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 Sala dos Doutrinadores - Monografias
Autoria:

Carla Danielle Lima Gomes Ferreira
Advogada, Pós-graduada em Direito Marítimo, Portuário e do Petróleo Pela Universidade Mauricio de Nassau, Pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Superior da Advocacia ESA/PE, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário do Pará - CESUPA.

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A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO E A RUPTURA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOBRE O ACUSADO

Este trabalho teve por escopo verificar quanto a mídia pode influenciar na condução do processo penal brasileiro sobre os acusados, até aonde esta pode interferir neste processo e pode violar as garantias fundamentais inerentes ao acusado.

Texto enviado ao JurisWay em 27/08/2014.

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INTRODUÇÃO

Nenhum meio é mais eficaz e ágil para propagação de ideias (sejam elas boas ou más) do que os meios de comunicação nas suas diversas formas: internet, televisão, rádio, jornais, revistas, etc. O fato é que estes, na nossa sociedade, tornaram-se de extrema importância, não somente para nos informar, mas também como essa informação vai ser absorvida pelo destinatário (telespectador, leitor, ouvinte), como moldará a perspectiva do que se passa ao nosso redor e da nossa vida em sociedade.

Os meios de comunicação funcionam como instrumentos de influência na construção e compreensão da realidade ao transmitir acontecimentos e opiniões por meio da escrita, sons e imagens, exercendo uma espécie de controle social de forma indireta e informal, pois ditam comportamentos, modismos, costumes e disseminam ideologias, de modo que a opinião pública é construída sob forte influência midiática.

Sendo assim, a mídia, que tanto influencia nosso cotidiano, consequentemente também exprime suas vontades no nosso meio jurídico, especificamente no sistema jurídico processual penal brasileiro, que sofre intervenção da opinião transmitida pelos meios de comunicação.

Por isso, no primeiro capítulo abordaremos o modo como a mídia, no decurso do tempo, tem introduzido seus ideais e influenciado no processo penal brasileiro, pois não é raro ver a mídia ferindo princípios norteadores do processo penal, além de princípios constitucionais e tratados celebrados pelo Brasil que tratam da dignidade da pessoa humana, uma vez que a pressão exercida pela mídia em certos casos é tanta que alguns desses princípios, além do devido processo legal, não são observados.

Já no segundo capítulo, para melhor demonstrarmos como a mídia vem influenciando abordamos três casos vividos pelo judiciário brasileiro e que tiveram grande influência da mídia, e como isto repercutiu sobre os acusados.

No terceiro capítulo, analisaremos, de forma geral, os casos e apontaremos, sobre uma ótica jurídico-analítica e critica, os abusos que foram cometidos nos casos.

Por fim, trataremos do que consideramos ser a solução para essa problemática, ou seja, a ponderação de princípios como meio de atingir o estado democrático de direito em processo penal, falando da liberdade de imprensa e de como o judiciário pode utilizar o recurso da ponderação para não deixar a mídia influenciar no julgamento do acusado.

 

É nítido que esse assunto deve ser apreciado e discutido pelos estudiosos, acadêmicos, professores e a população como um todo, pois não devemos nos levar pelo desejo de parte da sociedade em ver punições exemplares formatadas de acordo com as informações transmitidas pela mídia e que levam as conclusões apressadas que, mesmo quando se configuram errôneas, têm consequências de difícil reparação.


EVOLUÇÃO E HISTÓRICO DA MÍDIA COMO COMUNICADOR SOCIAL

 

Mídia, segundo Almeida, pode ser definida como "o conjunto das diferentes empresas de comunicação: emissoras de rádio, televisão, portais da internet, cinema, revistas e jornais impressos em seus diferentes ramos, como jornalismo, entretenimento e publicidade."..[1]

Ressalta-se que, para o nosso estudo, abordaremos a mídia como sendo meio de comunicação social, com destaque para a mídia impressa e televisiva, que fortemente influencia o cotidiano do ser humano, descartando primeiramente a ideia de ser intencional ou não, esta acaba sendo vinculada à formação de ideias do individuo telespectador.

A imprensa é de suma importância em nossa civilização, principalmente no processo democrático, ao divulgar informações para as massas. Sobre o tema afirma Artur César Souza:

 

A invenção dos canais técnicos de difusão e transmissão de mensagens – los-mas-media- origina um novo tipo de instituição social com funções também novas, ou seja, de estruturar e reestruturar por meio de um ritual midiático os aparentes símbolos de comportamento social, mediante uma interação constante com a opinião pública.[2]

 

Observa-se tal importância da imprensa desde a Roma antiga de Júlio César, por meio do jornal Acta Diurna[3], surgido em 69 a. C., que tinha por escopo justamente a divulgação dos acontecimentos políticos e sociais mais importantes e já se encaixava na sociedade como basilar para as informações, e, por oportuno influenciador de opiniões. Na China antiga, em Pequim, por volta do século VIII, também já se conhecia a imprensa escrita, sob a forma de boletins escritos à mão. 

Com o surgimento da prensa, em 1447, inventada por Johann Gutenberg, iniciou-se a imprensa moderna, possibilitando o livre intercâmbio e disseminação do conhecimento, de maneira mais ágil, econômica e fácil, começando a propagação de ideias em massa em diferentes países e continentes, como podemos comprovar pelo movimento renascentista que muito se utilizou dessa tecnologia para propagação de seus ideais.

Importante ressaltar ensinamentos de Alberto Terrou:

 

Embora seja possível em cada tipo de civilização, em todas as sociedades organizadas encontrar “antepassados” do jornal e dos jornalistas, seria insensato ater-se a antecedentes longínquos. A partir do século XV, uma série de fatores políticos, econômicos e intelectuais conjugaram seus efeitos para aumentar notavelmente a sede de notícias no Ocidente: O Renascimento, as Reformas, os processos de troca bancárias e comerciais. A imprensa periódica só nasceu  há mais de um século e meio após a invenção da tipografia, tendo sido um verdadeiro florescimento de escritos de informação dos mais diversos. Desde o século XVI, pelo menos, as notícias já tinham se tornado verdadeira mercadoria. E desde o seu nascimento, a mídia já vem preocupando; relatos constatam que uma das principais preocupações de Bonaparte após o golpe de Estado foi subjugar a imprensa. Ele tinha uma consciência clara da importância da imprensa. Lia regularmente, repreendia constantemente os censores, inspirava artigos. A menor crítica deixava-o furioso. Napoleão calou os opositores e empenhou-se em utilizar o poder dos jornais a serviço de sua propaganda na França e no exterior.[4]

 

Em meados do século XVII, deu-se início à circulação de periódicos. Os primeiros jornais modernos foram produtos de países da Europa ocidental, como a Alemanha (que publicou o Avisa Relation oder Zeitung em 1609), a França (Gazette em 1631), a Bélgica (Nieuwe Tijdingen em 1616) e a Inglaterra (o London Gazette, fundado em 1665, ainda hoje publicado como diário oficial do Judiciário).

No Brasil, a imprensa veio tardiamente, como mostrada no estudo de Judson Pereira:

 

No Brasil, pode-se dizer que a imprensa chegou atrasada. A primeira tipografia veio com a família real portuguesa, que fugia de Napoleão Bonaparte. Foi em 1808 que D. João VI autorizou o funcionamento da Imprensa Régia, exercendo sobre ela forte censura. Os jornais falavam sobre cultura europeia, exaltavam as virtudes da família real, os bons costumes e valores familiares. Nada que contestasse ou colocasse em xeque a ordem ou o poder vigente podia ser publicado. Até a década de 1950, os jornais brasileiros seguiam o estilo francês: opinativo, de vertente política, literário. Foi a partir da metade do século XX, mais precisamente após a Segunda Grande Guerra, que os jornais se profissionalizaram e adotaram um estilo neutro, tirando a influência literária de suas páginas. Adotou-se o padrão americano, com frases mais objetivas, com as principais informações dos fatos contidas nos primeiros parágrafos do texto. Adotou-se o modelo da pirâmide invertida, ou seja, as informações eram dispostas em ordem decrescente de importância. [5]

 

Os jornais também ajudaram na divulgação de propaganda revolucionária. O Iskra (A Centelha) publicado por Lênin em 1900 é um exemplo notável. Em 21 de junho de 1925, foi lançado o Thanh Nien no Vietnã, apresentando o marxismo ao país e fornecendo informação sobre as políticas estratégicas da revolução.

Nota-se então que a mídia foi emergindo na sociedade com o poder de trazer a informação que queria o editor, ou seja, na história vimos que se fazia uso da imprensa, pelos reis, para “enganar” o povo com falsas verdades escritas por eles. A liberdade de imprensa, algo que não existia nesse período, foi sendo lentamente albergada pelas leis, sendo a Suécia, em 1776, o primeiro país a proteger essa liberdade.

Desde então sempre se utilizou desse meio para influenciar na formação do pensamento dos leitores, sendo feita pelo próprio estado, ou mesmo por idealistas censurados. O jornal era e é uma fonte de persuasão e transmissão de ideais.

Em meados do século XIX formou-se um novo conceito de jornal, ao ser introduzido na sociedade o sistema Penny Press, que eram modelos mais simples, baratos e acessíveis à população em geral, tinha por manchete os crimes, tragédias, fofocas e aventuras; assim, com o preço baixo (um centavo de dólar, enquanto os outros jornais custavam entre 15 a 30 centavos de dólar), o jornal se popularizou e estendeu a influência da mídia para as classes mais pobres.

Com histórias redigidas com uma invocação aos sentidos e às emoções, com características vividas, frases simples e parágrafos pequenos formou-se a popularidade das notícias, havendo rapidamente o aumento da circulação dos jornais que eram baseados em fotografias de crimes com muito sangue e histórias de assassinatos.

Portanto, ao observamos a linha temporal, desde a Roma Antiga até os tempos atuais, notamos que a imprensa é influenciadora de opiniões e transborda seus conceitos à formação de pensamentos e críticas.

E, como mostrado, houve um avanço muito grande no sistema midiático, adquirindo notoriedade na história da humanidade, e, em consequência, adquiriu importantes direitos fundamentais como a liberdade de expressão e o livre arbítrio de pensamento. Todavia a problemática está em torno dos limites disso, pois até onde é possível essa livre expressão em depreciação do princípio da inocência, do juiz imparcial e da influência no tribunal do júri? Acreditamos que este limite está no velho ditado de que seu direito termina ao começar o do outro.

Assim, “no momento que a imprensa ‘apodera-se’ de um processo, esta não se limita a ilustrar o trabalho da magistratura ou a denunciar eventuais disfunções da justiça: os meios de comunicação em massa induzem inevitavelmente ao desejo de substituir-se ao juiz e de julgar em seu lugar”.[6]

Ressalte-se que em nenhum momento o presente trabalho tem por objetivo questionar a liberdade de imprensa. Ocorre que alguns alardeadores de uma “ampla e irrestrita liberdade de imprensa” costumam confundi-la com “libertinagem” de imprensa.

Ensina Flávia Rahal que:

 

A Justiça que é feita com base na pressão pública e na opinião publicada é quase sempre Justiça mal feita, e torna ainda mais desacreditado o Poder Judiciário. É muito fácil: a Justiça que prende por pressão e não com base em provas sólidas é a mesma que vai soltar dias depois. Quem perde com isso é o inocente que foi preso, a vítima que se sente desamparada, a Justiça que trabalha na direção errada e a sociedade que permanece insatisfeita. Perdemos todos nós, daí o perigo desta inversão tão corriqueira de papéis.[7] 

 

Contudo, mesmo havendo esse confronto com a justiça, “os meios de comunicação em massa podem ser considerados um componente importante e indispensável da estrutura social sem o qual a sociedade contemporânea como é conhecida deixaria de existir”[8]. Essa importância relacional pode ser tanto no sentindo de um catalisador social, como por outro lado, “podem ser disfuncionais, isto é, contribuir para desarmonia ao invés de estabilidade”[9].

 

 

1.1  TEORIAS MIDIÁTICAS

 

Com essa influência comportamental que a mídia exerce, há muito vem se estudando tais fenômenos[10], e apesar das várias opiniões doutrinárias, a influência negativa da comunicação em massa é um ponto comum entre todas as opiniões.

A sociedade tem a necessidade de transmitir e receber informações, sendo que esta foi preponderante para a incorporação da liberdade de imprensa e de expressão aos catálogos dos direitos individuais das constituições liberais modernas e nas convenções internacionais, como um direito fundamental do ser humano utilizar-se dos meios de comunicação para receber informações que lhe sejam úteis ao seu próprio benefício e ao enriquecimento cultural, social e econômico da sociedade em que vive.[11]

Pensando nessas consequências, houve estudos que criaram teorias de como essa transmissão seria aceita pelo telespectador, verificando melhor como a mídia pode influenciar o processo jurídico penal na formação da decisão do julgamento. Assim, advieram as Teorias da Comunicação, que são estudos acadêmicos que pesquisam os efeitos, origens e funcionamento do fenômeno da Comunicação Social em seus aspectos tecnológicos, sociais, econômicos, políticos e cognitivos.

Primeiramente, veio a Teoria Hipodérmica[12], segundo a qual o que a mídia expediu seria rapidamente absorvido pela massa, exercendo, por consequência, pressão popular em cima daquilo, tomando por base que o narrado seria verdade absoluta. Assim, os fatos narrados pela imprensa influenciariam na opinião pública, que ao exercer seu poder de massa social acabaria por intervir no direito fundamental do acusado, que não é mais inocente até que se prove ao contrário, e sim culpado até que a sociedade diga o contrário, rompendo com os direitos inerentes ao devido processo legal dos acusados, do seu principio da presunção de inocência, e até mesmo na formação de ideais dos legisladores e julgadores.

Em seguida tivemos a Teoria da Persuasão[13], que para contrapor a teoria hipodérmica, avaliou o estudo comportamental de determinado grupo, almejando atingir a funcionalidade desejada com a transmissão de especificada ideia, através de um estudo psicológico de determinada camada da massa, a impressa poderia criar um determinado show televiso específico. Assim, criou-se selecionados programas para grupos que gostam de ver e ou ouvir a “sentença” popular de casos penais, para os casos noticiados por determinados programas que buscam audiência em cima de pessoas que ainda não foram nem a julgamento, e já foram criminalizadas pela mídia, rompendo com vários preceitos constitucionais inerentes ao ser humano.

Em segunda fase, criou-se a Teoria do Agendamento[14], explicando a correlação entre a intensidade de cobertura de um fato pela mídia e a importância desse fato para o público, revelando que esta correlação é corriqueira.

A respeito do desejo exarcebado do público pela notícia, Barros Filho aduz que, o interesse gira em torno daquilo que os meios de comunicação publicam[15], é justamente nesse conceito que a Teoria do Agendamento trabalha, sendo difícil determinar uma causalidade, se os meios de comunicação mapeiam os interesses públicos ou se o interesse público alimenta os meios de comunicação. Nota-se ser de suma importância a influência da mídia sobre o público e sendo considerado, portanto, um tipo de efeito social da mídia.

Segundo Mauro Wolf:

 

Os noticiários televisivos desempenham um papel neste processo de agendasetting. Desempenham-no, sobretudo, em relação ao baixo perfil de agenda, isto é, não é tanto à capacidade de focar temas e assuntos precisos, delimitados, uma ordem do dia hierarquizada (efeito mais conforme com a imprensa escrita), mas à capacidade mais indiferenciada, mais igualmente importante, de empolar certos aspectos gerais, em detrimento de outros: aspectos competitivos e formais, de “bastidores”, versus elementos essenciais de uma estratégia política. [16]

 

Assim, a mídia escolheria o seu ponto de vista de uma situação, e publicaria de acordo como seria a sua vontade (que é a vontade popular que lhe traz audiência).

Assim, de acordo com tais teorias é possível que a sociedade se deixe manipular pela mídia, e de forma indireta ou direta o sistema midiático tira proveito disto. É o que explica Artur Cezar Souza:

 

Há interesse próprio dos meios de comunicação em massa, muitas vezes delineado por uma conotação especificamente econômica, pois a empresa midiática não deixa de ser um meio de produção econômica (capital/trabalho), a seletividade dos temas tratados pelos mass media não está à margem dos ‘cabimentos’ dos aspectos culturais, sociais e econômicos de um dado momento histórico.[17]

 

Mas por que a sociedade acompanha com espantosa morbidez episódios trágicos da vida real tal qual acompanha novelas? 

Para tal pergunta, pode-se citar também a teoria do famoso filósofo Aristóteles, de que a tragédia resulta numa catarse da audiência e isto explicaria o motivo dos humanos apreciarem assistir ao sofrimento dramatizado. Concluiu que o espetáculo trágico para realizar-se como obra de arte deveria sempre provocar a Katarsis, a catarse, isto é a purgação das emoções dos espectadores. Assistindo às terríveis dilacerações do herói trágico, sensibilizando-se com o horror que a vida dele se tornara, sentindo uma profunda compaixão pelo infausto que o destino reservara ao herói, o público deveria passar por uma espécie de exorcismo coletivo..[18]

RUPTURA DOS PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS E PROCESSUAIS PENAIS INAPLICADOS NOS CASOS CONCRETOS

 

Para complementar e aprofundar o tema estudado, abordaremos adiante exemplos reais de como a mídia, através de sua influência pode modificar o Devido Processo Legal e ferir tantos outros princípios inerentes ao acusado em alguns casos.

Vejamos tais interferências das comunicações sociais na decisão judicial destes casos a seguir expostos.

 

 

2.1   CASO “COQUEIRO”

 

Mota Coqueiro era dono de uma grande extensão de terras, na qual possuía muitos escravos, empregados e meeiros. Entre estes últimos estava Francisco Benedito da Silva, juntamente com sua numerosa família. Uma de suas filhas, Francisca acabou tendo um caso amoroso com o suposto assassino Mota Coqueiro. Ao tomar conhecimento do relacionamento o pai da moça passou a chantagear Coqueiro.

Em uma noite de 1852, Francisco Benedito e toda sua família (esposa, três filhos adolescentes e três crianças) foram mortos a golpe de facões por um grupo de cerca de oito negros, escapando somente Francisca, a filha grávida. 

Nas palavras do mestre Yúdice Andrade, tal história poderia se resumir da seguinte maneira:

 

Em apertadíssima síntese, Manoel da Motta Coqueiro era um fazendeiro na região de Macabu, hoje Município de Macaé, Estado do Rio de Janeiro. Na noite de 12.9.1852, a família do colono Francisco Benedito da Silva foi chacinada, sendo oito pessoas trucidadas. A única sobrevivente foi uma das filhas do colono, Francisca, amante de Coqueiro e que dele engravidara. Esse teria sido o estopim do crime e, tendo Coqueiro angariado muitas e influentes inimizades ao longo da vida, seja no campo pessoal, seja no político, não faltou quem o acusasse da mortandade. (...)[1]

 

Conhecido como o crime do Caso Coqueiro, ou também como a Fera de Macabu, um crime ocorrido por volta do século XIX, e que condenou Manoel da Mota Coqueiro à pena de morte por enforcamento por ter supostamente matado a família de meeiros que viviam em suas terras, que até hoje repercute como um dos maiores erros da justiça brasileira, e que inevitavelmente sofreu repercussões no Sistema Penal Brasileiro, que pouco depois eliminou a pena de morte no Brasil.

 

2.1.1    Como a mídia influenciou e influencia nos tempos passados e atuais

 

A mídia vem se configurando como uma intensa ferramenta formuladora e criadora de opiniões, saberes, normas, valores e subjetividades. Utilizando-se de manobras estratégicas, a mídia, na maioria das vezes, não dialoga, mas sim unidireciona sua mensagem para o interlocutor, fazendo com que um grande contingente de pessoas aviste o mundo por suas lentes, seus vieses. Assim, como a mídia influencia há tempos[2], em diversos setores sociais, é obvio que a Justiça não ficaria alheia a isto.

No caso Coqueiro, ocorrido no período imperial, em 1852, não foi diferente.

Executado no dia 6 de março de 1855, após decisão confirmada pelos tribunais superiores, - o fazendeiro sempre afirmou sua inocência -, porém houve grande manifestação por parte dos jornais que, antes mesmo de qualquer sentença, já noticiaram o crime intitulando o acusado de “A Fera de Macabu”, consequentemente houve também forte pressão popular influenciada pelos jornais.

Depois de sua morte surgiram diversas provas que demonstraram que Motta Coqueiro foi vítima de uma conspiração de seus adversários políticos, deixando nas mãos de seus julgadores o sangue inocente de um acusado que sofreu a perseguição da mídia.

O jornal “O Globo” em 21 de setembro de 2010, se referiu ao tema ilustrando o erro processual cometido pela forte influência midiática da época em torno do caso. Vejamos:

 

 

Ainda no Império, o fazendeiro Mota Coqueiro, suposto assassino de uma família de escravos, foi sentenciado à morte por um crime que não cometeu, mas os jornais, empolgados com a notoriedade do caso, a ele Mota Coqueiro, só se referiam como a Fera de Macabu. Quando, depois da sua execução, se descobriu que o processo fora manipulado por um poderoso inimigo de Coqueiro para incriminar o réu, o imperador, horrorizado, passou a comutar, sistematicamente, as penas de morte. [3]

 

Observa-se que a mídia pode ser considerada como um quarto poder, ou seja, o quarto maior segmento econômico do mundo, sendo a maior fonte de informação e entretenimento que a população possui. Seria um poder paralelo de condenação, sentenciador de casos penais, que estariam sempre de acordo com as perspectivas midiáticas, uma vez que seu poder de manipulação pode atuar como uma espécie de controle social.

Assim contribui para o processo de massificação da sociedade, resultando num contingente de pessoas que caminham sem opinião própria, revelando que a sentença midiática seria a correta, excluindo o Código Penal e a verdadeira Corte, não havendo nenhum devido processo legal e muito menos um estado de defesa e inocência do acusado.

Subliminarmente, através da televisão, das novelas, jornais e internet, é transmitido um discurso ideológico, criando modelos a serem seguidos e homogeneizando estilos de vida, exatamente como aconteceu no caso Coqueiro, já que o caso foi conduzido de acordo com a vontade jornalística da época, a mídia manipulada pela perspectiva e vontade dos poderosos da época, e talvez, se não houvesse tanta pressão midiática no referido caso, talvez a história fosse outra.

A grande problemática estaria na seletividade escolhida pela mídia, pois somente o que é de seu interesse, sua vontade, estaria exposto à opinião pública.

Essa seletividade decorrente da busca pela rentabilidade da própria mídia, que é uma empresa que visa o lucro, seja através de seus patrocinadores que escolhem um tema, seja através da audiência. O importante é perceber que por trás da televisão, rádio, jornal, entre outros, há um grupo de pessoas não interessado nas consequências de notícias e sim no resultado que ali irão obter.

Helmut Kury percebeu também esse interesse próprio dos meios de comunicação. Vejamos:

 

(...) os meios de comunicação de massa e os jornalistas, como o resto da imprensa e dos profissionais, perseguem também interesses próprios, que não coincidem com aqueles da coletividade. Crescente concentração e crescente globalização tornam gigante o problema da ‘luta pela sobrevivência’. Isso que tradicionalmente se vende bem é ‘sexo e crime’, com a conseqüência  de um complexivo aumento as notícias de crônica.[4]

 

Sobre esta influência no tempo e sua seletividade David Garland aduz:

 

Durante a maior parte do século XX, as penalidades que pareciam como explicitamente retributivas ou deliberadamente duras foram amplamente criticadas como anacronismo em um sistema penal ‘moderno’. Porém, nos últimos vinte anos temos visto nos ‘Estados Unidos e na Grã-Bretanha a reaparição da retribuição do ‘merecimento justo’, como um objetivo político generalizado.[5]

 

No decorrer do tempo, como houve um enfoque maior dos meios de comunicação social em cima de temas relacionados à violência, uma revolta subliminar começou a surgir na vida das pessoas: o que antes era repudiado (como a pena de morte, execuções sumárias, linchamentos e outras formas de julgamento) agora é requisitado pela população que clama pelo aumento das penas e reforma do Código Processo Penal para um código mais severo.

Continuando o pensamento de Garland, este afirma que:

 

“Durante a maior parte do século XX, era virtualmente tabu a expressão abertamente assumida de sentimentos vingativos, ao menos por parte dos funcionários do Estado. Nos últimos anos, a tendência explícita em expressar a ira e o ressentimento público tem-se convertido em tema recorrente da retórica que acompanha a legislação e as tomadas de decisões de uma maneira geral. Atualmente invocam-se com freqüência os sentimentos das vítimas ou das famílias ou de um público temeroso e indignado para apoiar novas leis ou políticas penais.”[6]

 

Para finalizar esta teoria de como a mídia pode, fez e faz de forma sorrateira tal modificação de pensamento, de cotidiano e na lei, citamos os ensinamentos de Luhmann:

 

(...) ainda que habitualmente pareça que os temas tratados pelos meios de comunicação em massa são transportados da política, economia, arte, direito etc., o que efetivamente sucede é que os meios de comunicação em massa transformam esses temas de maneira peculiar. É precisamente esse processamento e reprocessamento de temas advindos de outros confins que acaba por construir o universo específico e fechado dos meios de comunicação de massa. Nem a informação, nem a representação que se faz nos meios de comunicação sobre a arte é arte; nem a informação nem a representação sobre a ciência é ciência; nem a informação, nem a representação sobre a política é política; nem a informação nem a representação sobre o crime é crime.[7]

 

 2.2  CASO “NARDONI”

 

Ao digitar o nome “Isabella Nardoni” no maior site de busca da internet, o gigante Google, aparece como resposta cerca de 330 mil sites que noticiaram e acompanharam o crime[8], todas as imprensas se focaram no crime que chocou o país e o mundo.

Em 29 de Março de 2008, foi encontrado na grama do Edifício London o corpo da menina Isabella Oliveira Nardoni, atirada do 6º andar do prédio. Ainda houve atendimento de socorro, mas ela não resistiu e morreu a caminho do hospital.

Isabella era filha de Ana Carolina Cunha de Oliveira e de Alexandre Alves Nardoni, que se separaram quando Isabella tinha onze meses. Em acordo jurídico foi definida pensão alimentícia mensal de R$ 250 (duzentos e cinquenta reais) e o direito a duas visitas por mês. Na época da morte Alexandre Nardoni vivia com a madrasta da menina, Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá, e tinham mais dois filhos, um de três anos e outro de onze meses.

Na edição 2057, de 23 de abril de 2008, menos de um mês após o crime, a revista Veja já decidira quem seria os criminosos, com a foto do casal Ana Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni com a legenda: “Foram Eles”.

A esse respeito aduzem Gustavo Vargas Quinamo e Marcelo Zenkner:

 

 Em um olhar jurídico logo observará, dentre as muitas dimensões da relação de comunicação social, uma dupla potencialmente conflituosa: quanto aos difusores, se manifesta como liberdade de expressão e comunicação e, no que tange aos destinatários, surge em face dos direitos suscetíveis de serem afetados pela divulgação de fatos ou opiniões pela mídia. A problemática do tema que nos propusemos a estudar reside no fato de que, em muitos casos, embora ainda haja dúvidas sobre um determinado delito, sobre suas circunstâncias e autoria, ainda assim os meios de comunicação noticiam tais dados, em muitos momentos, de forma sensacionalista. Uma vez veiculadas pela mídia, essas informações acabam por tornar-se certezas aos olhos da população, o que contribui para embutir a idéia de que suspeitos e acusados não possuem o direito, nem mesmo, de preservar as garantias advindas de sua personalidade.[1]

 

2.2.1 Prisão preventiva e Devido Processo Legal

 

O devido processo legal é corolário de todo e qualquer modelo de processo democrático de apuração de um crime, sendo direito do acusado ter um processo justo, de acordo com as leis e é dever do estado fornecer isso aos acusados e à população em geral.

O princípio está previsto em nossa Constituição Federal brasileira, art. 5º, LIV, in verbis:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; (...) [2]

 

Nas palavras do professor Uadi Lammêgo Bulus o “devido processo legal é o reservatório de princípios constitucionais, expressos e implícitos, que limitam a ação dos Poderes Públicos” [3], ou seja, o devido processo legal é o elo entre todos os outros princípios inerentes ao acusado, sendo um direito inerente à vontade do acusado, servindo de base para qualquer processo, seja penal ou cível.

Continuando na ideia do Professor Lammêgo, podemos dizer que o devido processo legal é “mais do que um princípio, é um sobreprincípio, ou seja, fundamento sobre o qual todos os demais direitos fundamentais repousam. Por seu intermédio, a toda pessoa deverá ser concedido o que lhe é devido.”

Assim, por meio deste sobreprincípio podemos impedir o livre arbítrio das autoridades executivas, legislativas e judiciais, havendo um molde regulador, que é o direito-dever do cidadão de receber o devido processo legal.

Posto isso, podemos dizer que não foi concebido o devido processo legal no caso de Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá.

Demonstra-se tal fato através da prisão cautelar deferida para ambos, primeiramente, ainda em fase de inquérito policial a prisão temporária, e posteriormente em fase processual, prisão preventiva.

A prisão cautelar é meio previsto em nosso código penal para a segurança do meio processual, acautelando o processo e não a sociedade.

Vejamos os artigos 311, 312 e 313 do Código de Processo Penal Brasileiro:

 

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

 

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).

 

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

 I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;.

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.” (GRIFO NOSSO)[4]

 

 

Presos inicialmente em regime temporário, visando o bom andamento processual, e em seguida, por meio de despacho do juiz Maurício Fossen, do 2º Tribunal do Júri da Capital foi determinada a prisão preventiva de ambos, considerando materialmente presentes os indícios de autoria dos dois crimes atribuídos ao casal: homicídio doloso triplamente qualificado e fraude processual (mudança do cenário do local do crime) agravada por, presumivelmente, ter sido cometida para produzir efeito em um processo penal que ainda não havia sido iniciado.

Vejamos a decisão proferida pelo magistrado:

 

“(...) Por fim, quanto ao requerimento de decretação da Prisão Preventiva dos réus (...) entende este Juízo que tal pretensão deve realmente ser acolhida no presente caso concreto, já que se encontram presentes os requisitos legais exigidos para tanto pelos arts. 311 e 312, ambos do Código de Processo Penal.

Porquanto este mesmo magistrado já tenha decretado, em momento anterior, a prisão temporária dos réus, o fato é que os fundamentos para a decretação da prisão preventiva são totalmente diversos e, portanto, em nada vinculam a presente decisão, uma vez que se tratam de medidas judiciais com finalidades totalmente diversas.

Isto porque a prisão temporária decretada anteriormente possuía um objetivo estritamente pré-processual, visando, no entendimento deste magistrado, impedir que a presença dos réus na cena do crime, naquele momento – sobre quem recaíam as suspeitas de autoria do delito – pudesse acarretar algum prejuízo aos trabalhos de campo que as perícias técnicas já designadas e que se mostravam imprescindíveis para o esclarecimento dos fatos, necessitavam ainda serem realizadas naquele local.

(...)

No presente caso concreto, ainda que se reconheça que os réus possuem endereço fixo no distrito da culpa, posto que, como noticiado, o apartamento onde os fatos ocorreram foi adquirido recentemente pelos mesmos para ali estabelecerem seu domicílio, com ânimo definitivo, além do fato de Alexandre, como provedor da família, possuir profissão definida e emprego fixo, além de não ostentarem outros antecedentes criminais e terem se apresentado espontaneamente à Autoridade Policial para cumprimento da ordem de prisão temporária decretada anteriormente, isto somente não basta para assegurar-lhes a manutenção de sua liberdade durante todo o transcorrer da presente ação penal,

(...)

Na visão deste julgador, prisão processual dos acusados se mostra necessária para garantia da ordem pública, objetivando acautelar a credibilidade da Justiça em razão da gravidade e intensidade do dolo com que o crime descrito na denúncia foi praticado e a repercussão que o delito causou no meio social, (...)

Sob esta ótica, pode-se constatar que a conduta imputada aos autores do crime descrito na denúncia deixa transparecer que se tratam de pessoas desprovidas de sensibilidade moral e sem um mínimo de compaixão humana, ainda mais em se tratando do fato de que a vítima seria filha de um deles e enteada do outro, a qual estava sob a responsabilidade dos mesmos, e que, se não por esta razão jurídica, ao menos pelo dever moral, deveriam velar por sua segurança, o que, no entanto, foi desprezado por eles, posto que além da acusação de esganadura contra a menina, a qual teria provocado um quadro de asfixia mecânica, como apontado na conclusão do laudo pericial juntado aos autos, foi ainda brutalmente atirada pela janela do 6º andar do prédio onde a família residia, sem nenhuma piedade.

Queiramos ou não, o crime imputado aos acusados acabou chamando a atenção e prendendo o interesse da opinião pública – em certa medida, deve-se reconhecer, pela excessiva exposição do caso pela mídia que, em certas ocasiões, chegou a extrapolar seu legítimo direito de informar a população – o que, no entanto, não pode ser ignorado pelo Poder Judiciário e fazer-se de conta que esta realidade social simplesmente não existe, a qual dele espera uma resposta.

(...)

Assim, frente a todas essas considerações, entendendo este Juízo estarem preenchidos os requisitos previstos nos arts. 311 e 312, ambos do Código de Processo Penal, defiro o requerimento formulado pela D. Autoridade Policial, que contou com a manifestação favorável por parte do nobre representante do Ministério Público, a fim de decretar a prisão preventiva dos réus Alexandre Alves Nardoni e Anna Carolina Trotta Peixoto Jatobá, por considerar que (...) se mostra justificável não apenas como medida necessária à conveniência da instrução criminal, mas também para garantir a ordem pública, com o objetivo de tentar restabelecer o abalo gerado ao equilíbrio social por conta da gravidade e brutalidade com que o crime descrito na denúncia foi praticado e, com isso, acautelar os pilares da credibilidade e do prestígio sobre os quais se assenta a Justiça que, do contrário, poderiam ficar sensivelmente abalados. (Grifo nosso)[5]

 

Observemos que os indícios de autoria são mais do que suficientes para demonstrar a periculosidade e sustentar a recomendação da prisão do casal acusado, porém o juiz baseou-se principalmente na questão da "garantia da ordem pública", expresso no artigo 312, em virtude do seu potencial na repercussão social, onde a decisão do juiz mostrou que a repercussão pública provocada pela mídia é o fator principal para a decretação daquela prisão mostrando seu entendimento através dos comentadores jurídicos de Guilherme de Souza Nucci:

 

Crimes que ganham destaque na mídia podem comover multidões e provocar, de certo modo, abalo à credibilidade da Justiça e do sistema penal. Não se pode, naturalmente, considerar que publicações feitas pela imprensa sirvam de base exclusiva para a decretação da prisão preventiva. Entretanto, não menos verdadeiro é o fato de que o abalo emocional pode dissipar-se pela sociedade, quando o agente ou a vítima é pessoa conhecida, fazendo com que os olhos se voltem ao destino dado ao autor do crime. Nesse aspecto, a decretação da prisão preventiva pode ser uma necessidade para a garantia de ordem pública, pois se aguarda uma providência do Judiciário como resposta a um delito grave. [6]

 

Bem é verdade que o Brasil se abalou com as circunstâncias do crime, a comoção social pela sua atrocidade, todavia, não podemos ignorar o fator decisivo para esta a comoção popular: a ênfase absurda da mídia na divulgação do caso.

Agora pensemos: se sempre agirmos assim temos um problema, pois seriam os meios de comunicação o órgão selecionador para o judiciário verificar os casos que são e os que não são passíveis de decretação de uma prisão preventiva.

Ou seja: se a mídia resolver noticiar certo crime “A”, o acusado será preso. Se esta não tiver interesse de noticiar o crime “B”, o acusado terá direito a sua liberdade, e porventura este até poderia realmente ter necessidade de prisão temporária, porém não houve o enfoque da mídia para aquele crime.

Realmente todo o sistema igualitário do processo penal estaria prejudicado, e mais, a tão citada segurança jurídica, abalada.

Parafraseando o magistrado, não podemos fazer de conta que essa realidade social simplesmente não existe.

 

2.2.2 Influência no tribunal do Júri

 

A instituição do júri está previsto em nossa Carta Magna, no artigo 5º, inciso XXXVIII, trazendo quatro princípios básicos que o regem, como cita Andrey Borges de Mendonça:

 

a) plenitude de defesa. No Tribunal do Júri a ampla defesa é potencializada, de sorte que são admitidos, inclusive, argumentos extrajurídicos (morais, religiosos, ético etc.). Segundo se entende, o referido princípio vai além da garantia da ampla defesa. Uma demonstração disto é que o juiz presidente deve dissolver o Conselho de Sentença em razão do desempenho insuficiente do advogado,. Outro exemplo, agora expresso na reforma, é que o juiz presidente deve considerar tanto a autodefesa quanto a defesa técnica no momento de formular os quesitos;

b) soberania dos veredictos: significa que os juízes togados não podem se substituir aos jurados na decisão da causa, ou seja, o mérito do julgamento é de competência exclusiva dos jurados (absolver ou condenar). Vale destacar que este princípio não é absoluto, possuindo algumas restrições, entre elas a possibilidade de absolvição sumária e a revisão criminal, situações excepcionais criadas em beneficio do próprio indivíduo;

c) sigilo das votações: visa assegurar aos jurados a garantia de que não sofrerão perseguições em razão das suas decisões. Para tanto, existe a sala secreta, com os corolários que dela decorrem, e a incomunicabilidade entre os jurados;

d) competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida: é possível que a lei amplie a competência do Júri, mas nunca a restrinja. Inclusive já há uma hipótese de ampliação, contemplada no art. 78, inc. I, do CPP, que prevê a competência do Júri para o julgamento dos crimes conexos contra a vida.[7]

 

Recorde-se que o tribunal do júri já é meio processual existente há tempos e foi criado por meio da Lei nº 263/1948, dando redação nova a vários artigos do Decreto-lei nº 3.689/1941, que é nosso Código de Processo Penal, estando em vigência até os dias de hoje.

Assim, ficou definido pelos artigos 2º e 3º da Lei nº 263, a competência do júri popular, tanto em razão da matéria, como pela conexão ou contingência, respectivamente, ocorrendo na redação final dos artigos 74 e 78 do Código de Processo Penal.

Segundo Tucci, “o artigo 5º da referida lei, inovou o procedimento de quesitação dos jurados a respeito das circunstâncias agravantes e atenuantes, modificando o artigo 484 do Código de Processo Penal. Já o artigo 7º da lei previa a nulidade por deficiência dos quesitos ou das respostas, e contradição entre elas.” [8]

Portanto, de acordo com o citado autor:

 

 A inovaçãode relevante importância, trazida pela mencionada lei foi a contida no artigo 8º, que deu nova redação ao artigo 593, III, “d”, do Código de Processo Penal, inserindo a apelação limitada, que visava controlar, através das jurisdições superiores, para garantir o princípio da soberania das decisões do júri, os vereditos populares.[9]

 

Com base neste breve ideia do que é o tribunal do júri, perguntamos, se essas pessoas do povo ficam inertes a toda divulgação propagada pela mídia antes e durante o julgamento que estão decidindo?

Seria possível que os jurados, escolhidas aleatoriamente, não tenha se envolvido demais com o crime, antes mesmo de ver os autos? Será que antes mesmo de sentar-se na cadeira de júri ela já não sentenciou o crime como fazem os meios de comunicação?

Continuando os ensinamentos de Rogério Tucci, respondemos que não, vejamos:

 

Quem não se lembra das centenas de pessoas à porta do Fórum de Santana, na Zona Norte de São Paulo, com faixas, cartazes e fotos da menina Isabella? As pessoas aguardavam na calçada gritando palavras de ordem, como ‘Justiça!’, e pedindo a condenação por unanimidade do casal aos brados de ‘7 x 0’. Muitos também gritavam ‘Isabella, eu te amo!’ Quando anunciada a condenação, uma explosão de alegria em frente ao local. A multidão gritava: ‘condenados!’, ‘condenados!’. Em seguida, passaram a gritar: ‘Cembranelli!’, ‘Cembranelli’ – nome do Promotor de Justiça que atuou no caso. Após a leitura do veredicto do júri que condenou o casal, as pessoas festejaram soltando fogos de artifício.[10]

 

É indispensável persistir no fato de que toda esta pressão midiática, exercida pelos meios de comunicação, contagia a atuação do juiz presidente da sessão do Júri, assim, como também interfere no resultado final nos votos dos jurados, que representam a sociedade. Por isso, de acordo com Ailton Henrique:

 

Todo este excesso de emotividade, os fatos narrados de forma teatral, às vezes sem apoio nas provas colecionadas aos autos, a pressão da opinião pública, tudo isso afeta sobremaneira a atuação do jurado na sessão de julgamento, a tal ponto que, principalmente em casos de grande repercussão, seu veredicto já se encontra elaborado antes mesmo do sorteio de seu nome para compor o Conselho de Sentença, a despeito do que ele possa ouvir ou ver durante a sessão.[11]

 

Em relação a esta influência da mídia no tribunal do júri, relata-se outro exemplo dado por Flávio Prates e Neusa dos Anjos Tavares:

 

Veja-se, por exemplo, o polêmico julgamento de Suzane Reichtofen e dos irmãos Cravinhos em que antes do julgamento ocorrer uma emissora de televisão colocou no ar um membro do Ministério Público e o advogado de Defesa da ré. Os dois debateram acerca das teses que seriam usadas durante o julgamento, ou seja, o julgamento estava acontecendo no ar, perante o público e o apresentador do programa exaltando que agora é que se veria se existe justiça neste país. Como se a condenação de Suzane fosse a exata medida de justiça para todos os crimes. [12]

 

Concluído a ideia de que é possível a influência da mídia no tribunal do júri, em especial do caso “Nardoni”, registra-se as palavras de Flávia Christiane Figueira Sampaio:

 

Onde fica a total imparcialidade dos jurados nesse caso?

Um número recorde de inscrições foi registrado no Fórum de Santana, das mais diversas localidades, para se fazer parte do júri.

Constituiu-se de um crime bárbaro, repulsivo pela moral da sociedade, porém sem provas, existindo sim um emaranhado de suposições que levaram a crer na culpabilidade dos dois acusados, mas que desde o primeiro momento foram taxativamente apresentados pela mídia com os verdadeiros e únicos culpados pela defenestração da menina Isabella.

Há de se observar que centenas de caso como este acontecem em todo o Brasil por ano, mas que não chegam ao conhecimento da população, e muitas vezes por não possuir provas materiais, os acusados são absolvidos.

O próprio juiz Maurício Fossen, que presidiu o Júri do casal Nardoni em suas palavras anteriores a prolação da sentença, afirmou que tendo em vista a grande repercussão do caso, o referido julgamento era uma resposta a sociedade tão calejada de casos sem solução pela justiça Brasileira.

Mas será que essa tão aguardada condenação foi justa?

O que realmente aconteceu neste caso, dificilmente será conhecido pela população. Deve-se ter cuidado quanto a total divulgação dessas informações para que verdadeiros inocentes não sejam condenados por crimes que não cometeram e que a verdadeira justiça seja a mais imparcial possível.  Não se fala aqui em censura, mas sim em responsabilidades e limites de todos os envolvidos.[13](GRIFO NOSSO).

 

 

2.3 CASO “ESCOLA BASE”

 

Ser acusado, xingado, escrachado publicamente, preso e ser inocente. Podem pessoas ser sentenciadas antes mesmo de um processo? Acusadas pela mídia antes mesmo de qualquer defesa? Parece possível tudo isto em uma democracia e em um país que prevê em sua Carta Maior o devido processo legal como direito inerente a qualquer cidadão? Seria isso possível?

Não só possível, como é fato, realidade ocorrida com os donos da escola Base no ano de 1994.

Em 28 de Março de 1994, na cidade de São Paulo, zona sul, duas mães vão à delegacia denunciando abuso sexual contra seus filhos, duas crianças de 4 anos que estudavam na Escola Base, relatando que os proprietários da escola Icushiro Shimada e sua esposa Aparecida Shimada, além dos sócios da instituição Maurício e Paula Alvarenga e Maurício cometeram tais abusos sexuais, arrolando ainda Saulo e Mara Nunes, pais de outro aluno, e que supostamente, na sua casa, as orgias aconteciam. 

A mãe de um dos meninos, Lucia, resolveu fazer a denuncia, quando ouviu de seu filho que teria ido à casa de um coleguinha de escola, e lá viu filme de “gente pelada” que batia “fotos” e havia “cama redonda” no local, esses pais seriam Saulo e Mara Nunes, o fato teria aconteceu no horário de aula, e não teria como ter sido outra pessoa, se não os responsáveis da escola de levarem as crianças até o local, haja vista que as crianças iam para suas residências na Kombi de um dos sócios da escola, o Sr. Mauricio.

Mediante denúncia, o delegado de plantão, Edélcio Lemos, seguiu inicialmente o procedimento de praxe mandando as duas crianças para o IML a fim de realização do exame de corpo de delito nos menores.

Em seguida, dirigiu-se ao apartamento de Saulo e Mara Nunes com as mães das vítimas, Cléa Parente de Carvalho e Lúcia Eiko Tanoue. Ao chegar ao local descrito pelos menores, o delegado não localizou indícios dos rimes, tudo apenas encontrado foi uma cama retangular, uma fita de vídeo com o show do cantor Fabio Jr, e um filme do casal na maquina fotográfica, e na escola também nada foi encontrado além de uma coleção de fitas da Disney.

Ainda em fase de inquérito policial, a TV Globo, em seu programa “Jornal Nacional” do dia 31 de março daquele mesmo ano noticiou o crime como caso de pedofilia, e já reportava como conclusivo e certo. [14] E mais, o repórter da mesma emissora afirmou neste Jornal que a perícia do IML tinha apontado abuso sexual em uma das crianças, enquanto que na verdade o laudo da perícia se mostrava inconclusivo.[15]

Em entrevista concedida à TV Cultura no dia 30 de Março de 1994, Lúcia Eiko Tanoue, mãe de uma das crianças envolvidas no caso afirma:

 

(...) Uma criança não tira isso do nada, ela não vê coisa pornográfica, ela não lê ainda. Ela só pode escutar televisão, vê desenho, está entendendo? Alguma coisa assim, porque filme pornográfico em casa eu não tenho, jamais agente assistiu então ele não sabe o que é isso. Está entendendo? Agora ele falar que viu esse filme, é que me estranhou (...)[16]

 

Informações que nunca estiveram presentes em autos ou mesmo em inquérito policial foram noticiadas pela imprensa como o fato de uma das mães das crianças ter relatado que teriam acontecido “supostas orgias” e a transmissão do vírus HIV. Relata Alex Ribeiro sobre o caso:

 

(...) Tudo o que elas (as mães acusadoras da violência sexual) denunciaram passou a ser publicado antes mesmo do registro no inquérito policial - como a denúncia ao suposto uso de tóxico e a acusação de contaminação com o vírus HIV.[17]

 

Pra complementar ainda mais o erro neste procedimento processual, o delegado responsável, incumbido de certeza de autoria do crime, falou em rede nacional que não precisaria de provas, “o inquérito é a prova”[18], e tinha certeza da culpabilidade dos indiciados. Tudo isto favoreceu ainda mais para a composição social de revolta e de certeza de culpa dos acusados antes mesmo de qualquer julgamento.

A superposição e o comportamento do delegado fez com que o a Conselheira da Policia Civil o substituísse por outro, e este, acertadamente, continuou com as investigações, e sem provas materiais de culpabilidade, arquivou o inquérito policial.

Demonstra-se a certeza social da culpabilidade dos criminosos, influenciados pela mídia desta convicção pelo fato da casa dos acusados terem sido depredadas, pichadas e a escola foi totalmente destruída pela população.

Os telejornais abordaram massivamente o caso, os veículos impressos começaram a publicar manchetes a respeito do caso. No jornal extinto “Noticias Populares” do dia 31 de Março de 1994, a sua manchete era “Kombi era motel na escolinha do sexo”. 

 Na revista Veja, de 6 de Abril de 1994, o titulo da matéria não era muito diferente: “Uma escola de horrores”.

Como repetidamente escrito neste trabalho, a imprensa sempre julga, sentenciando os acusados antes mesmo de qualquer julgamento propriamente dito, desrespeitando todos os princípios fundamentais inerentes ao acusado.

Corriqueiramente, a mídia noticia os crimes e os julga, condenando os réus, que mesmo culpados, poderiam ter outro julgamento se não houvesse influência da mídia. Porém neste caso, a mídia foi muito pior, pois além de julgar como sempre o faz, esta julgou e condena pessoas inocentes, que provaram isso no lugar que é pra ser provado: no judiciário.

 

2.3.1 Presunção de Inocência

 

O princípio da presunção de inocência, ou o direito à não consideração prévia de culpabilidade, é, sem dúvida, o mais corrompido pelos julgamentos midiáticos.

Algumas vezes a mídia julga antes de qualquer decisão judicial, ou mesmo antesdo fim do inquérito policial, sem esperar por decisão transitada em julgado.

Para definir o princípio de inocência, utilizaremos o conceito dado pelo mestre Alexandre de Moraes:

 

O princípio da presunção de inocência consubstancia-se, portanto, no direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença judicial com trânsito em julgado, ao término do devido processo legal (due processo of law), em que o acusado pôde utilizar-se de todos os meios de prova pertinentes  para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pelo acusado (contraditório).[1]

 

Sobre o estado ou situação jurídica de inocência Eugênio Pacelli afirma que:

 

Impõe ao Estado a observância e respeito a duas regras específicas ao acusado, uma com relação ao tratamento e outra de fundo probatório. (...) tratamento, segundo o qual o réu, em nenhum momento do inter persecutório, pode sofrer restrições pessoais fundadas exclusivamente na possibilidade de condenação, e a outra, de fundo probatório, a estabelecer que todos os ônus da prova relativa à existência do fato e à sua autoria devem recair exclusivamente sobre a acusação.”[2]

 

Importante destaque está nas palavras de Gustavo Vargas Quinamo e Marcelo Zenkner:

 

A questão entre o direito e, por que não, a obrigação da imprensa de informar, o direito da sociedade de ser informada e o princípio da presunção de inocência constitui emaranhado jurídico em quase todos os países. A presunção de inocência é uma das mais importantes garantias constitucionais, pois, por meio dela, o acusado deixa de ser um mero objeto do processo, passando a ser sujeito de direitos dentro da relação processual. [3]

 

Interessante transcrevermos o ensinamento de Luigi Ferrajoli sobre a presunção de inocência:

 

É um princípio fundamental de civilidade, fruto de uma opção garantista a favor da tutela da imunidade dos inocentes, ainda que para isso tenha-se que pagar o preço da impunidade de algum culpável. Isso porque, ao corpo social, lhe basta que os culpados sejam geralmente punidos, pois o maior interesse é que todos os inocentes, sem exceção, estejam protegidos.[4]

 

Colide esse julgamento midiático antecipado com o princípio da presunção de inocência, sendo prerrogativa conferida constitucionalmente ao acusado[5], de não ser tido como culpado até sentença condenatória transitada em julgado, (não sendo possível a impetração de mais nenhum recurso.). Com tal prerrogativa, vislumbra-se a proibição de qualquer ação punitiva antes da decisão final da justiça, e por punição, devemos entender não apenas a prisão do suspeito, mas também sua execração pública, a imputação de fatos não comprovados, gerando um estigma que ele carregará, em alguns casos, por toda a vida.

Tal preocupação também é vislumbrada na Declaração Universal dos Direitos do Homem, documento assinado pelo Brasil, e que diz seu art. XI: “Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”[6]

Em outras convenções e tratados internacionais também observamos a proteção do estado de inocência do acusado, como na Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, bem como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos que também introduziram dispositivos semelhantes, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, chamada Pacto de San José da Costa Rica, subscrita pelo Brasil que adotou o princípio de que toda pessoa acusada de delito tem direito de ter presumida sua inocência, até que se comprove, ou não, legalmente, sua culpa.

O próprio Código de Ética dos Jornalistas, (que tem por escopo oferecer subsídios ao jornalista de como ele deve se portar diante de situações que envolvam a ética perante o público ou os meios de comunicação), foi atualizado e introduzido o artigo de número 9, que afirma que “a presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística”.

Este novo Código de Ética dos Jornalistas trouxe consigo novas esperanças para os limites da mídia ao ratificar a presunção de inocência como um dos fundamentos da profissão. Para Venício Lima, o código vem restaurar os limites da imprensa na obrigação de respeitar o texto constitucional.

 

O novo código reforça o preceito constitucional de que qualquer pessoa é inocente até prova em contrário, com o objetivo de "coibir a ação de meios de comunicação que, em sua cobertura jornalística, denunciam, julgam e submetem pessoas à execração pública. Isto é crime, mas muitas vezes sequer o direito de resposta é concedido aos denunciados. Por que não se aplicaria ao jornalista o princípio da presunção de inocência, que tem sua origem na Revolução Francesa e está consagrado na Constituição de 1988? O texto constitucional diz, no seu art. 5º, inciso LVII: "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

Não seria a obediência a este princípio dever elementar de qualquer cidadão e, sobretudo, dos jornalistas, independente das informações que obtiver e de sua convicção pessoal?[7]

 

Nota-se que mundialmente há a preocupação de não haver um pré-julgamento do acusado, que só poderá ser considerado culpado após todas as instâncias competentes assim o julgarem.

O inquérito policial tem como uma de suas características ser sigiloso, porém não é isso que observamos na prática, onde a mídia, normalmente, detém as informações ali contidas. O caso abordado da “Escola Base” é um exemplo disto. A mídia utiliza estas informações para fazer seu pré-julgamento e expor a vida do acusado em troca de audiência.

Sobre tal exploração afirma o autor Edilson Farias:

 

Fotografar ou filmar pessoas detidas ou suspeitas de perpetrarem infrações à lei, sem o consentimento das mesmas, além de constituir violação do direito à imagem daquelas pessoas, expõe ainda à execração pública cidadãos que geralmente não foram julgados e condenados por sentença transitada em julgado, sendo, pois, presumivelmente inocentes (CF, art 5º, LVII).[8]

 

O fato é que a mídia, querendo ou não, acaba violando esse princípio basilar de toda unidade democrática, como podemos verificar no texto trazido pela revista Veja,[9] em que no titulo líamos “Uma escola de horrores”, e na matéria, altamente tendenciosa a culpabilidade dos acusados no caso da Escola Base. Verifica-se que não houve qualquer preocupação da mídia em respeitar o princípio constitucional e o direito dos acusados da presunção de inocência.

Nas palavras do professor Luiz Fernando Pereira Neto:

 

É simplesmente impressionante como na maioria das vezes os meios de comunicação agem, como se a lei não se aplicassem a eles, uma visão poderosa de que estes são princípios a serem obedecidos por cidadãos comuns, não por esta entidade tão magnânima.  Sendo assim, fica claro não ser possível obrigar a mídia a respeitar o princípio da não violação do estado de inocência, quando a própria sociedade fomenta esses espetáculos proporcionados pelos veículos de comunicação, dando audiência a fatos que massacram nossas garantias constitucionais.[10]

 

É fundamental que haja a preocupação do poder judiciário para que a mídia não possa obstruir esse direito básico do cidadão. E caso isso venha a ocorrer, que sejam impostas medidas corretivas para a imprensa, pois até o momento o que vemos é o uso irresponsável da liberdade da imprensa.

 

2.3.2 Ação civil como forma de solucionar os abusos cometidos

 

Os acusados da Escola Base, depois de comprovada sua inocência (pois, por incrível que pareça, eles eram culpados até que foi provado o contrário), ajuizaram ações contra a Fazenda Pública, Editora Abril, Editora Três, O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, TV Globo, TV SBT, TV Record e TV Bandeirantes, buscando o mínimo de ressarcimento pelos danos causados.

Após 18 anos, o processo movido com intuito de ressarcimento dos danos morais cometidos, ainda se encontra em fase recursal, e os senhores Icushiro Shimada, Maria Aparecida Shimada e Maurício Monteiro de Alvarenga, proprietários da Escola de Educação Infantil Base, ainda não receberam por parte do Estado de S. Paulo nenhum valor pecuniário como forma indenizatória pelo erro da Polícia Civil, mais especificamente do Delegado do início do caso, Sr. Edélcio Lemos, que muito cedo culpou e denegriu a imagem dos acusados.

O Recurso Especial nº 351.779-SP foi julgado pelo STJ em 19 de novembro de 2002, que decidiu condenar o litisdenunciado (Edélcio Lemos) a ressarcir os cofres públicos por inteiro e aumentar a indenização a título de danos morais para R$250.000,00 para cada um dos recorrentes.

Em sua decisão, a relatora Eliana Calmon proferiu:

 

O pleito indenizatório teve como causa de pedi a irregularidade na condução de um inquérito policial, que levou a trágicas conseqüências. E isto porque o agente estatal, o Delegado de Polícia que conduziu o processo, sem provas precisas se antes mesmo do final das investigações, de forma irresponsável, divulgou para a imprensa resultados duvidosos do seu trabalho, resultados estes que chegaram à imprensa de forma sensacionalista, como sendo de conclusão final, quando em verdade estavam as investigações policiais ainda em curso, no final das quais foram os autores inocentados das levianas acusações. O que levou os litigantes ao absurdo de serem repudiados e quase linchados pela população, perdendo não só a honra, mas o estabelecimento de ensino e o sossego de viver honesta e tranquilamente. (...) Por fim, não tenho dúvida em dizer que o sofrimento pelo qual passaram os autores, agredidos, desrespeitados, aniquilados pela opinião pública, jamais será ressarcido completamente, senão na Recomposição do que perderam patrimonialmente.[11]

 

Atualmente, o processo contra o estado de São Paulo se encontra em fase de recurso extraordinário para o STF e ainda aguarda julgamento.

A também processada Rede Globo foi condenada a pagar R$ 1,35 milhão para reparar os danos morais sofridos pelos donos e pelo motorista da Escola Base. Segundo informações do Consultor Jurídico, os donos da escola,  deve receber o equivalente a 1.500 salários mínimos (R$ 450 mil), cada um. Antes da Rede Globo, outros veículos de comunicação, como jornais e emissoras de tevê, também foram condenados a pagar indenização, porém em todos os casos, no entanto, ainda cabe recurso.

Foi defendido pelo TJ-SP que o direito de informação e a liberdade de imprensa não se sustentam no espetáculo nem no linchamento, mas na cautela para com a honra e dignidade das pessoas, entendendo ainda que na sua atuação, a imprensa deve ter precaução na divulgação ou veiculação de fatos ofensivos à dignidade e aos direitos de cidadania.

O Jornal Folha de S.Paulo foi condenado a pagar R$ 750 mil (setecentos e cinqüenta mil reais) e a Editora Três, responsável pela publicação da revista IstoÉ responsável a pagar R$ 360 mil (trezentos e sessenta mil reais) aos donos da escola à titulo de danos morais. Ressalta-se que em todos os casos de processos por danos morais ainda cabe recurso.

E por óbvio, quando finalmente forem pagas as indenizações as pessoas prejudicadas, com certeza não ressarcirá toda a dor causada, sendo elas um meio de se coibir futuros equívocos da mídia. Essas indenizações devem ter caráter pedagógico, de forma a tornar a imprensa mais cautelosa na divulgação de fatos dessa natureza, sabendo que, ao extrapolar seu papel meramente informativo, sofrerá sanções de cunho pecuniário.

Como é de sabedoria geral, o processo judiciário é lento, o que faz com que, passados 18 anos ainda não houvesse por parte da mídia, nem do estado qualquer tipo de ressarcimento pelos danos causados.

A única coisa que temos até agora são pessoas que tiveram a imagem denegrida e que ainda sofrem com o caso.

 ANÁLISE CRÍTICA DOS CASOS APRESENTADOS

 Em todos os casos apresentados, vimos que de uma maneira direta ou indireta a mídia exerceu papel de órgão julgador, e influenciou na sentença judicial dos acusados, mudando, sem dúvida, o rumo da vida dos mesmos.

O discutido aqui não é a inocência ou culpa dos acusados, mas sim que, de acordo com nossa legislação, todos tem direitos ao devido processo legal, ao princípio da inocência e a um julgamento justo. Sendo assim, observamos que foram violados tais princípios.

No julgamento de Ana Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni, ambos condenados, e provadamente culpados, atualmente estão cumprindo pena em regime fechado, liquidando sua dívida com a sociedade e a justiça. Mas se em nossa constituição está previsto direitos fundamentais, pode a mídia (que noticia os desastres da vida em prol de audiência) ir contra isto, e romper com tais direitos inerentes a qualquer ser humano?!

A análise do leitor deverá partir do pressuposto não de inocência ou culpabilidade, mas de direitos. Normalmente pensamos “Esses criminosos são culpados e devem mesmo é serem presos!”. E devem mesmo, mas não é direito nosso, nem de ninguém, muito menos da mídia, usurpar o direito do outro, para isso vivemos em um Estado Democrático de Direito, e na divisão de poderes, coube ao judiciário, julgar e condenar, de acordo com todas as leis e princípios norteadores do direito.

E quando a mídia faz seu pré-julgamento errado, como no caso da “escola base”, será que podemos correr sempre esse risco de sermos pré-julgados por um poder paralelo?

E se formos nós? Você gostaria de ser acusado por alguém incompetente? E julgado?

Com toda certeza, como diz o velho ditado, se você quer saber se aquela conduta é certa ou errada, ponha-se no lugar da pessoa prejudicada. Como já dito, não é direito de ninguém roubar o direito do outro.  Uma vez que, está previsto que todos aqueles princípios e direitos citados são inerentes ao acusado, assim deverá ser.

Importante observar o índice de audiência obtido por alguns tipos de programação que enfocam noticiários sobre crimes de grande repercussão, nos quais as versões apresentadas nem sempre retratam a realidade dos fatos, porém estes são bastante persuasivos. É bem verdade que a boa notícia não dá ibope e a maioria da audiência gosta mesmo é, como se diz vulgarmente, “ver sangue”, de ver leões comendo gente, gladiadores se matando. Sobre esse assunto, o delegado de polícia em Minas Gerais e professor de Direito Cícero Henrique Luís Arantes da Silva, aduz:

 

Com efeito, a notícia sobre o crime fascina a humanidade desde os primórdios. Trata-se de um fascínio sobre o que motiva o crime e principalmente sobre a pessoa do criminoso, diferenciando-o do homem de bem.

O que se alardeia, ainda, que muito de nossa legislação penal é irracional, portanto, obsoleta, tornando o público moralmente indignado e atenua suas emoções em vinganças localizadas.[1]

 

Assim, os meios de comunicação se tornam eficazes para o empresário da mídia obter a audiência necessária, conseguindo assim a repercussão almejada do fato criminoso. Nesse sentido, Régis de Morais entende que:

 

(...) quem tem filhos em casa sujeitos à invasão autoritária da TV, não precisa ler tratados ou fiar-se em pesquisas ditas científicas. O cotidiano mostra-lhes a ditadura que os meios de comunicação pela imagem exercem, uma vez subvertidos por espúrios interesses econômicos. Este autoritarismo se baseia nas chamadas técnicas de persuasão; isto é: o invasor invade, inferioriza com ‘doçura’ o invadido e este acaba ainda confusamente grato ao invasor.[2]

 

Denota-se que a função social da imprensa num Estado Democrático de Direito e suas premissas éticas vêm sendo corriqueiramente deixadas de lado, em virtude da frenética busca por maiores índices de audiência, e, consequentemente, maior lucro com publicidade. A mídia elege determinados cidadãos, os quais, muitas vezes, nem chegaram a ser réus em processo criminal, e, numa tentativa de substituir os próprios tribunais, transfere para si a sede do julgamento, prejulgando e crucificando homens e mulheres, não importa se culpados ou inocentes.

Nos casos concretos, observamos a quebra dessa barreira de ética e de lei e vemos como essa mídia realmente é forte e pode prejudicar aquelas pessoas que estão sofrendo persecução penal.

É o caso da mãe Danielle Toledo, acusada de ter matado a própria filha dando-lhe substâncias tóxicas (cocaína) provocando uma possível overdose. e em depoimento dado ao jornal Folha de S. Paulo, de 19 de setembro de 2010, relata que por uma noção errada do ocorrido, e pela notícia ter se espalhado de forma equivocada, ela acabou ficando presa durante 38 dias. Na prisão, por conta da violência cometida contra ela pelas próprias presidiárias, telespectadoras da versão midiática do caso, teve parte da audição e visão comprometidas.[3]

Com essa influência da mídia é possível que ocorra alteração do Código Penal?

Sim, e é o caso da filha de Gloria Perez (escritora e autora da Rede Globo), praticado pelo casal Guilherme de Pádua e Paula Thomaz no final de 1992. A Rede Globo e outros meios de comunicação divulgaram amplamente o caso, aproveitando que os meios de comunicação estavam ao seu lado. Assim, a autora passou a divulgar sua iniciativa de colher mais de 1,3 milhão de assinaturas, para inserir o homicídio qualificado no rol de crimes hediondo. E assim foi feito, enviando ao Senado essas assinaturas, e criando, por meio de iniciativa popular, a Lei nº 8.930/94.

De certo que a mídia não é um monstro, e pode e deve ser utilizada para o bem, por ser um grande e poderoso instrumento para melhorar a qualidade de vida de toda uma comunidade.

Luiz Pereira relatando sobre o lado poderoso e positivo que a mídia tem relata:

 

 

Um bom exemplo deste potencial foi uma campanha realizada no Japão e que foi retratado por Tony Schwartz.

Em Osaka, o dramático crescimento da industrialização, provocou um aumento da criminalidade. Objetivando atacar o problema, a polícia utilizou-se do antigo método de sociedade centradas no grupo. Usaram o sentimento da vergonha como um meio de controlar os gangsters, a campanha dirigia-se não somente aos criminosos, como também às suas famílias, amigos e outros elementos que mantivessem contato diário com os vagabundos de rua. Isto gerou um problema junto às famílias e amigos, que se sentiram socialmente embaraçados, pressionando os criminosos a mudar de vida. O chefe de polícia de Osaka descreveu esse processo com “tentar trocar a água onde nadam os criminosos.

Utilizar dos meios de comunicação, não para denegrir a imagem do suspeito, ou para violar o princípio da presunção de inocência, mas sim para criar hábitos morais e éticos, restabelecer os princípios tão esquecidos pela nossa sociedade. 

Se em uma nação, em que seu povo, valoriza a moral e os bons princípios, um determinado cidadão vier a delinqüir, seu sentimento de vergonha com relação às demais pessoas será quase insuportável. Numa sociedade onde estes princípios não são valorizados o criminoso não possui este sentimento de arrependimento.[4]

 

Portanto, mostramos estes casos concretos para mostrar o quão imperativo e influenciador de opiniões é a mídia, seja no cotidiano, na formação de intelecto e no judiciário brasileiro.

O direito à informação e o direito de informar não estão sendo discutidos, o que se defende neste trabalho é o jornalismo responsável e não apenas lucrativo, não havendo rupturas de direitos e nenhum pré-julgamento. O que se busca é imparcialidade da mídia e ponderação do judiciário para que não se deixe ser usado pela massa midiática.

Busca-se apenas que seja exercido o poder-dever do estado de penalizar criminosos de forma justa, e que aquele indiciado tenha todos seus direitos preservados.

Destarte, analisando os casos expostos neste trabalho, chegamos à conclusão de que a mídia influência e intervém no processo penal brasileiro de forma negativa, retirando dos acusados a chance de uma legítima defesa, usurpando o direito a um devido processo legal, influenciando nas decisões dos magistrados e julgadores no caso de tribunal do júri, além de corromper totalmente com o estado de inocência dos acusados.

A própria essência humana já faz um preconceito em cima daqueles acusados, e a mídia acaba explorando esse lado negro do ser. Observemos as palavras de Felipe Pena:

 

Os julgamentos são influenciados pela formação e, também pelo que os meios de co­municação nos apresentam como verdade. Somos cruéis em nossos julgamentos. Na maioria das vezes, esquecemos que eles são mediados. Se não forem pela imprensa, podem ser pelos nossos próprios preconceitos, pelo inconsciente ou pela linguagem. [...] os maniqueísmos se apresentam e o veredicto se resume à velha luta entre o bem e o mal. Só que os indivíduos são muito mais complexos do que isso.[5]

 

Conclui-se que deverá haver por parte da mídia conduta ética e jornalismo responsável, e ponderação dos julgadores nos casos infectados pela opinião midiática,

Sobre esta ponderação trataremos em capítulo próprio como meio de solucionar a problemática, já que temos a liberdade de imprensa e o devido processo legal e outros princípios como constitucionais, revelando um verdadeiro problema para a doutrina e para o próprio judiciário.


PONDERAÇÃO ENTRE A LIBERDADE DE IMPRENSA E O INTERESSE PÚBLICO PELA INFORMAÇÃO VERSUS DIREITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL INERENTE AO ACUSADO EM PROCESSO PENAL

 

 

4.1 LIBERDADE DE IMPRENSA

 

A liberdade de imprensa, esteio básico de toda e qualquer sociedade democrática, está inserida dentre os direitos constitucionais da liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º IV) e da liberdade de expressão (art. 5º IX).

A manifestação de pensamento, deve ocorrer livremente, sem amarras, de acordo com a sua vontade de pensar. Porém, frisa-se que esta vontade é mitigada, não podendo este pensamento ser causa de danos morais ou materiais a outrem, como a própria Constituição demonstra logo após citar a liberdade de pensamento, no inciso V, do art. 5º da Constituição Federal Brasileira, assegurando o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização pelos danos causados.

     Liberdade de expressão é o direito de manifestar livremente suas opiniões, pensamentos e ideais, sendo conceito basilar nas  democracias  modernas, nas quais a censura não tem respaldo moral. Explica-se como a liberdade de se expressar pelo exercício de atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação, não se sujeitando a qualquer tipo de censura ou licença prévia.

Vejamos o que dizem os artigos citados:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;  

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; 

(...)

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;(...)[6]

 

Observa-se que censura e licença são termos distintos, sendo o primeiro a vedação total a um pensamento, através de uma ordem expedida pelo detentor do poder que almeja impedir a circulação daquela ideia. Já a segunda é uma autorização do detentor do poder para a circulação de notícias, comunicados, livros, etc.

Nota-se que a licença prévia e a censura são objeções proibidas, porém é dever do estado regularizar e zelar pela moralidade pública, pois teríamos o caos, caso fosse possível tornar público todos os pensamentos injuriosos, difamantes e caluniosos.

Portanto, apesar de imprescindível em uma democracia o direito à liberdade de expressão e pensamento, esta não constitui salvaguarda para a prática de atos ilícitos, onde o Estado Regulador que é, deverá cumprir seu dever de zelar pelo bem estar social.

Observa-se tal preocupação do legislador ao dispor em nossa Carta Magna:

 

Art. 220 - A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no Art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

§  - Compete à lei federal:

I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no Art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente. (...)[7] (GRIFO NOSSO)

 

Desse modo, deveremos sempre estar alertas para o fato de que a liberdade de imprensa, sem dúvida alguma é de valor imensurável, não devendo existir de modo algum a censura prévia. Todavia, como antes dito deverá sempre ser contrabalanceado, como afirma Bianca Zanardi:

 

Por mais que a liberdade de imprensa seja um valor amplamente defendido, sendo inadmissível sua violação por censura prévia, deve-se lembrar que outros princípios, tão nobres quanto, devem ser protegidos, tais como a honra, imagem, intimidade, presunção de inocência, segredo de justiça e devido processo legal.[8]

 

 

 

4.2 PONDERAÇÃO DE PRINCÍPIOS COMO MEIO DE ATINGIR O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

 

O Devido Processo Legal, princípio constitucional que ladeia a vários outros princípios (contraditório e a ampla defesa, a presunção de inocência, a publicidade processual, o juiz natural), por vezes entra em conflito com o Princípio da Liberdade de Expressão, também previsto em nossa Carta Magna, e que também acompanha outros princípios (liberdade de imprensa, vedação da censura prévia e o sigilo da fonte para o exercício profissional).

De um lado do impasse temos a mídia e a divulgação de informações referentes a um crime, interrogatórios, indiciamentos e notícias que despertam o interesse da população; e do outro lado, temos a proteção dos interesses de quem sofre a persecução penal, de quem é submetido ao inquérito policial.

Então, como proceder, se ambos tratam de direitos inerentes ao homem previsto em nossa Constituição Federal? Como se comportar diante do choque de normas de mesma hierarquia dentro do ordenamento jurídico? Como balancear a liberdade de imprensa e o interesse público pela informação, de forma a não prejudicar o due process of law e o direito de transmitir e receber informações?

Para J. J. Canotilho é possível proporcionar a compatibilização dos interesses em rota de colisão, uma vez que “(...) os princípios não obedecem, em caso de conflito, a uma lógica do tudo ou nada, antes podem ser objecto de ponderação e concordância prática, consoante o seu peso e as circunstâncias do caso.” [9]

Seria uma valoração dada em particular a casos concretos, uma aplicabilidade pessoal do julgador medindo, no caso concreto, qual princípio constitucional seria mais fundamental, ponderando suas medidas.

Ana Lúcia Menezes Vieira, sobre tal valoração é enfática, quando afirma:

 

Os critérios de valoração deverão ser cuidadosos e flexíveis, capazes de proporcionar uma avaliação dos bens colidentes, suficientes para uma escolha em que não haja espaço para o arbítrio.

(...) quando um bem individual puder sofrer prejuízo que justifique a restrição da liberdade de imprensa, este direito deverá ceder espaço àquele outro. Do contrário, a tutela do direito de informar da mídia, e de ser informado, do público, deve prevalecer.[10]

 

A publicidade dos atos processuais se constitui em elemento imprescindível para o efetivo exercício da jurisdição, é uma garantia constitucional que está à disposição da sociedade para o exercício da fiscalização dos atos do judiciário, dos atos da administração pública e etc.

Todavia, a linha entre a publicidade, que favorece a democracia, e a execração popular e seus efeitos deletérios, é muito tênue. Ao mesmo tempo em que o processo público garante ao acusado a proteção dos direitos fundamentais, a publicidade exacerbada e carregada de juízos de valor, pode provocar um efeito contrário: a violação de direitos fundamentais da pessoa humana e os prejuízos que tendem a se prolongar no tempo.

Mas por que tais notícias agradam tanto ao público?

Para Altheide David, há a necessidade do cidadão colocar-se em lugar do outro, isto é, no lugar da vítima de um crime massificamente transmitido pela mass media.[11]

Por meio da sensação do medo, ao colocar-se em lugar do outro, os meios de comunicação conseguem influenciar e prender o telespectador aquele assunto, que, na opinião de Artur Souza, acaba por influenciar o telespectador. Vejamos:

 

Essa sensação de constante aumento generalizado da criminalidade também está enraizada no ‘inconsciente coletivo’ em decorrência do efeito perlocucionário do discurso retórico linguístico midiático”. Em que pese a sensação generalizada de aumento da criminalidade e a forte impressão de que a qualquer momento o cidadão poderá ser vitima de um delito de natureza grave, em recente pesquisa verificou-se que apenas em 10% dos municípios brasileiros concentram-se 71% dos crimes de homicídio do País.[12]

 

Não estando imune a essa influência, o magistrado, o delegado, e todos os outros responsáveis pelas investigações e julgamento, ficam vulneráveis a tal perspectiva, porém isto não deveria ocorrer, uma vez que deveriam sempre contrapor o peso nas balanças, uma espécie de proporcionalidade dos direitos constitucionais, observando o que a mídia apresenta, e assegurando sempre ao acusado seus direitos inerentes, não ferindo o principio de presunção de inocência, dando-lhe sempre o devido processo legal.

O contrabalanceamento dos princípios conflitantes, para que um não se sobreponha ao outro, e a ponderação, que afasta o arbítrio, deverão ser preciosos nas decisões judiciais, e não somente aí, mas também no inquérito policial, que por si só, já é um procedimento administrativo sigiloso[13], o que dificulta a divulgação de elementos da investigação que venham a prejudicá-la (ou ao acusado), deverão também ser contrabalanceados. Observa-se que a publicidade processual é a regra[14], mas o juiz pode decretar o sigilo de atos e audiências se entender que a publicidade pode provocar, em determinado caso concreto, perturbação da ordem e grave inconveniente e, ao nosso entender, prejuízos para as partes[15].

E não somente os delegados e juízes devem atender a essa proporcionalidade, mas os jornalistas deviam ter como um dos pilares de sua atividade este contrapeso, uma vez que nem sempre a colisão entre liberdade de expressão e devido processo legal chega ao conhecimento do julgador, para que possa ponderá-lo, por um simples motivo: não há tempo para isso. A atividade jornalística é profundamente marcada pela rapidez. Seja na delegacia de polícia, na entrevista com acusados e testemunhas ou em reportagens que falam de crimes, a ponderação entre os direitos colidentes também precisa ser feita pelo próprio profissional de imprensa. Nenhum valor é absoluto; a liberdade de informação não pode ser exercida de forma irrestrita, assim como as garantias do due process of law também não possuem caráter imutável, para que não se caia no abismo do arbítrio, tanto para um lado, quanto para o outro. Apesar da posição de igualdade constitucional destes princípios, J.J. Canotilho admite a criação de uma hierarquia axiológica temporária, para o caso concreto, na medida em que se ponderam os valores contrastantes. Vejamos:

 

(...) a ponderação reconduz-se, no fundo (...) a criação de uma hierarquia axiológica móvel entre princípios conflitantes. Hierarquia porque se trata de estabelecer um “peso” ou “valor” maior ou menor entre princípios. Móvel porque se trata de uma relação de valor instável, que é válida para um caso concreto, podendo essa relação inverter-se noutro caso.[16] [17]

 

Ainda sobre o assunto, o autor Luhmann afirma:

 

Ainda que a verdade ou presunção de verdade seja indispensável para as notícias e para as reportagens, os meios de comunicação em massa não se orientam pelo código de verdade/falsidade (...) senão pelo código próprio de seu campo programático, informação/não informação. (...). O problema da informação noticiosa funda-se na sua seletividade[18],

 

A mídia não está se importando com a verdade, mas sim se aquela notícia lhe traz lucro e se será repassada ou não ao público com base nisso.

Mesmo que haja “certeza” da autoridade competente de que o acusado é responsável por determinado crime, quem lida com a notícia deve ter sempre em mente o princípio da presunção de inocência.[19]

Importante observar que algumas redações trazem, em suas regras editoriais, diretrizes para o exercício do jornalismo preocupado com a informação e o respeito às normas de persecução criminal.

Sobre essa responsabilidade jornalística, a professora Mariana Rocha Urban afirma:

 

A facilidade de acesso à notícia e a quantidade de informações disponibilizadas no mundo globalizado acarretou no surgimento de uma comunicação de massas. O comunicador passou assim a ser uma espécie de porta voz dos fatos havidos no mundo, o que fez aumentar a sua responsabilidade de passar a notícia de modo adequado aos valores constitucionais, legais e morais. Levando em consideração as consequências sociais, econômicas e políticas a que se pode chegar por conta da proliferação de uma noticia, e também considerando que com o desenvolvimento do capitalismo as noticias passaram a ser repassadas como se fossem mercadorias, com mero intuito lucrativo, passou-se a dar especial destaque à questão da ‘responsabilidade social da imprensa’. Significa a obrigação da imprensa, através dos meios de comunicação, de publicar a realidade dos fatos expostos, preservar os valores e princípios institucionalizados, os costumes prevalentes na sociedade, bem como a ética no desencadeamento do processo de cidadania.[20]

 

Vejamos algumas regras editoriais da Folha de São Paulo:

 

Além do cuidado com a exposição da privacidade alheia, o jornalista deve ter outras preocupações éticas. Por exemplo: agir sempre em cumprimento estrito das leis (...).

Também não cabe ao jornalista praticar funções de policiamento e fiscalização da maneira como são exercidas por órgãos públicos.

A investigação dos fatos diz respeito ao compromisso do jornalista com a verdade e a crítica, e não com a promoção de atos de julgamento, que competem à justiça.[21]

 

As regras editoriais da Central Globo de Jornalismo soam no mesmo sentido:

 

Usar sempre o termo acusado ou suspeito, até a condenação em última instância.

Autores de crimes são sempre acusados ou suspeitos.

Não exibir a imagem nem citar o nome de simples suspeitos apresentados pela polícia, quando se tratar de alguém sem antecedentes criminais.

Não divulgar o nome de grupos criminosos (como PCC, Comando Vermelho, Terceiro Comando ou qualquer outro).

Não é proibido acompanhar flagrantes policiais. Você não pode é armar o flagrante. Isso é função policial.[22]

 

Ana Lúcia Menezes Vieira traz, no final de sua obra, alguns conselhos dos quais escolhemos três que julgamos mais importantes para o profissional de imprensa avaliar e ponderar, na sua atividade diária, a proporcionalidade dos valores contrastantes. Vejamos:

 

A reportagem sobre crimes e atos judiciais deve ser a mais objetiva possível. A crônica judiciária que exalta ou denigre, utilizando-se de critérios unicamente subjetivos, é abusiva. A imprensa pode informar sobre uma investigação criminal em curso, porque o direito de ser informado abrange o acesso às fontes de informação. Deve, porém, respeitar o sigilo do inquérito policial, respeitar a dignidade do suspeito ou investigado, das vítimas e testemunhas. A imagem do investigado, preso ou não, poderá ser divulgada se houver a anuência dele. A vítima deverá ser resguardada, evitando-se a divulgação de sua identidade. As testemunhas, se o caso exigir, por questão de segurança pessoal, não poderão ser identificadas.

O jornalismo investigativo não é vedado. Todavia, o jornalismo deverá ser prudente e comedido, procurando salvaguardar os valores éticos do ser humano. São abusivas as acusações infundadas – inclusive aquelas feitas sobre uma denúncia anônima – contra um indivíduo e que ferem a presunção de inocência. Mesmo em bases sólidas, a afirmação de prática delituosa contra alguém exige cautela.[23]

 

Conclui-se que deverá sempre haver harmonização do choque axiológico entre liberdade de expressão e garantias individuais do acusado, feito com cautela, haja vista que, se por um lado aquela é um dos baluartes do regime democrático, por outro, estas também não podem ser amesquinhadas, por serem princípios reitores do Estado de Direito.

 

 

CONCLUSÃO

 

Demonstramos, neste trabalho, o poder da mídia em influenciar no destino de acusados do cometimento de crimes que, por necessidade das empresas detentoras dos meios de comunicação, têm grande repercussão no seio da sociedade. Essa influência muitas vezes é perniciosa por prejudicar direitos constitucionalmente assegurados aos acusados de crimes.

O que se tem observado, conforme ficou evidenciado neste trabalho, é que o devido processo legal e a presunção da inocência, dois princípios norteados e basilares do processo penal, são sumariamente postos de lado e aniquilados pela fortíssima exploração, pela mídia, de crimes (ou supostos crimes) cometidos. Essa exploração, com caráter de sensacionalismo e espetacularismo, feita à exaustão, influencia significativamente a sociedade como um todo, e, em particular, os encarregados da apuração dos fatos, do oferecimento da denúncia, da acusação e do julgamento dos supostos criminosos – investigadores, delegados de polícia, juízes, promotores e membros do tribunal do júri.

Os casos expostos neste trabalho são exemplos clássicos de como, muitas vezes, pessoas inocentes (exemplo do Caso Coqueiro e da Escola Base) são investigadas, acusadas, julgadas e condenadas pela mídia, mesmo por algumas que se auto-consideram “não sensacionalistas”, como é o caso da Rede Globo de Televisão e Revista Veja. Evidentemente que a imprensa chamada sensacionalista explora os fatos e atos criminosos com avidez, muitas vezes têm sua programação quase toda dedicada ao tema. São veículos de comunicação (rádio, jornal impresso e canais de televisão) que lhe são atribuídas, pelo povo, a expressão “se espremer sai sangue”.

Evidentemente, não se quis sugerir qualquer amarra à liberdade da imprensa (ou de expressão). Qualquer país que adote a democracia como forma de governo terá que ter, entre suas premissas, a livre manifestação de pensamento, aí incluída a plena liberdade de imprensa, sem controle por qualquer órgão governamental, ressalvados, obviamente, os direitos à reparação civil e penal quando do cometimento de abusos.

A presidente Dilma disse recentemente que “até mesmo quando possam existir exageros, e sabemos que existem em todos os setores, também naquele da informação, é sempre melhor o rumor da imprensa do que a cova da ditadura”. Thomas Jefferson, um dos pais da nação americana, ao ser inquirido sobre a imprensa livre (à época representada pelos jornais) disse: "Se pudesse decidir se devemos ter um governo sem jornais ou jornais sem governo, eu não vacilaria um instante em preferir o último."

Desse modo, o que deveria ser levado em conta é que a existência de uma imprensa livre e compromissada com a informação verdadeira é o objetivo a ser perseguido, com profissionais sérios e éticos, capazes de fazer com que a imprensa livre seja um bastião da democracia, a serviço da população e não de grupos ou governos.


[1] SILVA, Cícero Henrique Luís Arantes da. A mídia e sua influência no Sistema Penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/2814>. Acesso em: 22/10/2012.

[2]  MORAIS, Régis. O que é Violência Urbana? Apud BASTOS, Lea Cunha. Direito à cidadania e à imagem individual: Um estudo de caso do programa Rota 22. Monografia. Departamento de Comunicação Social. Universidade Federal do Ceará (UFC), 1997. p. 28. 

[3] “Quando o oxímetro passou a fazer ‘píííííííííííííííí’, sabia que minha filha tinha partido. Meu corpo todo gelou. Vi a médica Érika Skamarakis caminhar em minha direção. Ela me pegou pelo braço, me arrastou para a sala de emergência e me empurrou sobre a maca onde minha filha estava deitadinha, só de calça, toda entubada. Morta. Eu não tive reação. Ela, a médica Érika, começou a gritar. ‘Olha o que você fez com sua filha, assassina. Você a matou com overdose de cocaína’. Eu olhava para todos, médicos e enfermeiros, mas não conseguia dizer nada. Estava em estado de choque. Ali mesmo, na sala de emergência, um policial disse que eu estava presa.

Acharam na minha casa uma mamadeira e uma seringa. Dentro tinha pó branco, o mesmo recolhido da boca de minha filha por uma enfermeira do pronto-socorro. Os policiais fizeram um teste nesse pó e decretaram ser cocaína. Para eles, o caso estava esclarecido: eu havia posto por maldade cocaína na mamadeira de minha filha e ela morreu de overdose.

O delegado Paulo Roberto Rodrigues chamou a imprensa. Passei a ser chamada de "monstro da mamadeira". Apareceu tudo nas TVs da cadeia para onde fui levada, lá em Pindamonhangaba.

De um grupo de 21 presas, pelo menos 12 delas passaram a espancar o "monstro" e a "vagabunda" que matou "sua própria filha". Eu ainda não conseguia falar nada.

Puxaram meu cabelo, me jogaram no chão. Recebi chutes, muros e pauladas. (...) Perdi a audição e a visão do lado direito do rosto. Ainda sinto dores e precisarei passar por novas cirurgias porque os ossos foram calcificados em posição errada.

Só consegui ver o túmulo da minha filha quando os laudos comprovaram que o pó branco, aquele que a polícia afirmou ser cocaína, era resíduo dos remédios que ela estava tomando. (..)

Minha filha estava internada para tratamento de saúde, rotina que vivíamos havia três meses. Ela tinha uma doença rara. No seu cérebro surgiam feridas e, em razão delas, ficava inconsciente.

Os medicamentos do misterioso pó branco eram justamente para tratar isso. (...)

Ela morreu quando tinha 1 ano e 3 meses de idade. Ainda não sei a causa da morte.

Tento, na Justiça, que parte de todo esse meu sofrimento seja reparado. Movo uma ação de indenização contra o Estado e ainda aguardo o resultado desse pedido. Quero tentar ajudar um pouco das mães violentadas todos os dias nesse país por conta de sua classe social.”. (Depoimento de Daniella Prado para o Jornal Folha de S. Paulo – Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp.cotidian/ff1909201021.htm. Acessado em: 10/09/2012)

 

[4] PEREIRA, NETO. Luiz Fernando: O PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA E A SUA VIOLAÇÃO PELA MÍDIA. Disponível em: http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/anais/cienciascriminais/edicao2/Luiz_Fernando.pdf. Acessado em: 07/11/2012.

[5] PENA, Felipe. Teoria do Jornalismo. São Paulo: Contexto, 2007. p. 113.

[6] Constituição Federal Brasileira. . Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicaocompilado.htm. Acessado dia 29/10/2012.

 

[7] Constituição Federal Brasileira. Op. Cit.

[8] ZANARDI, Bianca Botter. A Imprensa e a Liberdade de Expressão no Estado Democrático de Direito: Análise da Concepção de Justiça Difundida pelos Meios de Comunicação de Massa. Revista do Instituto dos Advogados do Paraná, Curitiba, n. 38, v. 1. p. 201.

[9] CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4a ed. Almedina. Coimbra-Portugal: 2000. p.1446.

[10] VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 129.

[11] ALTHEIDE, David L. Op. Cit. P. 289

[12] SOUZA. Artur César de.O. Cit. P. 63

[13]  Art. 20 do Código de Processo Penal

[14] Art. 792 caput do Código de Processo Penal

[15] Art. 792 §1o do Código de Processo Penal

[16] CANOTILHO, op. cit. p. 1203

[17] O próprio J.J. Canotilho traz um exemplo elucidativo: Um determinado indivíduo cometeu um crime grave (assassínio de sentinela de um quartel militar) e por esse facto foi julgado e condenado a pena de prisão. Pouco antes do termo da sua pena e conseqüente regresso à liberdade e à sociedade, um canal da televisão anunciou a emissão de um filme-documentário sobre este caso. Reagiu o condenado argumentando que a passagem televisiva do filme implicava uma nova condenação pública, perturbando seriamente sua ressocialização. Replicou a estação de televisão com o argumento do direito e liberdade de informação. Não é possível metodologicamente estabelecer, de forma abstracta, esquemas de supra/infra-ordenação entre os direitos conflituantes dizendo que o direito à informação “ pesa” mais de que o direito à ressocialização, ou vice-versa, afirmar que este último se sobrepõe ao primeiro. É necessário um esquema de prevalência parcial estabelecido segundo a ponderação dos bens em conflito e tendo em conta as circunstâncias do caso. Por mais que procurassem, os juízes não encontravam na “interpretação” das normas constitucionais a solução para o conflito de direitos. O balancing adhoc levou-os a considerar que nas exactas circunstãncias do caso (o “caso Lebach”) o direito à ressocialização prevalecia sobre o direito à informação. Idem p. 1200

[18] LUHMANN, Niklas. La Realidad de los medios de masas. Trad. e prólogo de Javier Torres Nafarrate.Barcelona : Universidad Iberoamericana,2000. P XXII.

[19] 14 [...] os policiais, auxiliam mediante entrevistas dadas aos jornalistas sobre as investigações em curso, permitindo que a mídia faça acusações infundadas sobre pessoas inocentes ou, irresponsavelmente, destrua reputações. VIEIRA, op. cit. p. 159

[20] URBAN, Mariana Rocha. O papel do Estado na Formação de uma Sociedade Livre, Culta Crítica e Democrática. Revista do Instituto dos advogados do Paraná, Curitiba, nº 38, v. 2, p. 43-44.

[21] Manual da redação: Folha de São Paulo. 4a ed. São Paulo: Publifolha, 2001.p. 28.

[22] Regras editoriais da Central Globo de Jornalismo.

[23] VIEIRA, op. cit. p.265



[1]MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação infraconstitucional.  São Paulo: Atlas, 2003. p. 386

[2] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p.31.

[3] QUINAMO. / ZENKNER. Op. Cit.

[4] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón, Ed. Trota: Madrid, 1995, p. 549.

[5] Art. 5º, LVII da Constituição Federal Brasileira: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

[6] Declaração dos Direitos Humanos.

[7] LIMA, Venício A. de. Ética, presunção de inocência e privacidade. Disponível em: Consultor Jurídico, Acessado em 02/05/2012.

[8]  FARIAS, Edílson Pereira de, Colisão de Direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1996. p. 128.

[9] REVISTA VEJA, op. cit. Edição de 6 de abril de 1994.

[10] PEREIRA, NETO. Luiz Fernando: O PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA E A SUA VIOLAÇÃO PELA MÍDIA. Disponível em: http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/anais/cienciascriminais/edicao2/Luiz_Fernando.pdf. Acessado em: 07/11/2012.

[11] Recurso Especial nº 351.779-SP. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/56123959/Escola-de-Base-Acordao-do-STJ. Acessado dia: 07/11/2012.

 



[1] . QUINAMO. Gustavo Vargas Quinamo/ ZENKNER. Marcelo. Presunção de inocência vs liberdade de imprensa: suas implicações no ordenamento legal. Disponível em: http://www.fdv.br/publicacoes/periodicos/revistadepoimentos/n8/3.pdf. Acessado dia: 07/11/2012.

[2] Constituição Federal Brasileira. Op. cit.

[3] BULOS, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao alcance de todos – São Paulo: Saraiva, 2009. P.264

[4] Código de processo Penal Brasileiro. Disponível em: http://www.dji.com.br/codigos/1941_dl_003689_ cpp/cpp311a316.htm. Acessado dia 29/10/2012 às 16:00h.

[6] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, Ed. RT, 6ª edição, SP, 2007, pág. 591.

 

[7] MENDONÇA, Kléber. A punição pela audiência: um estudo do Linha Direta. Rio de Janeiro: Quarter, 2002. p.23

[8]  TUCCI, Rogério Lauria. Tribunal do Júri: origem evolução, características e perspectivas. Estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999. p. 86

[9] Idem. Ibidem.

[10] ROMANHOL, Fernanda Bella. A Influência da Mídia no Processo Penal Brasileiro. Disponível em: http://www.suldamerica.edu.br/arquivos/_publicacoes/fernanda bella.pdf. Acesso em 18/08/2012 as 16.30h.

[11] DIAS. Ailton Henrique. Júri e Mídia. Disponível em: . Acesso em: 05/10/2012 as 10:50h.

[12] PRATES, Flávio Cruz; TAVARES, Neusa Felipim dos Anjos. A influência da mídia nas decisões do conselho de sentença. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 34, n. 2,p. 34, jul./dez. 2008.

 

[13] SAMPAIO. Flavia Christiane Figueira. A Influência da mídia no Tribunal do Júri. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4128. Acessado dia 22/10/2012 as 11.01h.

[14] O jornal Nacional da TV Globo, é sem dúvida alguma, um dos maiores meios de comunicação social brasileiro e por consequência de maior repercussão social. Logo após sua notícia sentenciadora, o caso passou a ser explorado compulsivamente, como mostra o documentário “10 Anos do Caso Escola Base”, disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY e http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY.

[15] Disponível no Documentário “10 Anos do Caso Escola Base”, disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY e http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY

[16] Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY. Acessado dia 31/10/2012.

[17] RIBEIRO, Alex. Escola Base. São Paulo. Ática. 1995. p.32.

[18] No Documentário “10 Anos do Caso Escola Base”, disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY e http://www.youtube.com/watch?v=033A9C13gGY, têm-se a entrevista do delegado afirmando em inquérito policial ter certeza de que os indiciados eram culpados.



[1] RANDOL. Yudice Andrade. O fim dos erros do judiciário brasileiro. Disponível em: http://yudicerandol.blogspot.com.br/2006/12/erros-judicirios-brasileiros-o-fim-da.html. Acessado dia 20/10/2012 às 14.29h

[2] No capitulo 1 deste trabalho falamos da mídia e sua influência ao longo do tempo, de como esta influenciou e mudou a história.

[3] Disponível em: http://oglobo.globo.com/ece_incoming/a-luz-dos-holofotes-2976961#ixzz29a9b9NxM . acessado em 17/10/2012 às 15:26h.



[4] KURY, Helmut. Mass Media e criminalità: I’esperienza tedesca. Trad. Carlo Ruga Riva e Arianna Cremona. Milano: V&P Università, 2005. p321

[5] GARLAND, David. La cultura del control: crimen y orden social nem mondo contemporaneio. Trad. Máximo Sozzo. Barcelona: Gedisa, 2005.

[6] Idem.Ibdem.

[7] LUMANN. Op. Cit. p. X

 
 
 
 
 
 


 

[1] ALMEIDA, Judson Pereira de. Os Meios de Comunicação de Massa e o Direito Penal. Disponível em: . Acesso em: 28/07/2012. p. 12.

[2] SOUZA, Artur César de, A decisão do juiz e a influência da mídia / SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 26.

[3] Associação Nacional dos Jornais. Jornais: Breve história. Acessado em: 15/05/2012.

[4] TERROU, Alberto.  A pré-história dos jornais e o nascimento das gazetas. Disponível em: . Acesso em: 15/05/2012.

 

[5] ALMEIDA, op. cit.,p. 40.

 

[6] “Nel momento in cu la stampa ‘si impossessa’ di um processo, essa non si limita a illustare il lavoro dela magistratura o a denunciare eventuali disfunzioni dela diustizia: i media indulgono inevitabilmentes al desiderio di sostituirsi al giudissedice e giudicare in vece sua” (GARAPON, Antonie. Del Giudicare – Sagio sul rituale giudiziario. Edizione italiana a cura di Daniela Bifulco.Milano:Raffaelo Cortina, 2001. p. 222)

[7] RAHAL, Flávia. Mídia e Direito Penal. 13º Seminário Internacional de Ciências Criminais. São Paulo: DVD, 2007.

[8] VEGA RUIZ,José Augusto de. Libertad de expresíon. Informacíon veraz. Juicios paralelos. Medios de comunicacíon. Madrid : Universitas, 1998, p.15

[9] DeFLEUR, Melvin. Teorie delle comunicazionm di massa. Bologna:Il Mulino, 1995. P. 40

[10] Os primeiros estudos empíricos sobre os efeitos dos meios de comunicação iniciaram-se nos anos vinte com a pesquisa de Payne Funde sobre os influxos do cinema em relação às crianças.

[11] Arts. 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e 10,1 e 2 da Convenção Europeia de Direitos Humanos.

[12] Elaborada entre os anos de 1920 e 1930 pela Escola Norte-Americana de Comunicação e proposto, em seguida, um aperfeiçoamento da mesma por Harold Lasswell, que foi um cientista político e teórico da comunicação e propôs que a influência que os meios de comunicação de massa exercem é ferramenta eficaz na adesão das massas a ideologias, sendo excelente modo de gerir as opiniões públicas.  A Teoria Hipodérmica tem como escopo verificar e compreender o modo que as influências da comunicação em massa podem afetar a população em geral, e como isto poderia ser passível para criar estratégias de influência comportamental sobre o povo. Ficou conhecida também como teoria da Bala Mágica, por fundamentar-se de que todo estímulo causado por uma mensagem enviada terá resposta, sem encontrar resistência do receptor, como o disparo de uma arma de fogo ou uma agulha hipodérmica, que perfuram a pele humana sem dificuldade, sendo a passividade do receptor a principal característica do indivíduo nesta teoria. Tal teoria é representada pela seguinte formula: E → R. Onde E significa estímulo e R resposta. Assim, o indivíduo pode ser controlado, manipulado e induzido a agir.

[13] Criada nos anos 40 tem por característica estudar os fatores que provocam o sucesso e fracasso do processo comunicativo, tendo por base a mensagem transmitida e sua audiência, estudando a massa como coletividade e não individual, caracterizando a mensagem à um destinado grupo (massa), sendo então possível persuadir os destinatários se a mensagem se adequar aos fatores pessoais ativados pelo destinatário ao interpretá-la, onde a mensagem deverá conter características particulares do estímulo, que interagem de maneira diferente de acordo com os traços específicos da personalidade do destinatário. Teremos a seguinte fórmula: E FP R

Onde E continua a ser estímulo, FP são os Fatores Psicológicos e R será a Resposta.

[14] Formulada por Maxwell McCombs e Donald Shaw na década de 1970, tal teoria afirma que a mídia dá preferência, e indica sua pauta de acordo com a opinião pública, destacando determinados temas e ignorando outros.

[15] BARROS FILHO, C. Ética na Comunicação - Revista e Atualizada. 6. ed. São Paulo: Summus, 2008. v. 1. 238 p.

[16] WOLF, Mauro.  Teorias da Comunicação.  Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_da_ comunica%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 04/09/2012.

[17] SOUZA, op. cit. p. 100.

[18] ARISTÓTELES. A Tragédia Grega. Disponível em: . Acesso em: 08/09/2012.

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