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O artigo tece considerações sobre prisão especial a luz da Constituição Federal
Texto enviado ao JurisWay em 31/05/2012.
Uma das polemicas que o atual Direito Processual Penal encerra diz respeito a “prisão especial”, prevista em particular, no art. 295 do Código de Processo Penal, e em outras normas de legislação especial. Eis a dicção da norma em comento:
Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva:
I - os ministros de Estado;
II - os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia;
III - os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembléias Legislativas dos Estados;
IV - os cidadãos inscritos no "Livro de Mérito";
V – os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;
VI - os magistrados;
VII - os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República;
VIII - os ministros de confissão religiosa;
IX - os ministros do Tribunal de Contas;
X - os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função;
XI - os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos.
§ 1o A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum.
§ 2o Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento.
§ 3o A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana.
§ 4o O preso especial não será transportado juntamente com o preso comum.
§ 5o Os demais direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum.
Bem se vê que o dispositivo legal retro assegura recolhimento em local distinto da prisão comum, aos presos provisórios, ou seja, aqueles ainda não sujeitos a condenação definitiva, desde que se enquadrem em um dos incisos acima.
Em termos práticos o que faz a norma é segregar duas modalidades de presos provisórios: os que têm direito a prisão especial, e os que não têm.
Depreende-se daí o entendimento de parte da doutrina no sentido da inconstitucionalidade da regra em comento haja vista sua incompatibilidade com preceitos constitucionalmente assegurados. Explica-se. O critério de diferenciação para que o preso provisório tenha acesso a prisão especial esta pautado em títulos e cargos, o que configuraria de forma iniludível afronta aos artigos 1º, III, e 5º, caput, da Constituição Federal, que tutelam, respectivamente, a dignidade da pessoa humana e a igualdade perante a lei.
Nesse passo, a prerrogativa estampada no art. 295 do CPC, configuraria obstaculização a efetivação de garantias constitucionais, se revelando verdadeira forma de se privilegiar parte da sociedade.
Forçoso concluir que as exigências da norma legal tendem a excluir grande parcela da população de baixa renda, o que , a toda evidencia, padece de sentido.
Por outro lado, há quem defenda que se trata apenas de forma de execução da prisão cautelar, a garantir tratamento apropriado ao réu, ainda que com base em características morais e sociais, além de privá-los da perniciosa convivência com presos definitivos.
Não se desconhece que sendo a prisão provisória, não é adequado misturar o preso cautelar com o condenado, contudo não é correto que a prerrogativa da prisão especial seja conferida apenas a parte da população. O apropriado seria a construção de estabelecimentos prisionais distintos para todos os presos provisórios.
Sobre o tema, assim leciona Guilherme de Souza Nucci
“Diante da meridiana clareza do texto constitucional, não se pode cogitar de acolher, sob a ótica do Estado Democrático de Direito, a distinção entre pessoas, para o fim de recolhimento ao cárcere, baseado em títulos e cargos, sem qualquer vínculo com a necessidade. Por isso, é inconstitucional a prisão especial, prevista, em particular, no art. 295 do Código de Processo Penal, e em outras normas de legislação especial.
Observa-se a preocupação da lei em isolar o denominado preso especial de outra categoria de presos, o comum. Eles não poderão nem mesmo ser transportados juntos numa só viatura (§ 4º). Chega-se ao ponto de especificar o óbvio, vale dizer, a cela especial deverá atender a requisitos de salubridade do ambiente, com fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana (§ 3º). Ora, por acaso os chamados presos comuns não teriam direito às mesmas celas, devidamente adequadas à sua existência, humanos que também são? Quais fatores levam o legislador a pretender a separação - inclusive no transporte - entre especiais e comuns? Não há, sob nosso entendimento, explicação plausível para tanto.”
Do exposto, e cotejando-se as previsões legais constantes da Constituição Federal e aquelas previvas no Código de Processo Penal, e legislação especial, no que diz respeito a prisão especial, infere-se de imediato a sua incompatibilidade .
A prisão especial nos moldes atuais reveste-se de um viés de desigualdade inadmissível no Estado de Direito.
Bibliografia:
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 5ª ed. São Paulo: Ed. Revistas do Tribunais. 2006
BRASIL. Constituição ( 1988 ). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.
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