Queixas de usuários sobem 55% nos Procons, enquanto operadoras alcançam quase todas as metas da Anatel

RIO — É difícil encontrar clientes de telefonia celular que nunca tenham reclamado ou ao menos pensado em reclamar sobre os serviços oferecidos pelas operadoras, mas, de acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), “há um processo de melhoria” em curso. No fim do mês passado, a agência divulgou a avaliação trimestral do Plano Nacional de Ação de Melhoria da Prestação do Serviço Móvel Pessoal, referente ao período entre fevereiro e abril. Dos quatro indicadores técnicos, apenas a taxa de acesso à rede de dados ficou pouco abaixo da meta. Porém, ao menos pelo volume de queixas, não é essa a percepção dos consumidores. No primeiro semestre deste ano, foram registradas 277,8 mil demandas de telecomunicações no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), que reúne dados de 26 Procons do país, 55% a mais que no mesmo período de 2012.
A Anatel também registrou movimento semelhante. Em abril de 2012, cada uma das quatro grandes operadoras recebeu entre 500 e 1,5 mil reclamações sobre problemas na rede. Em abril deste ano, o volume de queixas variou entre 1,5 mil e 3,5 mil. De janeiro a junho, foram feitas 3,7 milhões de chamadas para a central de atendimento da agência, sendo que 40% delas eram reclamações. Para o diretor executivo da Superfones (empresa especializada em celulares), Jorge Monteiro, o que aconteceu foi uma mudança na atitude do consumidor, provocada pelas medidas adotadas contra as teles em julho do ano passado.
— A Anatel foi dura com as operadoras. Chegou a proibir a abertura de novas inhas. De certa forma, ela chamou para si a responsabilidade de resolver os problemas dos clientes — avalia Monteiro.
Metas não esgotam medições possíveis
Por outro lado, especialistas contestam as metas adotadas. De acordo com Maria Inês Dolci, coordenadora Institucional da Proteste, os índices técnicos — taxas de acesso à rede de voz, de acesso à rede de dados, de queda da rede de voz e queda da rede de dados — não esgotam todas as medições possíveis. O maior alvo de reclamações, por exemplo, é o setor de cobranças. Segundo a Anatel, 48% das queixas dos clientes de pós-pago se referem às contas.
Foi o caso da publicitária Vivian Nunes. No fim do ano passado, ela contratou um plano de telefonia com banda larga móvel. No momento da compra, foi informada pelo atendente da operadora que o acesso à internet era ilimitado, com redução da velocidade após o consumo da franquia, mas sem cobrança de excedentes. Ao fim do primeiro mês, o susto:
— Em vez de cobrarem R$ 100, cobraram R$ 300. Liguei para reclamar e me disseram que eu tinha ultrapassado a franquia do plano. Foram três meses nessa discussão. Já tinha uns 15 protocolos.
Cansada e insatisfeita com o atendimento na operadora, a publicitária teve que perder um dia indo ao Procon, com toda a documentação e protocolos, para resolver a situação, conta Vivian:
— Foi um aborrecimento. Mas depois que fui ao Procon, devolveram o triplo do valor que tinham me cobrado indevidamente e não tive mais problemas.
Para Silvia Regina Melchior, professora do curso de Direito Digital e das Telecomunicações da Universidade Mackenzie, o número elevado de reclamações contra as teles é esperado, dada a massificação do serviço. No país, existem mais de 265 milhões de linhas de celular ativas. Contudo, a especialista vê espaços para aprimoramento com vistas à redução da insatisfação dos consumidores, principalmente em relação à cobrança. A complexidade dos pacotes ofertados, diz a professora, é ponto central na discussão.
— As operadoras precisam melhorar os processos de venda, com planos mais claros para o consumidor. Muitas queixas são feitas por desconhecimento do cliente sobre os serviços contratados. Existe um espaço amplo para melhorias, sobretudo no call center. Às vezes, os atendentes desconhecem as nuances do serviço e as demandas vão parar no Procon. O Estado está fazendo um serviço que era para ser feito pelas operadoras.
De acordo com a Anatel, a central de atendimento da agência consome cerca de R$ 17 milhões por ano para resolver questões que poderiam ser tratadas pelas operadoras. Está em estudo, aliás, a possibilidade de repassar esses custos para as empresas. Outra alternativa que vem sendo estudada pela agência reguladora é a padronização de pacotes, a exemplo do que aconteceu no setor bancário.
O diretor executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular (SindiTelebrasil), Eduardo Levy, discorda da ideia de unificar os planos. A multiplicidade de pacotes, diz, beneficia os consumidores. Sobre o aumento no volume de reclamações, ele explica que existe um desconhecimento da população sobre o que é o serviço celular, e das obrigações e limitações das operadoras. Pelas normas, as empresas devem oferecer 80% de cobertura das áreas urbanas dos municípios atendidos. Além disso, destaca, há legislações consideradas restritivas que proíbem a instalação de infraestrutura em determinados pontos:
— A população está satisfeita? Claro que não. O consumidor quer pegar o celular e ligar, mas não sabe que existe um caminhão de leis que nos impede de prestar o serviço em alguns lugares.