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Comissão Parlamentar de Inquérito e Câmara Municipal


Autoria:

Rosicler Saporski


Advogada, Consultora Jurídica da União das Câmaras Municipais do Estado de Mato Grosso - UCMMAT, Assessora Parlamentar na Assembléia Legislativa de MT, pós graduada em Direito Constitucional, Administradora de Empresas

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Resumo:

As Comissões Parlamentares de Inquérito defluem da tríplice função que a Constituição da República Federativa de 1988 delegou ao Poder Legislativo, a saber, as funções legislativa, representativa e fiscalizadora das instâncias governamentais de poder

Texto enviado ao JurisWay em 01/05/2009.



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COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO E CÂMARA MUNICIPAL

 

Intróito

 

As Comissões Parlamentares de Inquérito defluem da tríplice função que a Constituição da República Federativa de 1988 delegou ao Poder Legislativo, a saber, as funções legislativa, representativa e fiscalizadora das instâncias governamentais de poder. Propõem-se a apurar fatos que influem direta ou indiretamente na Administração Pública, com ênfase naqueles de natureza pecuniária, que envolvem interesses da população como um todo.

É investigação transitória levada a cabo por membros do Poder Legislativo, a fim de examinar, em prazo predeterminado, minuciosamente fato(s) determinado(s), e especial porque seus atos são praticados por agentes políticos, integrantes do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais ou Vereadores).

 

 

1. Fundamento legal da constituição da CPI

A previsão das Comissões Parlamentares de Inquérito está regulamentada no § 3º, do Art. 58, da Constituição da República Federativa do Brasil, verbis:

Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.

...

§ 3º As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

...

 

 

A Constituição do estado de Mato Grosso em seu Art. 36, § 3º aduz:

Art. 36. A Assembléia Legislativa terá comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no Regimento Interno ou no ato de que resulta sua criação.

...

§ 3º As Comissões Parlamentares de Inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos no Regimento Interno da Casa, serão criadas a requerimento de um terço dos membros da Assembléia Legislativa, para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

...

 

No plano municipal a Comissão de Inquérito é criada na forma da Lei Orgânica, tendo como parâmetros as disposições fundamentais da Constituição da República, mediante requerimento de um terço dos membros da Câmara Municipal, independentemente de deliberação do Plenário, podendo, todavia, quando não tenha ocorrido requerimento de sua criação, ser instituída por deliberação do Plenário.

Na criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, em cumprimento das disposições legais, devem ser atendidos três pressupostos básicos:

1. Pressuposto formal

1.1. requerimento de 1/3 no mínimo dos membros da Casa Legislativa;

2. Pressuposto substancial

2.1 apuração de fato determinado;

3. Pressuposto temporal

3.1 prazo certo.

O número mínimo de vereadores que deve subscrever o requerimento, como pressuposto formal, é de 1/3 dos membros da Câmara Municipal, todavia, um único vereador pode requerer à Mesa da Câmara a instituição de uma Comissão de Inquérito, devendo o seu requerimento ser submetido ao Plenário da Câmara, que tem poderes para decidir sobre seu acatamento.

O requerimento ou a decisão do Plenário deve indicar um fato determinado a ser investigado, não podendo ser genérico. Não sendo o fato determinado o Presidente pode indeferir a constituição da Comissão, devolvendo o requerimento ao primeiro signatário.

Tendo em vista que se trata de comissão temporária, não permanente, a CPI tem prazo certo para atuação, e devem os seus trabalhos, ser encerrados ao fim da sessão legislativa, (que equivale a um ano de atividade parlamentar), podendo ser prorrogado, desde que com a aprovação da respectiva Casa Legislativa, pelo tempo que for necessário à conclusão de suas atividades.

A Lei n. 1.579 de 18/09/52, dispõe acerca do assunto no § 2º do seu art. 5º:

A incumbência da Comissão Parlamentar de Inquérito termina com a sessão legislativa em que tiver sido outorgada, salvo deliberação da respectiva Câmara, prorrogando-a dentro da legislação em curso.

 

2. Funcionamento da CPI

Sendo o requerimento firmado por, no mínimo, 1/3 dos membros da Casa Legislativa, o Presidente, verificando que o objeto é determinado, independentemente de pronunciamento do Plenário, no prazo de quarenta e oito horas publicará obrigatoriamente:

a) resolução de sua constituição, especificando o fato a ser investigado;

b) os Vereadores que a constituirão, observada a composição partidária;

c) o prazo de sua duração, que não deverá ser superior a noventa dias, prorrogáveis, a juízo do Plenário.

Os membros da Comissão são designados pelo Presidente, por indicação expressa e proporcional dos partidos com representação na Casa. Não havendo providências por parte do Presidente, proceder-se-á como definido no Regimento Interno, restando, ainda, aos requerentes o apelo ao Poder Judiciário.

Em razão da responsabilidade da Comissão convém que os seus integrantes sejam escolhidos entre vereadores, tanto quanto possível, conhecedores do assunto a ser tratado, não devendo ser dispensado assessoramento jurídico.

Conclui-se o trabalho da CPI por projeto de resolução e, havendo fatos diversos, a comissão falará, em apartado, acerca de cada um, de acordo com a Lei 1.579/52:

Art. 5º. As Comissões Parlamentares de Inquérito apresentarão relatório de seus trabalhos à respectiva Câmara, concluindo por projeto de resolução.

§ 1º. Se forem diversos os fatos objeto de inquérito, a comissão dirá, em separado, sobre cada um, podendo fazê-lo antes mesmo de finda a investigação dos demais.

 

3. Poderes de atuação da CPI

É importante assinalar que a Constituição da República define serem invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Também são invioláveis o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, das comunicações telefônicas, salvo ordem judicial motivada.

Como dispuser o Regimento Interno da Câmara, a Comissão Legislativa do Inquérito poderá requisitar técnicos especializados para realizar as perícias indispensáveis ao completo esclarecimento do assunto.

No exercício de suas atribuições a Comissão poderá, dentro e fora da Câmara, observada a legislação específica, diligenciar, ouvir indiciados, inquirir testemunhas, requisitar informações e documentos, requerer a convocação de Secretários Municipais e tomar depoimento de quaisquer autoridades.

Para a quebra do sigilo bancário ou telefônico, quando necessários à apuração dos fatos, deve a Comissão, por meio de requerimento fundamentado, solicitar essa providência ao Poder Judiciário. Ato da Comissão que venha ferir direitos constitucionais enseja ao interessado o direito à impetração de mandado de segurança ao Poder Judiciário.

A Comissão deverá atuar em obediência às normas definidas na legislação específica, conforme o caso a apurar, podendo indiciar testemunhas e intimá-las de acordo com as prescrições estabelecidas na legislação penal. É o que diz a Lei 1.579/52, em seu art. 6º - O processo e a instrução dos inquéritos obedecerão ao que prescreve esta Lei, no que lhes for aplicável, às normas do processo penal.

Os indiciados, assim também as testemunhas, poderão fazer-se acompanhar de advogados, que terão livre acesso aos autos nas dependências da Câmara Municipal, sendo-lhes permitido, para formalização da defesa ou justificação, obter cópia integral dos autos da acusação.

A pessoa arrolada como testemunha está obrigada a comparecer a Juízo no local e nas horas designados para o depoimento, em qualquer ação penal. Salvo as hipóteses previstas em lei (arts. 207, 220, 221, 252, II, 258 e 564, I, do CPP), se a testemunha regularmente notificada deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial sua apresentação, ou determinar seja ela conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar auxílio da força pública.

Disso decorre que a testemunha regularmente intimada tem o dever legal de comparecer à sessão realizada pela Comissão Parlamentar de Inquérito e responder aos questionamentos que lhe forem dirigidos, ressalvadas as exceções legais. Caso não compareça espontaneamente, poderá ser determinada sua apresentação mediante condução coercitiva.

É de ser observado que, mesmo não pertencendo à Comissão, qualquer Vereador poderá comparecer às reuniões, mas sem participação nos debates e, desejando esclarecimento de qualquer parte, requererá ao Presidente da Comissão sobre o que pretende seja inquirida a testemunha ou o indiciado, apresentando, se entender conveniente, quesitos.

 

4. O Decreto-lei 201, a CPI e a cassação de mandato de Prefeito

Incumbe a qualquer Vereador a deflagração do processo de cassação de mandato do Prefeito, por cometimento de infração político-administrativa, nos termos dos arts. 4º e seguintes do Decreto-Lei nº 201/67.

Estabelece o art. 5º do Dec.-lei 201/67 o processo de cassação do mandato do Prefeito, pela Câmara, por infrações político-administrativas. E o § 1º do art. 7º dispõe que o processo de cassação de mandato de Vereador será o mesmo do art. 5º, no que couber.

As infrações político-administrativas cometidas pelos Prefeitos e sujeitas a julgamento pelas Câmaras Municipais, acham-se listadas nos dez incisos do art. 4º do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, que define os crimes funcionais, regula o respectivo processo criminal e comina as penas de igual natureza, e ao mesmo passo, trata das infrações político-administrativas, estabelece sanção de natureza política e disciplina o adequado processo político-disciplinar.

Cabe assinalar, nesse ponto, em face de sua relevância, que a apreciação técnico-jurídica da conduta de um Prefeito à luz do art. 4º do Decreto-Lei nº 201/67 resta sobremaneira dificultada pela circunstância de a Câmara Municipal proferir, em verdade, um julgamento de caráter altamente político; aliás, não por acaso tais infrações são chamadas de político-administrativas.

Destarte, a constatação técnico-jurídica da existência da infração político-administrativa possui valor relativo, na medida em que o julgamento referido nos arts. 4º e ss. do DL 201/67 é de caráter eminentemente político, portanto, deve a Comissão se cercar de todos os cuidados para não sofrer intervenção judicial.

Em eventual diversidade de tratamento entre as normas municipais (Lei Orgânica e Regimento Interno) e dispositivos do Decreto-lei 201/67, se sugere que, a fim de evitar prejuízo à defesa, sejam utilizadas as normas mais benéficas no que for cabível e compatível.

O rito a ser observado no processo de cassação do mandato de prefeito, o qual abrange desde a denúncia até o final da cassação, está delineado no artigo 5º do Decreto-lei 201/67, in verbis:

Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:

I - A denúncia escrita da infração poderá ser feita por qualquer eleitor, com a exposição dos fatos e a indicação das provas. Se o denunciante for Vereador, ficará impedido de voltar sobre a denúncia e de integrar a Comissão processante, podendo, todavia, praticar todos os atos de acusação. Se o denunciante for o Presidente da Câmara, passará a Presidência ao substituto legal, para os atos do processo, e só votará se necessário para completar o quorum de julgamento. Será convocado o suplente do Vereador impedido de votar, o qual não poderá integrar a Comissão processante.

II - De posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara sobre o seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.

III - Recebendo o processo, o Presidente da Comissão iniciará os trabalhos, dentro em cinco dias, notificando o denunciado, com a remessa de cópia da denúncia e documentos que a instruírem, para que, no prazo de dez dias, apresente defesa prévia, por escrito, indique as provas que pretender produzir e arrole testemunhas, até o máximo de dez. Se estiver ausente do Município, a notificação far-se-á por edital, publicado duas vezes, no órgão oficial, com intervalo de três dias, pelo menos, contado o prazo da primeira publicação. Decorrido o prazo de defesa, a Comissão processante emitirá parecer dentro em cinco dias, opinando pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia, o qual, neste caso, será submetido ao Plenário. Se a Comissão opinar pelo prosseguimento, o Presidente designará desde logo, o início da instrução, e determinará os atos, diligências e audiências que se fizerem necessários, para o depoimento do denunciado e inquirição das testemunhas.

IV - O denunciado deverá ser intimado de todos os atos do processo, pessoalmente, ou na pessoa de seu procurador, com a antecedência, pelo menos, de vinte e quatro horas, sendo lhe permitido assistir as diligências e audiências, bem como formular perguntas e reperguntas às testemunhas e requerer o que for de interesse da defesa.

V - Concluída a instrução, será aberta vista do processo ao denunciado, para razões escritas, no prazo de cinco dias, e após, a Comissão processante emitirá parecer final, pela procedência ou improcedência da acusação, e solicitará ao Presidente da Câmara, a convocação de sessão para julgamento. Na sessão de julgamento, o processo será lido, integralmente, e, a seguir, os Vereadores que o desejarem poderão manifestar-se verbalmente, pelo tempo máximo de quinze minutos cada um, e, ao final, o denunciado, ou seu procurador, terá o prazo máximo de duas horas, para produzir sua defesa oral.

VI - Concluída a defesa, proceder-se-á a tantas votações nominais, quantas forem as infrações articuladas na denúncia. Considerar-se-á afastado, definitivamente, do cargo, o denunciado que for declarado pelo voto de dois terços, pelo menos, dos membros da Câmara, em curso de qualquer das infrações especificadas na denúncia. Concluído o julgamento, o Presidente da Câmara proclamará imediatamente o resultado e fará lavrar ata que consigne a votação nominal sobre cada infração, e, se houver condenação, expedirá o competente decreto legislativo de cassação do mandato de Prefeito. Se o resultado da votação for absolutório, o Presidente determinará o arquivamento do processo. Em qualquer dos casos, o Presidente da Câmara comunicará à Justiça Eleitoral o resultado.

VII - O processo, a que se refere este artigo, deverá estar concluído dentro em noventa dias, contados da data em que se efetivar a notificação do acusado. Transcorrido o prazo sem o julgamento, o processo será arquivado, sem prejuízo de nova denúncia ainda que sobre os mesmos fatos.

 

4.1 Vereador denunciante

Em regra, o Vereador denunciante fica impedido de votar sobre a denúncia quando a Câmara deliberar sobre o seu recebimento ou não. Também está vedada a participação do denunciante na composição da Comissão processante, podendo, entretanto, praticar todos os atos de acusação.

Sendo o Presidente o denunciante, passará a presidência ao substituto legal, para os atos do processo, e só votará se necessário para completar o quorum de julgamento.

O suplente do Vereador impedido de votar deve ser convocado, sem, no entanto, integrar a Comissão processante pelo fato de que o mandato do suplente, a princípio, tem duração limitada no tempo.

A denúncia deve trazer com clareza e em grupos distintos os fatos atinentes a diferentes infrações, indicando, para cada uma delas as provas que o denunciante pretende produzir, haja vista que nos termos do inc. VI, deve haver tantas votações nominais quantas forem as infrações articuladas na denúncia.[1]

O Regimento Interno da Assembléia Legislativa de Mato Grosso, em seu art. 378, aduz que a presidência da CPI caberá ao Deputado signatário do requerimento ou da proposição, incumbindo-se a Mesa Diretora do atendimento preferencial das providências solicitadas.

 

4.2 A instrução do processo

A partir da constituição da comissão inicia-se a instrução processual propriamente dita.

De conformidade com o Decreto-lei 201 o Presidente da Comissão deve iniciar os trabalhos em cinco dias, obedecendo às seguintes instruções:

1) Notificar o denunciado, preferencialmente de modo pessoal (ou por edital, com ampla divulgação, se preciso), encaminhando-lhe cópia da denúncia;

A notificação deve ser sempre pessoal, mas se for impossível proceder deste modo, será a notificação feita por edital, publicado duas vezes, no órgão oficial do Município, com intervalo de três dias.

Pode-se exigir que o denunciado assine o comprovante do seu recebimento; em caso de recusa, o funcionário encarregado pela notificação deverá fornecer, por escrito, informações detalhadas sobre a atitude do notificando, dia, hora, local e condições em que a notificação lhe tenha sido entregue.

2) Dar o direito ao acusado de defesa prévia, que deverá ser apresentada em dez dias, no mínimo;

3) Emitir parecer em cinco dias, opinando pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia. (O processo só será arquivado se a Câmara, por maioria de dois terços, aprovar o arquivamento);

4) Caso a Comissão tenha opinado pelo prosseguimento do processo ou caso o Plenário não aprove o parecer de arquivamento, deve-se dar início à instrução do processo com diligências, audiências, depoimentos - sempre oferecendo ampla defesa ao acusado;

5) Informar o acusado de todos os atos processuais, facultando-lhe constituir advogado e assistir aos atos processuais, inclusive permitindo-lhe formular perguntas.

            Tito Costa, com toda sua maestria, entende possível, sem comprometimento do roteiro legal do processo, que a comissão processante, para evitar falhas que podem ensejar a anulação do processo todo, antes de notificar o denunciado para ofertar sua defesa, promova uma espécie de “saneamento” em relação à denúncia.

            No saneador proceder-se-ia um julgamento preliminar sobre todas as questões formais e procedimentares, exceto o mérito do caso.

 

5. Assistência de advogado a indiciados e testemunhas

A Constituição da República de 1988, em seu art. 133, estabelece que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Além disso, as prerrogativas dos advogados estão explicitamente asseguradas na Lei Federal nº 8.906, de 4/7/94, mais precisamente nos incisos I a XX do art. 7º, o que já garante aos indiciados e testemunhas o direito de serem assistidos por esses profissionais do Direito.

A esse respeito, cabe mencionar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal ao apreciar Pedido de Reconsideração no Mandado de Segurança nº 23.576-DF, publicado no DJU de 3/2/2000, no qual atuou como relator o Ministro Celso de Mello:

O ordenamento positivo brasileiro garante ao cidadão, qualquer que seja a instância de Poder que o tenha convocado, o direito de fazer-se assistir, tecnicamente, por Advogado, a quem incumbe, com apoio no Estatuto da Advocacia, comparecer às reuniões da CPI, nelas podendo, dentre outras prerrogativas de ordem profissional, comunicar-se, pessoal e diretamente, com o seu cliente, para adverti-lo de que tem o direito de permanecer em silêncio (direito este fundado no privilégio constitucional contra a auto-incriminação), sendo-lhe lícito, ainda, reclamar, verbalmente ou por escrito, contra a inobservância de preceitos constitucionais, legais ou regimentais, notadamente quando o comportamento arbitrário do órgão de investigação parlamentar lesar as garantias básicas daquele - indiciado ou testemunha - que constituiu esse profissional do Direito.

 

Assim, desde que o advogado do convocado não perturbe os trabalhos da Comissão de Inquérito, inexiste fundamento para impedir a assistência técnico-jurídica ao indiciado ou à testemunha, uma vez que a presença do profissional do Direito tem o escopo de evitar abusos de autoridade ou comportamentos incompatíveis com o ordenamento jurídico vigente.

 

Das testemunhas

É importante ressaltar que a testemunha regularmente intimada tem o dever legal de comparecer à sessão realizada pela Comissão Parlamentar de Inquérito e responder aos questionamentos que lhe forem dirigidos, ressalvadas as exceções legais. Caso não compareça espontaneamente, poderá ser determinada sua apresentação mediante condução coercitiva.

O compromisso de dizer a verdade é medida preliminar do testemunho. A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado, declarando seu nome, idade, estado civil, residência, lugar onde exerce sua atividade, bem como se tem relação de parentesco ou de amizade com eventual indiciado.

            Na realidade, ninguém pode ser constrangido a confessar a prática de um ilícito penal, como bem informado pelo STF, verbis:

Não configura o crime de falso testemunho, quando a pessoa, depondo como testemunha, ainda que compromissada, deixa de revelar fatos que possam incriminá-la" (RTJ 163/626, Rel. Min. CARLOS VELLOSO). Com o explícito reconhecimento dessa prerrogativa, constitucionalizou-se, em nosso sistema jurídico, uma das mais expressivas conseqüências derivadas da cláusula do due process of law. Qualquer pessoa que sofra investigações penais, policiais ou parlamentares, ostentando, ou não, a condição formal de indiciado, possui, dentre as várias prerrogativas que lhe são constitucionalmente asseguradas, o direito de permanecer em silêncio, consoante reconhece a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 141/512, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

 

Esse direito, na realidade, obriga o Estado, quaisquer de seus Poderes e seus respectivos agentes. É o que se depreende da jurisprudência:

No sistema jurídico brasileiro, não existe qualquer possibilidade de o Poder Público (uma Comissão Parlamentar de Inquérito, p. ex.), por simples presunção ou com fundamento em meras suspeitas, reconhecer, sem prévia decisão judicial condenatória irrecorrível, a culpa de alguém. Na realidade, os princípios democráticos que informam o modelo constitucional consagrado na Carta Política de 1988 repelem qualquer comportamento estatal que transgrida o dogma de que não haverá culpa penal por presunção e nem responsabilidade criminal por mera suspeita (RT 690/390 - RT 698/452-454). É por essa razão que "Não podem repercutir contra o réu situações jurídico-processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível do Poder Judiciário, especialmente naquelas hipóteses de inexistência de título penal condenatório definitivamente constituído" (RTJ 139/885, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Cabe ter presente, bem por isso, o próprio magistério jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, que, ao dar sentido e conseqüência ao postulado da não-culpabilidade, deixou assentadas, nesse tema, diretrizes que se revestem de um inequívoco significado político-jurídico concernente à preservação do regime constitucional das liberdades públicas, em nosso ordenamento positivo. Com efeito, esta Suprema Corte já se pronunciou sobre a questão do necessário respeito estatal aos direitos de qualquer pessoa contra quem é instaurado procedimento de caráter investigatório (cuide-se de investigação policial ou trate-se de inquérito parlamentar), firmando entendimento que não permite reconhecer, fora das hipóteses previstas na Constituição, a validade de medidas que possam gerar restrições jurídicas à esfera de autonomia individual do indiciado, ou, excepcionalmente, da própria testemunha. Nesse sentido, cabe ter presente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, na qual esta Corte deixou assentada diretriz da mais alta significação na exegese do princípio constitucional de que ninguém pode ser considerado culpado antes que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível: "Nenhuma acusação penal se presume provada. Não compete ao réu demonstrar a sua inocência. Cabe ao Ministério Público comprovar, de forma inequívoca, a culpabilidade do acusado. Já não mais prevalece, em nosso sistema de direito positivo, a regra, que, em dado momento histórico do processo político brasileiro (Estado Novo), criou, para o réu, com a falta de pudor que caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o acusado provar a sua própria inocência (Decreto-Lei nº 88, de 20/12/37, art. 20, n. 5)." (RTJ 161/264-266, Rel. Min. CELSO DE MELLO) A natureza essencialmente democrática do regime político sob o qual vivemos confere sentido de permanente atualidade à lapidar decisão proferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em acórdão da lavra do saudoso Des. Vicente de Azevedo, proclamou, sob a égide da Constituição de 1946, que, "Por exclusão, suspeita ou presunção, ninguém pode ser condenado em nosso sistema jurídico-penal" (RT 165/596), e nem privado ou afetado em seus direitos, quando estes encontram pleno fundamento no ordenamento positivo. (...) Em suma: cabe ter presente, no exame da matéria ora em análise, a jurisprudência constitucional que tem prevalecido, sem maiores disceptações, no âmbito do Supremo Tribunal Federal: "O privilégio contra a auto-incriminação - que é plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito - traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa que deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário. - O exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental. Precedentes. - Ninguém pode ser tratado como culpado, independentemente da natureza do ilícito penal que lhe possa ser atribuído, sem que exista decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade consagra, em nosso sistema jurídico, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário. Precedentes." (HC 79.812-SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)

 

           

6. Publicidade dos atos da CPI

Os atos da CPI em regra são públicos, entretanto, o artigo 5º, LX da Constituição da República oferece uma exceção: a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais, quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.

 

7. Conclusão dos trabalhos da CPI

            Dentro do prazo preestabelecido a CPI concluirá seus trabalhos.

Findo o julgamento, o Presidente da Câmara proclamará imediatamente o resultado e fará lavrar ata que consigne a votação nominal sobre cada infração, e, se houver condenação, expedirá o competente decreto legislativo de cassação do mandato de Prefeito. Se o resultado da votação for absolutório, o Presidente determinará o arquivamento do processo. Em qualquer dos casos, o Presidente da Câmara comunicará à Justiça Eleitoral o resultado.

Colha-se, neste ponto, jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, verbis:

A Constituição Federal, no § 3º do seu artigo 58, dispõe que as conclusões da CPI, ‘se for o caso’, serão encaminhadas ao Ministério Público para que promova a responsabilidade civil e criminal dos infratores. Ora, somente a comissão poderá decidir se se verifica, ou não, a hipótese do referido encaminhamento das conclusões, o que não implica, necessariamente, que sejam elas acompanhadas dos documentos sigilosos." (MS 23.970-MC, Rel. Min. Maurício Corrêa, decisão monocrática, julgamento em 29-5-01, DJ de 5-6-01)

 

8. Crimes contra a CPI Municipal

A Lei 1.579, de 18 de março de 1952 ao tratar dos crimes que podem ser cometidos contra a CPI, disciplina:

Art. 4º. Constitui crime:

I - Impedir, ou tentar impedir, mediante violência, ameaça ou assuadas, o regular funcionamento de Comissão Parlamentar de Inquérito, ou o livre exercício das atribuições de qualquer dos seus membros.

Pena - A do art. 329 do Código Penal.

II - fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, tradutor ou intérprete, perante a Comissão Parlamentar de Inquérito:

Pena - A do art. 342 do Código Penal

 

8. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

Quebra do sigilo bancário

Possibilidade de quebra do sigilo bancário por requisição do MP quando tratar-se de envolvimento de dinheiro ou verbas públicas.  A maioria dos Ministros do STF reconheceu a possibilidade de o MP requisitar diretamente as informações revestidas de sigilo bancário às instituições financeiras quando se tratar de envolvimento de dinheiro ou verbas públicas, com base no poder de requisição e na publicidade dos atos governamentais. (MS - 21.729-4-DF. Rel Min. Francisco Rezek).

 

Prerrogativa de solicitar informações aos órgãos da administração direta e indireta, situados no município

Constitucionalidade do art. 12 da Constituição gaúcha, que assegura às câmaras municipais, no exercício de suas funções legislativas e fiscalizadoras, a prerrogativa de solicitarem informações aos órgãos da administração direta e indireta, situados no respectivo município. (ADI 1.001, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 8-8-02, DJ de 21-2-03)

 

CPI compelir estranhos a sua órbita de indagação

Comissão parlamentar de inquérito instaurada pela Câmara Municipal. Não se lhe aplica o disposto no artigo 3º da Lei n. 1.579/52 e artigo 218 do Código de Processo Penal, para compelir estranhos a sua órbita de indagação. (RE 96.049, Rel. Min. Oscar Corrêa, julgamento em 30-6-83, DJ de 19-8-83)

 

Crime de desobediência

Têm-se que o tipo do crime de desobediência é formado pelo núcleo “desobedecer" e pelos elementos "ordem legal" e "funcionário público". Desobedecer significa não acatar, desatender, não cumprir ordem legal de funcionário público, situação ausente na hipótese ora examinada. A segunda decisão prolatada monocraticamente pelo Relator afirmou a legalidade da convocação, nos termos em que esta se deu, por ter justificativa diversa da primeira, e assim, firmou-se no sentido de que o paciente deveria comparecer a esta segunda convocação. Isto posto, não havia nada que desobrigasse o paciente a comparecer ao depoimento marcado, tampouco a convocação descumpriu ordem do Supremo Tribunal Federal. Assim, não vislumbrando a prática de ilícito penal pelos parlamentares Representados, manifesto-me pelo arquivamento dos autos. A manifestação do titular da ação penal é irrecusável. (Pet 3.550, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, julgamento 25- 4-06, DJ 3-5-06)

 

Direito ao silêncio

O entendimento pacificado nesta Corte está alinhado no sentido de que ‘as Comissões Parlamentares de Inquérito detêm poder instrutório das autoridades judiciais - e não mais que o destas. Logo, às Comissões Parlamentares de Inquérito poder-se-ão opor os mesmos limites formais e substanciais oponíveis aos juízes, entre os quais os derivados da garantia constitucional da não-auto-incriminação, que tem sua manifestação eloqüente no direito ao silencio dos acusados’. O privilégio constitucional da não auto-incriminação alcança tanto o investigado quanto a testemunha (HC 79.812, Celso de Melo). A pretensão do impetrante/paciente, de não comparecer à CPI para prestar informações, não pode vingar. Isso porque a circunstância de tratar-se de ocupante de cargo da ABIN não o exime de ser investigado e, portanto, de comparecer a órgão ou autoridade incumbida da investigação. Não visualizo situação que justifique exceção à regra da publicidade. Assiste-lhe razão, no entanto, quanto ao privilégio da não auto-incriminação, aí incluída a conveniência, ou não, de revelar fatos relacionados ao exercício do cargo.” (HC 96.981-MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, decisão monocrática proferida pelo Min. Eros Grau, julgamento em 26-11-08, DJE de 1º-12-08)

 

O direito ao silêncio, que assegura a não-produção de prova contra si mesmo, constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da dignidade da pessoa humana. Como se sabe, na sua acepção originária, este princípio proíbe a utilização ou transformação do homem em objeto dos processos e ações estatais. O Estado está vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações. A propósito, em comentários ao art. 1º da Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a submissão do homem a um processo judicial indefinido e sua degradação como objeto do processo estatal atenta contra o princípio da proteção judicial efetiva (rechtliches Gehör) e fere o princípio da dignidade humana [Eine Auslieferung des Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verfahrens wäre die Verweigerung des rechtlichen Gehörs.] (Maunz-Dürig, Grundgesetz Kommentar, Band I, München, Verlag C.H.Beck, 1990, 1I 18). A premissa acima é suficiente a fazer incidir, automaticamente, a essência dos direitos argüidos na impetração. E se há justo receio de serem eles infringidos, deve-se deferir aos pacientes o necessário salvo-conduto que evite possível constrangimento: não se trata de afirmar que ele ocorrerá, ou ocorreria — até porque, como ressaltado pelo Min. Celso de Mello na decisão liminar do MS n. 25.617, é de pressupor que o conhecimento e a consciência próprias à formação jurídica dos parlamentares que compõem a direção dos trabalhos da CPMI não ‘permitiria que se consumassem abusos e que se perpetrassem transgressões’ aos direitos dos depoentes ou às prerrogativas profissionais dos seus defensores técnicos —, mas, infelizmente, eventos de passado recente, e de público conhecimento, indicam a oportunidade e a necessidade de acautelar qualquer ocorrência." (HC 87.971-MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, decisão monocrática, julgamento em 13-2-06, DJ de 21-2-06). No mesmo sentido: HC 88.553-MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, decisão monocrática, julgamento em 19-4-06, DJ de 25-5-06.

 

É firme jurisprudência desta Corte no sentido de que a garantia contra a autoincriminação (art. 5º, inc. LXIII, da Constituição Federal) se estende a todas as pessoas sujeitas aos poderes de investigação das comissões parlamentares de inquérito, assim às que ostentem qualidade de testemunhas, como aos indiciados mesmos, ou, recte, envolvidos ou suspeitos (v. g., HC 79.244, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, in RTJ 172/929-930; HC 78.814 e HC 83.648, Rel. Min. Celso de Mello. Cf., ainda, Ovidio Rocha Barros Sandoval, ‘CPI ao Pé da Letra’, Campinas, Ed. Millennium, 2001, pp. 64-66, n. 58). De tal garantia decorrem, para a pessoa objeto de investigação, e, até, para testemunha, os seguintes direitos: a) manter silêncio diante de perguntas cuja resposta possa implicar auto-incriminação; b) não ser presa em flagrante por exercício dessa prerrogativa constitucional, sob pretexto da prática de crime de desobediência (art. 330 do Código Penal), nem tampouco de falso testemunho (art. 342 do mesmo Código); e c) não ter o silêncio interpretado em seu desfavor." (HC 84.214-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, decisão monocrática, julgamento em 23-4-04, DJ de 29-4-04). No mesmo sentido: HC 95.903-MC, Rel. Min. Menezes Direito, decisão monocrática, julgamento em 26-8-08, DJE de 1º-9-08

 

 

Tenho enfatizado, em decisões proferidas no Supremo Tribunal Federal, a propósito da prerrogativa constitucional contra a auto-incriminação (RTJ 176/805-806, Rel. Min. Celso de Mello), e com apoio na jurisprudência prevalecente no âmbito desta Corte, que assiste, a qualquer pessoa, regularmente convocada para depor perante comissão parlamentar de inquérito, o direito de se manter em silêncio, sem se expor — em virtude do exercício legítimo dessa faculdade — a qualquer restrição em sua esfera jurídica, desde que as suas respostas, às indagações que lhe venham a ser feitas, possam acarretar-lhe grave dano (Nemo tenetur se deteger’). É que indiciados ou testemunhas dispõem, em nosso ordenamento jurídico, da prerrogativa contra a auto-incriminação, consoante tem proclamado a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal (RTJ 172/929-930, Rel. Min. Sepúlveda Pertence — RDA 196/197, Rel. Min. Celso de Mello — HC 78.814/PR, Rel. Min. Celso de Mello, v.g.). Cabe enfatizar que o privilégio contra a auto-incriminação — que é plenamente invocável perante as comissões parlamentares de inquérito (Nelson de Souza Sampaio, Do Inquérito Parlamentar, pp. 47/48 e 58/59, 1964, Fundação Getúlio Vargas; José Luiz Mônaco da Silva, Comissões Parlamentares de Inquérito, pp. 65 e 73, 1999, Ícone Editora; Pinto Ferreira, Comentários à Constituição Brasileira, vol. 3, pp. 126-127, 1992, Saraiva, v.g.) — traduz direito público subjetivo, de estatura constitucional, assegurado a qualquer pessoa pelo art. 5º, inciso LXIII, da nossa Carta Política. Convém assinalar, neste ponto, que, ‘embora aludindo ao preso, a interpretação da regra constitucional deve ser no sentido de que a garantia abrange toda e qualquer pessoa, pois, diante da presunção de inocência, que também constitui garantia fundamental do cidadão (...), a prova da culpabilidade incumbe exclusivamente à acusação’ (Antônio Magalhães Gomes Filho, Direito à Prova no Processo Penal, p. 113, item n. 7, 1997, RT...). É por essa razão que o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu esse direito também em favor de quem presta depoimento na condição de testemunha, advertindo, então, que ‘não configura o crime de falso testemunho, quando a pessoa, depondo como testemunha, ainda que compromissada, deixa de revelar fatos que possam incriminá-la’ (RTJ 163/626, Rel. Min. Carlos Velloso). Com o explícito reconhecimento dessa prerrogativa, constitucionalizou-se, em nosso sistema jurídico, uma das mais expressivas conseqüências derivadas da cláusula do due process of law. Qualquer pessoa que sofra investigações penais, policiais ou parlamentares, ostentando, ou não, a condição formal de indiciado, possui, dentre as várias prerrogativas que lhe são constitucionalmente asseguradas, o direito de permanecer em silêncio, consoante reconhece a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 141/512, Rel. Min. Celso de Mello). (...) O direito de o indiciado/acusado (ou testemunha) permanecer em silêncio — consoante proclamou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, em Escobedo v. Illinois (1964) e, de maneira mais incisiva, em Miranda v. Arizona (1966) — insere-se no alcance concreto da cláusula constitucional do devido processo legal. E esse direito ao silêncio inclui, até mesmo por implicitude, a prerrogativa processual de o depoente negar, ainda que falsamente, perante a autoridade policial, judiciária ou legislativa, a prática de qualquer infração penal. (...) Cabe enfatizar, por necessário — e como natural decorrência dessa insuprimível prerrogativa constitucional —, que nenhuma conclusão desfavorável ou qualquer restrição de ordem jurídica à situação individual da pessoa que invoca essa cláusula de tutela pode ser extraída de sua válida e legítima opção pelo silêncio. Daí a grave — e corretíssima — advertência de Rogério Lauria Tucci (Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro, p. 396, 1993, Saraiva), para quem o direito de permanecer calado ‘não pode importar desfavorecimento do imputado, até mesmo porque consistiria inominado absurdo entender-se que o exercício de um direito, expresso na Lei das Leis como fundamental do indivíduo, possa acarretar-lhe qualquer desvantagem’.(...) No sistema jurídico brasileiro, não existe qualquer possibilidade de o Poder Público (uma comissão parlamentar de inquérito, p. ex.), por simples presunção ou com fundamento em meras suspeitas, reconhecer, sem prévia decisão judicial condenatória irrecorrível, a culpa de alguém. Na realidade, os princípios democráticos que informam o modelo constitucional consagrado na Carta Política de 1988 repelem qualquer comportamento estatal que transgrida o dogma de que não haverá culpa penal por presunção, nem responsabilidade criminal por mera suspeita." (HC 83.622-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, decisão monocrática proferida pelo Min. Celso de Mello, julgamento em 13-10-03, DJ de 21-10-03). No mesmo sentido: HC 79.589, Rel. Min. Octávio Gallotti, julgamento em 5-4-00, DJ de 6-10-00.

 

Fundamentação da decisão parlamentar

A jurisprudência firmada pela Corte, ao propósito do alcance da norma prevista no art. 58, § 3º, da Constituição Federal, já reconheceu a qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito o poder de decretar quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico, desde que o faça em ato devidamente fundamentado, relativo a fatos que, servindo de indício de atividade ilícita ou irregular, revelem a existência de causa provável, apta a legitimar a medida, que guarda manifestíssimo caráter excepcional (MS n. 23.452-RJ, Rel. Min. Celso de Mello; MS n. 23.466-DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; MS n. 23.619-DF, Rel. Min. Octavio Gallotti; MS n. 23.639-DF, Rel. Min. Celso de Mello; etc.). Não é lícito, pois, a nenhuma delas, como o não é sequer aos juízes mesmos (CF, art. 93, IX), afastar-se dos requisitos constitucionais que resguardam o direito humano fundamental de se opor ao arbítrio do Estado, o qual a ordem jurídica civilizada não autoriza a, sem graves razões, cuja declaração as torne suscetíveis de controle jurisdicional, devassar registros sigilosos alheios, inerentes à esfera da vida privada e da intimidade pessoal." (MS 25.966-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, decisão monocrática, julgamento em 17-5-06, DJ de 22-5-06)

 

É induvidoso que, ao poder instrutório das CPIs, hão de aplicar-se as mesmas limitações materiais e formais oponíveis ao poder instrutório dos órgãos judiciários. Limitação relevantíssima dos poderes de decisão do juiz é a exigência de motivação, hoje, com hierarquia constitucional explícita — CF, art. 93, IX: (...). A exigência cresce de tomo quando se trata, como na espécie, de um juízo de ponderação, à luz do princípio da proporcionalidade, entre o interesse público na produção de prova visada e as garantias constitucionais de sigilo e privacidade por ela necessariamente comprometidas. De resto, se se cogita de CPI, a escrupulosa observância do imperativo constitucional de motivação serve ainda a viabilizar o controle jurisdicional de conter-se a medida nos limites materiais de legitimidade da ação da comissão, em particular, os derivados de sua pertinência ao fato ou fatos determinados, que lhe demarcam os lindes da investigação." (MS 25.281-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, decisão monocrática, julgamento em 9-3-05, DJ de 15-3-05)

 

Uma coisa é o fundamento político ou jurídico de uma decisão. Outra é não ter fundamento algum. O que se exige é a fundamentação de uma decisão. O que não se permite é a decisão arbitrária, porque sem fundamentação. No mesmo MS 23.446-6, fiz distinção entre o processo decisório judicial e o processo decisório das Casas Políticas. Disse não se poder ‘(...) fazer uma paridade entre o processo decisório judicial e o processo decisório político no que diz respeito à fundamentação de suas decisões (....) Não se pode pretender (...) que a fundamentação da decisão do parlamento tenha a mesma contextura, a mesma forma ou a mesma densidade das decisões do Poder Judiciário. (...) O procedimento pelo qual agem os parlamentares é absolutamente distinto do procedimento judicial. (...)’. A fundamentação da decisão política se encontra em qualquer peça ou momento do procedimento. Pode se encontrar no próprio projeto, no requerimento, na indicação, no parecer e na emenda — que são os tipos de proposições parlamentares. Pode decorrer do debate quando da votação da matéria. O certo é que as decisões parlamentares não estão sujeitas às regras que disciplinam as decisões judiciais que impõem relatório, fundamentos e dispositivo (CPC, art. 458). O procedimento parlamentar é outro. O procedimento de tomada de decisões é outro. Logo, não se lhe aplica as regras de processo judicial, que é diverso. No entanto, não se conclua que a decisão parlamentar possa ser arbitrária e sem nenhum fundamento. " Não se confunda inexistência de fundamentação com topologia da fundamentação. Para as decisões judiciais, a lei impõe uma topologia própria e específica para os seus fundamentos. Não é o caso das decisões parlamentares. A localização dos fundamentos pode e é difuso. Os fundamentos podem se encontrar em diversos locus do processo decisório. É o caso do autos." (MS 23.575-MC, Rel. Min. Nelson Jobim, decisão monocrática, julgamento em 16-12-99, DJ de 1º-2-00)

 

Intimação para depor

A leitura do requerimento aprovado de convocação do paciente para depor perante a CPI não deixa dúvida de que sua motivação se prende, por conta do número aparentemente elevado das respectivas ordens, à necessidade de ‘informações e esclarecimentos acerca de autorizações para realização de interceptações telefônicas’ (...), ou seja, sobre a prática de atos tipicamente jurisdicionais no exercício das funções de Juiz Titular da Vara Criminal da comarca de Itaguaí/RJ. Tal convicção é reforçada pelos termos do segundo ofício. Diante da resposta do magistrado, que havia declinado do que considerou mero ‘convite’ para se pronunciar sobre os processos em que atua (...), o novo ofício comunica-lhe que tal justificativa ‘não foi aceita’ pela CPI, além de deixar manifesto o caráter coercitivo da nova convocação, sob cominações tidas por legais (...). Ora, caso o interesse da Comissão não fosse apenas questionar atos jurisdicionais praticados pelo paciente, outros eventuais motivos da sua convocação, que, à evidência, enquanto legítimos deveriam constar do requerimento até para efeito de fundamentação necessária da deliberação, teriam sido esclarecidos na oportunidade, ou alguma feita. Havendo, pois, à míngua de outra perceptível, nítida relação entre a convocação do Juiz e os atos jurisdicionais por ele praticados, força é dar logo pela aparência de grave ilegalidade daquela e pelo óbvio risco de dano irreparável a esse. É que, conforme velha, aturada e conhecida jurisprudência desta Corte, decisões judiciais só podem, como objeto de controle de sua legitimidade, ser revistas no âmbito dos remédios jurídico-processuais e pelos órgãos jurisdicionais competentes, ou, em caso de suposto desvio ou abuso, pelas instâncias das correspondentes corregedorias, em procedimento próprio. Assim como não pode o Judiciário submeter nenhum membro do Poder Legislativo a procedimento em que seja obrigado, sob cominações adequadas à condição de testemunha ou de acusado, a prestar ‘informações e esclarecimentos’ sobre votos que, em certo sentido ou número, haja dado no Parlamento, no exercício legítimo da sua função política, tampouco pode o Legislativo, ainda que por via de Comissão Parlamentar de Inquérito, controlar a regularidade ou a legalidade de atos jurisdicionais, obrigando magistrado a dar, além das que constam dos autos, outras razões de sua prática, ou a revelar as cobertas por segredo de justiça, que uma e outra coisas ofendem, de modo grosseiro e frontal, o princípio constitucional da separação e independência dos poderes (cf. HC n. 86.581, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 19/5/2006; HC n. 80.539, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 1/8/2003; HC n. 80.089, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 29/9/2000; HC n. 79.441, Rel. Min. Octávio Gallotti; DJ 6/10/2000; HC n. 71.049, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 17/03/1995). ao propósito, ao julgar a ADI n. 2.911-ES (Rel. Min. Carlos Britto, DJ 2/2/2007), o Plenário desta Corte declarou a inconstitucionalidade de norma de Constituição estadual que obrigava o Presidente do Tribunal de Justiça a comparecer à Assembléia Legislativa, mediante convocação, sob pena de crime de responsabilidade. Na ocasião, deixou patente que a atual Constituição da República só atribui ao Poder Legislativo competência para exercer fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial sobre as unidades administrativas do Poder Judiciário, e apenas por intermédio do Tribunal de Contas. “Qualquer outro ato com pretensões de revisão ou de controle administrativo e, sobretudo, jurisdicional, romperia o sistema constitucional de freios e contrapesos, agredindo o princípio da separação de poderes (art. 2º da Constituição da República).” (HC 96.549-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, decisão monocrática, julgamento em 21-10-08, DJE de 28-10-08).

 

No que concerne à alegação de que o paciente não dispõe de condições financeiras para se deslocar até a CPI, verifico a presença do fumus boni iuris. É que não me parece, em princípio, lícito que o paciente seja obrigado a arcar com as despesas de viagem, suas e do advogado, quando o art. 222 do Código de Processo Penal lhe garante o direito de ser ouvido na comarca do seu domicílio. Aliás, o teor do art. 2º da Lei 1.579/1952 é no sentido de que, se necessário, são os membros da CPI que poderão transportar-se aos lugares onde se fizer mister a sua presença, e não o contrário. Penso, porém, que a regra do art. 222 do Código de Processo Penal não é absoluta, desde que existam fundadas razões para o deslocamento da testemunha até o local onde deva depor. Os custos de tal deslocamento, contudo, devem correr por conta do órgão que a convocou. (...) No presente caso, além de ter sido descumprido o procedimento do art. 222 do Código de Processo Penal, sem a necessária justificativa, não foram oferecidos ao paciente e seu defensor os meios necessários ao atendimento da convocação, sendo certo que a condução coercitiva prevista no art. 218 do Código de Processo Penal pressupõe a regular intimação da testemunha (no caso, nos termos do art. 222), o que não ocorreu. (...) Do exposto, defiro parcialmente a liminar, para permitir ao paciente que deixe de atender à convocação da CPI do Tráfico de Armas, da forma como consta do Ofício 779/05-P, facultada à CPI a renovação da intimação, desde que obedecidos os ditames legais." (HC 87.230-MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, decisão monocrática, julgamento em 22-11-05, DJ de 28- 11-05)

 

Comissão Parlamentar de Inquérito: intimação de indígena para prestar depoimento na condição de testemunha, fora do seu habitat: violação às normas constitucionais que conferem proteção específica aos povos indígenas (CF, arts. 215, 216 e 231). A convocação de um índio para prestar depoimento em local diverso de suas terras constrange a sua liberdade de locomoção, na medida em que é vedada pela Constituição da República a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo exceções nela previstas (CF/88, artigo 231, § 5º). A tutela constitucional do grupo indígena, que visa a proteger, além da posse e do usufruto das terras originariamente dos índios, a respectiva identidade cultural, estende-se ao indivíduo que o compõe, quanto à remoção de suas terras, que é sempre ato de opção, de vontade própria, não podendo se apresentar como imposição, salvo hipóteses excepcionais. Ademais, o depoimento do índio, que não incorporou ou compreende as práticas e modos de existência comuns ao ‘homem branco’ pode ocasionar o cometimento pelo silvícola de ato ilícito, passível de comprometimento do seu status libertatis. Donde a necessidade de adoção de cautelas tendentes a assegurar que não haja agressão aos seus usos, costumes e tradições.” (HC 80.240, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 20-6-01, DJ de 14-10-05)

 

Perguntas: limites

Invoca agora o impetrante, para afetar risco largo e fundado de violação de direito subjetivo líquido e certo, que não estaria obrigado a responder, no depoimento, a perguntas que, a seu juízo, desbordem dos limites do domínio dos fatos objeto das investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito, pois outra coisa lhe importaria grave constrangimento pessoal. (...) E, no que concerne ao outro âmbito de tutela, não encontro nem descubro nenhum direito subjetivo pessoal do impetrante a furtar-se a responder a perguntas dos membros da Comissão Parlamentar de Inquérito, sob pretexto de elevada probabilidade de que incursionem pela área de fatos diversos dos que lhe ditaram a criação. É verdade que, em princípio, não pode nenhuma comissão parlamentar de inquérito, porque não o permite a Constituição da República (art. 58, § 3º), apurar fatos diversos dos que, certos, lhe justificaram a formação. Mas à transposição caracterizada desse limite constitucional não corresponde ofensa a direito subjetivo de pessoa convocada para depor, senão apenas hipotética invalidez dos resultados da investigação e atipicidade penal de eventual silêncio invocado pelo depoente. E não corresponde por duas boas e autônomas razões. A primeira, porque, como já assentou o Plenário desta Corte, não está comissão parlamentar de inquérito impedida de estender seus trabalhos a fatos outros que, no curso das investigações, despontem como irregulares, ilícitos, ou passíveis de interesse ou estima do Parlamento, desde que conexos com a causa determinante da criação da CPI, nem de aditar ao seu objetivo original outros fatos inicialmente imprevistos (HC n. 71.231, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 31-10-96, e HC n. 71.039, Rel. Min. Paulo Brossard, apud Jessé Claudio Franco de Alencar, Comissões Parlamentares de Inquérito no Brasil, RJ, Ed. Renovar, 2005, pp. 49 e 50. Cf., ainda, MS n. 23.652 e n. 23.639, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 16-2-01). Donde não está a priori impedida de formular perguntas destinadas a esclarecer fatos conexos com o principal ou outros suscetíveis de serem aditados ao seu programa temático, desde que relevantes para a vida política, econômica ou social do País. Não há aí direito subjetivo capaz de se lhe opor, nesses termos, como limitação a indagações. E a segunda, é porque, ainda quando, ad argumentandum tantum, fora superado esse obstáculo intransponível, seria, na prática, inviável predefinir limites para perguntas em torno de fato ou fatos certos, porque, como é óbvio, uma pergunta pode, à primeira vista, não ter com o fato relação que só se revelará na seqüência e no desdobramento das respostas e da inquirição. É simplesmente impossível preestabelecer o roteiro e o campo de pertinência das perguntas, sob pena de aniquilar o poder de investigação. É absurdo que escusa argumentos adicionais. Tampouco há, neste passo, direito oponível de antemão à CPI. Daí, revendo a primeira decisão, proferida já ao depois do horário de expediente, quando, por hábito que bem poderia ser abolido pelas partes, se distribuiu a ação em véspera do feriado nacional de ontem, sobre depoimento há muito designado para esta manhã, vejo agora que falta, assim ao pedido, como ao seu aditamento, toda possibilidade ou viabilidade jurídica, cuja deficiência é causa ostensiva de carência da ação de segurança." (MS 25.663-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, decisão monocrática, julgamento em 16-11-05, DJ de 22-11-05)

 

Se o objeto da CPI é mais amplo do que os fatos em relação aos quais o cidadão intimado a depor tem sido objeto de suspeitas, do direito ao silêncio não decorre o de recusar-se de logo a depor, mas sim o de não responder às perguntas cujas repostas entenda possam vir a incriminá-lo: liminar deferida para que, comparecendo à CPI, nesses termos, possa o paciente exercê-lo, sem novamente ser preso ou ameaçado de prisão." (HC 79.244, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 23-2-00, DJ de 24-3-00)

 

Às câmaras legislativas pertencem poderes investigatórios, bem como os meios instrumentais destinados a torná-los efetivos. Por uma questão de funcionalidade, elas os exercem por intermédio de comissões parlamentares de inquérito, que fazem as suas vezes. Mesmo quando as comissões parlamentares de inquérito não eram sequer mencionadas na Constituição, estavam elas armadas de poderes congressuais, porque sempre se entendeu que o poder de investigar era inerente ao poder de legislar e de fiscalizar, e sem ele o Poder Legislativo estaria defectivo para o exercício de suas atribuições. O poder investigatório é auxiliar necessário do poder de legislar; conditio sine qua non de seu exercício regular. Podem ser objeto de investigação todos os assuntos que estejam na competência legislativa ou fiscalizatória do Congresso. Se os poderes da comissão parlamentar de inquérito são dimensionados pelos poderes da entidade matriz, os poderes desta delimitam a competência da comissão. Ela não terá poderes maiores do que os de sua matriz. De outro lado, o poder da comissão parlamentar de inquérito é coextensivo ao da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional. São amplos os poderes da comissão parlamentar de inquérito, pois são os necessários e úteis para o cabal desempenho de suas atribuições. Contudo, não são ilimitados. Toda autoridade, seja ela qual for, está sujeita à Constituição. O Poder Legislativo também, e com ele as suas comissões. (...) O poder de investigar não é um fim em si mesmo, mas um poder instrumental ou ancilar relacionado com as atribuições do Poder Legislativo. Quem quer o fim dá os meios. A comissão parlamentar de inquérito, destinada a investigar fatos relacionados com as atribuições congressuais, tem poderes imanentes ao natural exercício de suas atribuições, como de colher depoimentos, ouvir indiciados, inquirir testemunhas, notificando-as a comparecer perante ela e a depor; a este poder corresponde o dever de, comparecendo a pessoa perante a comissão, prestar-lhe depoimento, não podendo calar a verdade. (...) Também pode requisitar documentos e buscar todos os meios de provas legalmente admitidos. (...) Não se destina a apurar crimes nem a puni-los, da competência dos Poderes Executivo e Judiciário; entretanto, se no curso de uma investigação, vem a deparar fato criminoso, dele dará ciência ao Ministério Público, para os fins de direito, como qualquer autoridade, e mesmo como qualquer do povo. Constituição, art. 58, § 3º, in fine. (...) Se a comissão parlamentar de inquérito não tivesse meios compulsórios para o desempenho de suas atribuições, ela não teria como levar a termo os seus trabalhos, pois ficaria à mercê da boa vontade ou, quiçá, da complacência de pessoas das quais dependesse em seu trabalho. Esses poderes são inerentes à comissão parlamentar de inquérito e são implícitos em sua constitucional existência. Não fora assim e ela não poderia funcionar senão amparada nas muletas que lhe fornecesse outro Poder, o que contraria a lógica das instituições. A comissão pode, em princípio, determinar buscas e apreensões, sem o que essas medidas poderiam tornar-se inócuas e, quando viessem a ser executadas, cairiam no vazio. Prudência, moderação e adequação recomendáveis nessa matéria, que pode constituir o punctum dollens da comissão parlamentar de inquérito no exercício de seus poderes, que, entretanto, devem ser exercidos, sob pena da investigação tornar-se ilusória e destituída de qualquer sentido útil. Em caso de desacato, à entidade ofendida cabe tomar as providências devidas ato contínuo, sem prejuízo do oportuno envio das peças respectivas ou do ato correspondente ao Ministério Público para a instauração do processo criminal. Ninguém pode escusar-se de comparecer a comissão parlamentar de inquérito para depor. Ninguém pode recusar-se a depor. Contudo, a testemunha pode escusar-se a prestar depoimento se este colidir com o dever de guardar sigilo. O sigilo profissional tem alcance geral e se aplica a qualquer juízo, cível, criminal, administrativo ou parlamentar." (HC 71.039, Rel. Min. Paulo Brossard, julgamento em 7-4-94, DJ de 14-4-94)

 

Prazo

Imputa-se, por outro lado, ao mencionado Requerimento subscrito pela minoria parlamentar, uma falha consistente na ausência de indicação do prazo de funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito. Um dos requisitos constitucionais subjacentes à criação de uma CPI refere-se à temporariedade de sua duração, pois esse órgão de investigação legislativa não pode funcionar por prazo indeterminado. Ao contrário, exige-se a indicação de ‘prazo certo’ para duração de qualquer CPI (CF, art. 58, § 3º). Cabe observar, no entanto, que o Regimento Interno da Câmara dos Deputados determina, ele próprio, o prazo de vigência das Comissões Parlamentares de Inquérito que deverão atuar no âmbito dessa Casa do Congresso Nacional. O estatuto regimental em questão dispõe, em seu art. 35, § 3º, que ‘A Comissão (...) terá o prazo de cento e vinte dias, prorrogável por até metade, mediante deliberação do Plenário, para conclusão de seus trabalhos’. Isso significa, portanto, que eventual omissão do requerimento de criação de CPI será suprida, de pleno direito, pelo que prescreve a norma regimental em causa, pois esta — dando concreção à finalidade da regra inscrita no § 3º do art. 58 da Constituição — estabelece, desde logo, o prazo de duração dos trabalhos da Comissão encarregada da investigação parlamentar. No caso ora em exame, a CPI em questão não foi instituída por prazo indeterminado (o que é vedado pela Constituição da República), mas, ao contrário, reconheceu-se — por efeito da incidência da norma regimental mencionada — que a investigação parlamentar teria a duração de 120 dias, como expressamente afirmou o eminente Presidente da Câmara dos Deputados, ao indeferir a questão de ordem suscitada pelo Senhor Líder do PT (...). Vê-se, desse modo, em face do próprio caráter supletivo que qualifica a norma regimental mencionada (art. 35, § 3º), que não se está, na espécie, diante de uma CPI sem prazo certo, pois — insista-se —, tal como expressamente o reconheceu o Senhor Presidente da Câmara dos Deputados (fls. 27/27v.), foi ela criada pelo ‘prazo de cento e vinte dias (...)’, ajustando-se, desse modo, à exigência constitucional de temporariedade, que se impõe a qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito." (MS 26.441-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 29-3-07, DJ de 9-4-07)

 

Proteção contra tratamento desumano

"Nessa linha de raciocínio, de se ver que a mesma Constituição Federal também proíbe que se inflija a quem quer que seja tratamento desumano ou degradante (além da tortura, naturalmente), conforme se lê do inciso III do art, 5º. O que já significa a vedação de se submeter eventual testemunha, investigado ou pessoa acusada a situações de menosprezo. Quero dizer, situações desrespeitosas, humilhantes ou, por qualquer forma, atentatórias da integridade física, psicológica e moral de qualquer depoente. Acresce que tais direitos e garantias individuais tanto podem ser exigidos pelos sujeitos jurídicos de que trata o tópico anterior quanto por seus eventuais advogados. Sem distinção entre uma sala de audiências judiciais e uma sessão de comissão parlamentar de inquérito." (HC 88.163-MC, decisão monocrática, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 6-3-06, DJ de14-3-06). No mesmo sentido: HC 87.976- MC, Rel. Min. Carlos Britto, decisão monocrática, julgamento em 8-2-06, DJ de 14-2- 06).

 

Publicidade dos atos

A Assembléia Nacional Constituinte, em momento de feliz inspiração, repudiou o compromisso do Estado com o mistério e com o sigilo, que fora tão fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior. Ao dessacralizar o segredo, a Assembléia Constituinte restaurou velho dogma republicano e expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade, convertido, em sua expressão concreta, em fator de legitimação das decisões e dos atos governamentais. É preciso não perder de perspectiva que a Constituição da República não privilegia o sigilo, nem permite que este se transforme em praxis governamental, sob pena de grave ofensa ao princípio democrático, pois, consoante adverte Norberto Bobbio, em lição magistral sobre o tema (‘O Futuro da Democracia’, 1986, Paz e Terra), não há, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério. Tenho por inquestionável, por isso mesmo, que a exigência de publicidade dos atos que se formam no âmbito do aparelho de Estado traduz conseqüência que resulta de um princípio essencial a que a nova ordem jurídico-constitucional vigente em nosso País não permaneceu indiferente. O novo estatuto político brasileiro – que rejeita o poder que oculta e que não tolera o poder que se oculta - consagrou a publicidade dos atos e das atividades estatais como expressivo valor constitucional, incluindo-o, tal a magnitude desse postulado, no rol dos direitos, das garantias e das liberdades fundamentais, como o reconheceu, em julgamento plenário, o Supremo Tribunal Federal (RTJ 139/712-713, Rel. Min. Celso de Mello). Impende assinalar, ainda, que o direito de acesso às informações de interesse coletivo ou geral - a que fazem jus os cidadãos e, também, os meios de comunicação social - qualifica-se como instrumento viabilizador do exercício da fiscalização social a que estão sujeitos os atos do poder público (...). Não cabe, ao Supremo Tribunal Federal, interditar o acesso dos meios de comunicação às sessões dos órgãos que compõem o Poder Legislativo, muito menos privá-los do conhecimento dos atos do Congresso Nacional e de suas Comissões de Inquérito, pois, nesse domínio, há de preponderar um valor maior, representado pela exposição, ao escrutínio público, dos processos decisórios e investigatórios em curso no Parlamento.” (HC 96.982-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 25-11-08, DJE de 1º-12-08)

 

 

O pedido de restrição da mídia e de jornalistas fica indeferido, por tratar-se de questão interna do Poder Legislativo.” (HC 89.226, Rel. Min. Ellen Gracie, decisão monocrática, julgamento em 4-7-06, DJ de 1º-8-06) ”(...) entendo não competir, ao Poder Judiciário, sob pena de ofensa ao postulado da separação de poderes, substituir-se, indevidamente, à CPMI/Correios na formulação de um juízo — que pertence, exclusivamente, à própria Comissão Parlamentar de Inquérito — consistente em restringir a publicidade da sessão a ser por ela realizada, em ordem a vedar o acesso, a tal sessão, de pessoas estranhas à mencionada CPMI, estendendo-se essa mesma proibição a jornalistas, inclusive. Na realidade, a postulação em causa, se admitida, representaria claro (e inaceitável) ato de censura judicial à publicidade e divulgação das sessões dos órgãos legislativos em geral, inclusive das Comissões Parlamentares de Inquérito. Não cabe, ao Supremo Tribunal Federal, interditar o acesso dos cidadãos às sessões dos órgãos que compõem o Poder Legislativo, muito menos privá-los do conhecimento dos atos do Congresso Nacional e de suas Comissões de Inquérito, pois, nesse domínio, há de preponderar um valor maior, representado pela exposição, ao escrutínio público, dos processos decisórios e investigatórios em curso no Parlamento. Não foi por outra razão que o Plenário do Supremo Tribunal Federal — apoiando-se em valioso precedente histórico firmado, por esta Corte, em 5-6-1914, no julgamento do HC 3.536, Rel. Min. Oliveira Ribeiro (Revista Forense, vol. 22/301-304) — não referendou, em data mais recente (18-3-2004), decisão liminar, que, proferida no MS 24.832-MC/DF, havia impedido o acesso de câmeras de televisão e de particulares em geral a uma determinada sessão de CPI, em que tal órgão parlamentar procederia à inquirição de certa pessoa, por entender que a liberdade de informação (que compreende tanto a prerrogativa do cidadão de receber informação quanto o direito do profissional de imprensa de buscar e de transmitir essa mesma informação) deveria preponderar no contexto então em exame.” (MS 25.832-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 14-2-06, DJ de 20-2-06)

 

 

Questões processuais

 

O princípio da razoabilidade, da racionalidade, da razão suficiente, conduz à presunção de integrantes do parlamento – representantes de Poder da República – não virem a cometer arbitrariedades. Surge extravagante balizar os trabalhos desenvolvidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito, lançando em caráter preventivo o que pode, ou não, fazer. Óptica diversa implica cerceio à atuação que está, alfim, prevista na Lei Fundamental.” (HC 87.214, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, julgamento em 27-5-06, DJ de 21-6-06).

 

Requerem seja concedida, liminarmente, a ordem para determinar-se ‘a expedição de salvo-conduto em favor do Paciente, para que o mesmo possa beneficiar-se do direito constitucional de permanecer calado, sem ser molestado ou ridicularizado pelos membros da referida CPI, devendo ser tratado sem agressividade, truculência ou deboche’ (fls. 12). (...) Não havendo, ademais, indicação de ato concreto e específico por parte da autoridade apontada como coatora, a evidenciar a prática de comportamento abusivo ou ilícito, não cabe deferir habeas corpus preventivo, de forma genérica, pois não presente qualquer prática de constrangimento ilegal ou injusto ao status libertatis do paciente." (HC 80.853-MC, Rel. Min. Néri da Silveira, decisão monocrática, julgamento em 4-4-01, DJ de 16-4-01)

 

A intimação — que representa o meio formal pelo qual se procede à convocação de alguém para comparecer perante uma comissão parlamentar de inquérito — não traduz, não configura e nem se reduz à condição de ato concretizador de ilegalidade ou de abuso de poder. É irrecusável que as atividades desenvolvidas por qualquer comissão parlamentar de inquérito estão necessariamente sujeitas à observância do ordenamento jurídico. Não se pode presumir, contudo, que esse órgão estatal vá transgredir os estatutos da República, eis que milita, em favor do Poder Público, salvo demonstração em contrário, a presunção juris tantum de legitimidade e de regularidade dos atos que pratica. Por isso mesmo, mera suposição de abuso estatal ou de prática arbitrária, quando destituída de base empírica, não pode justificar a concessão de medida judicial que suspenda, liminarmente, o regular exercício, por parte de uma comissão parlamentar de inquérito, da competência investigatória de que se acha investida. (...) É preciso ter presente, no entanto, que, sem a indicação, pelo impetrante, de um ato concreto e específico que evidencie, por parte da autoridade apontada como coatora, a prática de comportamento abusivo ou de conduta revestida de ilicitude, não há como sequer admitir o processamento da ação de habeas corpus, em face da inocorrência de hipótese caracterizadora de injusto constrangimento ao status libertatis da paciente. " (HC 80.427-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 8-9-2000, DJ de 13-9-2000)

 

Quórum

A observância do quorum previsto regimentalmente para deliberação — maioria absoluta dos membros que integram a comissão — é formalidade essencial à valia das decisões, presente ato de constrição a alcançar terceiro." (MS 25.005, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 7-10-04, DJ de 18-2-05)

 

Relatório parcial e final

Comissão Parlamentar de Inquérito extinta (CPMI dos Bingos). Prejudicialidade da ação. Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é de se julgar prejudicada ação de mandado de segurança quando, impetrada contra ato de Comissão Parlamentar de Inquérito, esta vier a se extinguir, em decorrência da conclusão de seus trabalhos investigatórios. Ausência, no caso, de autoridade coatora para figurar no pólo passivo da ação. Precedentes: (...) É irrelevante o fato de o mandado de segurança impugnar suposta ilegalidade do relatório final, e não de atos investigatórios praticados pela CPI. Tal circunstância, ao contrário, reforça a inviabilidade desta ação, dado que voltada à antecipação de um pronunciamento judiciário que apenas se dará se e quando ajuizada a concernente ação penal.” (MS 25.996-AgR, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 22-11-07, DJE de 22-2-08)

 

A sugestão de indiciamento em questão tem por base os trabalhos da referida CPMI, e consiste, na verdade, na conclusão mencionada no §3º do artigo 58 da Constituição Federal, não gerando, de imediato, constrangimento ilegal a ser sanado pela via do habeas corpus. Ademais, a jurisprudência desta Corte é no sentido de que o mero indiciamento em inquérito policial não gera constrangimento ilegal a ser sanado por habeas corpus.(cf. HC 85.491, 1ª Turma, Rel Min. Eros Grau, DJ de 9-9-05, HC n. 81.648, 1ª Turma, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 23-8-02, e os RHC 65.322, 2ª Turma, Relator o Ministro Francisco Rezek, DJ de 20-5-88, e 66.180, 2ª Turma, Relator o Ministro Francisco Rezek, DJ de 10-3-89). O que se admite, e isso somente em hipóteses excepcionais, é o trancamento do inquérito policial em face de flagrante atipicidade de conduta, o que não é possível de se averiguar no presente caso, por demandar incursão probatória inadequada à via eleita." (HC 88.680-MC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, decisão monocrática, julgamento em 5-5-06, DJ de 12-5-06)

 

A produção de relatórios parciais constitui prática que não traduz nem se qualifica como ato abusivo das comissões parlamentares de inquérito, cujos trabalhos — porque voltados ao esclarecimento de ocorrências anômalas que afetam, gravemente, o interesse geral da sociedade e do Estado — devem estar sujeitos a permanente escrutínio público, representando, por isso mesmo, forma legítima de apresentação de resultados, ainda que setoriais, das atividades desenvolvidas ao longo do inquérito legislativo, assim permitindo que a coletividade exerça, sobre tais órgãos de investigação, a necessária fiscalização social. Na realidade, a divulgação de relatórios parciais traduz a legítima expressão do necessário diálogo democrático que se estabelece entre a comissão parlamentar de inquérito e os cidadãos da República, que têm direito público subjetivo à prestação de informações por parte dos órgãos parlamentares de representação popular, notadamente nos casos em que se registra — considerada a gravidade dos fatos sob investigação legislativa — direta repercussão sobre o interesse público. O que esta Suprema Corte tem censurado — e desautoriza do — é a divulgação indevida, desnecessária, imotivada ou sem justa causa dos registros sigilosos, pelo fato de inexistir, em tal contexto, qualquer razão idônea ou fundada no interesse público, cuja constatação, uma vez demonstrada, revela-se capaz de justificar, só por si, o ato excepcional de pública exposição, à coletividade, das informações legitimamente obtidas pela comissão parlamentar de inquérito." (MS 25.717-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 16-12-05, DJ de 1º-2-06). No mesmo sentido: MS 25.995-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 5-6-06, DJ de 9-6-06); MS 25.995-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 5-6-06, DJ de 9-6-06.

 

Reserva de jurisdição

A Constituição da República, ao outorgar às comissões parlamentares de inquérito ‘poderes de investigação próprios das autoridades judiciais’ (art. 58, § 3º), claramente delimitou a natureza de suas atribuições institucionais, restringindo-as, unicamente, ao campo da indagação probatória, com absoluta exclusão de quaisquer outras prerrogativas que se incluem, ordinariamente, na esfera de competência dos magistrados e Tribunais, inclusive aquelas que decorrem do poder geral de cautela conferido aos juízes, como o poder de decretar a indisponibilidade dos bens pertencentes a pessoas sujeitas à investigação parlamentar. A circunstância de os poderes investigatórios de uma CPI serem essencialmente limitados levou a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal a advertir que as comissões parlamentares de inquérito não podem formular acusações e nem punir delitos (RDA 199/205, Rel. Min. Paulo Brossard), nem desrespeitar o privilégio contra a autoincriminação que assiste a qualquer indiciado ou testemunha (RDA 196/197, Rel. Min. Celso de Mello — HC 79.244-DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence), nem decretar a prisão de qualquer pessoa, exceto nas hipóteses de flagrância (RDA 196/195, Rel. Min. Celso de Mello — RDA 199/205, Rel. Min. Paulo Brossard)." (MS 23.452, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 16-9-94, DJ de 12-5-00)

 

Sigilo das informações

Analiso, inicialmente, a pretendida imposição do regime de sigilo, tanto à tramitação, no Supremo Tribunal Federal, deste processo de habeas corpus (...), quanto à inquirição, pela ‘CPI das Escutas Telefônicas Clandestinas’, do ora impetrante, que deseja ser ouvido ‘em sessão secreta e em local cuja entrada e saída também possa assegurar o sigilo de sua identidade’ (...). Indefiro tais pleitos, pois - segundo entendo - nada deve justificar, em princípio, a tramitação, em regime de sigilo, de qualquer procedimento que tenha curso em juízo, notadamente no Supremo Tribunal Federal, eis que, na matéria, deve prevalecer a cláusula da publicidade. E no que concerne ao pedido de ‘que seja resguardada a imagem e a pessoa do impetrante, assegurando-se sua oitiva em sessão secreta e em local cuja entrada e saída também possa assegurar o sigilo de sua identidade’ (...), também entendo que tal postulação, se admitida, representaria claro (e inaceitável) ato de censura judicial à publicidade e divulgação das sessões dos órgãos legislativos em geral, inclusive das Comissões Parlamentares de Inquérito.” (HC 96.982-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 25-11-08, DJE de 1º-12-08)

 

Consubstancia direito do advogado recusar-se a depor, como testemunha, em processo no qual haja funcionado ou deva funcionar ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que caracterize sigilo profissional. A partir da premissa constante, repita-se, da justificativa do requerimento de convocação — o paciente atuou como advogado, na prestação de serviços a certo cliente —, não se tem como placitar o ato da Comissão Parlamentar de Inquérito. Defiro a liminar pleiteada, desobrigando o paciente, ante a convocação, tal como formalizada, de comparecer à Comissão Parlamentar de Inquérito aludida para ser ouvido." (HC 86.429, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, julgamento 8-8-05, DJ de 16-8- 05)

 

 

 

 

8.1 Jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso

                       

Afastamento do Prefeito

Agravo de Instrumento - Prefeito Municipal - Câmara Municipal - Comissão de Investigação e Processante - Relatório conclusivo pela cassação do mandato - Liminar concedida pelo Relator e confirmada a final - Recurso provido. Só circunstâncias excepcionais e com provas induvidosas recomendam o afastamento de prefeito municipal de seu mandato, através de CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito, mormente quando as acusações são veementemente rechaçadas e o desgaste natural político do conflito impõe-se evitar. (Recurso de Agravo de Instrumento - Classe II - 15 - nº 14.703)

 

Causa de retardamento provocada pelo próprio impetrante

Mandado de Segurança - Comissão Parlamentar de Inquérito - Investigação de ato de improbidade administrativa - Vereador - Alegação de excesso do prazo nonagesimal - Artimanhas jurídicas produzidas pela defesa do impetrante - Causa de retardamento provocada pelo próprio impetrante - Inocorrência de prejuízo - Sentença denegatória da segurança - Apelo Improvido.  Utilizando-se o impetrante de variedades de procedimentos condenáveis, com o fito evidente de impedir o normal seguimento dos trabalhos da Comissão Processante, instaurada para apuração de eventual prática de falta de decoro parlamentar, não pode ele valer-se da própria torpeza para buscar a tutela mandamental.  Apelo improvido diante do inegável acerto da sentença monocrática que denegou a segurança. (Recurso de Apelação Cível - Nº  25.624 - Classe II - 19)

 

Nulidade na formação da constituição da CPI

Reexame necessário de sentença - Mandado de Segurança - Prefeito Municipal - Formação de Comissão Processante sem observar o disposto no Decreto-lei 201/67 (art. 5º, II) - Nulidade na formação da constituição da Comissão Processante de Inquérito - Sentença concessiva da segurança - Ratificada - Recurso oficial denegado. A constituição de Comissão Processante para apuração de denúncia formulada em face de Prefeito Municipal, deve obedecer o critério de sorteio dos vereadores desimpedidos, nos termos do que dispõe o inciso II, do art. 5º do Decreto-lei 201/67.(Número 28350 – ano 2004, Des. Munir Feguri)

 

Prazo para conclusão da CPI

Suspensão temporária de mandato eletivo - Observância da ampla defesa, contraditório e o devido processo legal - Intelecção do artigo 5°, VII, do Decreto-lei nº 201/67, Recepcionado pela atual Constituição Da República - Prazo para conclusão da CPI, em 90 dias da notificação do acusado - Agravo conhecido e improvido - Interlocutória mantida. Instaurada a Comissão Parlamentar de Inquérito a lei estipula prazo de 90 (noventa) dias para a conclusão da denúncia, a contar da notificação do acusado. Transcorrido o prazo sem julgamento, o processo será arquivado, sem prejuízo de nova denúncia, ainda que sobre os mesmos fatos. (Recurso de Agravo de Instrumento nº 42876/2004)

 

 

 

8.2 Jurisprudência de outros Tribunais pátrios

 

Apresentação de Documentos

CONSTITUCIONAL - CPI MUNICIPAL - MANDADO DE SEGURANÇA - REQUISIÇÃO DE DOCUMENTOS E INFORMAÇÕES AO EXECUTIVO - REQUISIÇÃO QUE SE LIMITA A ELEMENTOS RELACIONADOS COM O OBJETO DETERMINADO DA CPI - SEGURANÇA DENEGADA - SENTENÇA CONFIRMADA, EM REEXAME NECESSÁRIO. 1. Em face do que dispõe o art. 66, XII, da Lei Orgânica Municipal, compete ao sr. Prefeito, entre outras atribuições, prestar à Câmara, dentro de quinze dias (15), as informações pela mesma solicitadas, salvo prorrogação, a seu pedido e por prazo determinado, em face da complexidade da matéria ou da dificuldade de obtenção nas respectivas fontes dos dados pleiteados. 2. Determinando a CPI prazo inferior ao estabelecido em lei para apresentação de documentos, inexiste a esta direito líquido e certo a embasar a sua pretensão. 3. Em reexame necessário, confirmar a decisão. (Acórdão Nº 1.0000.00.210299-4/000(1) de TJMG. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 29/11/2001)

 

 

 



[1] COSTA, Tito. Responsabilidade de Prefeitos e Vereadores. 4ª ed. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2002

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