corpus quando verificada a iminência de sofrer violação ou coação à liberdade de ir, vir e permanecer.

Assim, resta evidente e demonstrada a relevância do Habeas Corpus para a garantia de um dos maiores direitos tutelados pelo Estado de Direito, a liberdade. Tendo em vista que uma das bases do Estado de Direito é a tutela pelos direitos individuais.

2 De acordo com os últimos dados publicado pelo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), em junho de 2019, a população prisional era de 752.277, dos quais 248.929 eram presos provisórios. Disponível em: . A situação fica ainda mais delicada ao analisarmos outros dados disponibilizados pelo CNJ, de acordo com o relatório de 2021, o tempo médio de tramitação dos processos criminais estaduais em primeiro grau são de 2 anos e 7 meses, além disso, os casos pendentes equivalem a 3,1 vezes a quantidade de processos baixados. Disponível em: .

3 Em 2008 foi criado pelo CNJ o “Mutirão Carcerário”, esse programa durou 2 anos e teve finalidade assegurar direitos e garantias dos detentos, só no Estado de São Paulo 400 foram liberados porque suas penas haviam sido extintas. O mutirão analisou 310 mil processos e concedeu liberdade para 24.884 pessoas. Disponível em:

A defesa combativa dos direitos individuais é um dos verdadeiros pilares do Estado de Direito, vez que são cruciais para a formação de uma sociedade democrática que respeita e preserva os direitos humanos. O contexto histórico que originou o habeas corpus também serviu para positivar direitos de igual ou superior importância.


2.2. O RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL, SUA APLICAÇÃO E FORMALIDADES À LUZ DO WRIT CONSTITUCIONAL.

O recurso ordinário constitucional é o recurso próprio contra a decisão que denegar a ordem de habeas corpus, se demonstrando como órgãos competentes ao seu julgamento o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça.

Derivada do artigo 102, II, alínea “a”, da Constituição Federal é a competência do STF para o julgamento do recurso ordinário. Vejamos que os remédios constitucionais podem ser de competência originária dos Tribunais Superiores em alguns casos, sendo cabível o recurso ordinário somente de suas decisões denegatórias. Compete ao STF julgá-lo quando a decisão for proferida em única instância pelo STJ, por se tratar de competência originária do STJ para julgar o writ. (BADÁRO, 2020)

Por outro lado, o STJ também possui competência para apreciar o recurso ordinário constitucional, nos termos do artigo 105, II, da Carta Magna. Neste caso, o recurso de habeas corpus perante o STJ também só deve ser interposto contra decisão denegatória do writ ou ainda daquela que determinar o não conhecimento, conforme entendimento jurisprudencial. Distintamente, a atuação do STJ se dará nos casos onde a decisão for proferida em única ou última instância pelos tribunais de justiça ou tribunais regionais federais. (LOPES JR., 2020)

Vejamos que no caso do STJ, o recurso ordinário pode ter como objeto um ato coator realizado por magistrado, enquanto no STF ele somente será interposto contra decisão do colegiado.

O recurso ordinário constitucional em habeas corpus trata-se de um recurso criminal sujeito às regras do Código de Processo Penal.

A Constituição Federal estabelece a impossibilidade de substituição do recurso ordinário constitucional por pedido originário de habeas corpus, sendo esta impossibilidade justificada pela distinção de ordem do ato coator, o que impede o reconhecimento do pedido originário.

Simplificando, após a decisão negativa do writ, o recurso ordinário deve ser interposto para o mesmo fim do habeas corpus, porém trata-se de um recurso próprio, de modo que a parte não poderá realizar o pleito através de novo habeas corpus dirigido ao órgão ad quem.

Insta salientar uma grande diferença entre o recurso ordinário e o habeas corpus, no campo da legitimidade. Enquanto o writ pode ser interposto por qualquer pessoa, independente de procuração ou qualquer ato mandatário, o recurso ordinário requer subscrição através de advogado. De acordo com Gustavo Badaró (2020, p. 1.002 e 1.003) a exigência de procuração é descabida, contudo exigem-se tal instrumento para tentar aliviar a sobrecarga sobre o serviço jurisdicional.

Somente há a dispensa de mandato, considerando a sua dispensa para o oferecimento do habeas corpus, conforme já decidido pelo STF no julgamento do HC nº 86.307-8. (LOPES JR., 2020)

Apesar de ser um recurso mais simples, dispensando o prequestionamento e a demonstração de repercussão geral, o mesmo deve se restringir à matéria ventilada no habeas corpus, e segue o procedimento do Código de Processo Penal.

Diversamente do habeas corpus, não detém efeito suspensivo e sua tramitação é mais lenta por tratar-se de um recurso, sendo extremamente prejudicial àquele que encontra-se privado de sua liberdade. Bem como se constitui em uma via ordinária de impugnação, de modo que seu efeito devolutivo é o mais amplo possível, permitindo que o tribunal conheça de toda a matéria de fato e direito impugnada, nos moldes do tantum devolutum quantum appellatum. (PACELLI, 2014)

Assim, apesar de ser um recurso mais demorado, permite a análise da situação fática, diferentemente do habeas corpus. Por outro lado, o recurso ordinário em habeas corpus possui prazo de 5 dias para sua interposição, enquanto o habeas corpus não possui prazo.

Um prazo tão diminuto em recurso de tamanha relevância se demonstra bastante perigoso, de modo que a perda do mesmo se constitui em um grande prejuízo ao paciente, acarretando na perda do direito de questionar a ilegalidade.

Por conseguinte, muitos advogados abandonaram o recurso ordinário e optam pela interposição de um novo habeas corpus, tanto perante o STJ quanto ao STF. Tal prática levou ao surgimento de grandes discussões a respeito desta temática, sendo adotado pelo STJ o entendimento de que o Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário não pode ser conhecido, uma filtragem jurisdicional alicerçada na grande quantidade de writs interpostos.

Há enorme divergência jurisprudencial sobre a sua admissão, no ano de 2012, a 1ª turma do STF julgou ser inadequada a impetração de habeas corpus substitutivo em recurso ordinário, o qual vinha sendo aceito sem restrições, nos autos do HC 109.956, 1ª turma, DJe 11.09.12. A decisão fora justificada na sobrecarga do colegiado, mas o entendimento antigo foi mantido pela 2ª turma que continuava aceitando o writ substituto.

Restou firmado o entendimento da Primeira Turma do STF, de que não seria admissível impetrar habeas corpus substitutivo ao recurso ordinário contra acórdão denegatório de idêntica ação constitucional. A lição foi exarada no julgamento do Habeas Corpus nº 109.956/PR, em seu voto, o relator Marco Aurélio defendeu que o writ é voltado a preservar o direito de ir e vir do cidadão.

Segundo o mesmo, a admissão dos writs substitutivos ocorria anteriormente pois não havia sobrecarga de processos, que na ocasião era percebida pelo Tribunal, o que inviabilizaria a jurisdição em tempo hábil. No entanto, tal comportamento implicou na sobrecarga de habeas corpus dirigidos ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça.

Em sua decisão, o relator destacou que no primeiro semestre de 2012, o STF recebeu 2.181 habeas e 108 recursos ordinários, enquanto o STJ recebeu 16.372 habeas e 1.475 recursos ordinários. Segundo ele, em pouquíssimos casos as impetrações não eram passíveis de serem enquadradas como originárias.

Estes números demonstram a discrepância entre a imposição de ROC e do writ substitutivo, clareando que a conduta defensiva vinha sendo adotar o habeas corpus substituto como o recurso adequado e efetivamente substituindo o originário.

Assim, não estando o habeas corpus substitutivo do recurso ordinário assegurado pela garantia constante do inciso LXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, não havendo sequer previsão legal, enfraqueceria o texto constitucional. Decidindo pela necessidade de barrar o uso do writ substituto destacando que esta conduta mitigou a importância do habeas corpus e emperrou a máquina judiciária, prejudicando a cidadania. (STF - HC: 115262 SP, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 22/10/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-227 DIVULG 18-11-2013 PUBLIC 19-11-2013)

No julgamento do habeas corpus nº 125.879/RS houve uma rica discussão entre os ministros julgadores, merece destaque o posicionamento do Ministro Marco Aurélio: “Propus que não se admitisse o habeas substitutivo do recurso ordinário constitucional. Essa óptica caiu no gosto de todos. Um mês depois, trouxe proposta de flexibilização, para admitir-se o habeas substitutivo quando em jogo, na via direta, por mandado expedido ou cumprido de prisão, a liberdade de ir e vir. Continuo sustentando essa tese, muito preocupado, não com os habeas que batem no Supremo, mas com os habeas que batem nos tribunais de justiça em geral.”

Na presente situação, o writ substituto foi negado, onde o Ministro Edson Fachin defendeu pelo acolhimento da preliminar suscitada pelo Ministério Público, sugerindo o não conhecimento da ordem substitutiva e que o caráter substitutivo permite o acolhimento da preliminar. Fora ainda estabelecido que a admissão do habeas corpus substituto ao recurso ordinário ofende o sistema recursal presente na Constituição Federal.

A tese defendida pelo Ministro Marco Aurélio foi ganhando força nos julgamentos dos habeas corpus e restou estabelecido pelos ministros, no julgamento do HC nº 110.055/MG, que não haveria obstrução para análise de ofício, nos casos onde houver o manejo inadequado do habeas corpus como substitutivo, ocorrendo flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia.

Neste momento, as cortes inferiores começaram a seguir o entendimento desta Turma, inadmitindo o habeas corpus substituto. O STJ comungando do entendimento, adotou a mesma medida, destacando a possibilidade de concessão da ordem de ofício na evidência de ilegalidade.

Ademais, de suma importância para a análise da aceitação do writ substituto é o entendimento exarado pelo Ministro Dias Toffoli no julgamento do já citado Habeas Corpus nº 109.956/PR, elucidando que desde o Código Processual Penal do Império, há previsão legal para que, quando um magistrado ou colegiado se depare com flagrante ilegalidade, a ordem deve ser concedida, ainda que de ofício, quando se tratar de constrição à liberdade de ir e vir do cidadão.

Novamente, o Ministro Marco Aurélio, no julgamento do Habeas Corpus nº 122.256/DF leciona que: “Em jogo a liberdade de ir e vir, cabível é o habeas corpus, ainda que substitutivo do recurso ordinário constitucional. Este, ao contrário do primeiro, fica submetido a prazo peremptório”. Neste caso, o ministro destaca a impossibilidade de alteração do prazo a que se submete o ROC, enquanto o Habeas Corpus não possui prazo para sua impetração, conforme a diferenciação já realizada no presente artigo. (STF - HC: 122256 DF - DISTRITO FEDERAL 9958715-74.2014.1.00.0000, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 29/05/2018, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-116 13-06-2018)

Vejamos que os julgados supramencionados apontam pela admissibilidade do writ nos casos de flagrante ilegalidade e constrangimento à liberdade de ir e vir do cidadão, de modo que o órgão julgador deve reconhecer a ordem de ofício. Nestes casos, o habeas corpus não será conhecido, por não se tratar da via correta, mas ante a ilegalidade praticada contra o paciente, deverá conceder a ordem de ofício, comungando com o entendimento do Ministro Dias Toffoli.

A Sexta Turma do STJ passou a adotar o mesmo entendimento, nesse sentido podemos citar AgRg no HC n. 585.926/SP, Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 4/8/2020; o AgRg no HC n. 532.601/SP de minha relatoria, Sexta Turma, DJe 10/2/2021; e o AgRg no HC n. 559.967/RO, Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 16/6/2021.

A partir de uma análise jurisprudencial minuciosa, chegamos à conclusão de que o STF vem admitindo o writ substituto desde meados de 2018, enquanto o STJ ainda apresenta uma enorme divergência entre suas turmas.

Esta mudança no entendimento do Supremo Tribunal ocorreu em um caso de grande notoriedade, onde o objeto da discussão era a execução provisória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No Habeas Corpus nº 152.752/PR, o ministro Dias Toffoli novamente destacou seu posicionamento alegando ser de praxe a concessão da ordem de ofício, vez que posteriormente o Tribunal receberia um ROC, após a inadmissão do writ. Ademais, o ministro Ricardo Lewandowski fez questão de defender a expansão do habeas corpus, defendendo que confere maior eficiência ao Poder Judiciário (HC 152.752/PR, rel. min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, DJe 27.06.18).

Ocorre que apesar do julgado supra, as turmas do STJ continuam se valendo de julgados pretéritos para não conhecer os habeas corpus substitutivos, tal posicionamento é utilizado pela 5ª Turma e descaradamente todas as decisões fazem referência ao entendimento do Supremo, o qual já foi devidamente superado.

O STF, portanto, pacificou seu entendimento a respeito da adequação do habeas corpus substitutivo de recurso ordinário no ano de 2018, porém o remédio constitucional impetrado desta forma ainda não é admitido pela 5ª Turma do STJ, ao passo que a 6ª turma e a 3ª seção do mesmo tribunal não proíbam o seu conhecimento.

Ou seja, o STF tem relativizado a restrição de oferecimento do habeas corpus substitutivo, admitindo o remédio constitucional em alguns casos. Este comportamento tem causado grande controvérsia e discussão entre os doutrinadores. (LOPES JR, 2020)

Os Ministros do STJ defendem ser o writ substitutivo uma forma de burlar o sistema, ante a existência de recurso próprio. O Ministro Rogério Schietti Cruz comunga do mesmo entendimento, ressalvando a possibilidade da flexibilização em casos de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia.

Deveras prejudicial ao coagido ter de esperar o julgamento do competente recurso para a restauração de seu status quo, demonstrando-se uma afronta aos maiores direitos constitucionais.

A flexibilização deve ser ainda mais analisada nos casos de réu preso, por constituir-se o habeas corpus como instrumento constitucional voltado a tutelar o direito à liberdade, demonstrando a necessidade de preferência em seu julgamento para findar o ato coator ilegal.

Evidente que nenhum prejuízo pode ser verificado nos casos de réu solto, por não haver esta necessidade de preferência, tão somente quando se tratar de decisão manifestamente ilegal ou abusiva. (PACELLI, 2014)


2.3. DA NECESSIDADE DE ADMISSÃO DO HABEAS CORPUS SUBSTITUTO E A DISPENSA DAS FORMALIDADES, OPTANDO PELA LIBERDADE E CELERIDADE PROCESSUAL.

A inadmissão do Habeas Corpus Substitutivo nada mais é do que um capricho por parte dos Tribunais Superiores, apesar da imposição de Recurso Ordinário estar alicerçada em um dispositivo constitucional. Conforme já narrado, além de possuir uma série de formalidades para o seu manejo, constituindo um grande prejuízo àqueles que necessitam de uma resposta imediata do Poder Judiciário.

Cumpre salientar que ao limitar a legitimidade para impetração do habeas corpus, não fora analisada a exigência do recurso ordinário, o qual somente pode ser manejado por advogado. Afronta a segurança jurídica limitar os meios de recorrer da decisão denegatória, ainda mais quando há tanta liberdade para o oferecimento do remédio heroico.

Por óbvio, o habeas corpus se constitui em um meio de maior abrangência para a defesa dos interesses do paciente/recorrente. Ainda mais quando ele já encontra sofrendo as consequências do ato coator, sendo o instrumento constitucional a única forma de garantir os direitos constitucionais do recorrente.

Assim é que, tendo em vista o excesso de formalismo ao Recurso Ordinário, o Habeas Corpus Substituto mostra-se como instrumento de extrema relevância, na medida em que essa ação constitucional se revela despida de maiores exigências. Ocorre que é comum que este procedimento seja rejeitado pelo Superior Tribunal de Justiça, todavia a situação é diferente no Superior Tribunal Federal, o qual aparenta estar flexibilizando a aplicação dessa modalidade. (LOPES JR, 2020)

Vale dizer ainda que na praxe forense é comum que os causídicos façam a interposição do Recurso Ordinário e, em razão das diversas vantagens, seja quanto aos efeitos seja quanto a informalidade, impetrem novo HC.

A impetração do writ assegura um dos maiores direitos humanos, a possibilidade de ir e vir, pertencente a própria natureza do ser humano. Não se trata tão somente do direito de ir e vir, mas sim da liberdade de locomoção, que não se restringe a tal, abrangendo também qualquer medida que afete-a indiretamente. (MENDES, 2019)

Em continuidade a análise deste direito de ampla importância, devemos mencionar a existência do princípio do devido processo legal, com o intuito de evitar qualquer conduta arbitrária por parte do Estado e conferindo segurança jurídica aos populares nos casos de terem privada a sua liberdade, se dando somente mediante ordem escrita e fundamentada.

Notável a importância conferida pelo nosso ordenamento à liberdade dos indivíduos, de modo que não se demonstra razoável impor limites aos meios recursais para discutir e impedir as limitações impostas a direitos de suma importância. A propositura deste remédio constitucional tem como fulcro questionar a legalidade, assim não pode ser suprimida.

Ainda mais quando analisado a quantidade de presos provisórios que geram a superlotação do sistema carcerário, que por muitas vezes são absolvidos após um longo período preso aguardando o seu julgamento. O Poder Judiciário é moroso, há grande carga processual e não permite a resolução das causas em prazo hábil e razoável.

O processo do recurso próprio enfrentaria um grande período de tempo, implicando na restrição do direito fundamental à liberdade. A gravidade desta restrição é aflorada quando pensamos nos réus que acabam sendo absolvidos após a instrução processual, sendo que permaneceram encarcerados durante todo o processo.

Nesta senda, imperioso frisar que não há nenhuma matéria de ordem pública com maior relevância do que a liberdade. Assim, um instrumento com o intuito de proteger e resguardar direito desta monta deve ter um tratamento diferenciado e especial, inexistindo limites.

Caso efetivamente esteja ocorrendo qualquer ilegalidade, por meio do writ esta será imediatamente sanada e restaurado o status quo do paciente. De modo contrário, não sendo atestada nenhuma irregularidade, a liberdade continuará sendo restringida, porém de modo seguro e fundamentado, tendo inclusive o crivo do colegiado.


3. CONCLUSÃO

O habeas corpus foi desenvolvido para proteger a liberdade de maneira rápida e eficaz, figurando como um instrumento autônomo e que somente deve evidenciar a ilegalidade da ameaça ou efetiva restrição à liberdade. Não há dúvidas de que se trata de um grande instrumento ao Estado Democrático de Direito.

São raras as hipóteses em que não se admite o remédio constitucional, demonstrando ainda mais a sua importância para o Direito e a sociedade.

A liberdade deve ser preservada e somente poderá ser tolhida mediante uma ordem judicial fundamentada, qualquer restrição ou ameaça precisa ser combatida. Ocorre que muitas vezes as decisões proferidas pelos Tribunais Estaduais acabam denegando a ordem, apesar de restar devidamente demonstrada a ilegalidade na decisão. Neste interim, é preciso se socorrer às cortes superiores, ocorre que o ordenamento impõe a necessidade de impetrar o Recurso Ordinário Constitucional.

Assim, o que anteriormente se tratava de um simples habeas corpus, instrumento ao qual é conferida grande celeridade e simplicidade, dispensando até mesmo a propositura por advogado, transforma-se em um recurso sujeito às regras do Código de Processo Penal e com processamento comum, se perdendo todas as vantagens do writ.

As particularidades do habeas corpus são justificáveis, vez que é o instrumento próprio e eficaz para assegurar o direito constitucional à liberdade. Ao passo que, ao substituir o writ pelo ROC o objeto do recurso é o mesmo, a liberdade do paciente. Não há nenhuma alteração no quantum discutido, os argumentos serão os mesmos e terá de ser evidenciado aos julgadores a coação ilegal que vem sofrendo o paciente.

Se foi conferido tanto poder e importância ao Habeas Corpus por visar preservar a liberdade dos indivíduos, tendo o ROC o mesmo objeto, não se demonstra crível a existência de formalidades e a sua inserção no rito comum. Apesar de estar tutelando o mesmo direito, a liberdade perde a importância, sendo inserido com todos os demais recursos a serem julgados pelos Tribunais.

Deste modo, partindo-se de uma análise prática, onde um paciente impetra a ordem de habeas corpus de próprio punho, vindo a obter uma decisão negativa, inexiste razões aptas a justificar o impedimento do mesmo exercício perante o órgão ad quem. Se há dispensa de inúmeras formalidades para o oferecimento do habeas corpus, não se mostra razoável impor uma série de restrições para recorrer da decisão denegatória.

Apesar de possuir a mesma finalidade, o ROC é um recurso próprio, não podendo ser interposto por qualquer pessoa, somente através de advogado. Merece destaque que é um recurso e possui tramitação vagarosa, prejudicando o paciente que se encontra privado de sua liberdade.

O fundamento utilizado para a não aceitação do habeas corpus substituto é a grande quantidade interposição, provocando uma sobrecarga dos órgãos superiores. Descabido incumbir àqueles que estão sendo coagidos e privados de grande direito a culpa pelo ato praticado pelo coator.

A inexistência de decisões arbitrárias e sem fundamento idôneo, desrespeitando direitos constitucionais e processuais por parte dos tribunais estaduais não é tratada e tampouco discutida. A estas é que deve ser atribuído a sobrecarga das cortes superiores, caso não houvesse a necessidade de combater o grande número de decisões desconexas e afrontosas à segurança jurídica, os órgãos superiores não estariam com tamanha carga de trabalho.

Impossibilitar que pessoas privadas de sua liberdade tenham seus casos apreciados pelas Cortes Superiores com a maior agilidade possível jamais poderá se fundamentar na sobrecarga do judiciário, ainda mais quando esta deve-se aos próprios julgadores de instância inferior. Nenhum direito pode ser colocado à frente da liberdade, muito menos a sobrecarga dos Colegiados Superiores.

Se por acaso os Habeas Corpus fossem apreciados de maneira correta e seguindo todos os entendimentos jurisprudenciais firmados pelos órgãos superiores, jamais haveria a necessidade de recorrer das decisões. Desta forma, impróprio privar os pacientes do writ substituto, tendo em vista que o mesmo somente é uma forma de conceder um julgamento mais célere e condizente com as diretrizes fixadas pelas cortes superiores.

Observamos que o argumento para se denegar o remédio constitucional substituto baseia-se tão somente na sobrecarga das cortes superiores e na previsão legal de recurso próprio. Incongruente dar tanta relevância à previsão de recurso próprio e esquecer que o writ substituto visa tutelar a liberdade, direito de extrema glória para a Legislação Pátria.

De qualquer forma, pela via adequada ou alternativa, haveria o acionamento da corte superior, sendo assim, que seja permitida a sua ocorrência pela via mais eficaz e benéfica ao paciente, possibilitando que seja apreciada a suposta coação de seu direito o mais breve possível.

Diante dos conceitos estudados, é possível entender a importância do writ e a mesma deve ser conferida ao substituto, por amparar o mesmo direito.

A partir da análise jurisprudencial verificou-se o conflito entre o STJ e o STF na sua aceitação, sendo necessário um consenso para que seja garantida a segurança jurídica. O correto e esperado seria a aceitação por parte da corte inferior do entendimento do STF.

Sob a perspectiva da importância do Habeas Corpus e a garantia da liberdade, é possível chegar à conclusão que a aceitação do writ substituto não implicaria em maiores esforços aos tribunais superiores, trazendo grandes benefícios aos pacientes privados de sua liberdade. Por outro lado, restou devidamente demonstrada a incongruência em exigir a interposição de um recurso próprio, disciplinado pelo Código de Processo Penal, para recorrer de uma decisão no âmbito de um habeas corpus, instrumento autônomo, e com o mesmo fito.

A grande diferença é que o recurso próprio detém maiores formalidades e exigências, postergando o processamento e sua mera existência jamais poderia obstar a impetração do remédio heroico.

Ante o exposto, imperiosa a estabilização jurisprudencial e o alinhamento das cortes superiores para admitir o Habeas Corpus Substituto à Recurso Ordinário, constituindo-se como a via mais célere e potente para recuperar o status libertatis.


4. REFERÊNCIAS

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AMARAL JUNIOR, José Levi Mello do. Estado de defesa e estado de sítio. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito, v. 10, p. 428-438, 2021. Disponível em: http://revistas.unisinos.br/index.php/RECHTD/article/view/rechtd.2020.123.07/60748253. Acesso em: 18 nov. 2001.

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BRASIL. Codigo do Processo Criminal, Rio de Janeiro, 1832. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-29-11-1832.htm >. Acesso em: 14 nov. 2021.

BUSANA, Dante. O habeas corpus no Brasil. São Paulo: Atlas, 2009.

GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no processo penal: teoria geral dos recursos, recursos em espécies, ações impugnativas, reclamações aos tribunais. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 18. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

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MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito constitucional. - 14 ed. Ver. Atual – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. – 36. ed. – São Paulo: Atlas, 2020.

MIRANDA, Pontes de (Francisco Cavalcante). História e Prática do Habeas Corpus, vol. 1 – 3ª ed. Campinas: Bookseller, 2007.

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PINTO, Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. Editora Saraiva, São Paulo. 1996, p. 202

SABINO JÚNIOR, Vicente. O habeas corpus e a liberdade pessoal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1964.

SMANIO, Gianpaolo Poggio. Direito processual penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 16. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2016.

TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Manual de Processo Penal. 8ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.

Zackseski, Cristina. O problema dos presos sem julgamento no Brasil. 2010

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