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O Abandono Afetivo e a Possibilidade de Responsabilização Civil


Autoria:

Adv. Fernanda Elisa De Borba


Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pela PUC/RS. Advogada inscrita na OAB/RS sob o nº 81.079. Cursando Especialização em Direito de Família e Sucessões na FMP/RS Membro do IBDFAM Membro da Com. de Práticas Sistêmicas do IBDFAM/RS

Telefone: 51 32320342


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Texto enviado ao JurisWay em 30/06/2019.



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Atualmente, pode ser observado em inúmeras doutrinas e jurisprudências que o vínculo familiar tem sido relacionado mais a vínculos afetivos do que vínculos biológicos, tanto é que já há reconhecimento de parentalidade socioafetiva, que não se sobrepõe à parentalidade biológica, mas iguala os efeitos jurídicos dessas relações. O afeto e o dever de cuidado são os principais fundamentos do Direito de Família, em especial nas relações parentais e estão diretamente relacionados à valorização da dignidade humana. Prova disso é o reconhecimento do direito ao afeto, conforme consta no Enunciado 08 do IBDFAM:

 

 “O abandono afetivo pode gerar direito à reparação pelo dano causado”.

 

O afeto não é uma imposição de amor, ele é somente uma de suas características, também está relacionado à convivência, à responsabilidade e ao cuidado.

 

“Na maioria dos casos, a filiação deriva-se da relação biológica; todavia ela emerge da construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na responsabilidade (...) o afeto não é fruto da biologia. Os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não do sangue.” (LÔBO, Paulo. Princípio jurídico..., cit.)[1]

 

O dever de assistência e convivência passou a ser visto como um direito dos filhos. É essencial que lhes seja oportunizado um desenvolvimento sadio, com a convivência com ambos os pais para o completo desenvolvimento dos filhos, e havendo a omissão de um deles ensejaria a possibilidade de reparação por dano moral. A responsabilidade civil por abandono afetivo, para os doutrinadores e magistrados que vão ao encontro desse entendimento, produziria também um efeito pedagógico em quem opta pelo abandono.

Como exemplo da relevância da afetividade, pode ser citada a decisão do magistrado Mario Romano Maggioni, nos autos de uma Ação Indenizatória n. 141/1030012032-0, na 2ª Vara da Comarca de Capão da Canoa, no Rio Grande do Sul, em que consignou que “a educação abrange não somente a escolaridade, mas também a convivência familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao parque, jugar futebol, brincar, passear, visitar, estabelecer paradigmas, criar condições para que a criança se auto afirme (...) a ausência, o descaso e a rejeição do pai em relação ao filho recém-nascido ou em desenvolvimento violam sua honra e a sua imagem”[2]. Na decisão também mencionou que não basta ser pai biológico ou prestar alimentos ao filho, que o sustento seria apenas um das parcelas da paternidade, pois é preciso ser pai na amplitude legal, que abrange sustento, guarda e educação*, afinal, quando ocorre a concepção, seja ou não planejada, são geradas uma série de responsabilidades aos genitores, que os impõem um agir consciente da importância dos seus papeis na formação biopsíquica dos filhos.

Nos Arts. 3º, 4º e 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente consta expressamente o dever da família de assegurar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social do filho, em condições de dignidade, o que abrange a importância da convivência familiar para a criança e o adolescente e a possibilidade de punição quando houver omissão quanto à preservação dos seus direito de personalidade. Não é feita nenhuma referência direta tanto no ECA como na Constituição Federal sobre assistência afetiva, porém ao considerar o princípio da dignidade humana e interpretar  as garantias anteriormente mencionadas do Estatuto, está implícita a sua imprescindibilidade e as consequências irreparáveis que a ausência propositada do exercício paternal ou maternal podem causar, com repercussões psíquicas sérias. 

Havendo condenação numa Ação de Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo é essencial que seja avaliada a extensão do dano causada ao abandonado para mensurar a verba indenizatória, devendo ser consideradas as despesas necessárias para tratamentos médicos e psicológicos por profissional especializado visando amenizar os traumas decorrentes do abandono, que muitas vezes persistem na vida adulta quando não tratados. Vale lembrar que pelo abandono afetivo estar relacionado a um dano moral, a questão probatória não é análoga ao dano material, nesses casos o dano moral é in re ipsa, deriva da própria situação, conforme pode ser verificado na doutrina de Cavalieri Filho[3], e em relação aos critérios indenizatórios, ficará a cargo do julgador analisar cada caso concreto, criteriosamente, para aplicação da melhor forma de reparação dos danos.

Apesar de já haver esse reconhecimento de possibilidade de pleitear reparação por danos em razão do abandono afetivo, há dicotomia acerca do tema entre as correntes doutrinárias. Há juristas que acreditam que em contrapartida à finalidade precípua da Ação Indenizatória por Abandono Afetivo, os seus efeitos poderiam causar consequências contrárias à pretensão do filho abandonado, haja vista que o deferimento de uma ação dessas não tem como objetivo reparação financeira, que em alguns casos já é alcançada pela pensão alimentícia, e sim de impor uma relação afetiva, do Judiciário obrigar uma aproximação, e que, dependendo das circunstâncias, poderia ter consequências ainda mais negativas do que o próprio abandono, por ser uma medida a ser cumprida forçadamente e, às vezes, contrariamente. Exemplificativamente, Ma. Aracy Menezes da Costa afirma que “pagar pela falta de amor não faz surgir o amor, e tampouco o restabelece; pagar por falta de companhia não tem o dom de substituir o prazer de conviver”[4].

É inegável que a responsabilidade civil pelo descumprimento do direito à afetividade jamais irá suprir a falta do afeto, do cuidado, porém foi a forma que o Judiciário encontrou para reparar, na medida do possível, algo que não pode ser imposto (afeto), pois essa é uma questão muito mais complexa, conforme entendimento de João Ricardo Brandão Aguirre[5], que alerta para a necessidade de adequação dos fundamentos da responsabilidade civil à realidade pós-moderna, com vistas a promover assistência às vítimas de danos, já que o desenvolvimento das relações humanas deve estar embasado num ideal de excelência e respeito à individualidade, pela consideração recíproca e por princípios de equidade, para proporcionar a obtenção do bem-estar social e da plenitude de vida.



[1] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/527/principio-juridico-da-afetividade-na-filiacao. Acesso em 30 jun. 2019

[2] Referência citada na obra de ROSA, Conrado Paulino da. Curso de direito de família contemporâneo. 5. Ed. Salvador: JusPodivm, 2019, p. 438.

[3] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. Ed. São Paulo: Atlas, 2010, p.90.

[4] COSTA, Maria Aracy Menezes da. Responsabilidade civil no direito de família. ADV- Advocacia Dinâmica- Seleções Jurídicas, n. 2, fev. 2005, p. 157.

[5] AGUIRRE, João Ricardo Brandão. A responsabilidade dos profissionais  no âmbito do direito de família. In: ROSA, Conrado Paulino da; THOMÉ, Liane Maria Busnello. O papel de cada um nos conflitos familiares e sucessórios. Porto Alegre: IBDFAM-RS, 2014, p. 211.

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