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IMPUNIDADE NO SISTEMA PENAL: aspectos extrajudiciais e alopoiese


Autoria:

Wadson Xavier


Graduação em Direito pelo Instituto Vianna Junior, Brasil(2009), advogado militante em Juiz de Fora (MG).

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Resumo:

O tema deste trabalho é a impunidade. Tendo por base a teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann, faz-se uma abordagem sócio-jurídica da desconstrução do sistema penal brasileiro através de fatores externos como a violência, desigualdade...

Texto enviado ao JurisWay em 01/11/2013.



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INTRODUÇÃO

 

             O tema “impunidade” não se trata de nenhuma novidade, seja no meio jurídico ou fora dele, pois como é de conhecimento geral, o assunto é abordado inúmeras vezes e sempre destacado pela imprensa quando um fato ilegal, mormente violento ou corrupto, gera clamor social, ensejando providencias das autoridades e mudanças na legislação penal.

            No entanto, tais providencias, atendidas de alguma forma, não solucionam o problema, quando não apresentam efeitos quase nulos ou até negativos. Aumentando o calhamaço de leis que se sobrepõem no tempo, dificulta-se a interpretação e aplicação das normas pelos operadores do direito, debilitando a segurança jurídica no país.

            Destarte, é evidente que se trata de tema complexo, abordado muitas vezes superficialmente e discutido de maneira pouco embasada. Assim, o debate da impunidade na esfera jurídica é de grande valia, pois somente conhecendo a fundo o inimigo, pode-se atacá-lo, apresentando alternativas cada vez mais eficientes para que o legislador e toda a sociedade possam se aprimorar no combate de tão caro agente destruidor do tecido social.

            Não mais que uma tentativa de clarear a atual escuridão na qual se encontra a matéria, tem o presente estudo, intento de contribuir de maneira humilde na formação do juízo acerca da impunidade, interligando os vários aspectos extrajudiciais que lhe dão forma, em seu aspecto subjetivo, através do fenômeno da alopoiese, ou seja, a desestruturação autonômica da criação, interpretação e aplicação das normas penais e, objetivamente, por meio dos entraves verificados no âmbito extrajudicial que impedem a concreta aplicação da lei.

            Aborda-se de maneira integrada o tema “impunidade”, na maioria das vezes, combatido com medidas isoladas, por meio de mudanças na legislação vigente, contemplando apenas o caráter positivista (judicial), sem pesar, contudo, os aspectos externos que levam a desfiguração/desmantelamento do ordenamento jurídico, tornando-o ineficaz ao atacar a impunidade, por justamente omitir os demais aspectos que levam aos atores sociais a praticar atos ilícitos sem temerem a devida punição.

            Sendo a impunidade tema complexo e passível de análises nas mais diversas áreas do conhecimento, procura-se, na presente pesquisa, delimitar o assunto no campo das ciências sócio-jurídicas, demonstrando como fatores alienígenas se infiltram na aplicação da norma penal, distorcendo os princípios norteadores do Direito Penal, tornando a aplicação da punição - quando concretizada - distorcida em várias formas: eficácia, isonomia, celeridade etc.  

            Existem alguns fatores geradores da impunidade no sistema penal - violência, desigualdade social, falta de cidadania e direitos humanos - que não tratados, geram impunidade. Assim, é de suma importância a abordagem desses temas.

            Não tendo, o presente trabalho, pretensão de esgotar ou concluir a matéria, é a co-relação do acima exposto (apresentadas, aqui, em linhas gerais), o que se pretende abordar.

 


1.      IMPUNIDADE


  1.1.   Conceito de Impunidade


             São escassos no Brasil estudos e pesquisas relacionados ao tema da impunidade no âmbito jurídico. Não obstante o grande material encontrado sobre os problemas da criminalidade, violência, desigualdades sociais, direitos humanos dentre outros – que fazem referência ao tema “impunidade” – são na maioria das vezes abordados separadamente e sem uma fundamentação teórica que permita correlacionar todos aqueles aspectos à impunidade.

            Poucos são os trabalhos dedicados de maneira específica, analítica, ao fenômeno da impunidade correlacionado ao sistema penal, em seus aspectos sociais (extrajurídicos) que afetam diretamente os aspectos legais (judiciais) tão discutidos.

            Segundo afirmação do Desembargador Laércio Laurelli (2000, p. 9), “a impunidade é um tema pouco examinado em nossa literatura jurídica, inexistindo obra específica sobre o assunto”.

            Desta forma, para iniciar a abordagem do tema impunidade, faz-se necessário a definição do termo em estudo, seja no âmbito sociológico, bem como no jurídico. Pois “o uso indiscriminado da palavra impunidade parece estar sofrendo um desgaste em relação ao seu significado” (MESQUITA, 1998, p. 110).

            Genericamente, segundo Bruno Amaral Machado (2006, p. 277), impunidade é

 

a falta de castigo. Do ponto de vista estritamente jurídico, a impunidade pode ser definida como a não aplicação de uma pena a um determinado crime. A definição de determinada prática como criminosa depende, contudo, de fatores complexos.

 

            Emprega-se aqui a definição usada pelo sociólogo Levy Cruz (2002, p.1), segundo este a impunidade

 

é o gozo da liberdade, ou de isenção de outros tipos de pena, por uma determinada pessoa, apesar de haver cometido alguma ação passível de penalidade. É a não aplicação de pena, mas também o não cumprimento, seja qual for o motivo, de pena imposta a alguém que praticou algum delito.

 

            Entende-se que tal conceito, seja aplicável tanto no âmbito jurídico como no sociológico, por seu caráter difuso.

 

 

1.2.   Premissas legais para caracterização da Impunidade

  

            Após definir o conceito de impunidade, faz-se necessário estabelecer as premissas legais (jurídicas) que tipificam o fenômeno.

a)      Ação passível de penalidade: seria determinada conduta ilícita, definida como crime pelo ordenamento jurídico-penal pátrio, respeitado o princípio da anterioridade da lei[1], exigindo algum tipo de sanção penal.

b)      A certeza do delito: do ponto de visto jurídico, exige-se a certeza do cometimento do ilícito penal pelo agente, ou seja, que a existência do fato criminoso tenha sido gerada por determinada pessoa, provada a sua causalidade[2]. Assim, se uma pessoa "parece" culpada e está em liberdade, não se pode dizer que, tecnicamente, ela esteja impune.

c)      O julgamento competente: somente uma Corte habilitada, obedecendo aos procedimentos previstos nos códigos de processo penal, pode determinar a punição do agente[3].

 

            Portanto, se o agente, atendida as premissas acima citadas, não recebe e/ou cumpre a devida pena, estaria configurada a impunidade penal.

 

 

1.3.   Quadro tipológico da impunidade

 

 

Tipo

Situação do suspeito ou do réu

Posição quanto ao processo ou julgamento

Resultado do julgamento

Situação do condenado

1

Infrator

Processo não aberto

X

X

2

Infrator

Não julgado e processo arquivado ou abandonado, sem perspectivas de retomada

X

X

3

Infrator

Julgado

Condenado

Livre

4

Infrator

Julgado

Absolvido

X

5

Não Infrator

Julgado

Absolvido

X

6

Não Infrator

Julgado

Condenado

Cumprindo pena

7

Não Infrator

Julgado

Condenado

Livre

(CRUZ, 2002)

            De acordo com a tabela acima, pode-se observar as diversas situações possíveis que podem configurar a impunidade.

            No tipo 1, tem-se a situação do infrator que por diversos fatores – inexistência de denuncia ou queixa, falta de provas, etc. – não tem o processo aberto.      

No tipo 2, observa-se a situação do infrator não julgado – prescrição do crime, falta de provas, etc. – ou processo arquivado ou abandonado.

No tipo 3, infrator que julgado e condenado, encontra-se livre.

O tipo 4, não configura impunidade no sentindo estritamente jurídico, pois a absolvição foi aplicada, considerando-se que foram observados todos os aspectos do devido processo legal, não eximindo, no entanto, esse tipo a uma analise reflexiva sociológica. Confirma-se isso nas palavras de Machado (p. 279, 2006), que diz:

 

Se o fato passa por todas as instâncias previstas e procedimentos previamente estabelecidos (pelos códigos do direito/não direito), sob o enfoque sistêmico luhmanniano, com importante penetração no direito penal, eventual absolvição não pode ser considerada um caso de impunidade, exatamente porque nesse caso não houve a não-aplicação da pena a um determinado crime. As acusações de julgamento político ou corrupção das esferas de aplicação da lei penal correspondem a negação/corrupção dos códigos do sistema jurídico.

 

            O tipo 5, apesar de não configurar impunidade pelo fato do suspeito ter sido absolvido pois não era o agente criminoso, o verdadeiro infrator encontra-se impune.

            E finalmente os tipos 6 e 7 demonstram casos de não-infratores julgados e condenados que cumprem pena ou permanecem livres, que da mesma forma configurariam a impunidade do infrator não julgado.

            O presente trabalho, abordará, mais especificamente, as causas da impunidade descritas nos tipos 1 a 3, identificando os entraves no âmbito social que obstam a devida aplicação da pena. Todavia, os tipos 5 a 7, por se tratarem de casos de não-infratores, serão abordados, de maneira indireta, a medida que identificarmos as causas (falhas) que deixam os verdadeiros infratores excluídos da apreciação do sistema penal.

 

 

1.4.   Impunidade: do fato ao julgamento

 

 

            O Código Penal Brasileiro, já em seu art. 2º, usa a palavra “fato” como termo técnico, em substituição a palavra crime, sendo justificável, pois nem todo fato típico é culpável e antijurídico. De plano, pode-se excluir a culpabilidade do agente por seu caráter inimputável, assim, ensina Mirabete (2002, p. 213) que

 

excluída a imputabilidade por incapacidade total de entendimento da ilicitude do fato ou de autodeterminação, o autor do fato é absolvido e aplicar-se-á obrigatoriamente a medida de segurança (art. 97, CP). A comprovada inimputabilidade do agente não dispensa o juiz de analisar na sentença a existência ou não do delito apontado na denuncia e os argumentos do acusado quanto a inexistência de tipicidade ou de antijuridicidade. Inexistindo estas, o réu, embora inimputável, deve ser absolvido pela excludente do dolo ou da ilicitude, não se impondo, portanto, medida de segurança.

 

            Já a antijuridicidade, ou ilicitude, pode ser conceituada como a contrariedade da conduta com o ordenamento jurídico. Isto porque tem-se que a antijuridicidade em seu significado literal quer dizer: anti (contrário) juridicidade (qualidade ou caráter de jurídico, conformação ao direito; legalidade, licitude), ou seja, é o que é contrário a norma jurídica.                    Portanto, o conceito de antijuridicidade é mais amplo, não ficando restrito ao direito penal, podendo ser de natureza civil, comercial, administrativa, tributária, etc. Se a conduta do agente ferir um tipo legal, está-se diante de uma antijuridicidade penal.

            No dizer de Rogério Greco (2004, p.34),

 

o conceito de antijuridicidade, limita-se a observar a existência da anterioridade da norma em relação à conduta do agente, e se há contrariedade entre ambas, onde transparece uma natureza meramente formal da ilicitude.

 

            De posse do conceito de antijuridicidade, pode-se apresentar as excludentes de ilicitude (antijuridicidade) presentes no Código Penal Brasileiro, elencadas nos incisos do Art. 23, quais sejam: a) estado de necessidade; b) legítima defesa; c) estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

            Destarte, ocorrendo tais hipóteses, não há falar em crime, e, por conseqüência, em impunidade.

            Determinado o fato, aborda-se agora, de maneira geral (por sua extensão e complexidade), os entraves da persecução penal, já que este trabalho tem por essência, os fatores extrajudiciais.

            Grande parte da impunidade já esta definida nos primeiros momentos do processo, exemplificar-se-á os casos de roubo, onde a policia só toma conhecimento do fato quando a vítima, espontaneamente, comparece a delegacia para relatar o ocorrido. Uma forma de estimar o número real de roubos – e infratores – é a consulta direta aos cidadãos, por meio da chamada “pesquisa de vitimização”.

            Em pesquisa feita na Região Metropolitana do Rio de Janeiro em 1996[4], demonstra-se que nada menos que 80%[5] das vítimas não recorreram à polícia, apenas 20% compareceram a delegacia após a ocorrência. Em casos de furto, apenas 18%, menos ainda em casos de extorsão em geral e extorsão policial: menos de 2% recorreram à polícia.

            Daqueles 20% que recorreram à polícia, em casos de roubo, 7% não fizeram nenhum registro, totalizando 87% dos delitos excluídos da apreciação policial[6], restando, portanto, 13% de ocorrências de roubo registradas com a lavratura de um boletim de ocorrência (BO). (CARNEIRO, 1999)

            No que diz respeito a estes crimes, identifica-se aí o primeiro grande “filtro” inicial que caracteriza o fenômeno da impunidade.

            Trata-se, em grande número, de crimes de menos potencial ofensivo, ou seja, crimes em que a pena máxima cominada não é superior a dois anos de detenção[7].

            Não obstante, serem estes crimes de menor potencial ofensivo, “argumenta-se que o que desestimula o infrator a delinqüir é menos a gravidade da pena do que a certeza de sua aplicação” (MACHADO, 2006, p. 279), estimulando assim as práticas ilícitas.

            Em estudos de casos de homicídio de crianças e adolescentes, Myriam Mesquita (1998, p. 131) constatou que

 

o promotor de justiça fez a denúncia de 27,5% dos indiciados; o juiz fez a pronúncia de 9,31% dos réus; depois de quatro anos e meio da ocorrência do delito, 6,06% foram a júri na primeira instancia; destes, 3,3% dos réus foram condenados e 2,76% absolvidos; entre os réus condenados, 2,75% entraram com recurso; destes, em segunda instância, 1,03% foram absolvidos; portanto, no final, houve a condenação de 1,72% dos réus.

 

            José Reinaldo Lopes (2000, p. 77) apresenta o mesmo filtro com dados de homicídios contra crianças e sobre crimes financeiros, vê-se que:

 

Dos crimes financeiros (previstos na Lei n. 7.492/86) inicialmente descobertos pelo Banco Central do Brasil e encaminhados ao Ministério Público, somente 3,9% chegam a condenação. Estudo feito pela Comissão de Justiça e Paz de São Paulo em 1993 mostrou que apenas 20% dos réus de homicídio contra crianças eram condenados.

 

            Pode-se observar, com as pesquisas apresentadas, que grande parte da impunidade já esta definida nos primeiros momentos após o delito, continuando a ocorrer nas etapas da persecução penal (do inquérito ao julgamento).

            Apresenta-se neste trabalho, os entraves extrajudiciais (sociológicos), tendo por base a “teoria dos sistemas” de Niklas Luhmann e seu conceito de autopoiese aplicada às ciências sociais, especificamente o Direito. Sem pretensão de esgotar o tema, permiti-se aqui, apenas elaborar um estudo sócio-jurídico do fenômeno da impunidade que tanto obsta a aplicação da Justiça Penal.

 

 

2.      TEORIA DOS SISTEMAS DE NIKLAS LUHMANN

 

 

            Influenciado pela Teoria Estruturalista-Funcionalista[8] de Talcott Parsons[9], de quem foi aluno, Niklas Luhmann traça todo o instrumental que caracteriza, de forma bastante abrangente e complexa, a estrutura, na qual o Sistema do Direito é constituído, com a função de reduzir a complexidade apresentada pela sociedade, através da generalização de expectativas normativas com vistas a manter o sistema estável.

            A partir dos anos 80, dois biólogos chilenos, Humberto Maturana e Francisco Varela, revolucionaram as ciências biológicas com sua Teoria Autopoiética[10]. Estes autores buscavam a resposta para um problema histórico da ciência e filosofia: o da vida.

            Através de pesquisas neurofisiológicas, os biólogos descobriram que um sistema vivo apresenta em seu circuito interno uma interação fechada de seus elementos constituintes, possibilitando sua auto-organização e a auto-produção dos mesmos elementos que constituem este sistema.

            Tais circunstâncias acarretam em uma autonomia, sem que haja inter-relações diretas com os demais sistemas. A partir de uma diferenciação (peculiar ao sistema), obtem-se a idéia de identidade/não identidade que estabelece os limites entre sistema e seu ambiente (o que está fora do sistema).      

            Entretanto, o sistema interage com seu ambiente, mantendo um processo de acoplamento, através de uma espécie de decodificação das irritações causadas pelo ambiente, efetuadas mediante a utilização de suas próprias interações internas, circularmente organizadas em resposta aos ruídos externos (order from noise) e operacionalmente fechado. (NEVES, 1992)

            Niklas Luhmann foi quem trouxe e possibilitou a utilização dessa teoria, proveniente das ciências biológicas para as ciências sociais. Para tanto foram necessárias algumas rupturas com a autopoiésis biológica, com escopo de adequar essa teoria a uma realidade dos fenômenos sociais.

            Em primeiro plano, foi necessário conceber o sistema biológico autonomamente do sistema social (dentro do qual se encontram sistemas parciais, como o do Direito, da Política, da Economia). O sistema biológico tem como elemento constitutivo e base reprodutiva a vida, enquanto que o sistema social não é um mero bio-sistema de segundo grau, mas sim um sistema, no qual a base reprodutiva é a comunicação (Sistema Noético), pois, segundo Luhmann (1983, p. 45):

 

O homem vive num mundo constituído sensorialmente, mundo este que apresenta ao ser humano uma multiplicidade de possibilidades de experiências e ações, o que contrapõem-se ao seu limitado potencial perceptivo, de assimilação de informações e ação atual e consciente.

 

            Assim, “cada experiência concreta apresenta um conteúdo evidente que remete as outras possibilidades que são os mesmo tempo complexas[11] e contingentes[12]“. (LUHMANN, 1983, p. 45)

            A partir daí, sistemas internos ao sistema social vão se autonomizando, em comunicações especificas, ante uma codificação binária.

 

 

2.1.   O sistema autopoiético aplicado ao Direito

 

 

            O Direito mantém uma interdependência com a sociedade. Entretanto, devido ao seu poder de auto-produção aquele é autônomo em relação a esta.

Na definição de Luhmann (1989, p. 143):

 

A expressão autopoiesis refere-se àqueles sistemas que produzem todos seus componentes elementares, os quais surgem por meio de uma cadeia destes mesmos elementos e desta maneira, distinguem-se do meio envolvente – seja com a forma de vida, consciência ou (no caso dos sistemas sociais) comunicação. Autopoiesis, sobretudo, é o modo de reprodução destes sistemas.

 

            No caso do (sistema) Direito, diz Luhmann que, sendo autopoiético, prevalece o código de preferência licito/ilícito como condição de sua auto-referencia sistêmica.

            Conforme Guinter Teubner (1989), a auto-referência é a “característica visceral” do Direito Pós-Moderno e sua abordagem faz-se essencial para um entendimento do Direito como um sistema autopoiético. Referência é a designação proveniente de uma distinção e a peculiaridade do prefixo “auto” reside no fato de que a operação de referência resulta naquilo que designa a si próprio.

            Para Luhmann (1989, p. 143), a expressão auto-referência

 

designa toda operação que se refere a algo fora de si mesmo e que, através disto, volta a si. A pura auto-referência, a qual não toma o desvio do que lhe é externo, equivaleria a uma tautologia. Operações reais ou sistemas reais dependem de um ‘desdobramento’ ou destautologização desta tautologia, pois somente então, estas poderão compreender que são somente possíveis em um ambiente real de uma maneira limitada, não arbitrária.

 

            Daí, conclui-se que os valores e motivações, ainda que das mais diversas, da política legislativa e da atividade jurisdicional buscam suas fontes nos próprios princípios norteadores da e para a criação, interpretação e aplicação jurídicas. O que se quer dizer com isto é que a identidade operacional e a autonomia funcional do sistema jurídico, requisitos básicos deste, são sustentadas por aquele código binário, formando o que se pode chamar do núcleo ou cerne da autopoiese do Direito.

 

 

2.2.   O fenômeno da alopoiese no Direito Penal

 

 

            De posse do significado da autopoiese no Sistema Jurídico, conceituar-se-á sua antípoda, a alopoiese, que servirá de base para demonstrar os aspectos que circundam e destroem a independência autônoma do Direito Penal.

            Derivada do grego alo (outro, estranho, diferente) e poieses (criação, produção), a palavra, segundo Marcelo Neves (2000, p. 287),

 

designa a (re)produção do sistema por critérios e códigos do seu meio-ambiente. O respectivo sistema perde em significado a diferença entre sistema e meio-ambiente, sendo incompatível (...) com a própria noção de referência ao meio-ambiente (...).

 

            Afirmando que um sistema alopoiético caracteriza-se da

 

confusão de códigos jurídicos construídos e aplicados difusamente, como também do intrincamento destes com os códigos do poder, da economia, familiar, da amizade, como também daquilo que os alemães chamam de ‘boas relações’.

 

            Assim, esta definição da alopoiese, dará o enfoque a presente monografia, tanto no contexto sociológico como no jurídico, onde se observa: o surgimento de esferas “alternativas” ao Direito Penal estatal; a criação de subsistemas normativo-penais por parte daqueles que tem seu acesso negado à justiça; a interferência direta de fatores sociais particularistas e bloqueantes, através de outros sistemas sociais (política, economia) que interferem na independência (auto-referência) do sistema jurídico pátrio.

            A identidade sistêmica do Direito Penal (autopoiese) desconstrói-se pela assimilação de interesses diversos ou pela exclusão de grande parcela da população que não está integrada a democracia real, ou seja, não lhes são dadas condições de exercer seus direitos fundamentais[13], configurando a chamada subcidadania[14].

            Antoine Garapón (1996 apud MACHADO, 2006), alerta para

 

os riscos da assim chamada jurisprudência midiática, em clara alusão ao poder da mídia em rotular determinadas práticas, antecipando-se ao Judiciário ou mesmo substituindo-o na apreciação dos fatos.

 

            Destarte, a alopoiese jurídica pode ser afirmada quando se constata uma influência direta dos demais subsistemas sociais no subsistema jurídico. Não se trata do acoplamento necessário que deve haver entre os sistemas (abertura cognitiva), mas sim uma ingerência na autonomia operacional do Direito.

 

Não se trata de bloqueios eventuais da reprodução autopoiética do Direito positivo, superáveis através de mecanismos imunizatórios complementares do próprio sistema jurídico. O problema implica o comprometimento generalizado da autonomia operacional do Direito. Diluem-se mesmo as próprias fronteiras entre sistema jurídico e meio ambiente, inclusive no que se refere a um pretenso Direito extra-estatal socialmente difuso (NEVES apud HONESKO, 1994, p. 129).

 

            No próximo capítulo, serão abordados os entraves extrajudiciais que influem na falência do Sistema Penal Brasileiro – desconstrução do código binário luhmanniano “lícito/ilícito” – e conseqüentemente são fatores potencializadores do fenômeno da impunidade.

 

 

3.      ENTRAVES EXTRAJUDICIAIS DO SISTEMA PENAL BRASILEIRO

 

 

3.1.   Raízes da impunidade (Colônia e Império)

 

 

            Faz-se aqui um breve histórico sobre a impunidade no Brasil nos períodos coloniais e imperial. Com objetivo de demonstrar que o fenômeno alopoiético do sistema penal não é recente, tão pouco exclusivo do sistema jurídico brasileiro ou dos países subdesenvolvidos, mas sim um fenômeno que atinge qualquer sistema cujo código binário luhmanniano (licito/ilícito) é fundido a outros sistemas sociais.

            Exemplifica-se que tal intricamento de códigos ocorria com extrema freqüência pela falta de efetividade das punições criminais no período pré-republicano, não obstante a severidade extrema das Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas, Filipinas) em sua parte penal, vigentes aqui até 1830.

            A pena de morte, por exemplo, era estabelecida para a maioria das infrações penais. Como lembra António Hespanha[15]: “conta-se que Frederico o Grande, da Prússia, ao ler o Livro V das Ordenações, no século XVII, teria perguntando se em Portugal havia gente viva”.

            Porém, ressalta Hespanha, que o direito penal no Antigo Regime, em termos de punição efetiva, era praticamente ausente. A falta de efetividade[16] se dava por vários fatores, a começar pelos “conflitos de competência”, que prolongavam infinitamente os processos até questões de natureza prática, como a deficiência logística e a incapacidade de controle, por exemplo, do cumprimento da pena de degredo no ultramar. O historiador sustenta que até a pena de morte, de aplicação momentânea, era, estatisticamente, muito pouco utilizada em Portugal. (CARVALHO FILHO, 2004).

            Outro aspecto importante da não-efetividade do direito penal escrito no período era o caráter massivo da política de perdão[17], decorrente de necessidades conjunturais – como o esvaziamento de cárceres – e da própria legitimação ideológica do poder real.

            O degredo para o Brasil, depois estabelecido formalmente como pena criminal e aplicada em escala importante pelos tribunais civis de Portugal era medida severa.

            No período em que o território brasileiro foi divido em capitanias hereditárias os governadores e seus ouvidores dispunham do poder de julgar escravos, o “gentio”, “peões e cristãos e homens livres”, até em caso de “morte natural”, mas a necessidade do povoar era imperiosa.

            A instalação do governo-geral, em 1549, revogou, em parte, o poder judicial racionado entre os donatários. Com a fixação de uma autoridade suprema, Tomé de Souza, seu corregedor, pôde ingressar nas diversas capitanias e, assim, distribuir justiça. Capistrano de Abreu (1976, p. 45) explica que “estando as capitanias na condição de estados estrangeiros relativamente às outras, impossibilitava-se qualquer ação coletiva: os crimes proliferavam na impunidade, a pirataria surgia como função normal”.

            O projeto era estabelecer na colônia uma organização mais vigorosa, centralizada, “forte bastante para garantir a ordem interna”.

            Os relatos da administração Tomé de Souza indicam que ele exerceu o poder de punir conforme as conveniências do momento. Ainda no ano da fundação de Salvador, morto um colono por um índio e exigida a entrega do “criminoso”, este, por ordem do governador-geral, foi amarrado à boca de um canhão e atirado “pelos ares, desfeito em pedaços”. O simbolismo do ato seria captado por Robert Southey (1981, p. 169): “Mais humano para o padecente, mais terrível para os espectadores, não há suplício imaginável. Encheu de terror os Tupinambás e foi útil lição aos colonos(...)”.

            Porém, para dois franceses presos no sul do país, em 1550, por contrabando de pau brasil – atividade que a Coroa considerava intolerável –, o futuro seria diferente. Em carta ao rei, Tomé de Souza se justificaria depois: “Não os mandei enforcar porque tenho necessidade de gente que não me custe dinheiro”, ressaltando, no entanto, que “daqui por diante se fará o que Vossa Alteza mandar”. O ferreiro, “hábil homem”, fazia “bestas e espingardas e todas as armas”, e o outro, que era “língua”, ficou “aferrolhado” a um “bergantim” (MAGALHÃES, 1999, p. 15).

            A partir do exame da aplicação formal da pena de morte, para crimes comuns (em contraposição a delitos militares, políticos e religiosos), é possível verificar a não-efetividade do direito penal no Brasil, tal como escrito nas leis.

            Com a efetiva instalação do Tribunal da Relação na Bahia, no século XVII, essa perda de poder e de efetividade punitiva seria ainda mais acentuada – seja pela distância entre o local do crime e o local da punição (Salvador), seja pelas delongas burocráticas. Em 1616, um alvará reduziu para dois, excepcionalmente, o número de votos necessários para a confirmação das sentenças de morte na Relação: é que, desfalcado o tribunal, os réus permaneciam longos períodos nas cadeias à espera do veredicto.

            Havia também uma aparente insegurança institucional. A Coroa foi consultada sobre a condenação à pena de morte, pelo Tribunal da Relação, de dois franceses e de dois ingleses, presos em Ilha Grande, capitania do Rio de Janeiro, por tráfico de pau brasil.

            A resposta (1614) foi um inequívoco puxão de orelha nos magistrados, por “haverem dilatado a execução”. Lisboa ordenou “que para o diante se não faça mais”, mas, paradoxalmente, comutou a pena de morte dos quatro estrangeiros “em degredo para sempre nas galés” (CARRILO, 1997, p. 329). A impossibilidade de aplicação da pena de morte nas próprias capitanias incomodava as autoridades locais e era considerada fator de incentivo à criminalidade.

            O processo de colonização do Brasil permitiu que, sobretudo nos centros políticos periféricos, se formassem núcleos de mandonismo e redes de proteção que, na prática, inviabilizavam a aplicação da lei penal. Frei Vicente de Salvador relata as dificuldades encontradas pelo quarto governador-geral, Luis de Brito, para efetuar a prisão (ordenada pelo rei de Portugal) de um homem, “aliás honrado e rico”, mas que “era cruel em alguns castigos que dava a seus servos fossem brancos ou negros”, protegido pelo bispo D. Antônio Barreiros (SOUTHEY, 1981, p. 183).

            Três séculos depois, Nabuco de Araújo, ministro da Justiça do imperador Pedro II (1853-1857) estaria empenhado em uma autêntica cruzada contra o poder paralelo profundamente enraizado, disparando cartas aos presidentes das províncias, ora reclamando de um crime de morte praticado por uma “famigerada família” da Paraíba e da “indiferença da autoridade”, ora incentivando os sinais de “energia” com que se perseguia o crime em Alagoas, ora orientando-os a não terem escrúpulos de algum excesso que pudessem cometer.

            Seu biógrafo e filho, Joaquim Nabuco (1997, p. 323), registra:

 

A indiferença da população diante dos crimes mais atrozes, a convivência de todos com criminosos de morte, o sistema de vingança, o bárbaro feudalismo, que transforma o morador em “capanga” ou em “espoleta” do potentado local, colocavam a sociedade em muitos pontos do interior em uma espécie de estado de sítio permanente. Nabuco por vezes esboçara na Câmara esse quadro de impunidade, a sobranceira das influências que se encastelavam nas suas propriedades e desafiavam a justiça que lá não ousava penetrar.

 

            Durante o Império, são editados no Brasil o Código Criminal (1830) e o Código de Processo Criminal (1832).

Quanto ao primeiro, pode-se observar, partindo da análise feita por Carneiro Campos (apud LEAL, 1922, p. 1.143), que:

 

O Código antigo era monstruoso, era cruel, era inexeqüível, e por essa razão é que muitas vezes os criminosos ficam impunes. [...] Eu estive na Relação, vi muitas vezes que em regra era "morra por ele" e nós nos lançávamos, portanto, num sistema oposto de que resultava uma espécie de arbitrariedade nos juízes.

 

 

            Assim, para evitar a crueldade da lei, recorriam os juízes, a expedientes constantes para não aplicar tais penas.

Não fosse o paradoxo da escravidão, da pena de açoite, poder-se-ia dizer que adotamos um regime punitivo tecnicamente liberal. A incidência da pena de morte foi drasticamente reduzida (apenas para casos de homicídio, latrocínio e rebelião de escravos), as execuções passaram a ser realizadas de forma austera, sem o espetáculo da mutilação e da exposição do cadáver, com os julgamentos se efetivando por um conselho de jurados formado por doze cidadãos, todos “eleitores” (o que, na época, significava dispor de poder econômico) e de “reconhecido bom senso e probidade”.

            Aliás, os argumentos para a manutenção da pena de morte no Código Criminal do Império, após intenso debate político, foi a própria escravidão e a necessidade de produzir exemplos. O pronunciamento de Paula e Souza (apud RIBEIRO, 2000, p. 123) na Assembléia Legislativa é revelador:

 

Quem duvida que tendo o Brasil três milhões de gente livre, incluídos ambos os sexos e todas as idades, este número não chegue para arrostar dois milhões de escravos, todos ou quase todos capazes de pegarem em armas! Quem, senão o temor da morte, fará conter essa gente imoral nos seus limites? A experiência tem mostrado que toda vez que há execuções em qualquer lugar do Brasil, os assassinos e outros crimes cessam, e que ao contrário, se se passam alguns anos sem execuções públicas, os malfeitores fazem desatinos e cometem todo o gênero de atrocidades. Daqui se vê que essa pena é eficacíssima.

 

            Observa-se que, castigo existia, sobretudo para índios, escravos e peões. O pelourinho, símbolo da justiça, era monumento obrigatório nas vilas e muita gente permaneceu presa, indefinidamente, à espera de julgamento, em uma época em que a prisão, especificamente, não existia na lei como pena.

 

 

3.2.   Desigualdade social: a ausência da cidadania

 

 

            Para que o sistema jurídico-penal funcione de maneira autopoiética, deverá existir como pressuposto, uma inter-relação entre os sistemas sociais, ou seja, que todos estejam incluídos, dando-se tratamento igualitário a todos aqueles a quem a norma jurídica é dirigida, garantindo o acesso a todos os direitos inerentes ao cidadão.

            Assim, poderão ser-lhes cobrados também os deveres inerentes ao convívio social. O iluminista francês, Jean-Jacques Rousseau (2003), em sua famigerada obra, esclarece que o contrato social somente será efetivo quando houver uma condição de igualdade para todos.

            A cláusula principal, ou então, a primeira condição do contrato é a igualdade: “alienação total de cada associado, com todos os seus direitos, a toda a comunidade” (ROUSSEAU, 2003, p.21), porque somente assim, a partir do momento que cada indivíduo doa-se por inteiro, é que “a condição é igual para todos, e, sendo a condição igual para todos, ninguém tem interesse em torná-la onerosa para os demais” (ROUSSEAU, 2003, p. 21).

            Dessa forma torna-se possível constituir o sistema social, ou seja, o estado social é possível quando há uma igualdade de fato, não apenas aparente e ilusória, quando “todos têm alguma coisa e nenhum tem demais” (ROUSSEAU, 2003, p.30), por que “podendo ser desiguais em força ou talento, todos se tornam iguais por convenção e de direito” (ROUSSEAU, 2003, p.30).

            Portanto, “a lei e autoridade são elementos de garantia ou estímulo a confiança recíproca. Eles devem representar o ponto de vista do cidadão, não do indivíduo (como queria Rousseau)” (LOPES, 2000, p. 83).

            Todavia, grande parcela da população brasileira é constituída basicamente por subcidadãos, ou seja, aqueles que apesar de terem de cumprir com as obrigações e deveres que o Direito (especialmente o criminal) lhes impõe, estão impedidos de exercerem seus direitos fundamentais constantes de nossa Carta Magna vigente.

            Vê-se então que o conceito de cidadania, segundo De Plácido e Silva (1980, p. 335) está intimamente vinculado a titularidade de direitos:

 

Cidadania é expressão que identifica a qualidade da pessoa que, estando na posse de plena capacidade civil, também se encontra investida no uso e gozo de seus direitos políticos, que se indicam, pois, o gozo dessa cidadania.

 

            Pode-se entender também cidadania como "a inclusão de toda a população no acesso/dependência aos seus benefícios, vantagens e regras” (LUHMANN apud NEVES, 1992, p. 85). Já o conceito de Habermas (apud NEVES, 1992, p. 85) diz que “cidadania implica autonomia privada (direitos humanos) em conexão com autonomia pública (soberania popular)”.

            Daí, pode-se concluir que a cidadania só é completa quando existe a concretização das normas constitucionais referentes aos direitos fundamentais (individuais e coletivos), englobando os direitos civis, políticos e sociais, tendo na igualdade o pressuposto inerente à aplicação da Justiça Penal.

            Neste sentido, é indispensável garantir as liberdades civis, como nos esclarece Oliveira Vianna (1987, p. 150):

 

Garantir a liberdade civil ao povo-massa: eis o problema central da organização democrática no Brasil. (...) Esquecemo-nos de que jamais poderemos realizar essa regeneração da nossa vida política com que sonhamos sem termos garantido, previamente, aos cidadãos do povo-massa estas liberdades da vida privada. E o aspecto mais urgente desse problema é assegurar estas liberdades contra o arbítrio das autoridades públicas — principalmente as autoridades locais.

 

            Faltando o referido pressuposto, fica prejudicada a autonomia do sistema jurídico penal pátrio, já que grande parcela dos destinatários de suas normas não está habilitada, de forma integral, a exercer sua cidadania. Porquanto, sobre a ótica do sistema luhmanniano, o código binário – sistema penal (lícito/ilícito) – é desconstruído pela falta de capacidade do Estado, efetivamente, Democrático e Social de Direito em concretizar a cidadania de todos (o que implica autopoiese em todos os sistemas sociais e no sistema jurídico-penal estatal). Pois, como afirma Neves (1992, p. 77), “A realização da cidadania pressupõe autonomia do sistema jurídico”.

            Perde, assim, o Direito Penal e Processual Penal sua auto-referência, pois a idéia de autonomia/identidade do Direito deve vincular-se à democracia real. (HABERMAS apud NEVES, 1995, p. 16)

            São esclarecedoras as palavras de Guilherme da Rocha Ramos (2000, p. 3), em trabalho sobre o tema:

 

O sistema jurídico-penal brasileiro, em decorrência da sua alopoiese, vai perdendo, faticamente, forças para as influências diretas dos critérios econômicos e políticos, porquanto o texto constitucional perde o seu significado normativo generalizado, incapacitado de deter o avanço daqueles critérios, faltando-lhe a corroboração pragmática dos seus dispositivos.

 

            Revela-se claro, que a Lei Maior, no que tange aos direitos fundamentais, pilares da cidadania, exercem uma função meramente político-simbólica, deixando de concretizar-se em sua função jurídico-normativa. 

            O sistema jurídico-penal apresenta um elevado grau de legalismo, que não deve ser confundido com legalidade (generalização igualitária da lei), pois o legalismo

 

asfixia a autonomia operacional do sistema penal nacional, pois impõe aos subcidadãos os deveres a serem cumpridos, mas, concomitantemente, nega-lhes o acesso aos direitos "garantidos" constitucional e legalmente. A insensibilidade discriminatória legalista funciona, assim, como intolerância jurídica mantenedora da "exclusão" social dos subcidadãos, haja vista a evidência de tal alogia dejuridicizante. A Constituição Federal, bem como as legislações penal e processual penal, então, parece serem pragmatizadas apenas quando e porque interesses de grupos privilegiados não são comprometidos (RAMOS, 2000, p. 4).

 

            Assim, os subcidadãos se vêem inseridos na rigidez do sistema penal (licito/ilícito), porém, são lhes negadas a participação efetiva (cidadania) no sistema socioeconômico (ter/não ter, poder/não poder).

            Criam-se, desta forma, subsistemas - estranhos aos sistemas autopoiéticos - tanto para os subcidadãos, como para aqueles que detêm a cidadania plena (subsistema de privilégios), pois “os privilégios da impunidade implicam a própria quebra da autonomia/identidade da esfera jurídica por bloqueios políticos particularistas, econômicos e ‘relacionais’” (NEVES, 1995, p. 10).

            Não existe, portanto, uma luta generalizada ao combate a impunidade por toda a sociedade brasileira, mas sim por determinados grupos (os que exercem a cidadania completa – sobrecidadãos) que exigem do Estado efetiva repressão a violência gerada pelo “delinqüente” (os que não exercem a cidadania – subcidadão) ofensores do pretenso ordenamento jurídico igualitário e autopoiético.

            Como bem define Levy Cruz (2002, p. 4):

 

A sede de justiça não é generalizada; quer dizer, quem reclama punição não a deseja para todos os criminosos e contraventores ou para todos os tipos de contravenção ou crime. Em geral, pede-se punição para pessoas e conjuntos específicos e para determinados crimes em determinados momentos.

 

Certas condutas criminalizadas não geram sensação de impunidade, por serem socialmente aceitas, quebrando novamente o código lícito/ilícito por outros interesses particulares de subgrupos que detém o poder. São novamente esclarecedoras as palavras de Luhmann (1994, p. 3-4):

 

Através da aceitação de um código binário (jurídico/antijurídico), o sistema obriga a si próprio a essa bifurcação, e somente reconhece as operações como pertencentes ao sistema, se elas obedecem a esta lei. (...) Se os sistemas se baseiam em uma diferença codificada (verdadeiro/falso, jurídico/antijurídico, ter/não ter), toda a auto-referência teria lugar dentro destes códigos. Opera dentro deles como relação de negação, que excepciona terceiras possibilidades e contradições.

 

            O que de fato não ocorre em nosso ordenamento penal, são exemplos disso: o jogo do bicho, o contrabando, a pirataria de produtos, a sonegação tributária, dentre outras; combatidas de forma precária, pois de algum modo são praticadas de forma generalizada pela sociedade, tornando-se condutas comuns, apesar de todos saberem que representam infração a lei.

            A impunidade que é, na maioria das vezes, abordada pela mídia (jornais, revistas, televisão, etc.) é aquela que atinge alguns de seus membros (classe econômica privilegiada – sobrecidadãos).

            Neste sentido, reveladoras são as palavras do antropólogo Gilberto Velho (1991, p.25):

 

 As nossas "boas pessoas", de um modo geral, só são acudidas quando ocorre uma tragédia dentro de seu limitado in-group. É fascinante em termos sociológicos e chocante em termos éticos ver pessoas se deslocando dentro de uma sociedade injusta e violenta, anestesiadas diante da miséria, sofrimento e violência que afligem permanentemente os out-groups, no caso, a maioria esmagadora da população. [...] A maioria só se abala quando um parente ou uma pessoa muito próxima vai para o campo de concentração ou é seqüestrada, presa, torturada e/ou assassinada.

 

Conclui-se, assim, que a desigualdade social e a falta de cidadania são fatores determinantes para a desconstrução do sistema jurídico penal (alopoiese), perdendo sua auto-referência e circularidade (autopoiese), confundindo-se, ao sofrer interferências, aos códigos do sistema social fragmentado.

 

3.3.   Violência e Direitos Humanos no Brasil

 

            Inicia-se o capítulo apresentando um dado importante para prosseguirmos o tema, e que de fato parece resumir os entraves da violência e dos direitos humanos em apenas algumas linhas:

 

Recentemente, a Human Rights Watch (2006) fez duras críticas ao país. Segundo a ONG, em relatório apresentado em janeiro deste ano, os defensores dos direitos humanos no Brasil sofrem ameaças, a polícia é abusiva e as condições das prisões muito ruins. (MACHADO, p. 277, 2006).

 

            No Brasil, apesar de existir um consenso sobre a definição de Direitos Humanos[18], observamos a consolidação de práticas policiais de tortura e repressão violenta, principalmente após o golpe militar de 1964 e agravada pelo AI-5[19] com a supressão das liberdades políticas e o fechamento do Congresso Nacional.

            Para que haja um efetivo combate a impunidade, faz-se necessário o respeito e a concreta aplicação dos Direitos Humanos para todos, pois

 

a impunidade não se reduz a uma questão empírica ou da eficácia da lei: é reveladora de uma atitude moral. A desimportância atribuída à autonomia das pessoas procede de concepções autoritárias ou paternalistas e resulta que instituições liberais não conseguem se impor na sociedade brasileira. (LOPES, 2000, p. 77).

 

            Assim, grande parte da população brasileira, precisa ser conscientizada (através da inclusão social, cidadania) a respeito da importância dos Direitos Humanos, para, só depois, torná-los efetivos. Pois existem, formalmente, recursos para a defesa dos direitos fundamentais da pessoa, tanto pelas declarações, como a da ONU, como no plano institucional interno, através dos direitos fundamentais constitucionais.

            Como já foi tratada a questão da cidadania no item anterior - que seria a forma de colocar a disposição das vítimas de violação dos direitos humanos, recursos para cobrar das instituições uma efetiva aplicação da lei - aqui se faz uma argumentação de como o desrespeito aos direitos humanos vem desconstruindo a legitimidade das instituições, como a polícia, que usando da violência para combater a impunidade torna-se arbitrária e deslegitimada frente a esta população que não vê reconhecido seus direitos humanos, pois os infratores da lei penal não seriam dignos de nenhum direito, e sim repelidos da sociedade de forma violenta, como se a violência daqueles justifica-se a do Estado, como uma vingança legitima que é devida à criminalidade, tanto é verdade que:

 

Para uma parte da população, os violadores de direitos humanos não são, propriamente, criminosos. Espancar, torturar, violentar, desde que se faça com alguém que “mereça” isto, não constitui propriamente crime ou violência. Não são poucos os que querem um Estado vingador, capaz de fazer, por meio de seu braço armado, mais especificamente a polícia, uma espécie de justiça imediata e pelas próprias mãos. O Estado, pela polícia, faria as vezes da vítima e da legítima defesa. Esta noção tem algo de senso comum e não admira que seja, afinal de contas, tão popular. (LOPES, 2000, p. 79).

 

            Isto acontece devido à falta de distinção entre o poder de punir do Estado de Direito (jus puniendi) e a simples vingança social, amplamente aceita devido à nossa tradição autoritária anteriormente referida e a falta de cidadania de grande parte da população. Fazendo com que o Direito Penal perca seu caráter de universalidade e objetividade, não se estendendo de maneira geral e a qualquer um que se encontre sob o sistema jurídico, já que não são todos merecedores do mesmo tratamento perante a lei.

            Tem-se a impressão de seletividade da justiça penal, pois sendo incapaz de fazer justiça universalmente, o conjunto dos cidadãos não pode perceber com clareza e rapidez que só se faz justiça conforme a lei, desencadeando um processo de descrença nas instituições (justiça penal), legitimando as autoridades (policiais) a agirem à margem da lei. Formando na opinião pública, o conceito de que o aumento da violência é fruto de pouca repressão da policia.

            De acordo com a exposição de Lima Lopes (2000, p. 80):

 

O equívoco da posição de quem afinal termina aceitando uma polícia mais violenta está em que boa parte da impunidade, cuja cura se deseja, tem sido o resultado não da aplicação da lei, mas da incapacidade do Estado de aplicá-la. Para ser bem resumido: a sociedade brasileira, nos seus 176 anos de história institucional independente, tem sido incapaz de fazer aquilo que o Estado liberal mínimo prometeu, ou seja, aplicar universalmente a lei. Para esta incapacidade, o discurso contrário à defesa dos direitos humanos propõe indiretamente a abolição da lei. Ou melhor, propõe que alguns devem estar acima da lei, para poder disciplinar a sociedade.

 

            Resta claro que estamos diante de um legítimo fenômeno alopoiético do Direito, pois o Estado, segundo a lei, pode exercer a violência de modo controlado, com o propósito de garantir a igual liberdade de todos, devendo agir de maneira imparcial. Os órgãos estatais não podem ser movidos por sentimentos individuais ou seletivos, sendo crucial o respeito aos direitos humanos, pois o ponto de vista do Estado é garantir a defesa do cidadão, podendo puni-lo nos limites da lei, impondo perdas de direitos, não podendo insultá-lo, mesmo o criminoso, nem aviltá-lo física ou moralmente. O Estado não deve ser um vingador de indivíduos, mas sim um garantidor de igualdades.

            Dessa forma, “quando os movimentos de defesa dos direitos humanos insistem na punição dos violadores de direitos fundamentais da pessoa humana estão reafirmando o poder do Estado em fazer valer universalmente a lei” (LOPES, 2000, p. 81).

            A violação aos direitos humanos está mais presente nas sociedades desiguais e estratificadas, isto se dá porque o violador tem uma posição de superioridade em relação a vitima, seja esta social, política ou econômica.

            A impunidade de um crime de violação de direitos humanos é mais gravosa do que aquela do criminoso comum, pois se trata de um crime qualificado, cometido contra um conjunto de pessoas por pertencerem a determinado grupo (social, político, econômico), também qualificado pelo autor (investido de autoridade, grupos de extermínio etc.).

            Novamente, socorrem as palavras de Lima Lopes a respeito da impunidade em relação aos direitos humanos:

 

(...) ela é um forte estimulante ao desrespeito à lei. E o desrespeito à lei, numa sociedade complexa profundamente dividida em classes e grupos de interesse, tende a gerar o aumento da violência. Da parte das vítimas de crimes comuns, pode gerar demandas de mais violência pela polícia ou de maior apoio a grupos de vigilantes e justiceiros. Da parte dos delinqüentes, a inexistência de proporção entre delitos e pena generaliza-se em maior violência. (LOPES, p. 82, 2000).

 

            Destarte, além daqueles fatores que influenciam na desconstrução do sistema penal (alopoiese), são agravados pelo fracasso da autoridade pública, que violando os direitos humanos, estimulam o comportamento social predatório, gerando mais impunidade, corrupção e violência. Pois se os cidadãos não se respeitam entre si, não se reconhecendo como pertencentes a um mesmo grupo social, não são merecedores dos mesmos direitos, daí surge a discriminação na aplicação da lei, a criação de grupos impunes, resulta em uma forma de opressão de parte do povo por outra (MILL, 1974).

            Se o Estado é ineficaz, a população mais abastada (sobrecidadãos) toma iniciativas próprias para combater a impunidade, tornando claro o fracasso do Poder Público de manter a ordem coletiva, neste sentido, também se desconstrói o sistema punitivo pátrio; através da prática de contratação de seguranças particulares, serviços de guarda-costas, pagamento de dinheiro em troca de proteção, a criação de esquadrões da morte, privatização de espaços públicos por meio de bloqueio de ruas e outras medidas, permitindo a generalização do recurso a meios violentos, e a competição por esses meios desmoralizam ainda mais a autoridade pública (REIS, 1995).

            Para que exista um sistema jurídico autopoiético, é essencial que o Estado imponha tratamento isonômico, não discriminatório, combatendo as opressões, arbitrariedades e violências cometidas por agentes estatais contra seus próprios cidadãos, mantendo aquele código licito/ilícito de Luhmann a base da aplicação do Direito Penal, sem interferências externas (alopoiéticas).

            É por isso, diz Lima Lopes (2000, p. 90), que a impunidade

 

é um elemento disfuncional no Estado de direito: ela atenta contra a isonomia. Além de dificultar a cooperação, a impunidade consolida discriminações e gera um código paralelo e informal, pervertendo o sistema formal de proibições e permissões: ela dá a impressão, ou melhor, ela estabelece, na prática, que o proibido é permitido para certos grupos.

 

            Ainda mais esclarecedoras, são as palavras de Oliveira Vianna (1987, pp. 159-160), elucidando sobre a necessidade da efetividade do Poder Judiciário em todo território nacional, pois

 

nem a generalização do sufrágio direto, nem o self-government valerão nada sem o primado do Poder Judiciário — sem que este poder tenha pelo Brasil toda a penetração, a segurança, a acessibilidade que o ponha a toda hora e a todo momento ao alcance do Jeca mais humilde e desamparado. (...) De nada valerão a esses desamparados e relegados, entregues aos caprichos dos mandões locais, dos senhores das aldeias e dos delegados cheios de arbítrios, estas regras políticas, desde que os eleitos por este sufrágio universal e direto — sejam funcionários municipais, sejam estaduais, pouco importa — estiverem certos que poderão descumprir a lei ou praticar a arbitrariedade impunemente.

 

            Pesquisas feitas recentemente com a população brasileira, demonstraram que as pessoas valorizam menos as liberdades democráticas (esfera da autonomia da pessoa humana) do que os direitos de cunho social e patrimonial (esfera da redistribuição estatal). Segundo pesquisa do Ibope, feita a pedido da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, apurou o seguinte (na cidade de São Paulo): 26% dos entrevistados rejeitaram totalmente as violações graves dos direitos humanos; sendo que 21% as apoiou parcialmente e apenas 17% as apoiou totalmente.

            A tortura foi apoiada por 66% dos entrevistados no Recife, 63% em São Paulo e 54% no Rio de Janeiro. Os direitos cuja violação parece mais grave para os entrevistados são justamente os de caráter social, ao passo que os direitos de liberdade política aparecem em último lugar.

            Outra pesquisa significativa foi conduzida pelo Instituto Latinobarômetro em 1996 sobre a democracia e seu valor. Metade dos brasileiros (50%) a defendeu, quase um quarto (24%) disse preferir um regime autoritário e 21% disseram ser indiferentes. Vale dizer que para quase a metade dos brasileiros a democracia ou é má ou é indiferente, ou seja: as liberdades garantidas pelo Estado democrático não parecem importantes para a metade da população. Em números absolutos, o Brasil foi o país em que se verificou o menor índice de aprovação da democracia (no Uruguai o índice era de 80% e na Argentina de 71%). Se comparada com a média latino-americana (que foi de 61% de apoio à democracia), a opinião pública brasileira poderia ser descrita como menos sensível à democracia (LOPES, 2000).

            Na esteira desse pensamento, torna-se evidente que muito menos o infrator da norma penal possua algum direito frente à sociedade. Configurando assim, o entendimento da pouca aceitação dos direitos humanos na esfera penal. Sendo preferível ao sistema penal, eliminar os delinqüentes (erro social) do que lhes reconhecer seus direitos fundamentais, admitindo sua dignidade (cidadania).

            Por isso, nosso sistema é baseado na repressão, sem um cunho sócio-educativo. Assim, prolifera a violência tanto no sistema prisional, reconhecidamente avesso aos direitos humanos, quanto no âmbito estatal, através da polícia que age de maneira arbitrária, atendendo as políticas administrativas do Estado no combate ao crime.

            O critério usado é o da violência legitimada, em detrimento da inclusão a cidadania por meio do respeito aos direitos humanos do infrator, que reincidem tanto pelo caráter violento do sistema punitivo ao qual é inserido ou pela falta de efetividade do modelo penal.

 

 

CONCLUSÃO

 

 

            Observa-se em todo o trabalho que os fatores extrajudiciais detêm uma correlação com o fenômeno da impunidade se analisados segundo a teoria dos sistemas de Niklas Luhmann, no entanto, para que o sistema penal brasileiro torne-se autopoiético, é necessário que se corrijam as distorções apresentadas.

            A cidadania plena precisa ser universalizada para toda a população, permitindo o acesso aos bens e direitos resguardados nos textos legislativos do ordenamento jurídico brasileiro. A desigualdade social, historicamente retratada desde os tempos do período colonial precisa ser amenizada de alguma forma, pois é através da aquisição de bens materiais e serviços básicos que a população toma conhecimento de seus direitos e de sua cidadania, podendo se conscientizar da importância dos direitos humanos, valorizando e defendendo-os da arbitrariedade do Estado, ou da conivência de seus agentes com a violação desses direitos tão caros e imprescindíveis em uma Democracia de Direito.

            Certamente os níveis de violência diminuiriam na mesma proporção em que a cidadania crescesse, tanto o cidadão como o agente estatal agiriam nos limites legais, porquanto soubessem que a aplicação do Direito Penal estaria garantida para todos.

            A alopoiese do sistema jurídico penal seria paulatinamente combatida à medida que os fatores externos apresentados deixassem de existir, portanto, não podendo se infiltrar no ordenamento, deixando claro que, o binômio licito/ilícito, seria a única referencia na aplicação do direito penal, estaria garantida a estabilidade e previsibilidade da lei.

            Finalmente ter-se-ia a tão desejada segurança jurídica, deixando para trás o tempo das constantes reformas legislativas, que em nada colaboraram para o combate a impunidade. 

            Portanto, foi com a intenção de analisar a impunidade para além dos limites da lei, encontrando os fatores que levam o criminoso a persistir em sua conduta ilícita, que se construiu este trabalho, tendo por base a teoria dos sistemas, que permitiu o embasamento doutrinário da presente monografia.

Não se pretendia inovar com o tema impunidade, mas sim encontrar um raciocínio lógico que permitisse abordar os diversos fatores ligados ao tema. Teve-se a “teoria dos sistemas sociais” como linha condutora.

 

 

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[1] Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Código Penal Brasileiro).

[2] Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Código Penal Brasileiro).

[3] Art. 5°, LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente. (Constituição da Republica Federativa do Brasil).

[4] A referida pesquisa teve lugar entre dezembro de 1995 e agosto de 1996 e abrangeu 6.873 screen interviews nas quais foram coletadas informações sobre 16.763 pessoas, total de onde foi selecionada uma amostra de 681 vitimados, considerada representativa da população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Para detalhes sobre o método seguido, ver CPDOC-FGV/Iser, 1997; Carneiro, 1999.

[5] Os motivos alegados por aqueles oitenta em cem para não procurar a polícia, no caso dessa população específica, foram: 42% não acreditavam na ou tinham medo da polícia; para 18% a ocorrência não era importante; em 13% dos casos faltavam provas; e 27% alegaram outras razões.

[6] Destes 87% de vitimas que não fizeram o registro, 49% assim procederam porque foram convencidas pelas autoridades policiais ou estas se recusaram a fazê-lo, 44% deram outras razões e 7% não responderam.

[7] Conforme parágrafo único do art. 2º da Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, que instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal.

[8] O Dicionário de Ciências Sociais define o funcionalismo como: a perspectiva utilizada para analisar a sociedade e seus componentes característicos enfocando a mutua integração e interconexão deles. O funcionalismo analisa o caminho que o processo social e os arranjos institucionais contribuem para a efetiva manutenção da estabilidade da sociedade. A perspectiva fundamental é oposta às maiores mudanças sociais.

[9] Sociólogo norte-americano, Talcott Parsons nasceu em 1902, no Colorado Springs, EUA, e faleceu em 1979. Pretendeu criar uma estrutura conceitual capaz não só de abarcar toda a sociologia, mas também de integrar as restantes ciências sociais.

[10] A palavra autopoiésis deriva do grego auto (por si próprio) e poiesis (criação, produção, poesia).

[11] Por complexidade entende-se a contínua existência de mais possibilidades do que pode ser realizado.

[12] Contingência seria o perigo do desapontamento e necessidade de assumir riscos.

[13] Principalmente os dos artigos 1º, inc. II, 3º e 5º da Constituição Federal, em sua integralidade.

[14] Há ainda divergências quanto ao termo "subcidadania", no que tange ao tempo de seu aparecimento. Para isso, vide: NEVES, Entre Subintegração e Sobreintegração: A Cidadania Inexistente, p. 95.

[15] António Manuel Botelho Hespanha (Coimbra, 1945) é um historiador e jurista português.

[16] Uma carta régia de D. João V ao corregedor do crime (a redação do documento é atribuída ao ministro e diplomata brasileiro Alexandre de Gusmão) explicitou, em 1745, como orientação, a não-efetividade das Ordenações: “(...) as leis costumam ser feitas com muito vagar e sossego, e nunca devem ser executadas com aceleração, e... nos casos crimes sempre ameaçam mais do que na realidade mandam (...)”.

[17] Era da tradição portuguesa que o instituto do perdão fosse utilizado para fins de povoamento. Vilas como Marvão, Sabugal e Miranda, em algum momento, foram declaradas locais de refúgio, coutos, onde criminosos foragidos podiam se instalar, sem temor da justiça.

[18] Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu art. 1º, adotada pela ONU em 10 de dezembro de 1948, “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”

[19] O Ato Institucional Número Cinco foi o quinto de uma série de decretos emitidos pelo regime militar brasileiro nos anos seguintes ao golpe militar de 1964.

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