Consumidores prejudicados pela Marsans têm de ir logo à Justiça, dizem especialistas 18/7/2014
RIO - A operadora de turismo Marsans Brasil fechou as portas, e os clientes com pacotes comprados terão de correr atrás de seus direitos. Na avaliação de especialistas, é mais fácil recuperar o prejuízo enquanto a companhia, em recuperação judicial desde junho, tenta sair da crise. Um caminho é tentar fazer com que as empresas envolvidas nos pacotes honrem os compromissos. Outro é acionar a Justiça.
Segundo especialistas, quem ainda não viajou, mas comprou pacote da Marsans e já recebeu os vouchers da viagem, deve procurar a companhia aérea, os hotéis e as demais prestadoras de serviços e verificar se a operadora efetuou os pagamentos. Em caso negativo, vale a responsabilidade solidária, ou seja, essas empresas deverão honrar os compromissos, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor.
No fim da fila de credores
A situação é mais complicada para quem ainda não tem os vouchers em mãos ou não terminou de pagar o pacote. Nesse caso, a orientação é procurar órgãos de defesa do consumidor e acionar a Justiça.
— A primeira questão é evitar um dano maior. Pode-se pedir uma indenização por dano material e moral e a tutela antecipada, para rescindir o contrato e deixar de pagar o que legalmente precisaria ser pago — afirma o juiz Flavio Citro, coordenador do Centro de Conciliação dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Rio.
— Se a empresa vier a falir, a possibilidade de o consumidor reaver o dinheiro é muito remota. Se é para entrar na Justiça e tentar reavê-lo, é agora — diz Maria Inês Dolci, coordenadora da Proteste.
Há ainda consumidores surpreendidos durante a viagem. A professora Norma Corloski comprou um pacote de cinco dias na Serra Gaúcha, por R$ 3.900. Quando ela e o marido, Marcos, aterrissaram em Porto Alegre no dia 23 de junho, descobriram que as reservas no ônibus que faria o traslado para Gramado haviam sido canceladas, assim como todos os passeios.
— Tivemos que contratar outra empresa para fazer serviços que já estavam pagos — diz Norma, que calcula o prejuízo em R$ 1.700 e já entrou na Justiça.
De acordo com o administrador judicial da Marsans, Gustavo Licks, os clientes lesados receberão um comunicado sobre a situação da empresa. Eles serão listados no quadro de credores e, em tese, terão direito a receber ao menos parte de seus créditos. Como não têm garantia real, pela lei de recuperação judicial esses clientes se enquadram no último grupo de credores na fila de quitação do débito, atrás de funcionários e credores com garantia.
Licks não soube informar quantos clientes foram deixados na mão. Segundo ele, as passagens aéreas foram honradas e a parte terrestre (hotéis, passeios e traslados) ficou pendente. Os funcionários não recebem há dois meses.
O pedido de recuperação judicial foi deferido pelo juiz Gilberto Clóvis Matos, da 3ª Vara Empresarial do Rio, em 12 de junho. A contar dessa data, a empresa tem 60 dias para apresentar um plano de recuperação judicial, que terá de ser aprovado em assembleia de credores. Enquanto estiver em recuperação, a companhia, com dívidas de R$ 57 milhões, fica protegida da execução dos débitos. Mas o valor de eventuais indenizações é fixado nesse período.
Desde 2000, a Marsans acumula 300 queixas nos juizados especiais cíveis do estado do Rio por irregularidades na prestação de serviços. A Shangri-lá, outra operadora que fechou as portas, tem 128 processos abertos desde 2008.
A Marsans também não pagou a mensalidade de junho da Braztoa, associação que reúne operadoras de turismo.
— Soubemos que a empresa estava em recuperação judicial por um ex-funcionário. Temos recebido queixas de inadimplência, principalmente do exterior — diz Marco Ferraz, presidente da Braztoa.
Operadoras enfrentam dificuldades
Na Serra Gaúcha, estima-se que a dívida da Marsans gire em torno de R$ 1 milhão. Segundo os fornecedores da região, há cerca de oito meses a empresa vinha atrasando os pagamentos, alegando que os investidores não mais aportavam recursos. Alberto Youssef, doleiro preso na Operação Lava-Jato, investia na Marsans.
A Marsans atuava no Brasil desde 1973. Funcionava como um braço da Marsans espanhola, que chegou a ser um dos grupos mais fortes do mundo. Em 2010, a Marsans europeia quebrou. Na época, a operadora brasileira já havia se desligado da empresa-mãe e tinha gestão independente. Ainda assim, a imagem ficou arranhada. No mês passado, as 22 lojas que restavam fecharam.
A concorrência da internet e a fiscalização precária têm contribuído para a quebra de agências e operadoras de turismo. Em 2001, a gigante Soletur faliu, surpreendendo 7 mil clientes. Em 2012, fecharam as portas Trip&Fun, Tia Augusta e Shangri-lá, deixando na mão 7.500 pessoas.
O escritório LCCF Advogados, que representa a Marsans, procurado, não retornou as ligações. (Colaborou Renata Leal)
Fonte: O Globo - Online