Respostas Pesquisadas sobre Direito Civil

Como é a desconsideração da personalidade jurídica no direito brasileiro?

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Denner Santana

O trecho abaixo, indicado como resposta, faz parte do seguinte conteúdo:

A desconsideração da personalidade jurídica no direito brasileiro
Autor: Marcio Rogério Licerre
Área: Direito Civil
Última alteração: 20/07/2017
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Antes de adentrar na discussão acerca das principais teorias da desconsideração da personalidade jurídica e sinalizar o entendimento vigente na jurisprudência pátria é salutar traçar indicativos históricos do seu surgimento no Brasil.

Quando iniciou os estudos da doutrina da desconsideração em nosso país, REQUIÃO esclareceu que, na época, não havia no ordenamento jurídico brasileiro nenhum dispositivo que a autorizasse, apesar de existirem diversos artigos que poderiam ter o mesmo objetivo da desconsideração da personalidade jurídica. REQUIÃO citou o grupo econômico mencionado na Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, bem como os artigos 121, 122 e 167 do Decreto-lei n.º 2627/40, que dispõem respectivamente sobre responsabilidade dos diretores por descumprimento da lei ou dos estatutos e acerca da dissolução da sociedade quando exercer atividade ilícita.[14]

Já no entendimento de COELHO, a desconsideração foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro com o Código de Defesa do Consumidor, que dispõe em seu art. 28, verbis:

"Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração."

[...]

§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores."[15]





Observa-se que o dispositivo legal do art. 28 do CDC adota a Teoria Menor da desconsideração, e vai de encontro à concepção original do instituto. Na Teoria Menor, qualquer abuso ou excesso de poder, qualquer infração à lei ou qualquer ato ilícito ou violação dos estatutos poderá acarretar na desconsideração da personalidade jurídica, lesando sobremaneira o principio da autonomia empresarial.

Ainda de acordo com o referido autor, o segundo dispositivo legal a adotar a teoria da desconsideração, embora sem obedecer a sua formulação original anglo-saxã, foi o art. 18 da Lei n.º 8.884/94, cujo teor segue abaixo:



"Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração."





Atualmente, a Lei 8.884/94 foi revogada pela Lei 12.529/11 que estrutura o Sistema Brasileiro da Concorrência e dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica. Entretanto, ao invés de inovar e adotar a Teoria Maior da desconsideração, evitando assim um desgaste maior do principio da autonomia empresarial, o novo diploma optou pela manutenção da Teoria Menor, viabilizando a desconsideração nos casos de: a) abuso de direito; b) excesso de poder; c) infração da lei; d) fato ou ato ilícito; e) violação dos estatutos ou contrato social.

"Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. "



Essa ampla gama de possibilidades de desconsideração da personalidade jurídica adotada pela Teoria Menor aumenta a insegurança do empresário na gestão dos seus negócios, pois, sendo reduzida a força do principio da autonomia patrimonial, o patrimônio pessoal do empresário poderá ser facilmente atingido nos inúmeros casos elencados, até mesmo nos casos de um simples descumprimento contratual. Ou seja, essa permissiva ampla da desconsideração vai de encontro à construção original da disregard doctrine.

Com efeito, a terceira menção à possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica foi feita pelo art. 4.º da Lei 9605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, com a seguinte redação:



"Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente."



O que se entende por "obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente"? Condicionar o descortinamento da personalidade jurídica a um dispositivo do ordenamento ambiental tão subjetivo e amplo dificulta o trabalho hermenêutico e gera insegurança jurídica à autonomia do empresário.



Por fim, chega-se ao Código Civil, Lei n.º 10406 de 2002, que apresentou a seguinte disposição em seu art. 50, verbis:



"Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica."



Esse dispositivo introduziu no ordenamento uma posição mais próxima da doutrina original do instituto da desconsideração, ou seja, somente em 2002 foi adotada a Teoria Maior da desconsideração no direito pátrio, caminho inverso aos de outros ordenamentos jurídicos.

Apesar de algumas críticas que possam surgir contra o art. 50 do Código Civil, o fato é que, para REQUIÃO, é dispensável a previsão legal para a aplicação da desconsideração. Na mesma linha, COELHO afirma que a aplicação da desconsideração independe de previsão legal, e a melhor interpretação dos dispositivos legais acima:

"é a que prestigia a contribuição doutrinária, respeita o instituto da pessoa jurídica, reconhece a sua importância para o desenvolvimento das atividades econômicas e apenas admite a superação do princípio da autonomia patrimonial quando necessário à repressão de fraudes e à coibição do mau uso da forma da pessoa jurídica."[16]



De outro lado, o entendimento exposto pelos renomados doutrinadores acerca da ordem cronológica dos primeiros dispositivos legais que consagraram a teoria da desconsideração no ordenamento jurídico brasileiro, não é unânime. Para ALMEIDA não foi nem o Código de Defesa do Consumidor nem o Código Civil de 2002 que introduziu a figura da disregard doctrine na legislação brasileira. O jurista defende que a CLT teria sido o primeiro diploma legal a prever o instituto no art. 2.º, § 2.º. [17]



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