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A Importância da Psicologia para o Direito


Autoria:

Caroline Provin Yasri


Estudante de Direito no Centro Universitário Estácio do Ceará.

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Resumo:

Por Psicologia jurídica tem-se entendido o estudo sobre a natureza do comportamento humano e sua liberdade, referentes aos conceitos de vontade, interesse, necessidade, decisão e ação, colocados à disposição do aplicador do direito.

Texto enviado ao JurisWay em 21/12/2013.

Última edição/atualização em 23/12/2013.



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A importância da Psicologia para o Direito

RESUMO

O estudo tem por escopo a Psicologia jurídica, a partir de uma dialética entre as duas ciências. O Direito trata da compartição de liberdade e a Psicologia, embora em posição questionável em face das diversas escolas que restringem ou ampliam o seu processo de desenvolvimento, de forma geral, ocupa-se com o comportamento humano e seus processos mentais. Por Psicologia jurídica tem-se entendido o estudo sobre a natureza do comportamento humano e sua liberdade, referentes aos conceitos de vontade, interesse, necessidade, decisão e ação, colocados à disposição do aplicador do direito. A doutrina tem compreendido a questão psico-jurídica em três grandes campos: a) a psicologia do direito, que trata da natureza do fenômeno jurídico, também chamada de psicologismo jurídico; b) a psicologia no direito, cujo mister é a observação de estímulos ou prevenção de condutas em face de estruturas normativas e c) psicologia para o direito, reconhecida como ciência auxiliar do direito. Com efeito, a Psicologia jurídica quer compreender a natureza psíquica do fenômeno jurídico para o indivíduo globalizado, os problemas das relações sócio-jurídicas comportamentais e os processos mentais dos jurisdicionados e dos agentes funcionais da justiça em face de estruturas normativas que regulam a vida social.

 

Palavras-chave: 1.Epistemologia. 2.Psicologia. 3.Direito. 4.Psicologia jurídica

 

ABSTRACT

The study has the legal scope of psychology, from a dialectic between the two science. The law treats the share of freedom and psychology, although questionable position in the face of several schools that restrict or expand your development process, in general, is concerned with human behavior and mental processes. For legal psychology has understood the study of the nature of human behavior and their freedom, concerning the concepts of will, interest, need, decision and action, placed at the disposal of applying psychology of law, which deals with the nature of the legal phenomenon , also called psychologism legal b ) psychology in law whose mister is the observation of stimuli or prevention behaviors in the face of normative structures and c ) psychology to the right , recognized as auxiliary science of law. Indeed, legal psychology wants to understand the nature of psychic phenomena for the individual legal globalized problems of socio - legal behavior and mental processes of jurisdictional and functional agents of justice in the face of regulatory frameworks that regulate social life.

 

Keywords: 1.Epistemology. 2.Psychology. 3.Right. 4.Forensic psychology

 

[1] Aluna do Curso de Direito do Centro Universitário Estácio do Ceará.

[1] Mestre em Direito Constitucional. Professor do Centro Universitário Estácio do Ceará.

 

 INTRODUÇÃO

 

Quando se fala em Psicologia jurídica, quer-se dizer com isso uma locução imprecisa, embora largamente utilizada e por isso mesmo prestigiada na linguagem comum, sem ao certo estabelecer o que se entende por tal pesquisa, e este é um problema inicial: a questão do conhecimento qualificado sobre o que denominamos agora por Psicologia jurídica.

O estudo tem por objetivo geral proceder a uma análise sobre a importância entre Direito e Psicologia, visualizando como objetivo específico, investigar os pontos em comum entre as duas ciências. A metodologia do trabalho é do tipo bibliográfica, porque se baseou em literatura, doutrina especializada e a abordagem é livre e exploratória sobre a temática.

Para tanto, passeia-se pelo tema a partir da mito do cocheiro de Platão que é uma interpretação filosófica entre Direito e Psicologia no mundo antigo, em seguida a compreensão sobre Psicologia em suas dimensões e importância social, nas abordagens que esta ciência comporta; após, procura-se a interlocução com o Direito, em manifesta revisão sobre o ensaio de Pontes de Miranda, denominado: “À margem do Direito”, assinalando-lhe a proposta e sua reflexão contemporânea e, por último, aponta-se algumas diretrizes sobre a problemática, conferindo, de logo, que o estudo demanda uma discussão livre entre Psicologia e Direito.

 

 1. A Psicologia e o Direito na filosofia de Platão

A questão da Psicologia e o Direito não é coisa nova, veja-se, por exemplo, o antigo mito do cocheiro de Platão em que já se distinguia a alma do corpo, como escrevia o filósofo no Mundo Antigo.[1]

Para tanto a alma é como uma força ativa que unisse um carro puxado por uma parelha alada e conduzido por um cocheiro, a questão é que Platão utiliza o mito para relacionar a alma imortal dos deuses e a alma mortal dos homens, justamente a figura dos cavalos alados, em que a primeira alma é genuína e do bem, já a segunda alma é mestiça, daí a dificuldade de conduzir o carro, de tal sorte que enquanto o corcel divino leva a carruagem para o alto, o cavalo mestiço a quer levar para baixo, e isso faz com que o cocheiro desvie o seu objetivo para alcançar a verdade, ao invés de olhar a beleza e a verdade, tem de olhar para as virtudes. Com isso, o cocheiro concentra-se tão somente na condução da carruagem.

Nessa tensão os cavalos se machucam, o cocheiro fere as mãos e a carruagem que passeava pelo mundo divino e vai descer ao mundo terreno, fazendo com que o cocheiro guarde o pensamento nostálgico do mundo que deixou.

Neste momento resta claro a compreensão entre Psicologia e Ética, aquela estuda os devaneios da alma do cocheiro em busca da verdade e da beleza, e esta racionaliza os parâmetros da vontade humana em busca da virtude, mas em constante conflito com as paixões do mundo.

Esse é o diálogo que compreende o mundo natural e o cultural. A dicotomia entre ser e dever-se parece uma discussão anacrônica, ora como premissa do positivismo, ora um teorema filosófico. No entanto, se pode-se admitir que o mundo natural e o mundo cultural não demandam às mesmas concepções básicas sobre seus objetos, isso não implica que não se possa transitar entre seus mundos, daí que as divisões entre: ato e potência, ser e dever-ser, real e aparente, física e metafísica se implicam.

Potência é ato virtual, ou seja, o ato que ainda não é real, assim também pode-se fazer a interlocução com o ser que deve-ser e o dever-ser que é, ou ainda como afirma Vasconcelos (2003, p.190): “a melhor qualidade do mundo físico depende de sua maior conformidade com o mundo metafísico” firmando, igualmente a relação da metafísica com a ideologia.

Por isso que Thomas s. Kuhn quando interpelado a respeito da transitoriedade entre as falas de descrição e prescrição no trato de seus estudos e, por quebrar um teorema paradigmático, Kuhn (1997, p.254) advertiu em seu posfácio datado de 1969: “Esse teorema tornou-se uma etiqueta na prática e já não é mais respeitado por toda a parte. Diversos filósofos contemporâneos descobriram contextos importantes nos quais o normativo e o descritivo estão inextricavelmente misturados.”

De logo pode-se observar que o comportamentalismo envolve-se com a experiência comum, enraizada por seus mitos, crenças, vale dizer, o senso comum, funciona como uma psicologia utilizada em nosso cotidiano, o que vem a produzir uma psicologia para o dia-a-dia, tem como características a imaginação, a intuição, a criatividade, é pois uma psicologia que se dá através de experiências vividas ou presenciadas em permanente produção de idéias.

Esse é um problema ético que perpassa as dimensões individuais do sujeito até que se cheguem às dimensões jurídicas conforme expõe a boa doutrina, senão veja-se:

Na primeira dimensão encontra-se o sujeito, cuja existência é manifestamente complexa, isso porque ele é diferente dos outros, resguarda a própria personalidade que lhe confere uma identidade complexa repleto de valores, e por isso mesmo é um animal racional, que o diferencia dos demais, porque possui uma capacidade ilimitada e extraordinária para o estado de auto-consciência e conhecimento. Vê-se logo que a existência do sujeito é transcendental, como se pudéssemos reproduzir a velha máxima cartesiana: “penso, logo existo, mas eis que este sujeito só é reconhecido por outros sujeitos em sociedade, de modo que a primeira dimensão só se perfaz com a segunda, vale dizer, a dimensão social.

Em sua autoconsciência o sujeito nasce num meio social e passa a interagir com outros sujeitos diante ainda de outra complexidade de valores de toda a ordem. Para tanto, toda criatura precisa viver em sociedade, pois é vivendo em sociedade que construímos a liberdade social. O convívio social nos faz compreender melhor as diferenças de cada um, bem como a organização da própria sociedade, do contrário agir contra toda a organização social seria transformá-la em plena desordem, com isso o conjunto de pessoas que compartilham propósitos, preocupações, costumes, dentre outros tantos. Mas ocorre que o sujeito para viver em sociedade teve de especializar o seu conhecimento, a partir de categorias, que melhor o aperfeiçoa-se na evolução.

Com efeito, na terceira dimensão encontramos as categorias, que ora são instituições, ora segmentos do conhecimento humano. A sociedade é dividida em grupos sociais e instituições que são responsáveis por certos fins, aqui se encontra a própria Psicologia, na busca de observar, explicar, predizer e modificar o comportamento do sujeito social, com isso a Psicologia tem o mister de funcionar como recurso para o ser humano enfrentar as tensões a que é submetido.

Na terceira pode-se dizer que são estruturas sociais, ou sua divisão em categorias voltadas para o interesse cognitivo, podendo-se encontrar: a pedagogia, a economia, a história, a etnia, dentre outras tantas que qualificam o ser humano para a vida social, assumindo plena autonomia (VASCONCELOS, 2003, p.118)

            E na quarta qualificação estará o Direito, que por sua vez é um complexo científico-cultural que pode ser conhecido sob várias ordens. O Direito é uma dimensão humana e social que envolve todas as disciplinas, vale dizer, o Direito se utiliza de todas as disciplinas para ser compreendido (VASCONCELOS, 2003, p.118). 

 

2. Psicologias

Para a autonomia de um estudo científico há certa complexidade, pois que além de afirmar-se por um objeto de estudo próprio e métodos eficazes, também tem de mostrar-se independente de outras áreas do conhecimento. No caso da Psicologia tem sido um problema complexo, porque desde a Antiguidade seu objeto de estudo esteve fragmentado ou compartilhado com outros saberes. Tal fato põe a Psicologia científica em um dilema, pois de um lado ela reivindica seu lugar entre as ciências bem como suas competências específicas, de outro ela não conseguiu se desenvolver sem aproximar-se cada vez mais das ciências biológicas e sociais, o que é um problema da interdisciplinaridade.

Mas já é corrente a designação de “Psicologias”, e não Psicologia, haja vista a dimensão de correntes psicológicas, as quais enlaçam uma pluridiversidade de saberes, o que chamamos de transdisciplinaridade, muito embora ela possa estar consignada a outros saberes, a exemplo da Psicologia jurídica, o que melhor se traduz por multidisciplinaridade.[2]

            No entanto há um processo de construção desses saberes psicológicas cuja crise é bem formulada na pós modernidade, vale dizer, a crise da subjetividade, cujo problema agora se pretende-se tratar com a consignação da proposta comportamental.

 

2.1 A crise da subjetividade privatizada ou a decepção necessária

Quando o próprio Estado se conscientiza da individualidade dos sujeitos, surge a demanda por uma psicologia aplicada nos campos de educação e trabalho, principalmente, para que a eficácia das técnicas de controle e da preparação dos indivíduos para o serviço de uma ordem social seja elevada ao máximo.

Mesmo com essa constante tentativa de ajustamento, essa harmonização nem sempre é atingida, sendo o homem, muitas vezes frustrado em seus objetivos, sempre que aquilo de que ele necessita é contrariado.

Existem vários tipos de frustrações, como frustração por demora, contrariedade e conflito, sendo a sociedade responsável por muitas delas, e existem muitas formas de responder a elas, como através da agressão, agressão deslocada, fantasia, regressão, fixação, apatia, racionalização, compensação, projeção, entre outras.

As frustrações, bem como a reação a elas, são idiossincráticas. Cada indivíduo se portará de maneira bastante peculiar diante de cada situação, alguns com um nível de tolerância bem maior que outros. Seja como for, é essencial saber agir diante das adversidades, pois se não, elas se tornarão fatores desencadeadores de comportamentos neuróticos, que desregulam não só a mente humana, podendo, também, originar doenças físicas graves.


2.2  Conhecimento científico: privacidade e diferença

A ciência moderna baseia-se na suposição de que o homem pode deixar de ser mero expectador da natureza e passar a intervir nela, buscando colocá-la a seu serviço. Os procedimentos científicos necessários ao alcance desse controle, porém, exigem o afastamento completo do subjetivismo; a partir dessa tentativa, os cientistas passam a reconhecer a atuação incessante de elementos individuais e subjetivos.

Ao tentar conhecer e controlar a própria subjetividade, o homem deixa de ser apenas um pesquisador para vir a se tornar um possível objeto da ciência.

Mas o que é Psicologia? É a ciência que estuda o homem e seu comportamento, pretendendo ajudá-lo a alcançar a plenitude da vivência humana nas esferas social e individual.

Embora essa ciência esteja muito evidente nos tempos atuais, a preocupação com o interior humano e com o modo como o homem interage consigo mesmo e com o meio em que vive vem desde a Antigüidade. É oportuno lembrar que os gregos inicialmente, conceituaram a Psicologia como o estudo da alma, de onde os processos psíquicos advinham. O cérebro era, por sua vez, tido como um mero mediador entre a alma e o corpo.

Mais tarde como já mencionado o dualismo psico-físico de Descartes semeia novas perspectivas para a fertilização da Psicologia. Já nos séculos XVIII e XIX, surgiram duas grandes correntes filosóficas no Ocidente: o empirismo inglês e o racionalismo alemão. A primeira defendia a idéia de que a mente de uma criança recém-nascida era uma espécie de página em branco, onde todas as sensações e percepções eram registradas na memória, fonte do conhecimento humano. A outra advogava a favor de que a mente era a geradora das idéias, independendo assim da estimulação por sensações. Ou seja, não era a memória, mas sim a razão, a base do conhecimento humano.

Entretanto, a maior importância dessas duas correntes foi servir de apoio para as escolas psicológicas do século XX, cujas abordagens prosperam na vida contemporânea, me seus mais diversos segmentos.

 

3. Exame de um ensaio

Mas e o Direito e sua interlocução com a Psicologia? Inicialmente apresenta-se um estudo da lavra de Pontes de Miranda em seu “À margem do Direito: ensaio de Psicologia jurídica”, ao que se pode compreender uma gênese entre o Direito e a Psicologia, integrado ao pensamento ocidental ao tempo do jurista, em que anatomia, a fisiologia e a psicologia jurídicas são plenamente versadas, culminando à análise da evolução da regra jurídica e a doutrina organicista do Direito a que Pontes de Miranda se filiava.


3.1 Idéias propedêuticas

Passa a dissertar sobre a questão da unidade da ciência, defendo a idéia de que as ciências se completam, para ele há quase que um sentimento utópico de agregação homogênea de todas as ciências, inclusive o Direito. Pontes de Miranda o Direito engloba e condensa para si os problemas de outras ciências levando em consideração o costume, a experiência e o saber humano, compreende o seu objeto de heterogêneo para homogêneo conteúdo importantíssimo às leis, a as quais ajudarão nas decisões de forma elucidativa e decisiva. Com efeito, há uma grande conexão entre o Direito e as Ciências sociais, porque ambos levam em consideração os estudos psicológicos, o método e a teoria que os envolve.

O Direito é visto como algo instável, suscetível de mudanças, tendo uma evolução lenta e perceptível, sendo esta uma reflexão da evolução da própria sociedade que apresenta uma variabilidade na cultura, de riqueza e da própria civilização. O Direito como ciência racional, deve ter uma aplicação coerente e homogênea que leva em consideração outros ramos de ciência, tem uma preocupação realista, além de ditas normas, que a partir de certos princípios, pode transmitir através das leis, as suas manifestações e a efemeridade de sua evolução.

O Direito engloba e cristaliza os atos costumeiros, exprimindo assim o pensar coletivo. A lei escrita, suscetível a mudanças e brechas é a forma mais concreta de demonstração do costume, o qual tem seus traços psicológicos copiados, formando a vontade coletiva que determina a lei. A seu tempo, Pontes de Miranda, vê o Direito como algo subordinado à Igreja, inferior, sendo moldado conforme os interesses da Igreja, a qual impõe a forma, os limites e o movimento. As instituições que existem como a igreja, possuem finalidade de dominar os homens, entregando esta supremacia a uma classe que possua somente o domínio espiritual. (PONTES DE MIRANDA, 2004)

Há uma grande ligação e contraste entre o psiquismo individual e o coletivo, tendo como objeto algo que decorre de um processo natural, sendo influenciado pelos grupos sociais entre si dos movimentos que eles exercem. Não se sabe até onde há uma ligação, a influência e a separação entre a Sociologia, a Psicologia e o Direito. Elas juntas complementam-se e explicam a vida. A vida pelas físico-químicas, o espírito pelas leis fisiológicas e a sociedades pelos fenômenos psíquicos e econômicos.

Remete à questão da responsabilidade individual que possibilita a lei e se constitui como fator social de progresso, ressalta também o objetivo do Direito: firmar a ordem pública, balanceando interesses. (PONTES DE MIRANDA, 2004)

Por último o autor pergunta qual o fundamento do Direito do ponto de vista científico. Diz-se ele que se trata de uma criação do pensar coletivo, uma teoria da vontade, dessa forma liga o Direito à Psicologia. O direito é visto como algo imitativo, que não é capaz de criar suas próprias leis e regras, precisando copiar em modelos antigos, atuais e nele próprio, mas sempre levando em consideração os costumes. Podemos ver na lei o pensamento do costume de uma sociedade, sua sabedoria e bondade até a ignorância e a crueza, quando é capaz de machucar e matar o próprio semelhante.

É com o Direito que se pode perceber e notar a influência particular de um povo, com sua cultura, tradição, condições, marcos de beleza e força e até o que há de mais defeituoso e cruel. O Direito, enfim, representa o conjunto de regras e normas, que se adapta e oscila conforme os interesses do grupo dominante, não tendo como objetivo principal a representação dos interesses do povo.


3.2 À margem do Direito

Na segunda parte Pontes de Miranda estabelece a relação a relação entre Ciências sociais, Ciência do Direito e Psicologia com os fatos sociais. Para tanto, os fatos sociais são verdadeiros centros de irradiação, sendo estudados por diversas ciências sob vários aspectos. Uma ciência, por mais amplos que sejam seus domínios, não pode estudar ao mesmo tempo, o desenvolvimento e os efeitos de um fato.

Os fatos sociais estão presentes em várias ciências, por isso, pode-se perceber uma ligação entre fatos políticos, morais e jurídicos. Os fatos jurídicos são naturais bastante complexos, cuja pesquisa é abordada em várias ciências. Pode-se comparar o direito a um organismo animal, na anatomia jurídica temos a classificação do Direito, na filosofia jurídica temos os estudos da relação entre os direitos e a psicologia jurídica tem a função de examinar cientificamente os atos psíquicos.

Assim, quanto aos fatos sociais a Psicologia relaciona entre causas múltiplas, que se traduz pela substância desses fatos, a Sociologia estuda-os em sua propagação expansiva, o Direito os condiciona, dando-lhes a trilha dos costumes, da tradição e da necessidade social, destaca ainda Pontes de Miranda que a economia lhes mede o interesse e a linguagem os reduz à forma verbal.

A Psicologia geral é considerada uma ciência nova, levando em conta o tempo em que surgiu, e, assim sendo, a psicologia jurídica não aparente ser uma ciência autônoma. No âmbito jurídico ocorre uma aplicação da psicologia no campo do Direito. Todos os direitos individuais, políticos, contratuais são originados a partir de um plasma psicológico e muitos fenômenos jurídicos necessitam de experiências provenientes da ciência do espírito. Enfim, todas as áreas do direito demandam a psicologia, do mesmo modo que o Direito regula a vida social.

Ainda existe uma discussão sobre a definição de fatos psíquicos e sociais, já os fatos jurídicos são definidos como uma mescla entre fatos sociais e fatos da mente e eles são objetos da psicologia jurídica.

Para Pontes de Miranda entre as ciências há uma interdependência, um inter-relacionamento ao passo que uma ciência de maneira isolada não é capaz de compreender o desenvolvimento e os fatos de um país simultaneamente. (PONTES DE MIRANDA, 2004)

De todas as partes da Psicologia Social, o direito ocupa o mais vasto campo às pesquisas sociológicas. O direito é um conjunto de regras que busca regular o comportamento dos indivíduos, sendo a finalidade dessas regras atender às necessidades de todos, e é através das leis que são possíveis as relações de comunidade, de idéias e de comércio. As leis nascem subordinadas ou mudanças e elas não são produtos de inteligência individual, dessa maneira, assim como o homem não pode transformar as leis sozinhos, estas não podem mudar a sociedade. A base de formação de uma lei são os costumes, um fato se repete sucessivas vezes, com o tempo essa ação passa a ser realizada de forma mais intensa, gerando uma relação de obrigatoriedade. As leis são bastante complexas e sofrem mudanças no decorrer do tempo a fim de estar mais adaptadas a determinada época. As instituições jurídicas têm o objetivo de determinar se a liberdade de um indivíduo não afeta a liberdade da coletividade.

As leis podem ser falsas ou verdadeiras. As leis não têm função social, não respeitam os homens, elas têm quase sempre efeitos diversos e maléficos. Já as leis verdadeiras são aquelas que procuram atender os desejos da coletividade de forma a não prejudicar os interesses individuais. Enfim as leis são complexas, sofrem modificações, os erros são inevitáveis e podemos concluir dizendo: “legislar é descobrir”. (PONTES DE MIRANDA, 2004)

 

3.3 Formação da regra jurídica

O Direito em sua idade antiga deve ser analisado através de um método específico. Este método consiste na correlação entre Ontogenia e Filosofia. A comparação de ambos, um de âmbito individual, outro de âmbito geral apresentam variadas faces da evolução, podendo-se notar a feição psicológica do estudo jurídico.

A fonte jurídica possui dois elementos, um o social, o outro o psíquico. O comportamento do homem obedece a esses dois elementos que são complementares. O costume é a mais antiga fonte jurídica, caracterizando-se pela consciência coletiva, as regras e ditames jurídicos.

A regra jurídica, no entanto, não é bem definida, uma vez que não leva em conta o direito na sua forma inconsciente. Este tem um papel importante por anteceder o consciente. Atos conscientes e inconscientes não são contraditórios, mas são uma continuação progressiva um do outro.

Os fenômenos sociais e psicológicos entrelaçam-se nas ações humanas já que muitas delas são manifestações do inconsciente. A lei, entretanto, seria a consciência social, sendo produzida pela consciência coletiva, auxiliada pelas condições de necessidade, que parcialmente a determinam.

Direito e Psicologia devem caminhar lado a lado, posto que se completam. O método comparativo é dos mais eficientes para promover o intercâmbio entre Direito e Psicologia. Esta última é de extrema importância na avaliação do homem, buscando explicações para as suas ações, algo que pode ser aplicado no mundo jurídico.

A lei verdadeira é aquela que nasce do costume, devendo obedecer três elementos: o psíquico, o social e o jurídico. O que muda em uma lei é o modo como ela é interpretada, e é aí que entra a participação dos aplicadores da lei. Muitas leis são interpretadas de modo a favorecer as novas relações que surgem. Há, porém, governos que se utilizam de seu poder para impor ao povo uma lei que desrespeite seus costumes e hábitos. A psicologia coletiva trata do assunto utilizando as expressões do eu-personalíssimo e do eu-aparente. O eu aparente seria o governo que contraria a vontade do povo, vivendo de aparências e o eu-personalíssimo seria um governo que move suas ações de acordo com os anseios do povo.

As leis estão em processo de modificação freqüente, uma vez que as idéias e costumes também mudar. A lei é fruto dos costumes de um povo, dos seus aspectos sociais e psíquicos, o que justifica sua mudança. Os princípios tidos como imutáveis do direito assim não o são, pois o que há de constante e permanente no direito é a unidade de aparência, o fundo comum e psicológico da moral e do conhecimento jurídico das pessoas.

A lei se fixa através da repetição de seus acontecimentos em âmbito social. Quanto mais escassas se tornem as repetições, mais a lei vai sumir da memória coletiva, dando lugar a uma nova lei. Assim, pode-s notar que os eventos ocorrem primeiramente isolados, e sua repetição os confere ao caráter de costume. Esse costume vai originar a lei. Nota-se a evolução da legislação que, quando legítima, surge do povo e dos seus costumes.

 

3.4 Formação dos organismos jurídicos

Para Pontes de Miranda, para que exista Psicologia jurídica é preciso reiteração e vontade. No entanto, há uma grande diferença entre vontade psicológica e vontade jurídica, sendo a primeira o desejo, o querer, enquanto que a segunda é o “poder querer”, pois depende de certas condições, ou seja, do ordenamento jurídico. Ao nascer, O Direito compreende um sujeito, que é o autor da ação necessário à prática do ato; um objeto, pois é sobre ele que recai o direito; e o ato, que é a essência geradora. (PONTES DE MIRANDA, 2004)

Ao analisar a vida jurídica, Pontes de Miranda faz diversas analogias entre o sujeito e o direito, pois ambos nascem, desenvolvem-se e morrem. Observando, no entanto, que não se pode confundir direito com ação, pois o fundamento jurídico da ação é próprio direito violado e o sujeito ativo é o titular da ação de direito e o sujeito passivo, o violador (PONTES DE MIRANDA, 2004). Portanto, o que há é uma relação jurídica nova e não um novo direito. O sujeito passivo ainda pode variar, sendo a sociedade se as ações forem prejudiciais ou reais ou podem ser pessoas se as ações forem pessoais numa relação jurídica obrigacional já existente.

Há certa confusão quanto ao que seja um direito e os elementos que as compõem e apesar dessa polêmica entre diversos teóricos podemos afirmar existir a violação, que é a infração ou transgressão; a ação que é a “correção” requerida judicialmente; o processo, que é o conjunto de atos que se observa a aplicabilidade da lei, por fim as provas, que são atos que intentam auferir a existência ou não da relação jurídica.

O Direito quase sempre se refere a atos exteriorizados e não a pensamentos, como também são produzidos por esses atos e por essa razão apresentam as mais diversas funções, enquanto que as ações são sempre semelhantes umas às outras. Daí mais um motivo para não se confundir o Direito com ação. São esses acontecimentos mentais externalizados que suscitam as relações jurídicas e os fatos da vida social, ora do homem na sociedade como pessoa natural e responsável por seus atos, ora de grupos de homens, como pessoas jurídicas, que têm um mesmo fim social.

A noção de personalidade permeia a Psicologia e outras ciências, como a imagem verdadeira e confusa de uma pessoa, é verdadeira por ter a mesma origem e, portanto haverá semelhanças na elaboração, e confusa pois é um conjunto de fatos mentais que se confundem com os grupos sociais que são também sistemas de atos psíquicos só que mais amplos. A personalidade é uma estrutura dependente do sistema nervoso, mas este varia ao longo da vida e o que liga seus estados sucessivos é a memória. Em assim sendo, a personalidade psicológica e jurídica estão atreladas.

Na criação psico-jurídicas, onde o homem é responsável por seus atos, há de se diferenciar inteligência e instinto. A primeira é uma capacidade inata, adquirida, já instinto reveste um mecanismo bruto e originário. A vontade consciente caracteriza a personalidade psicológica, havendo, assim, responsabilidade social da vontade e a capacidade de se propor, querer ou aceitar.

Há fenômenos concernentes à capacidade jurídica, como a diminuição dessa capacidade, através de ações alienantes. A simulação e a dissimulação, que como exemplo podemos citar quando um indivíduo imita sintomas de doenças visando a auferir uma incapacidade jurídica ou responsabilidade penal. A criação sócio-jurídica tem como maior exemplo as associações comerciais. Com efeito, podemos afirmar ser o direito “um produto social de assimilação e desassimilação psíquica” como quer Pontes de Miranda em sua explanação sobre a formação dos organismos jurídicos.

De logo pode entender Pontes de Miranda de seu tempo, ao firmar pela provisoriedade das teorias de Direito enquanto ciência do espírito e a estagnação de algumas ciências, cujas mudanças são praticamente inexistentes, o que, neste último caso, não mais condiz com o pensamento da vida contemporânea e o atual estágio em que se encontra a Epistemologia. Que é o Direito é mutável, isso é inegável, e que as chamadas ciências exatas, também o são, há provas suficientes para isso, vide a respeito as inferências de Conjecturas e refutações, obra de Karl Popper. (PONTES DE MIRANDA, 2004).

É o que se vai notar também quanto à interlocução do Direito e as instituições sociais, formatando o Direito sob à égide da Igreja, por exemplo, outra questão que as parcelas do conhecimento, vale dizer, não poderia o Direito ser compreendido pela cognição religiosa, quando se quer compreendê-lo pelo viés científico. Na atualidade demanda-se uma organização social, portanto organicista, de hegemonias e contra-hegemonias sócias em que postulamos por uma ordem orgânica pluralista. Mas tudo está no âmbito da liberdade, de sorte que para a Psicologia a subjetividade privatizada do sujeito aufere-lhe uma liberdade intrínseca, ao passo que o Direito que resolver a problemática social compartindo a liberdade em justiça equânime. Resta-nos avaliar o diálogo entre Direito e Psicologia nas dimensões que se discute atualmente.

 

4 A psicologia jurídica

Sempre que pensamos a Psicologia enquanto ciência, partimos para a delimitação de seu objeto de estudo, ao que, costumeiramente, tem-se definido como ciência do comportamento e dos processos mentais. Ocorre que há um hiato, pelo menos do ponto de vista metodológico, sobre esse objeto, cujo cerne é a objetividade ou a subjetividade científica. Daí porque parafraseando Prado Jr. (2000, p.216), só se deve ser dualista em caso extremo, vale dizer, não partir do princípio que aqui começa o subjetivo e ali termina o objetivo. O problema da psicologia é que, o que se ganha em cientificidade, perde-se em psicologia, ou por outro lado, o que se ganha e objetividade, perde-se em subjetividade[3].

Entretanto, embasadas por um racionalismo universal ou por um positivismo atômico, outrora as ciências pretendiam encerrar seus objetos de estudo em caixas hermeticamente fechadas, mas a vida contemporânea promoveu o diálogo entre as ciências de um modo geral, procurando redefinir conceitos, reorganizar sistemas numa atitude compartilhada dos saberes científicos.

Neste certame as ciências estão por se reconstruir, vale dizer, nada está acabado. No campo da Psicologia jurídica, por exemplo, o que se deseja compreender é uma dialética entre o estudo da Psicologia e do Direito. Para tanto é imprescindível uma análise preliminar desses objetos de estudo, uma vez que se quer firmar as bases de intersecção do fenômeno para posteriormente, compreender suas causas, seus efeitos e aplicações.


4.1 Uma questão multidisciplinar

A Ciência jurídica procura conhecer, interpretar e a aplicar o ordenamento jurídico à luz dos fatos, cuja forma hipotética é o dever-ser; a Psicologia, embora em posição questionável em face das diversas escolas que restringem ou ampliam o seu processo de desenvolvimento, de forma geral, ocupas-se com o comportamento humano e seus processos mentais. Com efeito, é uma ciência humana que tem por objeto a psiquê do sujeito, não é certo, porém, identificá-la de modo fechado, sobretudo por um aspecto que não pode ser esquecido: o fato de que não há previsão e sugestão de conduta no comportamento subjetivo da pessoa, um coincidente “dever-ser” subjetivo, ao que elencam também como objetivos da Psicologia: descrição, explicação, predição e modificação do comportamento. Assim, qual a relação existente entre os estudos do dever-ser e do comportamentalismo subjetivo?

Se a princípio designamos a matéria por Psicologia jurídica desde logo se nota que a adjetivação jurídica é uma qualidade do objeto da Psicologia. Neste caso tem-se entendido os estudo sobre a natureza do comportamento humano, referentes aos conceitos de vontade, interesse, necessidade, decisão e ação, colocados à disposição do jurista e do aplicador do direito.

No entanto, se permutarmos pela expressão Direito psicológico, é possível compreender a locução sob o prisma do artífice jurista ou do profissional de psicologia, vale dizer, a atividade que exerça o aplicador do direito, sob a égide de certa psicologia ou do psicólogo enquanto auxiliar da justiça. Mas o que isso implica na prática?

Na primeira locução ao jurista e ao cientista do comportamento subjetivo interessa o mister de indagar a natureza do fenômeno jurídico à vida social. Na segunda locução o jurista retém parcela de psicologia para que na vida jurídica concretize a atividade jurisdicional e ao psicólogo resta auxiliar a justiça nos inúmeros casos que demandam à ordem comportamental do jurisdicionado.[4]

Para tanto, na segunda locução a experiência jurídica é capaz de identificar, interpretar e aplicar os institutos de direito dispondo de técnica própria desenvolvida e sistematizada, não raro, por teses reconhecidas oriundas de psicólogos, psicanalistas e psiquiatras forenses no desenvolvimento da ciência jurídica, cuja porção da realidade o jurista domina. Portanto, um direito psicológico, isto é, sob o prisma da experiência aplicada, o jurista se ocupa do direito como um instrumento que atua socialmente dentro de certas condições sociais (FERRAZ JR., 1994, p.46).


4.2 Que é Psicologia jurídica?

Delimitar a Psicologia jurídica, como sói acontecer, por mera atividade auxiliar à Justiça, seria o que mesmo que reduzir seu objeto de ciência a plano secundário ou pelo menos restringi-lo com força coadjuvante às demais ciências sociais. O que não é suficiente para a moderna Psicologia, notadamente, a de ordem humanista, porquanto a ciência comportamental está voltada para a reconstrução do ser humano integral, enquanto sujeito formado de paradigmas sociais e da dignidade da pessoa humana, que a ciência jurídica também não ignora.

Nesse sentido como levar a cabo uma definição de Psicologia jurídica descompassada com os ditames da atualidade? Há vozes que se levantam para afirmar aos sujeitos desta relação sócio-jurídica a tão revolucionária visão humanista concentrando-se “naquilo que significa estar vivo como ser humano” (DAVIDOFF apud BUGENTHAL, 2006, p.14). Às vistas disso afirma este pensamento teórico que a interpretação subjetiva é núcleo de toda atividade humana e não há de ser ignorada. Afirma, por sua vez, Trindade[5] (2004, p.22):

 

É fácil constatar que o direito e a psicologia possuem um destino comum, pois ambos tratam do comportamento humano. Parafraseando Sobral (1994), a psicologia e o direito parecem dois mundos condenados a entender-se. A psicologia vive obcecada pela compreensão das chaves do comportamento humano. O direito é o conjunto de regras que busca regular esse comportamento, prescrevendo condutas e formas de soluções de conflitos, de acordo com os quais deve se plasmar o contrato social que sustenta a vida em sociedade.

 

Dá-se, pois, que a “ciência do comportamento consignada ao dever-ser jurídico” vem a expandir sob a vertente da Psicologia humanista: “o processo de humanização do comportamento psíquico e relacional dos sujeitos regulados por estruturas normativas”. Destarte, a Psicologia jurídica está apta a resolver, a natureza do fenômeno jurídico para o indivíduo globalizado, os problemas das relações sócio-jurídicas comportamentais e os processos mentais dos jurisdicionados e dos agentes funcionais da justiça, em face de estruturas normativas que regulam a vida social.

Esperamos que uma das conseqüências dessa proposta seja a mudança na postura dos agentes da justiça e a amplitude da concepção sobre a Psicologia jurídica na vida jurisdicional. Tal definição permite-nos uma reflexão humanizada do comportamento jurídico a qual consignamos o objeto de nosso estudo.


4.3 Metódica e prática da Psicologia jurídica 

Resta saber agora como conseqüência dessa proposta qual o campo metodológico e de aplicação da atividade do profissional de Psicologia na seara do Direito.

Muñoz Sabaté apud Trindade (2007, p.25) divide a metódica da psico-jurídica em três grandes campos, a saber: a) a psicologia do direito, que se ocupa da natureza do fenômeno jurídico, também chamada de psicologismo jurídico; b) a psicologia no direito, cujo mister é a observação de estímulos ou prevenção de condutas em face de estruturas normativas e c) psicologia para o direito, manifestamente reconhecida como ciência auxiliar do direito.

Se nos propomos a tratar da essência do fenômeno jurídico é provável que estejamos a presença de certo psicologismo que autoriza a vontade do legislador na abstração da norma, bem como do intérprete na construção da norma diante do caso concreto, é notório que esta fase se coaduna com processos hermenêuticos que capacita o operador jurídico à compreensão das motivações e prospecção da experiência jurídica.

Certamente, a Psicologia tem dado provas de sua relevância tanto em fase prévia como pós-legislativa, desde que tenhamos em mente que a sociedade é um complexo de interações funcionais que tanto o direito, como a Psicologia são subcampos da vida social, cujos objetos não se excluem, muito pelo contrário, incluem-se, interagem-se. A vida comportamental do jurisdicionado é reflexo social que, não raro, está na mira dos métodos de pesquisa e terapêuticas codificadas pela Psicologia.

Além disso, não se restringirá o profissional de Psicologia às inúmeras varas de jurisdição, como mero serviço auxiliar à Justiça. É imprescindível que o terapeuta esteja dentro da instituição jurisdicional para trabalhar o material humano e seus sistemas, suas rotinas, suas emoções, seus relacionamentos.

Enfim todas as áreas do Direito demandam a Psicologia do mesmo modo que o Direito regula a vida social, é neste sentido que podemos classificar a psicologia para o direito. Vale ressaltar o que arregimenta Trindade (2007, p.31):

 

Combatida pelos juristas e desacolhida pelos psicólogos, a psicologia do direito teve vôos fugidios, logo abatidos pela especificidade dos fins do direito, como se ela não possuísse nenhuma qualidade ou atributo capaz de cooperar na missão de fazer o direito alcançar a justiça. Sua tarefa não tem a profundidade nem a extensão da filosofia do direito, mas, juntamente com a sociologia do direito, poderia somar esforços no sentido de transformar a justiça, em humaniza-la e aproxima-la dos sentimentos do povo.

Enfim é psicologia jurídica o Prometeu desacorrentado, a qual se utiliza o quadro pintado por David S. Landes, a reflexão de Domenico De Masi, referindo-se a um Prometeu humano, preso a um rochedo, torturado por uma ave que lhe roía o fígado, ao que, posteriormente, é desamarrado e se torna livre para expressar-se. Hodiernamente, a este Prometeu é dada uma segunda liberdade, isto é, depois do corpo, pode finalmente liberar também a alma. De tal sorte que a sociedade industrial permitiu que milhões de pessoas agissem somente com o corpo, mas não lhes abriu espaço para expressar-lhes o pensamento, “a sociedade pós-industrial oferece uma nova liberdade: depois do corpo, liberta a alma” (DE MASI, 2000, p.15).

 

Conclusão

O mito do cocheiro revela um compromisso ético entre a subjetividade do sujeito e externalidade ideal, a saber, os cavalos de raça demandariam um comportamento ideal que poderia ser aquele legislado ou formulado por lei e os cavalos de raça inferior representariam o comportamento real do indivíduo, ao que nesta crise entre o ser real e a ideal, cabe ao cocheiro, cuja vontade ou decisão subjetiva bem representaria o comportaria, determinar o processo decisório na condução de sua própria conduta.

Na existência a pessoa perpassa por quatro dimensões, a saber, a do indivíduo, a da sociedade, a das instituições e do direito. A primeira revela a subjetividade do indivíduo em seu processo de tensão entre seus atos de existência; a segunda assinala o comportamento do indivíduo na experiência, dotado de controles sociais formais e informais, que por sua vez, tem por consequência a terceira dimensão, isto é, o fato de que toda pessoa se insere em categorias ou instituições sociais, que visam à organização da sociedade, no entanto, como as instituições por si mesmas não capazes de resguardar a ordem social, faz-se indispensável, a quarta dimensão, em que o Direito funcionaria como participe na determinação da liberdade das pessoas.

A Psicologia enquanto ciência do comportamento e dos processos mentais é levada à chamada crise o sujeito, de vez que, o reaparecimento do reconhecimento do indivíduo na vida contemporânea conforma as mais diversas concepções entre o ser e o dever-ser, em que o comportamentalismo tem de se destacado pela multiplicidade de saberes interagindo com os diversos domínios dos segmentos sociais, na luta pela paz do ser humano enquanto pessoa integrando ao meio social em que vive.

Desde a filosofia cartesiana até os dias atuais em que o dualismo psicofísico se fez presente e as diversas abordagens comportamentais, a exemplo da Psicanálise, tem se falado em Psicologias e não um só método. Com efeito, procura-se enfrentar a crise do sujeito com a melhor abordagem compatível com a experiência ou a realidade do sujeito às vistas de seu amadurecimento e bom convívio social.

            À luz da teoria de Pontes de Miranda pode-se observar que a ideia do autor é promover um criacionismo do Direito a partir da Psicologia. Com efeito o autor remonta o desenvolvimento psicológico do sujeito até o desenvolvimento coletivo, como se pudesse tratar de uma Psicologia Social. Com isso remonta a doutrina de controles sociais formais e informais, vale dizer, de instituições como a Igreja, a escola, a família até as instituições estatais, neste se enquadraria também o Direito.

            Na sequencia Pontes de Miranda prevê a transformação da regra social à regra jurídica, de tal sorte que os costumes dentro de uma prática da experiência racional é levada a uma interpretação autêntica pelo Legislativo até que se fixa a regra geral, presumidamente legítima. Por último, Pontes de Miranda vê os institutos jurídicos como organismos, vale dizer, nascem, crescem, desenvolvem-se e até morrem com base na evolução do sistema social.

O grande problema entre a Psicologia e o Direito e o fato de classifica-la enquanto ciência auxiliar do Direito, assunto que os comportamentalistas não concordam, haja vista a subordinação da Psicologia ao Direito, vale dizer, uma conformação às práticas injustas das instituições jurídicas, isso é o que Muñoz Sabaté vai denominar de Psicologia para o Direito. Todavia, Psicologia do Direito enquanto epistemologia jurídica e Psicologia no Direito enquanto técnica de aplicação para os profissionais ora do Direito, ora da Psicologia, são bem-vindas às vistas de um futuro promissor entre as duas ciências.

 

REFERÊNCIAS

 

 

DAVIDOFF, Linda L. Introdução à Psicologia. 3a.ed. [trad. Lenike Peres]. São Paulo: Pearson Makron Books, 2006.

 

DE MASI, D. O ócio criativo:entrevista a Maria Serena Palieri. [trad. Léa Manzi]. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.

 

FIGUEIREDO, Luís Cláudio M. Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética das práticas e discursos psicológicos. 4a. ed. São Paulo: Vozes, 2008.

 

______, SANTI, Pedro Luiz Ribeiro. Psicologia: uma (nova) introdução – uma visão histórica da Psicologia como ciência. São Paulo: EDUC, 2007.

 

KUHN, Thomas S.A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva,1997.

 

MIRANDA, Pontes de. À margem do Direito: ensaio de Psicologia jurídica. 2a. ed. São Paulo: Bookseller, 2004.

 

TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia jurídica para operadores do Direito. 2a. ed. rev. ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

 

VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria pura do Direito: Repasse crítico dos seus principais fundamentos. São Paulo: Forense, 2003.

 

 



[1] A relação entre Psicologia e Ética encontra-se no livro IV da República e no mito do cocheiro.

[2] Para Figueiredo (2008, p.112): “[...] na condição de uma disciplina interdisciplinar, a psicologia, aqui representada exemplarmente pela psicanálise, deveria ser capaz de atravessar e ser permanentemente atravessada por outros saberes, o que daria a esta ‘disciplina’ um curioso aspecto, o de ser, para além da interdisciplinaridade constitutiva e da transdisciplinaridade obrigatória, um saber fecundante indisciplinado, ou seja, um saber que pela sua própria natureza está sempre transgredindo os limites da disciplina.”

[3] Para Prado Jr (2000, p.217): “Wittgenstein disse que, no limite, uma disciplina como a psicologia é conceitualmente impensável. Assim, a idéia de uma ‘psicologia literária’ me parece uma idéia simpática: não é ciência, mas através dela se compreendem figuras do espírito ou da vida mental”.

[4] Trindade (2007, p.26) nos fala de uma discussão histórica entre psicologia jurídica e psicologia forense ou judicial, quando aquela trata dos fundamentos psicológicos da justiça e do direito, ao passo que esta aparece como a aplicação dos processos psicológicos à prática do jurista, e foi inaugurada com a psicologia criminal. Por outro lado, a primeira tem sido mais utilizada no universo do direito e a segunda no âmbito da psicologia.

[5] Disserta ainda Trindade (2007, p.22): “O comportamento humano é um objeto de estudo, que pode ser apropriado por vários saberes simultaneamente, em diferentes perspectivas, sem esgotar epistemologicamente. Diversas ciências podem compartir o mesmo objeto material imediato, pois, do ponto de vista finalístico, todos os saberes são obrigatoriamente convergentes na pessoa humana. O fim último de toda ciência é diminuir o sofrimento humano.”

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