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Resumo:
O presente trabalho versa sobre a Aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita, fazendo-se uma abordagem jurídico-crítica.
Texto enviado ao JurisWay em 24/01/2013.
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RESUMO
O presente trabalho versa sobre a Aplicação dos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita, fazendo-se uma abordagem jurídico-crítica. O objetivo principal
da pesquisa foi verificar a possibilidade de diminuir os abusos concernentes ao
pedido, deferimento e indeferimento do benefício. Destacou-se que o Acesso ao
Judiciário faz parte do Acesso à Justiça, mas que não o torna efetivo sozinho.
Constatou-se a existência de muita divergência nos conceitos dados pelos juristas
para as expressões Assistência Jurídica Gratuita, Assistência Judiciária Gratuita e
Justiça Gratuita, bem como para os Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade. Concluiu-se que é possível combater os abusos nos pedidos,
concessões e não concessões da Assistência Judiciária Gratuita por meio da correta
aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, garantindo-se o
Acesso à Justiça, o direito aos honorários advocatícios e vários outros direitos
fundamentais. Por fim, discorreu-se acerca do dever do Estado de prover a Justiça
independente do pagamento de custas, chegando-se a conclusão de que, como
outros serviços públicos, o Acesso ao Poder Judiciário deveria ser prestado a
qualquer um, gratuitamente. O método de abordagem foi o dedutivo e o de
procedimento foi o monográfico, optando-se pela pesquisa bibliográfica e
jurisprudencial.
Palavras-chave: Acesso à Justiça. Princípio da Razoabilidade. Princípio da
Proporcionalidade. Assistência Judiciária Gratuita. Justiça Gratuita.
ABSTRACT
This paper describes the application of the principles of reasonableness and
proportionality in assessing the application for legal aid, becoming a legalphilosophical
approach. The main objective of the research was to investigate the
possibility of reducing the abuses pertaining to application, acceptance and rejection
of the benefit. It was emphasized that access to the judiciary is part of the Access to
Justice, but that alone does not make it effective. It was found that there was much
disagreement in the concepts given by the lawyer for the expressions Free Legal
Assistance, Free Legal Aid and Free Justice, as well as the principles of
reasonableness and proportionality. It was concluded that it is possible to combat
abuses in claims, grants and awards no free legal assistance through the correct
application of the principles of reasonableness and proportionality, ensuring the
access to justice, the right to attorneys' fees and various other fundamental rights.
Finally, spoke out about the state's obligation to provide justice regardless of the
payment of fees, reaching the conclusion that, like other public services, access to
the judiciary should be given to anyone for free. The method of approach was
deductive and the procedure was the monograph, opting for literature and case law.
Keywords: Access to Justice. Principle of Reasonableness. Principle of
Proportionality. Free Legal Aid. Free Justice.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 13
1.1 TEMA ………………………………………………………………………………….. 13
1.5 PROBLEMA........................................................................................................ 13
1.6 JUSTIFICATIVA.................................................................................................. 13
1.7 OBJETIVOS........................................................................................................ 15
1.7.1 Objetivo Geral .............................................................................................. 15
1.7.2 Objetivos Específicos ................................................................................. 16
1.5 METODOLOGIA ................................................................................................. 16
1.6 ORGANIZAÇÃO DOS CAPÍTULOS ................................................................... 17
2 O BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA ............................................................. 18
2.1 ACESSO AO JUDICIÁRIO É ACESSO À JUSTIÇA? ........................................ 18
2.2 JUSTIÇA GRATUITA, ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA E ASSISTÊNCIA JURÍDICA:
CONCEITOS E DIFERENÇA ................................................................................... 21
2.3 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA: OBJETO E ABRANGÊNCIA ............. 29
2.4 QUEM PODE SER BENEFICIÁRIO DA GRATUIDADE .................................... 32
2.5 PROCEDIMENTO LEGAL PARA O REQUERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA
E ANÁLISE DO PEDIDO .......................................................................................... 35
2.6 RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS DESPESAS PROCESSUAIS
E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO FIM DO PROCESSO ................................ 35
3 OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE ............. 37
3.1 ELEMENTOS DO SISTEMA JURÍDICO ............................................................ 37
3.1.1 Lei ................................................................................................................... 38
3.1.2 Regra .............................................................................................................. 39
3.1.3 Norma Jurídica .............................................................................................. 39
3.1.4 Princípios ....................................................................................................... 40
3.1.4.1 Princípios e Regras ...................................................................................... 42
3.1.4.2 Princípios Gerais de Direito e Princípios Positivos do Direito ...................... 44
3.1.4.3 Função dos Princípios .................................................................................. 46
3.2 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE 47
3.2.1 Princípio e Postulado .................................................................................... 47
3.2.2 Conceitos de Razoabilidade e Proporcionalidade ..................................... 48
4 A CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA SOB A ÓTICA DOS
PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE ....................... 52
4.1 CONSIDERAÇÕES NECESSÁRIAS ................................................................. 53
4.1.1 O que significa ser pobre na acepção jurídica do termo ........................... 53
4.1.1.1 À luz da Lei 1.060 ......................................................................................... 53
4.1.1.2 À luz do Código de Processo Penal ............................................................. 53
4.1.1.3 À luz do entendimento jurídico ..................................................................... 54
4.1.2 Consideração do Patrimônio e da Renda pelo magistrado para conceder
ou não o benefício da justiça gratuita .................................................................. 54
4.1.3 Natureza Jurídica das Custas Processuais ................................................ 56
4.2 APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA
PROPORCIONALIDADE NA APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITA .......................................................................................... 57
4.2.1 É possível fixar requisitos objetivos para a concessão da Assistência
Judiciária Gratuita? ................................................................................................ 64
4.3 BONS EXEMPLOS DE JULGAMENTOS QUE ENVOLVEM O BENEFÍCIO ..... 64
4.4 O DEVER DO ESTADO DE PROVER A JUSTIÇA GRATUITA INDEPENDENTE
DO PAGAMENTO DE CUSTAS ............................................................................... 64
5 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 67
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 69
13
1 INTRODUÇÃO
1.1 TEMA
O tema a que se destina tratar este trabalho refere-se à Aplicação dos
Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade pelos juízes e tribunais
brasileiros, quando da apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita no
Brasil.
1.2 PROBLEMA
A aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade pelos
magistrados quando da apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita é
capaz de diminuir os abusos concernentes ao pedido, deferimento e indeferimento
do benefício?
1.3 JUSTIFICATIVA
A Lei 1.060, de 1950, chamada Lei de Assistência Judiciária, é a que trata
de normatizar em nosso país, o benefício da Assistência Judiciária Gratuita. No
entanto, ela não propõe requisitos ou critérios para análise do julgador quando da
apreciação do pedido, que sejam capazes de norteá-lo em sua decisão. A norma
jurídica em questão apenas exige que aquele que pretende que lhe seja concedido o
benefício, declare que não está em condições de custear o processo e os honorários
advocatícios sem que seja necessário provar essa condição.
É claro que em um país como nosso, onde infelizmente temos a cultura
do “jeitinho brasileiro”, onde muitas pessoas vêem beleza em aproveitar-se das
oportunidades de lograr vantagem indevida, seja “furando filas”, seja “fazendo
14
gatos”, seja pleiteando um direito junto ao Poder Judiciário, o qual, em tese, não
fariam jus, essa desnecessidade de provar a pobreza fez “crescerem os olhos” de
muitos, que passaram a pleitear a gratuidade sem dela necessitarem.
Esses abusos cometidos por parte de alguns cidadãos geraram a revolta
de muitos juízes, que sem qualquer criação de critérios e baseando-se em um
dispositivo Constitucional que trata da Assistência Jurídica Integral (fornecida pela
Defensoria Pública), passaram a negar a gratuidade por ausência de prova da
necessidade, por verificar que a parte possui certo patrimônio ou renda considerada
por eles, suficiente para o pagamento das custas ou ainda por outros motivos
absurdos como o fato da parte gastar com algum lazer ou vir aos autos,
representada por advogado particular.
Somando-se a isso, tem-se no mundo jurídico uma grande confusão com
relação as terminologias “Assistência Judiciária”, “Assistência Jurídica” e “Justiça”
Gratuitas. A lei é confusa, a doutrina divergente e os magistrados partem do seu
livre convencimento para decidir se concedem ou não a gratuidade, esquecendo-se
que há dois, entre outros, Princípios de Direito que devem ser observados antes de
se proferir uma decisão desse tipo: estamos falando da Razoabilidade e da
Proporcionalidade. Em verdade, esses dois princípios são tão confundidos como as
terminologias apresentadas no início deste parágrafo.
O interesse de muitos está em jogo. Os processos judiciais custam
dinheiro. A natureza jurídica das custas é tributária. Os advogados, como quaisquer
trabalhadores, precisam receber pelo seu trabalho. Não há critérios objetivos para a
concessão da gratuidade da justiça. Os Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade talvez possam servir de norte aos juízes. Logo, o tema tratado
aqui é pertinente.
Está muito confusa e revoltante a situação atual do direito à gratuidade
judiciária: por um lado é preciso estabelecer critérios, norte para que o próprio
magistrado decida o mais acertadamente possível; por outro lado, indignamo-nos
com a natureza humana, corrupta e “doentia”, que teima em tomar partido naquilo
que não lhe pertence acarretando o mal do seu semelhante. Ao mesmo tempo nos
perguntamos se não seria dever do Estado prover a gratuidade da justiça
independente do pagamento de custas.
É preciso entender o tema aqui proposto, afim de que sociedade, ciência
e juristas possam resolver esse problema tão gritante que é o de conflitar a lei e
15
atender a um Princípio, para servir ao Direito. E assim, não se ouvir mais dizer que a
aplicação do direito nem sempre é fonte de justiça: é preciso que seja.
Portanto, existem razões de ordem pessoal, social, institucional e teórica
que justificam a realização do presente estudo.
Do ponto de vista pessoal podemos dizer que a realização deste estudo
monográfico integra a grade curricular do curso e, como tal, faz parte do processo
formativo da acadêmica com vistas a um futuro exercício profissional competente.
Já no âmbito social apontamos a condição de pertencimento a uma dada
sociedade e, como tal, implica um compromisso com esta. E estudar a temática
acima referida é cumprir, em parte, este compromisso.
No foco institucional assinalamos o compromisso da Universidade. É
possível dizer que sobre toda universidade recai uma hipoteca social. Todas elas,
sem exceção, têm a obrigação/dever de participar da discussão dos problemas da
sociedade na qual estão inseridas.
E no mundo teórico o estudo se justifica porque a explicitação da
temática, por si só, permite um maior conhecimento do assunto municiando àqueles
que atuam na esfera jurídica.
1.4 OBJETIVOS
Os objetivos do trabalho foram divididos em Objetivo Geral e Objetivos
Específicos.
1.4.1 Objetivo Geral
O principal objetivo da pesquisa foi analisar a possibilidade de combate
aos abusos nas concessões da Assistência Judiciária Gratuita no Brasil, mediante a
aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, buscando
identificar se critérios objetivos podem ser observados para que se garanta o Acesso
16
à Justiça ao cidadão e ao mesmo tempo se preservem o direito aos honorários
advocatícios e as boas condições econômicas do Poder Judiciário.
1.4.2 Objetivos Específicos
Como objetivos específicos traçamos os seguintes:
a) Demonstrar a diferença entre Acesso ao Judiciário e Acesso à justiça.
b) Expor os diferentes conceitos dados as expressões Assistência Judiciária
Gratuita, Justiça Gratuita e Assistência Jurídica Gratuita.
c) Identificar o Princípio da Razoabilidade e o Princípio da Proporcionalidade.
d) Descobrir se a aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade pode diminuir os abusos no pedido, deferimento e indeferimento
da Assistência Judiciária Gratuita.
e) Analisar se há possibilidade de se observar critérios específicos quando da
apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita.
f) Discorrer acerca do dever do Estado de prover a Justiça independente do
pagamento de custas.
1.5 METODOLOGIA
O método de abordagem utilizado na presente pesquisa foi o dedutivo,
pois buscamos investigar as concepções gerais sobre o tema para formar uma
conclusão particular.
Já o método de procedimento foi o monográfico, posto que a
pesquisadora buscou estudar os diversos conceitos de Assistência Judiciária,
Assistência Jurídica e Justiça Gratuita bem como os de Princípio da Razoabilidade e
Princípio da Proporcionalidade para saber se havia possibilidade da aplicação dos
segundos para resolver os abusos que envolvem as concessões ou não concessões
das primeiras.
17
1.6 ORGANIZAÇÃO DOS CAPÍTULOS
Objetivando uma melhor compreensão acerca do tema aqui proposto, o
presente trabalho científico foi estruturado em três capítulos, o primeiro destinado ao
estudo da Assistência Judiciária Gratuita, o segundo referente aos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade e o terceiro capítulo atinente à análise da
possibilidade de aplicação dos Princípios referidos na apreciação do pedido de
Assistência Judiciária Gratuita com a finalidade de dirimir os abusos existentes na
concessão e não concessão do benefício.
18
2 O BENEFÍCIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA
Para iniciar o estudo é necessário abordar a respeito do benefício em questão.
2.1 ACESSO AO JUDICIÁRIO É ACESSO À JUSTIÇA?
A garantia fundamental do Acesso à Justiça está prevista na Constituição
da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988) , em seu artigo 5º, inciso XXXV,
nos seguintes termos: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito”.
Para MARINONI (1999, apud DIDIER JUNIOR; OLIVEIRA, 2010, p. 9) o
acesso à Justiça significa o:
acesso a um processo justo, a garantia de acesso a uma justiça imparcial,
que não só possibilite a participação efetiva e adequada das partes no
processo jurisdicional, mas que também permita a efetividade da tutela dos
direitos, consideradas as diferentes posições sociais e as específicas
situações de direito substancial.
Completa o autor que o Acesso à Justiça também significa “acesso à
informação e à orientação jurídicas e a todos os meios alternativos de composição
de conflitos”.
Como é de se perceber, o doutrinador não se atém a letra da lei,
entendendo o Acesso à Justiça não como apenas o acesso ao Poder Judiciário, mas
ao processo justo, justiça imparcial, equidade, efetividade da tutela dos direitos e
acesso à informação e orientação jurídicas.
WATANABE (apud RODRIGUES, 1994, p. 29) entende que:
a problemática do acesso à justiça não pode ser estudada nos acanhados
limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de
possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de
viabilizar o acesso à ordem jurídica justa.
Interessante se faz, todavia, trazermos à luz o entendimento de Rodrigues
(1994, p. 28) para definir o acesso à justiça:
19
[...]é necessário destacar, frente a vagueza do termo acesso à justiça, que a
ele são atribuídos pela doutrina diferentes sentidos. São eles
fundamentalmente dois: o primeiro, atribuindo ao significante justiça, o
mesmo sentido e conteúdo que o de Poder Judiciário, torna sinônimas as
expressões acesso à Justiça e acesso ao Judiciário; o segundo, partindo de
uma visão axiológica da expressão justiça, compreende o acesso a ela
como o acesso a uma determinada ordem de valores e direitos
fundamentais para o ser humano. Esse último, por ser mais amplo, engloba
no seu significado o primeiro. Ambos os conceitos são válidos.[...] No
segundo sentido[...] o acesso à justiça não se esgota no acesso ao
Judiciário e nem no próprio universo do direito estatal.
Partilhamos do entendimento do segundo grupo na elaboração do
presente trabalho, valendo-nos do Acesso à Justiça como sendo não apenas acesso
ao Judiciário. Como DINAMARCO (apud RODRIGUES, 1994, p. 29), cremos que o
Acesso à Justiça não se esgota no processo e nos meios que ele oferece.
Entendemos que o benefício da gratuidade, que passaremos a tratar,
envolve o pagamento das custas processuais para ingresso no Poder Judiciário,
mas as diferenças sociais são tantas que não basta o ingresso com uma ação, mas
é necessária, nas palavras de WATANABE (apud RODRIGUES, 1994, p. 35)
“paridade de armas na disputa em juízo”.
Consoante argumenta RODRIGUES (1994, p. 29):
“se de um lado não se pode reduzir a questão do acesso à justiça à criação
de instrumentos processuais adequados à plena efetivação dos direitos, de
outro é também evidente que não se pode afastar a idéia de acesso à
justiça do acesso ao Judiciário [...] sem ele a cidadania se vê castrada,
impotente”.
Segundo o mesmo autor, “sempre que um direito não for respeitado
espontaneamente, não há como fazê-lo legitimamente senão através do processo”.
Portanto, embora saibamos que para chegar-se ao efetivo Acesso à Justiça é
preciso ter Acesso ao Poder Judiciário, salientamos que esse último é apenas parte
do primeiro.
Aduz ainda RODRIGUES (1994, p. 31) que:
O primeiro problema sempre apontado pela doutrina, como entrave ao
efetivo acesso à justiça, é a carência de recursos econômicos por grande
parte da população para fazer frente aos gastos que implicam uma
demanda judicial.
Completa o doutrinador (RODRIGUES, 1994, p. 35):
20
Sabe-se muito bem das despesas que envolvem uma demanda judicial; no
mínimo custas processuais e honorários advocatícios. A isso podem se
somar outros gastos, como perícias, por exemplo. Como poderão esses
brasileiros, que não ganham o suficiente nem para se alimentarem, custear
um processo judicial? Esse o primeiro entrave – talvez o mais grave – ao
efetivo acesso à justiça. Agrava-o ainda mais o fato de todas as partes
envolvidas possuírem formalmente os mesmos direitos; igualdade essa que,
em regra geral, não se concretiza em razão das diferenças sociais,
econômicas e culturais existentes entre as partes.
Assim, não é apenas econômica a causa da não efetivação do Acesso à
Justiça, mas como nesse trabalho abordaremos o benefício da gratuidade, iremos
nos ater apenas a questão econômica.
Ainda, ao tratar de acesso à justiça, não podemos deixar de falar em
Mauro Capeletti e Bryant Garth, que em sua famosa obra denominada “Acesso à
Justiça”, estudaram a fundo o tema. CARVALHO LUZ (2008, p. 42), ao se referir
sobre tal obra, chama nossa atenção para o fato de que ela foi, na verdade, um
opúsculo escrito como introdução a um trabalho maior de pesquisa chamado
“Projeto Florença”.
Na introdução da obra de CAPELLETTI e GARTH (1998, p. 8) os autores
dizem que a expressão “Acesso à Justiça” é de difícil definição, mas serve para
determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico: primeiro o sistema deve ser
igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam
individual e socialmente justos. O enfoque dos autores é na primeira finalidade, mas
sem perder de vista a segunda, tendo como premissa básica a de que a justiça
social pressupõe o acesso efetivo.
CAPPELLETTI e GARTH (1998, p. 9) fazem em seu estudo uma análise
histórica do significado de Acesso à Justiça, apontando que nos estados liberais
burgueses nos séculos dezoito e dezenove, refletia uma filosofia puramente
individualista, onde se pensava que o Acesso à Justiça era um direito natural, mas
que não necessitava de uma ação do Estado para sua proteção; era entendido como
o direito formal de ingressar com uma ação e de contestá-la. Afastar a “pobreza no
sentido legal” não era pretensão do Estado. Então, a justiça só podia ser obtida
pelos que pudessem arcar com seus custos.
Segundo os mesmos, o conceito de Acesso à Justiça e de direitos
humanos passou a sofrer uma radical transformação na medida em que as
sociedades foram crescendo em tamanho e complexidade, deixando-se para traz a
visão individualista dos direitos e passando-se a entender o acesso efetivo como
21
sendo de importância primordial entre os direitos individuais e sociais: “O acesso à
justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico
dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda
garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos”. (CAPPELLETTI; GARTH,
1998, p. 12)
E completam os autores (CAPPELLETTI; GARTH, 1998, p. 15):
O “acesso” não é apenas um direito social fundamental, crescentemente
reconhecido; ele é, também, necessariamente, o ponto central da moderna
processualística. Seu estudo pressupõe um alargamento e aprofundamento
dos objetivos e métodos da moderna ciência jurídica.
O primeiro obstáculo identificado por CAPPELLETTI e GARTH (1998, p.
15) para justificar a não existência do efetivo Acesso à Justiça é o financeiro (custas
judiciais): “a resolução formal de litígios, particularmente nos tribunais é muito
dispendiosa na maior parte das sociedades modernas.”
Como dito anteriormente, no presente trabalho nos prenderemos apenas
a esse óbice na concretização do efetivo Acesso à Justiça, qual seja, o financeiro,
isto porque, conforme veremos a seguir, é o que tem relação com o benefício da
Assistência Judiciária Gratuita.
2.2 JUSTIÇA GRATUITA, ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA E ASSISTÊNCIA JURÍDICA:
CONCEITOS E DIFERENÇA
Ensina RODRIGUES (1994, p. 80) que:
o problema econômico busca ser equacionado historicamente, na legislação
pátria, através da assistência gratuita. Ela, em todas as suas formas, é no
entanto apenas um paliativo, não a solução. Essa só é possível através da
erradicação da pobreza, objetivo fundamental do estado brasileiro, segundo
a lei maior vigente (art. 3º, III).
A norma jurídica a que o autor acima faz referência é a constante do
artigo 3º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil (CF), a saber:
Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
22
[...]
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
[...].
Porém, enquanto não alcança esse objetivo, o Estado cria mecanismos
para ao menos amenizar as desigualdades e inserir as pessoas menos favorecidas
dentro do rol daqueles que buscam dirimir seus litígios valendo-se do Poder
Judiciário.
Para esta finalidade foram criadas a Justiça Gratuita, a Assistência
Judiciária e a Assistência Jurídica, as quais, com nossos estudos, percebemos que
são muito confundidas por doutrinadores e magistrados. Destacaremos alguns
entendimentos.
DIDIER JÚNIOR e OLIVEIRA (2010, p.11-12) trazem sua conceituação
para cada um dos benefícios:
a) justiça gratuita, ou benefício da gratuidade, ou ainda gratuidade
judiciária, consiste na dispensa da parte do adiantamento de todas as
despesas, judiciais ou não, diretamente vinculadas ao processo, bem assim
na dispensa do pagamento de honorários de advogado;
b) assistência judiciária é o patrocínio gratuito da causa por advogado
público (ex.:defensor público) ou particular (entidades conveniadas ou não
com o Poder Público, como por exemplo, os núcleos de prática jurídica das
faculdades de direito);
c) assistência jurídica compreende, além do que já foi dito, a prestação
de serviços jurídicos extrajudiciais (como, por exemplo, a distribuição, por
órgão do Estado, de cartilha contendo os direitos básicos do consumidor) –
trata-se, como se vê, de direito bem abrangente.
LIPPMANN (1999 apud MELO, 2004, p. 2) trata de diferenciar as duas
primeiras, deixando de fora a Assistência Jurídica, até porque, se for adotado o
entendimento acima, ela engloba a Justiça Gratuita e Assistência Judiciária:
A assistência judiciária não se confunde com justiça gratuita. A primeira é
fornecida pelo Estado, que possibilita ao necessitado o acesso aos serviços
profissionais de advogado e dos demais auxiliares da justiça, inclusive os
peritos, seja mediante a defensoria pública ou da designação de um
profissional liberal pelo Juiz. Quanto à justiça gratuita, consiste na isenção
de todas as despesas inerentes à demanda, e é instituto de direito
processual.
Conclui LIPPMANN (1999 apud MELO, 2004, p. 3):
ambas são essenciais para que os menos favorecidos tenham acesso à
Justiça, pois ainda que o advogado se abstenha de cobrar honorários ao
trabalhar para os mais pobres, faltam a estes condições para arcar com
23
outros gastos inerentes à demanda, como custas, perícias, etc. Assim,
frequentemente, os acórdãos, ao tratar da justiça gratuita, ressaltam seu
caráter de Direito Constitucional.
É interessante observar que a própria Lei 1.060/50, chamada Lei de
Assistência Judiciária (LAJ) (BRASIL, 1950), a qual “estabelece normas para a
concessão da assistência judiciária aos necessitados”, gera, a nosso ver, uma
confusão com as nomenclaturas em seu artigo 3º. Vejamos:
Art. 3º A assistência judiciária compreende as seguintes isenções:
I – das taxas judiciárias e dos selos;
II – dos emolumentos e custas devidos aos juízes, órgãos do Ministério
público e serventuários da justiça;
III – das despesas com as publicações indispensáveis no jornal
encarregado da divulgação dos atos oficiais;
IV – das indenizações devidas às testemunhas que, quando empregados,
receberão do empregador salário integral, como se em serviço estivessem,
ressalvado o direito regressivo contra o poder público federal, no Distrito
Federal e nos Territórios; ou contra o poder público estadual nos Estados;
V – dos honorários de advogado e peritos;
VI – das despesas com a realização do exame de código genético – DNA
que for requisitado pela autoridade judiciária nas ações de investigação de
paternidade ou maternidade;
VII – dos depósitos previstos em lei para interposição de recurso,
ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da
ampla defesa e do contraditório.
Denote-se que referida lei fala em isenção de pagamentos de custas e
honorários de advogado e peritos e dá a essa isenção o nome de “Assistência
Judiciária”. A expressão “Justiça Gratuita” não é abrigada pela lei, contrariando os
conceitos dados pelos doutrinadores até aqui mencionados. Dizemos contrariando,
porque para eles a Assistência Judiciária é o patrocínio da causa por advogado,
enquanto a Justiça Gratuita tem relação com custas e verbas honorárias, ou seja,
aquilo que possui valor pecuniário. Da leitura da LAJ, a “Assistência Judiciária” não
abrange o “ser assistido por advogado”, mas apenas os honorários e as custas
processuais.
A expressão “Justiça Gratuita” é encontrada no Código de Processo Civil
(CPC) (BRASIL, 1973), em seu artigo 19:
“Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover
as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipandolhes
o pagamento desde o início até a sentença final; e bem ainda, na
execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença”.
24
Em uma primeira leitura dos dois dispositivos legais (artigo 3º da LAJ e
artigo 19 do CPC), nos parece que Justiça Gratuita e Assistência Judiciária Gratuita
são expressões sinônimas, pois ambas se referem as custas. Note-se, entretanto,
que o CPC não fala em honorários advocatícios. Então poderia se afirmar que a
Justiça Gratuita tem somente relação com as custas, enquanto a Assistência
abrange os dois.
Alguns doutrinadores tem assim entendido. É um exemplo o de MACIEL
(2000, apud. FREIRE, 2003):
Na “assistência judiciária”, o Estado assume, pelo beneficiário, a obrigação
de arcar com as despesas processuais e honorários do patrono, que não é
constituído pelo interessado, mas lhe é nomeado pelo Juízo ou pela Ordem
dos Advogados do Brasil, sem que lhe assista direito à livre escolha
profissional, enquanto que, na “justiça gratuita”, a isenção suportada pelo
Estado se restringe às despesas processuais, sendo o patrono escolhido,
constituído e remunerado pelo próprio cliente.
PONTES DE MIRANDA (1958, apud. FREIRE, 2003) também entendia
que a Justiça Gratuita abrange somente custas processuais, enquanto a Assistência
Judiciária tem relação com os honorários de advogado e custas. Vejamos:
Assistência judiciária e benefício da justiça gratuita não são a mesma coisa.
O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória de despesas,
exercível em relação jurídica processual perante o juiz que promete a
prestação jurisdicional. É instituto de direito pré-processual. A assistência
judiciária é a organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado
da dispensa provisória das despesas, a indicação de advogado. É instituto
de direito administrativo.
Note-se que ambos os autores (Maciel e Pontes de Miranda) entendem
que somente se fala em Assistência Judiciária Gratuita quando tratar-se de custas e
honorários e o advogado for indicado pelo Estado, seja pela Defensoria Pública ou
por advogado dativo nomeado pelo juiz. Já a Justiça Gratuita abrange apenas as
despesas processuais, sem se falar em honorários, devido ao fato da parte vir aos
autos representada por advogado particular.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (SANTA
CATARINA, 1997), também tem adotado esse entendimento. Isso porque a Lei
Complementar Estadual n. 155/1997, em seu artigo 17, inciso II, assim dispõe:
Art. 17. Não será devida a remuneração ao Advogado Assistente e
Judiciário ou Defensor Dativo quando:
25
[...]
II – o beneficiário da Assistência Judiciária, qualquer que seja sua situação
econômico-financeira, apresentar-se com advogado constituído;
[...].
Diante desse dispositivo, referido Tribunal (BRASIL, 2011) tem se
posicionado como o Desembargador José Volpato de Souza, em seu voto no Agravo
de Instrumento nº 2010.054278-1, no qual foi relator, nos seguintes termos:
[...]Como se sabe, existe diferença entre assistência judiciária gratuita e
justiça gratuita. Justiça gratuita compreende a isenção de todas as custas e
despesas, judiciais ou não, a serem suportadas pelo requerente. A
assistência judiciária gratuita, por sua vez, além da isenção das custas e
despesas, envolve o patrocínio gratuito da causa por advogado. O
Provimento n. 9/94, da Corregedoria Geral de Justiça de Santa Catarina,
esclarece bem essa diferença:
Justiça gratuita, é o benefício constitucional genérico, previsto no art. 5º,
LXXIV, da Constituição Federal, evocável por quem comprovadamente
tenha insuficiência de recursos para arcar com as despesas do processo. Já
assistência jurídica ou judiciária é o direito específico de obter a nomeação
de um advogado, frente à condição de insuficiência de recursos.
Além disso, a assistência judiciária gratuita possui procedimentos próprios a
serem observados para sua concessão. A escolha do causídico, por
exemplo, não depende da vontade do requerente, mas da disponibilidade
do órgão prestador da assistência judiciária, a quem é direcionado o pedido
para indicação do defensor.[...]
Todavia, não é este o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo. Extrai-se do voto do Desembargador Palma Bisson, Relator nos autos da
Apelação com Revisão nº. 999907- 0/1: “[...] Por fim, anoto que a Lei n° 1.060/50
não considera, para a concessão da gratuidade de Justiça, se a parte que a pediu
tenha constituído banca particular de Advocacia para o patrocínio de seus
interesses.[...].”
Em seu voto, no Agravo de Instrumento nº 1001412- 0/0 (SÃO PAULO,
2006), o mesmo Desembargador, também Relator, assim se manifestou:
[...]Logo, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua
vida, o que você nela tem de sobra, menino, é a fome não saciada dos
pobres.
Por conseguinte um deles é, e não deixa de sê-lo, saiba mais uma vez, nem
por estar contando com defensor particular.
O ser filho de marceneiro me ensinou inclusive a não ver nesse detalhe um
sinal de riqueza do cliente; antes e ao revés a nele divisar um gesto de
pureza do causídico.
Tantas, deveras, foram as causas pobres que patrocinei quando advogava,
em troca quase sempre de nada, ou, em certa feita, como me lembro com a
boca cheia d'água, de um prato de alvas balas de coco, verba honorária em
riqueza jamais superada pelo lúdico e inesquecível prazer que me
proporcionou.
26
Ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente
os advogados dos pobres para defendê-lo?
Quiçá no livro grosso dos preconceitos...[...]
Da leitura desses trechos de votos de dois Tribunais diferentes, já é
possível ter a noção da tamanha contradição entre os magistrados quanto aos
conceitos em questão e forma de decidir se concedem ou não os benefícios
pleiteados.
Os primeiros conceitos aqui apontados (de Fredie Didier Junior e Rafael
Oliveira) nos parecem mais didáticos. Soa-nos mais adequado nomear a isenção de
custas e honorários advocatícios como “Justiça Gratuita” e a representação por
advogado constituído como “Assistência Judiciária”.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina já se
manifestou nesse sentido (SANTA CATARINA, 2007). Do voto lançado na Apelação
Cível nº 2001.002987-7, de São José, cujo Relator foi o Desembargador Jorge
Schaefer Martins, extrai-se:
Justiça gratuita, é o benefício constitucional genérico, previsto no art. 5º,
LXXIV, da Constituição Federal, evocável por quem comprovadamente
tenha insuficiência de recursos para arcar com as despesas do processo. Já
a assistência jurídica ou judiciária, é o direito específico a obter nomeação
de um advogado, frente à condição de insuficiência de recursos.
Note-se que nessa decisão, o Desembargador afirma entender que a
Justiça Gratuita é sinônimo de Assistência Jurídica Integral. Não é o que
entendemos. Para nós, nesse artigo da CF, está se fazendo referência aos serviços
prestados pela Defensoria Pública. Basta analisar o disposto no artigo 4º, § 5º, da
Lei Complementar n.º 80 (BRASIL, 1994), que acreditamos trazer o complemento
para o dispositivo constitucional acima transcrito: “A assistência jurídica integral e
gratuita custeada ou fornecida pelo Estado será exercida pela Defensoria Pública”.
Porém, com o advento da Constituição Federal, de 1988, alguns Tribunais
passaram a entender que o artigo 5º, inciso LXXIV, ao dispor que “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que provarem insuficiência de recursos”
(BRASIL, 1988), revogou parte da LAJ, exigindo prova da necessidade para a
concessão da Assistência Judiciária Gratuita. É o exemplo do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul, que no julgamento do Agravo de Instrumento, nº
70042917724 (RIO GRANDE DO SUL, 2011), cujo Relator foi o Desembargador
Romeu Marques Ribeiro Filho, assim se manifestou:
27
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGUROS ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA FÍSICA. NECESSIDADE DE
COMPROVAÇÃO DA DIFICULDADE FINANCEIRA. CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
O benefício da gratuidade judiciária deve ser deferido a quem demonstrar a
insuficiência de recursos para suportar as despesas processuais e os
honorários advocatícios, sem prejuízo próprio ou da família. Recepção do
artigo 4º da Lei n.º 1.060/50 pela Constituição Federal, por meio do artigo
art. 5º, inc. LXXIV, o qual condicionou a concessão do benefício à prova da
necessidade.
A recorrente apresentou comprovantes atualizados de recebimento de
salário no valor equivalente a 7,1 (sete virgula) salários mínimos,
comprovando, assim, sua impossibilidade de acesso ao Poder Judiciário,
caso não seja deferido o benefício.
Agravo de instrumento provido, de plano.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) (BRASIL, 1996) já deixou
o seu posicionamento sobre o assunto ao manifestar sua decisão no Recurso
Extraordinário n.º 205.029-6-RS, cujo relator foi o Ministro Carlos Veloso. Extrai- se
da ementa:
A garantia do artigo 5.º, LXXIV, assistência jurídica integral e gratuita
aos que comprovarem insuficiência de recursos, não revogou a de
assistência judiciária gratuita da Lei n.º 1060, de 1950, aos
necessitados, certo que, para obtenção desta, basta declaração, feita
pelo próprio interessado, de que sua situação econômica não permite
vir a Juízo sem prejuízo da sua manutenção ou de sua família. Essa
norma infraconstitucional põe-se, ademais, dentro do espírito da
Constituição, que deseja que seja facilitado o acesso de todos à
Justiça (CF, artigo 5.º,XXXV) R.E. não conhecido. (grifo nosso)
Ao proferir a já mencionada decisão nos autos da Apelação com Revisão
nº. 999907- 0/1, o Desembargador Palma Bisson deixou clara a sua opinião sobre o
assunto:
[...]Entendo, ademais, que o disposto no art. 4º da Lei n° 1.060/50 continua
em vigor, pois exigir, com fundamento na literalidade dos termos do inciso
XXIV, do art. 5o da Constituição Federal, que a parte desejosa de auferir os
benefícios da gratuidade comprove a insuficiência de recursos, é o mesmo
que trancar o acesso da Justiça aos necessitados não aparentes, que neste
país são tantos. Não pode ter sido este o objetivo da Constituição chamada
de cidadã.[...]
O STF (BRASIL, 1998a), confirmou seu entendimento no julgamento do
Recurso Especial n.º 204.302-2-PR, que teve como relator o Ministro Moreira Alves,
onde assim decidiu:
28
Assistência Judiciária gratuita. Alegação de revogação do artigo 4º, § 1º, da
Lei nº 1.060/50 pelo artigo 5º, LXXIV, da Constituição. Improcedência. - A
atual Constituição, em seu artigo 5º, LXXIV, inclui, entre os direitos e
garantias fundamentais, o da assistência jurídica integral e gratuita pelo
Estado aos que comprovarem a insuficiência de recursos. - Portanto, em
face desse texto, não pode o Estado eximir-se desse dever desde que o
interessado comprove a insuficiência de recursos, mas isso não impede que
ele, por lei, e visando a facilitar o amplo acesso ao Poder Judiciário que é
também direito fundamental (art. 5º, XXXV, da Carta Magna), conceda
assistência judiciária gratuita - que, aliás, é menos ampla do que a
assistência jurídica integral - mediante a presunção "iuris tantum" de
pobreza decorrente da afirmação da parte de que não está em condições de
pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo
próprio ou de sua família. - Nesse sentido tem decidido a Segunda Turma
(assim, a título exemplificativo, nos RREE 205.029 e 205.746). Recurso
extraordinário não conhecido.
Analisando todos esses entendimentos, o que podemos concluir sobre os
conceitos das expressões Assistência Judiciária, Assistência Jurídica e Justiça
Gratuita, é que ainda há muita divergência de significados. Acreditamos como já
dito, que seria mais didático chamar a isenção pecuniária de “Justiça Gratuita” e a
representação por meio de advogado de “Assistência Judiciária”.
Como o Desembargador Palma Bisson, do Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo, cremos que não deve haver distinção de advogados quando se fala
em Assistência Judiciária Gratuita, isto é, não há que se falar nesse benefício
somente se aquele que o pleiteia ainda não estiver representado nos autos.
Escolhemos adotar a expressão “Assistência Judiciária Gratuita” no título
desse trabalho porque é a expressão que a lei que trata do assunto (LAJ) adotou e
não por pensar que é o correto.
No mais, seja qual for o entendimento adotado acerca das nomenclaturas
(Justiça Gratuita ou Assistência Judiciária Gratuita), independente de entendermos
que a primeira está dentro da segunda ou vice-versa, teremos fundamentação
teórica suficiente para defender nosso entendimento. Então, para a presente
pesquisa, o nome não fará diferença.
A nomenclatura só é prejudicial na prática, quando os juízes resolvem
conceder a Justiça Gratuita apenas com relação as custas, (deixando de conceder a
Assistência Judiciária Gratuita) por compreendê-la como sendo apenas os
honorários que deveriam ser pagos pelo Estado no lugar do beneficiário.
Na maioria das vezes aqui, utilizaremos Justiça Gratuita e Assistência
Judiciária Gratuita como expressões sinônimas, substituindo-as, às vezes, pela
expressão “benefício da gratuidade”.
29
Quanto a Assistência Jurídica Integral, por entender que tem relação com
os serviços prestados pela Defensoria Pública, não faremos maiores considerações.
Embora saibamos da importância de todos os institutos, por conta dos objetivos
desse trabalho, trataremos apenas do benefício da Assistência Judiciária Gratuita,
entendendo que ela abrange a Justiça Gratuita, isto é, trataremos das custas
processuais e dos honorários advocatícios. Não queremos aqui falar sobre a
Defensoria Pública, portanto, não buscaremos a aplicação dos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade na Assistência Jurídica Integral, de que fala a
Constituição Federal, mas somente na Assistência Judiciária e Justiça Gratuitas.
2.3 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA: OBJETO E ABRANGÊNCIA
Argumenta MELO (2004, p. 4):
O acesso à justiça não pode ficar a mercê da possibilidade econômica da
parte fazer frente às despesas processuais, visto que tal acesso consiste na
proteção de qualquer direito, sem qualquer restrição econômica, social ou
política. É importante destacar que não basta a simples garantia formal da
defesa dos direitos e o acesso aos tribunais, mas a garantia da proteção
material destes direitos, assegurando a todos os cidadãos,
independentemente de classe social, a ordem jurídica justa.
De outro lado, o Estado tem o dever de conceder a todos o acesso ao
Judiciário sem a necessidade de antecipação das despesas processuais.
Seria absurdo, para dizer o mínimo, que o ingresso em juízo fosse possível
apenas aos que detém situação econômica abastada. A função do Estado-
Juiz é decidir os litígios e trazer a paz social nas relações intersubjetivas,
logo esta máxima estaria prejudicada, se a maioria da população pobre não
pudesse defender seus direito.(sic).
Assim, o objeto da Justiça Gratuita ou Assistência Judiciária Gratuita
(conforme ser quiser nomear) é, consoante o entendimento de DIDIER JUNIOR e
OLIVEIRA (2010, p. 11), a dispensa no aditamento das despesas com o processo,
imposto pelo artigo 19 do Código de Processo Civil.
Tal dispositivo legal (BRASIL, 1973) assim prevê:
“Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover
as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipandolhes
o pagamento desde o início até a sentença final; e bem ainda, na
execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença”.
30
Segundo DIDIER JUNIOR e OLIVEIRA (2010, p. 13), “a discussão
doutrinária e jurisprudencial [acerca do tema] surge quando se indaga quais
despesas estariam abrangidas no benefício”. Segundo os mesmos, alguns
entendem que a dispensa é a mais ampla possível, acolhendo despesas
processuais e extraprocessuais; outros, mais comedidos, afirmam que algumas
despesas não devem ser gratuitas, como, por exemplo, a remuneração de particular
que trabalha no processo como perito e não deve ficar a mercê de talvez não
receber posteriormente.
Os autores (DIDIER JUNIOR e OLIVEIRA 2010, p. 14) preferem adotar o
entendimento mais ampliativo por considerá-lo o que mais se harmoniza com a idéia
constitucional de Assistência Jurídica Integral, completando que “a parte que é
carente de recursos, para que possa gozar plenamente do livre Acesso à Justiça,
[...] deverá contar com meios legais de transpor o óbice financeiro do processo”.
Todavia, ressaltam os mesmos que há que se fazer uma ressalva quanto às
despesas extraprocessuais – que se fazem em virtude do processo, mas não dentro
dele – eis que tem que serem baseadas na razoabilidade.
Como exemplo, trazem o deslocamento da parte entre municípios para
submeter-se a exame pericial. Numa situação dessas, afirmam DIDIER JUNIOR e
OLIVEIRA (2010, p. 14-15) que a condução e alimentação devem ser fornecidas
pelo Estado, com veículo, combustível e condutor próprios, sendo que, somente se
for “absolutamente impossível” que o Estado o faça, deve-se buscar ajuda do
particular, quando pode ser deferido o benefício da gratuidade.
Atentam ainda os autores (DIDIER JUNIOR e OLIVEIRA 2010, p. 15) que
o benefício da Justiça Gratuita não abrange as multas. Se abrangesse, correr-se-ia o
risco de permitir um Acesso a Justiça irresponsável, “consubstanciado no fato de o
beneficiário poder, impunemente, abusar do direito de demandar, sem que nenhuma
sanção lhe pudesse ser aplicada”.
Porém, há que se destacar que na esfera trabalhista, de acordo com a
Instrução Normativa nº. 17, do Tribunal Superior do Trabalho (TST) (BRASIL, 1999),
item IV, “Os beneficiários da justiça gratuita estão dispensados do recolhimento
antecipado da multa prevista no § 2º do art. 557 do CPC”.
Tal multa é aplicada quando manifestamente inadmissível ou infundado o
agravo, sendo que nesse caso, conforme referido dispositivo legal (BRASIL, 1973),
“o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por
31
cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso
condicionada ao depósito do respectivo valor”.
Sobre a isenção do pagamento dos cálculos elaborados pela Contadoria
Judicial, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) (BRASIL, 1998b) já deixou o seu
posicionamento ao julgar o Recurso Especial n.º 146.231-SP, cujo relator foi o
ministro Vicente Leal:
Constitucional - Processual Civil - Liquidação de sentença - Cálculo do
contador - Assistência judiciária gratuita - Garantia constitucional - Artigo
604 do CPC - Alcance. A Constituição Federal assegura assistência jurídica
integral aos que não possuem condições econômicas para suportar as
despesas decorrentes do uso do aparelho judiciário. Tratando-se de
garantia constitucional de alta relevância para o exercício dos demais
direitos, é de se reconhecer a validade, especialmente nas ações
acidentárias, da liquidação do débito judicial por cálculo elaborado pelo
próprio Contador do Foro, embora a reforma instituída pela Lei n.° 8.898/94
tenha modificado o sistema de liquidação de sentença, atribuindo ao credor
a obrigação de apresentar a memória discriminada do quantum debeatur.
Recurso especial conhecido.
Sobre os honorários do perito o STJ também já se manifestou, decidindo
no Recurso Especial n.º 14.729-0-RJ, que teve como relator o Ministro Eduardo
Ribeiro: “De acordo com o art.3,V, da Lei 1060/50, a assistência judiciária abrange
também os honorários de perito. Recurso conhecido e provido.”
Para que não restem dúvidas a respeito do que é ou não abrangido pelo
benefício, trazemos à baila a decisão do STF (BRASIL, 2009) no Agravo Regimental
no Agravo de Instrumento nº 580.880-7, que teve como relator o Ministro Menezes
Direito:
Agravo regimental no agravo de instrumento. Justiça gratuita.
Ausência de peça essencial. Precedentes.
1. O benefício da assistência judiciária gratuita, implica a isenção de
despesas, não de ônus processuais de outra natureza, como o de indicar
peças a serem trasladas e o de fiscalizar a correta formação do
instrumento.[...]
De modo geral, a Lei de Assistência Judiciária (BRASIL, 1950), em seu já
citado artigo 3º, elenca os atos processuais dos quais o beneficiário estará isento, e,
em seu artigo 9º temos que: “os benefícios da assistência judiciária compreendem
todos os atos do processo até decisão final do litígio em todas as instâncias”.
32
2.4 QUEM PODE SER BENEFICIÁRIO DA GRATUIDADE
Para que o benefício da Assistência Judiciária Gratuita seja concedido,
deve-se declarar pobreza, na acepção jurídica do termo, consoante o artigo 4º e §
1º, da Lei 1.060/50 (BRASIL, 1950), que assim dispõe:
Art. 4º A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante
simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições
de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo
próprio ou de sua família.
§1º Presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição
nos termos da lei, sob pena de pagamento até o décuplo das custas
judiciais.
Posto que demonstramos os diferentes conceitos dados às expressões
Assistência Judiciária, Assistência Jurídica e Justiça Gratuitas, é possível afirmar
que a Constituição exige prova da pobreza daquele que estiver gozando de
gratuidade nas custas (justiça gratuita) e do patrocínio de causa por advogado
(assistência judiciária) quando fornecidos pelo Estado, isto é, pela Defensoria
Pública. Portanto, não precisa provar a pobreza, mas somente afirmá-la, aquele que
pleitear a Assistência Judiciária Gratuita, recebendo presunção de boa-fé até prova
em contrário.
Logo, alguém que queira o benefício da gratuidade, deverá cumprir dois
requisitos legais. O primeiro, disposto no artigo art. 4º da LAJ, diz respeito a
declaração de pobreza. Entretanto, quando houver prova em contrário e for
verificada a má-fé, o declarante poderá ser obrigado a pagar até o décuplo das
custas judiciais, consoante o §1º do mesmo artigo.
O outro requisito para a concessão está contido no artigo 2º da mesma
Lei: “gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no
País, que necessitarem recorrer à justiça penal, civil ou militar ou do trabalho”.
Vejamos o que dispõe o Parágrafo Único do artigo supracitado a respeito
dessa necessidade: “considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja
situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de
advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”.
Analisando esses dispositivos legais temos a chave para saber quem
pode ser beneficiado pela gratuidade: a pessoa cuja nacionalidade seja a brasileira,
33
ou em não sendo, resida no Brasil, cuja situação econômica não lhe permita pagar
custas processuais e honorários advocatícios, sem prejudicar seu sustento ou de
sua família, quando necessite recorrer ao Judiciário.
DIDIER JUNIOR e OLIVEIRA (2010, p. 30-31) ensinam que o benefício
pode ser requerido por qualquer uma das partes, seja autor ou réu, atuando
isoladamente em litisconsórcio, bem como qualquer outro sujeito que intervenha no
feito, na modalidade de intervenção de terceiro.
Sobre a questão do estrangeiro, argumentam ainda os autores que
embora a lei exija que ele resida no país para obter a gratuidade, mesmo que esteja
transitando pelo Brasil, poderá ser deferido o pedido de Justiça Gratuita:
Ora, se a própria Constituição, quando fala dos direitos e garantias
individuais – dentre as quais, relembre-se, estão a isonomia, o devido
processo legal e irrestrito acesso à justiça – vem, sendo interpretada desse
modo ampliativo, alcançando também os estrangeiros que aqui não tem
residência, não se poderia pensar que a LAJ, mera lei ordinária que
implementaria uma garantia constitucional, pudesse erigir validamente uma
tal diferenciação. Aliás, a interpretação/aplicação dos direitos fundamentais
deve sempre buscar a ampliação da sua eficácia, como reza a cartilha da
hermenêutica constitucional contemporânea.
Segundo os autores, outra questão que vem à tona quando pensamos a
quem o benefício pode ser concedido é a da possibilidade de conceder a Justiça
Gratuita à pessoa jurídica. Há certa resistência na doutrina por pensar-se que jamais
ela poderia ser considerada miserável. No entanto, os autores acima citados
(DIDIER JUNIOR; OLIVEIRA, 2010, p.33) afirmam que o entendimento majoritário
da doutrina e da jurisprudência é no sentido de que a pessoa jurídica pode também
ser beneficiada pela gratuidade:
Basta pensar que também ela, pessoa jurídica, por conta dos dissabores da
atividade econômica que explora ou dos serviços que presta, pode, à
semelhança das pessoas físicas, passar por dificuldade financeiras(sic) que
a impeçam de, por exemplo, efetuar o pagamento das custas iniciais do
processo.
Contudo, mister salientar que o Supremo Tribunal Federal (BRASIL,
2010) entendeu em recente decisão, no Agravo Regimental no Agravo de
Instrumento nº 637.177, cujo Relator foi o Ministro Ricardo Lewandowski que é
necessário que a pessoa jurídica comprove sua necessidade para obter a
concessão do benefício. Vejamos a ementa da decisão:
34
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO.
PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA
JURÍDICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE
RECURSOS. PRESSUPOSTOS DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. OFENSA
REFLEXA. AGRAVO IMPROVIDO. I - A discussão referente ao momento do
indeferimento do pedido de assistência judiciária gratuita, bem como à
alegada necessidade de o juízo recorrido ter oportunizado o recolhimento
do preparo, demanda a análise de normas processuais, sendo pacífico na
jurisprudência desta corte o não cabimento de recurso extraordinário sob
alegação de má interpretação, aplicação ou inobservância dessas normas.
A afronta à constituição, se ocorrente, seria indireta. Incabível, portanto, o
recurso extraordinário. Precedentes. II – É necessária a comprovação de
insuficiência de recursos para que a pessoa jurídica solicite
assistência judiciária gratuita. Precedentes. III – Agravo regimental
improvido. (grifo nosso)
De igual forma, entende o Superior Tribunal de Justiça (BRASIL, 2011),
mesmo quando a pessoa jurídica não tem fins lucrativos. Veja-se entendimento
proferido na decisão no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n.º 1.382.470-
SC, de relatoria do ministro Arnaldo Esteves Lima:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO
REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. OFENSA AO ART. 557
DO CPC. AUSÊNCIA. PESSOA JURÍDICA SEM FINS LUCRATIVOS.
SINDICATO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. HIPOSSUFICIÊNCIA
NÃO RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. REEXAME.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. "Fica superada eventual ofensa ao art. 557 do Código de Processo Civil
pelo julgamento colegiado do agravo regimental interposto contra a decisão
singular do Relator" (AgRg no REsp 1.107.638/PR, Rel. Min. LAURITA VAZ,
Quinta Turma, DJe 25/5/09).
2. "Pacífico nesta Corte o entendimento de que, mesmo tratando-se de
pessoa jurídica sem fins lucrativos, a concessão da assistência
judiciária gratuita depende de comprovação da impossibilidade de
arcar com os encargos do processo" (AgRg Ag 1332841/SC, Min.
CESAR ASFOR ROCHA, Segunda Turma, DJe 16/3/11).
3. Reconhecer a alegada hipossuficiência do recorrente, apta a autorizar a
concessão da gratuidade da justiça, alterando o entendimento firmado na
instância ordinária, exigiria o reexame do contexto fático-probatório dos
autos, vedado pela Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental não provido. (grifo nosso)
Pensamos que embora a Lei 1.060 não se refira somente à pessoa física
quando não obriga o requerente a provar sua necessidade, o que o STF fez foi
aplicar a Razoabilidade e a Proporcionalidade para decidir. Exigir de uma empresa a
prova da insuficiência de recursos é mais aceitável do que exigi-la de uma pessoa
física, além de ser uma forma adequada para evitar abusos. Está se garantindo o
Acesso à Justiça, a Ampla Defesa, o Contraditório, evitando-se, entretanto, abusos.
35
2.5 PROCEDIMENTO LEGAL PARA O REQUERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA
E ANÁLISE DO PEDIDO
O artigo 4º da LAJ (BRASIL, 1950) traz a forma atual para se fazer o
pedido de Assistência Judiciária Gratuita:
Art. 4º A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante
simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições
de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo
próprio ou de sua família.
Embora na prática vejamos muitos profissionais utilizando-se de
declaração em separado da petição inicial, ou contestação, isto é, da primeira peça
processual em que a parte se declarar no processo, o ideal é que ali afirme a
pobreza e peça a concessão da Justiça Gratuita, como dispõe o dispositivo legal
acima transcrito.
DIDIER JÚNIOR e RAFAEL OLIVEIRA (2010, p. 45-46) dizem haver dois
momentos para se fazer o pedido: o disposto no artigo 4º da LAJ, que chamam de
inicial, e o disposto no artigo 6º da referida Lei, que chamam de momento ulterior.
Essa distinção tem importância em se tratando da prática processual.
Para eles, quando a parte pede a concessão da gratuidade no primeiro
momento que se manifesta no processo, tem-se um pedido inicial e o magistrado
para deferir ou não o pedido deve observar o disposto no artigo 4º da LAJ, deferindo
ou indeferindo o pedido e fundamentando no prazo de setenta e duas horas.
Já quando o pedido é feito em momento ulterior, isto é, já no curso do
processo, quando a parte já tiver feito sua primeira manifestação dentro dele, o
magistrado observará o artigo 6º da referida Lei, devendo ouvir a outra parte. Esse
pedido é autuado em separado e a respectiva petição é apensada aos autos da
ação principal, sem que esta seja suspensa.
2.6 RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS DESPESAS PROCESSUAIS
E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO FIM DO PROCESSO
36
Ensinam DIDIER JUNIOR e OLIVEIRA (2010, p. 25) que “nosso
ordenamento jurídico adotou o princípio da sucumbência para efeito de distribuição
do custo do processo”. Segundo esse princípio, deve arcar com as despesas
oriundas do processo aquele que deu causa à demanda, entendendo-se este como
a parte vencida no final do processo.
Argumentam os autores que não há maiores problemas quando o
beneficiário da Justiça Gratuita é o vencedor, pois as despesas ficarão a cargo
daquele que foi vencido, seguindo-se os ditames do artigo 11 da LAJ (BRASIL,
1950): “os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e
selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário da assistência for
vencedor na causa”.
O problema maior surge, segundo os autores mencionados (DIDIER
JUNIOR; RAFAEL OLIVEIRA, 2010, p. 27), “quando o beneficiário é vencido, ou
quando ambas as partes são beneficiárias” - nessa última hipótese um dos
beneficiários, será sucumbente. Em ambos os casos, a Fazenda Pública, isto é, o
Estado, “terá que suportar o prejuízo quanto às verbas que lhe forem eventualmente
devidas”. Quando se fala em “o Estado suportar o prejuízo”, não está se falando na
obrigação do mesmo de pagar as verbas sucumbenciais, tampouco, os honorários
periciais e advocatícios. Salientam os autores que a sentença não poderá servir de
título executivo para cobrar essas despesas do Estado, pois estar-se-ia violando os
princípios do Devido Processo Legal e do Contraditório, já que ele não teria
participação na formação do título. Todavia, veremos adiante, quando adentrarmos
especificamente em nosso tema, que os Princípios da Razoabilidade e
Proporcionalidade podem ser reivindicados nesse caso.
Quanto à possibilidade de cobrança de verbas devidas a parte contrária,
os autores mencionam a existência de três correntes: uma segundo a qual o
beneficiário da gratuidade deve ser condenado ao pagamento, que por decorrer do
princípio da Sucumbência não são abrangidas pelo benefício; outra segundo a qual
o beneficiário é totalmente isento do pagamento; e outra que defende a tese de que
o beneficiário deve ser condenado na sentença ao pagamento das verbas de
sucumbência, mas que o crédito só poderá ser exigido se provada a perda da
condição de necessitado e não estiver prescrito o direito.
O entendimento do STJ (BRASIL, 1991) é o seguinte:
37
[...]A parte beneficiária de justiça gratuita, quando vencida, sujeita-se ao
princípio da sucumbência, não se furtando ao pagamento dos consectários
dela decorrentes. A condenação respectiva deve constar da sentença,
ficando, contudo, sobrestada até e se, dentro de cinco anos, a parte
vencedora comprovar não mais subsistir o estado de miserabilidade da
parte vencida.
É interessante destacar que a parte beneficiada pela Assistência
Judiciária Gratuita, conforme os artigos 12 e 13 da LAJ, fica obrigada a pagar as
despesas processuais caso seja verificado, dentro do prazo de 5 (cinco) anos, a
contar da sentença final, que o pode fazer sem prejuízo do seu sustento ou de sua
família, mesmo que em parte.
É bom saber também que conforme o artigo 11, §2º, também da LAJ, a
parte vencida pode acionar a vencedora para reaver as custas e honorários, caso
prove que a última perdeu a condição de necessitada. Porém, segundo DIDIER
JUNIOR e OLIVEIRA (2010, p. 27) esse dispositivo foi revogado pelo atual Código
de Processo Civil, por contrariar o Princípio da Sucumbência.
3 OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE
3.1 ELEMENTOS DO SISTEMA JURÍDICO
Para que possamos falar dos princípios da Proporcionalidade e da
Razoabilidade, é necessário que primeiro saibamos o que são princípios, pois
segundo CARLOS ARI SUNDFELD (1992, apud. ESPÍNDOLA, 2002. p. 13), é “o
conhecimento dos princípios, e a habilitação para manejá-los, que distingue o jurista
do mero conhecedor de textos legais”.
Mas para chegarmos ao conceito de “princípios” temos que antes se faz
necessário, situá-los dentro do campo do Direito. Isso porque, segundo GABRIEL
(2007, p. 1):
Quando se fala em conceituar princípio, o grande problema inicial é
desfazer a confusão comum que se faz com os termos regra, norma e lei.
Não se trata, pois, de uma distinção meramente terminológica, mas de uma
exigência de clareza conceitual: quando existem várias espécies de exames
38
no plano concreto, é aconselhável que elas também sejam qualificadas de
modo distinto.
BOBBIO (1996, apud GABRIEL, 2007, p.1) afirma que talvez a confusão
entre os três termos se dê devido a grande importância que os princípios passaram
a ter, o que levou o ordenamento jurídico a ampliação de suas dimensões –
passando a ser um sistema normativo – e precisando assim, de uma “interpretação
estrutural”, porque não podem haver normas incompatíveis, já que a segurança
jurídica deve prevalecer.
Assim, nosso primeiro passo é entender nosso sistema jurídico, para que
então possamos situar os princípios dentro do mesmo. FERRAZ JUNIOR (1976,
apud. GABRIEL, 2007, p. 1) expõe que:
[...] o conceito de sistema, no Direito, está ligado ao de totalidade jurídica.
No conceito de sistema está, porém, implícita a noção de limite. Falando-se
em sistema jurídico surge assim a necessidade de se precisar o que
pertence ao seu âmbito, bem como se determinar as relações entre sistema
jurídico e aquilo a que ele se refira, embora não fazendo parte de seu
âmbito, e aquilo a que ele não se refira de modo algum.
Um sistema jurídico possui seus elementos, sendo necessário, segundo
GABRIEL (2007, p. 1), sabermos identificar cada um deles, a fim de interpretá-lo na
totalidade e evitar incoerências jurídicas. Porém, como não é o objetivo do presente
trabalho tratar dos outros elementos, explanaremos superficialmente sobre os
mesmos, aprofundando nosso estudo somente acerca dos princípios.
3.1.1 Lei
A lei, um dos elementos que compõem o sistema jurídico, possui vários
sentidos, conforme ensina RIZZATO NUNES (2004, apud. GABRIEL, 2007, p. 1):
“[...] a lei pode ter vários significados, ser divina, da natureza ou emanada do próprio
Estado”. Por óbvio, a lei jurídica é aquela emanada pelo Estado, e conforme citado
autor, pertencem a um gênero denominado norma jurídica, que por sua vez possui
duas espécies: normas escritas (leis, medidas provisórias, decretos legislativos,
39
resoluções, portarias, circulares, instrução normativa, ordens de serviço, etc) e
normas não escritas – não estatais (costumes jurídicos).
DINIZ (2005, p. 285) acrescenta às normas estatais a jurisprudência e às
normas não estatais, a doutrina, as convenções e os negócios jurídicos. A lei é,
portanto, uma das principais fontes de direito e é espécie, da qual a norma jurídica
estatal é gênero.
Conclui GABRIEL (2007, p. 1) que tal espécie normativa tem como função
específica estabelecer regras. E sem dúvidas, valendo-nos das palavras de DINIZ
(2005, p. 288), “grande é a importância da lei no Estado de Direito”.
3.1.2 Regra
Outro elemento do sistema normativo é a regra. Vários autores utilizam os
termos norma e regra como sendo sinônimos. Como exemplo, podemos citar REALE
(2005, p. 117). ÁVILA (2005, p. 7-8) acredita que isso se dá em decorrência de um
problema de interpretação, devido a lei não trazer conceitos e o intérprete ter que
“reconstruir” a idéia apresentada a ele.
GABRIEL (2007, p. 1.) simplifica esse entendimento de ÁVILA, dizendo
que: “em razão do sentido, na linguagem coloquial, muitas vezes se é forçado a
entender regra como sinônimo de norma”. Porém o autor ensina que:
As regras podem ser sociais, morais ou religiosas, sem a imposição
coercitiva do ordenamento jurídico – regras jurídicas, causando ao indivíduo
que não a cumpra apenas inconvenientes de ordem íntima ou
comportamental. Já as regras jurídicas, aquelas que emanam do
ordenamento jurídico, geram conseqüências na órbita jurídica, razão pela
qual possuem caráter muito mais coativo e que por isso se localizarão no
conjunto das normas jurídicas.
A diferença entre regra e lei é, no entanto, segundo GABRIEL (2007, p.
1), que a regra pode ou não ser positivada enquanto a lei é necessariamente
positivada.
3.1.3 Norma Jurídica
40
Como dito anteriormente, as normas são o gênero das quais a lei e a
regra são espécies. Ao tratar das normas, é primordial citar a obra de Humberto
Ávila, denominada “Teoria dos Princípios”. Vejamos o entendimento de ÁVILA,
(2005, p. 30-31) sobre as normas jurídicas:
Normas não são textos nem o conjunto deles, mas os sentidos construídos
a partir da interpretação sistemática de textos normativos. [...] O importante
é que não existe correspondência entre norma e dispositivo, no sentido de
que sempre que houver um dispositivo haverá uma norma, ou sempre que
houver uma norma deverá haver um dispositivo que lhe sirva de suporte.
Em alguns casos há norma mas não há dispositivo.[...]Em outros casos há
dispositivo mas não há norma. [...] Em outras hipóteses há apenas um
dispositivo, a partir do qual se constrói mais de uma norma. [...] Significa
que não há correspondência biunívoca entre dispositivo e norma – isto é,
onde houver um não terá de haver obrigatoriamente o outro.
Isto posto, devemos saber para entrar finalmente no que mais nos
interessa (os princípios), que existem várias classificações para as normas jurídicas,
dentre elas a da norma jurídica como fonte de Direito, onde seguindo os ensinos de
REALE (2005, p. 121), temos que ela é a expressão de um dever ser de
organização ou de conduta, podendo resultar de diversos processos, dentre os quais
o jurisdicional, o legislativo, o costumeiro e o negocial.
ÁVILA (2005, p.35) aduz que as normas podem ser tomadas no sentido
de princípios ou de regras, sendo importante definir os princípios.
3.1.4 Princípios
Passemos a analisar os mais relevantes, para nós, dos elementos
normativos, quais sejam, os princípios.
Acerta NALINI (2000, p. 45) ao insinuar:
A relevância dos princípios nunca tem sido suficientemente salientada.
Compreende-se que para a mentalidade calcada no dogmatismo positivista
mostra-se perigosa a incursão pela principiologia, necessariamente fluida.
Todavia, o direito não se esgota nas leis. [...] Direito é muito mais que isso.
É acervo de valores, é conjunto significativo. É consistência, é o consenso
jurídico resultante da consciência coletiva num determinado momento
histórico.
41
SANTOS (2009, p. 73) ensina que:
[...]cada sistema processual se calca em princípios que se estendem a
todos os sistemas e com aplicação mais ou menos intensa, e em princípios
outros, que lhe são próprios, que o caracterizam. É do exame dos princípios
gerais que informam um sistema que resultará qualificá-lo comum com os
demais, do presente ou do passado. [...]São os princípios gerais de cada
sistema que permitem ao legislador a criação de novos institutos, e ao
intérprete dar a inteligência dos que no sistema se estruturaram, o sentido
e a aplicação das normas legais que os disciplinam, propiciando, assim, a
colaboração da ciência jurídica na obra incessante do aprimoramento do
processo, visando sua adaptação às circunstâncias ocorrentes com as
transformações dos fenômenos sociais, dia a dia mais apressadas e até
inesperadas e bruscas.
A nosso ver, acertadas ambas as lições, pois acreditamos que os
princípios são a chave mestra para se legislar e interpretar a legislação de um povo.
Eles orientam o sistema normativo de tal modo que não podem ser desconsiderados
quando uma norma jurídica estiver os desrespeitando. Nas palavras de SANTOS
(2009, p. 73) há “indisfarçável utilidade no conhecimento dos princípios gerais ou
fundamentais, que orientam o sistema processual brasileiro”.
Isso nos leva a entender porque, segundo SÉRGIO GABRIEL (2007, p.
1), hodiernamente qualquer discussão jurídica envolve o termo “princípio”. Embora a
discussão venha de longa data, entre jusnaturalistas e juspositivistas, cada vez mais
o termo é colocado em debate. Conforme o autor, a doutrina traz muita discussão no
que envolve o conceito e a função dos princípios para o Direito, sendo que a certeza
existente é de que o sistema jurídico compõe-se de regras e princípios, restando a
necessidade de diferenciá-los e identificar a respectiva função.
Sendo assim, aqui analisaremos de forma sucinta o significado do termo
“princípio” e a sua função. A análise não se estenderá mais porque o tema do
presente trabalho é mais específico e o tema “princípios”, por si só, já daria ensejo
para se escrever outra monografia.
No tocante ao conceito de “princípios”, discorre ESPÍNDOLA (2002, p. 50-
53) acerca do significado da palavra em vários campos científicos – filosofia,
geometria, etc. – para ao final concluir que:
a idéia de princípio ou sua conceituação, seja lá qual for o campo do saber
que se tenha em mente, designa a estruturação de um sistema de idéias,
pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave,
por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou
normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam.
42
REALE (2005, p. 303-304) classifica os princípios discriminando-os em
três grandes categorias:
a) princípios omnivalentes, quando são válidos para todas as formas de
saber, como é o caso dos princípios de identidade e de razão suficiente;
b) princípios plurivalentes, quando aplicáveis a vários campos de
conhecimento, como se dá com o princípio de causalidade, essencial às
ciências naturais, mas não extensivo a todos os campos do conhecimento;
c) princípios monovalentes, que só valem no âmbito de determinada
ciência, como é o caso dos princípios gerais de direito.
Para NUCCI (2005, p. 25), no sentido jurídico, a palavra princípio
“significa uma ordenação que se irradia e imanta o sistema normativo,
proporcionando alicerce para a interpretação, integração, conhecimento e eficiente
aplicação do direito positivo”.
Completa o doutrinador ESPÍNDOLA (2002, p.55) que no campo do
Direito, a definição de princípio dominante é a mesma de NUCCI aqui apontada,
mas que é necessário ter em mente que, dentro dessa definição, há certa
estruturação feita pelos estudiosos do ramo jurídico, sendo que ora tem-se utilizado
o termo “princípio”:
para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre
o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e
ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas
construídas independentemente de uma ordem jurídica concreta ou de
institutos de direito ou normas legais vigentes.
Porém ESPÍNDOLA (2002, 55.) faz a seguinte ressalva:
Essa polissemia não é benéfica neste campo do saber [o direito], em que a
confusão de conceitos e idéias pode levar à frustração da práxis jurídica ou
à sonegação, por uma prática equívoca, de direitos ou de situações
protegíveis pelo sistema jurídico posto.
3.1.4.1 Princípios e Regras
Para tratar um pouco da diferença entre princípios e regras, examinemos
o que diz JOSEF ESSER, (1990, apud. ÁVILA, 2005, p.8):
43
princípios são aquelas normas que estabelecem fundamentos para que
determinado mandamento seja encontrado. Mais do que uma distinção
baseada no grau de abstração da prescrição normativa, a diferença entre os
princípios e as regras seria uma distinção qualitativa. O critério distintivo dos
princípios em relação às regras seria, portanto, a função de fundamento
normativo para a tomada de decisão.
No mesmo sentido, KARL LARENZ (1979, apud. ÁVILA, 2005. p. 8):
normas de grande relevância para o ordenamento jurídico, na medida em
que estabelecem fundamentos normativos para a interpretação e aplicação
do Direito, deles decorrendo, direta ou indiretamente, normas de
comportamento. [...] os princípios seriam pensamentos diretivos de uma
regulação jurídica existente ou possível, mas que ainda não são regras
suscetíveis de aplicação, na medida em que lhes falta o caráter formal de
proposições jurídicas, isto é, a conexão entre uma hipótese de incidência e
uma conseqüência jurídica.
Da análise dos conceitos de princípio de vários estudiosos do tema ÁVILA
(2005, p. 10) concluiu que há distinções fracas e fortes entre princípios e regras,
além de demonstrar que existem alguns critérios usualmente empregados para a
distinção:
Em primeiro lugar, há o critério do caráter hipotético-condicional, que se
fundamenta no fato de as regras possuírem uma hipótese e uma
conseqüência que predeterminam a decisão, sendo aplicadas ao modo se,
então, enquanto os princípios apenas indicam o fundamento a ser utilizado
pelo aplicador para futuramente encontrar a regra para o caso concreto.
Dworkin afirma: "Se os fatos estipulados por uma regra ocorrem, então ou a
regra é válida, em cujo caso a resposta que ela fornece deve ser aceita, ou
ela não é, em cujo caso ela em nada contribui para a decisão". Caminho
não muito diverso também é seguido por Alexy quando define as regras
como normas cujas premissas são, ou não, diretamente preenchidas.
Em segundo lugar, há o critério do modo final de aplicação, que se sustenta
no fato de as regras serem aplicadas de modo absoluto tudo ou nada, ao
passo que os princípios são aplicados de modo gradual mais ou menos.
Em terceiro lugar, o critério do relacionamento normativo, que se
fundamenta na idéia de a antinomia entre as regras consubstanciar
verdadeiro conflito, solucionável com a declaração de invalidade de uma
das regras ou com a criação de uma exceção, ao passo que o
relacionamento entre os princípios consiste num imbricamento, solucionável
mediante ponderação que atribua uma dimensão de peso a cada um deles.
Em quarto lugar, há o critério do fundamento axiológico, que considera os
princípios, ao contrário das regras, como fundamentos axiológicos para a
decisão a ser tomada.
Todos esses critérios de distinção são importantes, pois apontam para
qualidades dignas de serem examinadas pela Ciência do Direito. Isso não
nos impede, porém, de investigar modos de aperfeiçoamento desses
critérios de distinção, não no sentido de desprezar sua importância e, muito
menos ainda, de negar o mérito das obras que os examinaram; mas, em
vez disso, naquele de confirmar sua valia pela forma mais adequada para
demonstrar consideração e respeito científicos: a crítica.
44
Todavia o que mais nos interessa na presente pesquisa é entender como
é feita a aplicação dos princípios e para melhor saber interpretar os princípios, já
tomados no seu sentido jurídico, é preciso distinguir os princípios constantes nas
normas, dos princípios próprios à interpretação das normas. Estamos falando do que
ESPÍNDOLA (2009, p. 56) chama de “princípios positivos do Direito” e “princípios
gerais de Direito”.
3.1.4.2 Princípios Gerais de Direito e Princípios Positivos do Direito
Tanto os Princípios Positivos de Direito quanto os Princípios Gerais do
Direito são recepcionados na Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 4º: os
primeiros quando o dispositivo fala em lei e os segundos, quando fala
especificamente em princípios gerais de direito. Leia-se o referido dispositivo: “Art. 4º
Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os
costumes e os princípios gerais de direito”.
Argumenta REALE (2005, p. 304) que o legislador acaba nesse
dispositivo por reconhecer que só o sistema legislativo não é suficiente para coibir
todo o campo da experiência humana, isto é, resta sempre grande número de
situações imprevistas, que o legislador não poderia ter vislumbrado anteriormente.
Quando isso ocorre, o legislador pode e deve recorrer aos Princípios Gerais do
Direito, mas, saliente-se, eles não são capazes de sozinhos suprir as lacunas da lei.
BEVILÁQUIA (? apud. MOTTA;BARCHET, 2009), ensina que Princípios
Gerais do Direito são aqueles “elementos fundamentais da cultura jurídica humana
em nossos dias; das idéias e princípios sobre os quais assenta concepção jurídica
dominante”. Tratam-se de elementos interpretativos utilizados quando a lei for
insuficiente para se julgar o caso específico.
GRAU (1985, apud ESPÍNDOLA, 2002. pg. 57), chegou à conclusão, ao
estudar as posições de Antoine Jeammaud e Jerzy Wróblewski, que os princípios
positivos do Direito, devem ser valorados sob a ótica do “válido ou inválido, vigente
ou não, eficaz ou ineficaz, adequadas à análise do Direito enquanto sistema de
normas positivas”. Enquanto as normas gerais de Direito podem ser valoradas
segundo a idéia do falso e do verdadeiro.
45
O autor ainda concluiu (GRAU, 1985, apud ESPÍNDOLA, 2002, p. 58) que
os Princípios Gerais de Direito são muito utilizados pela jurisprudência na
fundamentação das decisões, quando então passam de “princípios descritivos”,
“para princípios positivados de inspiração doutrinal”. Eis que “transformam-se em
princípios positivados, através do ato decisional que os vinculou”. Então, para o
autor, Princípio Geral do Direito é aquele ainda não positivado, mas que pode ser
formulado ou reformulado pela jurisprudência.
Em verdade, cada ordenamento jurídico possui seus próprios Princípios
Gerais do Direito. Para CLEMENTE de DIEGO (?, apud ESPÍNDOLA, 2002, p. 59),
pensar em princípios gerais não contemplados na ordem jurídica de um povo é
deixar brecha para introdução de “regras exóticas”, passíveis de destruir as linhas do
respectivo ordenamento, gerando confusão, onde deve reinar segurança, clareza,
harmonia e precisão. Segundo o entendimento do autor, pode-se chegar a uma
equiparação entre “Princípios Gerais do Direito” e “Princípios Gerais do
Ordenamento Jurídico”.
MOTTA e BARCHET (2009, p. 311) trazem como princípios gerais do
direito o princípio da Realidade (segundo o qual o Direito não surge do irreal ou do
impossível); o princípio as Sindicabilidade (primordial para saber se a lei foi ou não
cumprida); o princípio da Responsabilidade (“responder pelo torto é um dever tão
antigo quanto o próprio direito”); o princípio da Legitimidade (que assegura que a
vontade geral seja respeitada); o princípio do Devido Processo Legal (que dispensa
definição); o princípio do Contraditório (segundo o qual todas as partes envolvidas
devem ser ouvidas; o princípio da Descentralização (que é resposta para os
problemas de hipertrofia estatal); e o princípio da Motivação (que como sabemos, é
obrigação tanto no campo administrativo quanto no judiciário daquele que pratica ato
jurídico, de fundamentar sua realização.
Interessante salientar que há outros Princípios Gerais de Direito admitidos
pelo Direito Pátrio e que cada ramo do Direito possui seus próprios Princípios Gerais
– como exemplo, temos a própria Razoabilidade e Proporcionalidade, que são
comportados pela Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo no Âmbito da
Administração Pública Federal (BRASIL, 1999), mas que são muito utilizados pelos
ministros do STF quando vão declarar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade
de determinada norma jurídica. São na verdade Princípios Gerais de Direito,
46
Princípios Gerais do Direito Processual Administrativo, do Direito como todo,
devendo ser SEMPRE observados.
Nas palavras de REALE (2002, p. 315), “toda experiência jurídica e, por
conseguinte, a legislação que a integra, repousa sobre princípios gerais de direito,
que podem ser considerados os alicerces e as vigas mestras do edifício jurídico”.
No mesmo sentido, ROSCOE POUND (1959, apud. REALE, 2002): “o
Direito é experiência desenvolvida pela razão e razão provada pela experiência,
residindo a sua parte vital nos princípios e não nas regras”.
Completa ainda REALE (2002, p. 317):
Os princípios gerais de Direito põem-se, dessarte, como as bases teóricas
ou as razões lógicas do ordenamento jurídico, que deles recebe o seu
sentido ético, a sua medida racional e a sua forma vital ou histórica. A vida
do Direito é elemento essencial do diálogo da história.
Assim, temos que é fundamental ao aplicar a letra da lei, que o juiz
observe se ela não contraria nenhum Princípio Geral do Direito.
3.1.4.3 Função dos Princípios
Tratando um pouco sobre a função dos princípios trazemos os ensinos de
BONAVIDES (1994, apud ESPÍNDOLA, 2002), segundo o qual, “os princípios
cumpririam três funções relevantes na ordem jurídica: fundamentadora, interpretativa
e supletiva”. Passa-se a resumir cada uma dessas funções.
A função fundamentadora dos princípios está ligada aquele conceito já
apresentado aqui, de base para o ordenamento jurídico, isto é, os princípios teriam o
condão de sustentar a ordem jurídica, seriam aquilo que mantém o sistema
normativo seguro.
Quanto à função interpretativa dos princípios, essa diz respeito ao fato de
que os princípios orientam as soluções jurídicas nos casos práticos. Muitas vezes as
normas jurídicas podem entrar em conflito, ou ainda, serem insuficientes para se
resolver uma questão jurídica, dando então lugar para que os princípios ajudem o
intérprete a buscar a solução mais adequada.
47
Já a função supletiva dos princípios diz respeito a eles servirem
“suplemento” quando a lei for omissa, ou seja, quando houver uma lacuna dentro do
ordenamento jurídico que necessite ser preenchida para se resolver uma lide. Os
princípios têm a função de suprir a insuficiência das normas ou regras.
Tendo então as funções dos princípios em mente, podemos passar a
tratar dos princípios que queremos por objeto da presente pesquisa.
3.2 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE
Trataremos agora dos princípios que fazem parte do objeto de estudo do
presente trabalho monográfico.
3.2.1 Princípio e Postulado
Antes de começar a conceituar os princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade, entendemos ser necessário passarmos pelas definições de
“princípio” e “postulado”. É que ÁVILA (2005, passim.), que como já dissemos tem
uma renomada obra na área dos princípios, afirma que na verdade, os princípios
estão no mesmo patamar das normas jurídicas, podendo ser violados, enquanto a
Razoabilidade e a Proporcionalidade, ao lado da Eficiência, não podem ser violadas,
o que faria delas não “princípios”, mas “postulados”.
Ele (ÁVILA, 2005, p. 77) chama ainda a Razoabilidade e a
Proporcionalidade de “metanormas” e “normas de segundo grau”. Veja-se seu
entendimento:
O qualificativo de normas de segundo grau, porém, não deve levar à
conclusão de que os postulados normativos funcionam como qualquer
norma que fundamenta a aplicação de outras normas, a exemplo do que
ocorre no caso de sobreprincípios como o princípio do Estado de Direito ou
do devido processo legal. Isso porque esses sobreprincípios situam-se no
próprio nível das normas que são objeto de aplicação, e não no nível das
normas que estruturam a aplicação de outras. Além disso, os
sobreprincípios funcionam como fundamento, formal e material, para a
48
instituição e atribuição de sentido às normas hierarquicamente inferiores, ao
passo que os postulados normativos funcionam como estrutura para
aplicação de outras normas.
O autor ainda afirma que a maior parte dos autores dá o nome de
princípios aos postulados jurídicos, colocando-os assim no mesmo patamar das
normas e regras, o que apenas faz confundir, em vez de esclarecer. Ressalta que
“rigorosamente, portanto, não se podem confundir princípios com postulados”. (ÁVILA,
2005, p. 78)
A diferença precípua entre princípio e postulado, para o autor, é que
[...] os princípios são definidos como normas imediatamente finalísticas, isto
é, normas que impõem a promoção de um estado ideal de coisas por meio
da prescrição indireta de comportamentos cujos efeitos são havidos como
necessários àquela promoção. Diversamente, os postulados, de um lado,
não impõem a promoção de um fim, mas, em vez disso, estruturam a
aplicação do dever de promover um fim; de outro, não prescrevem
indiretamente comportamentos, mas modos de raciocínio e de
argumentação relativamente a normas que indiretamente prescrevem
comportamentos.
Sem desmerecer a aprofundada pesquisa de ÁVILA, preferimos, para a
elaboração do presente trabalho, adotar o termo “princípios”, tendo em vista que a
maioria dos doutrinadores, como reconhece o próprio autor, adota essa
denominação para a Razoabilidade e a Proporcionalidade, além da própria lei,
destaque-se. Não é nosso objetivo aqui, fazer jogos de linguagem, mas entender o
que são os dois princípios e se podem ser aplicados, como desejamos, na
apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita.
Como já dissemos aqui, para nós, esses dois princípios são Princípios
Gerais de Direito, sendo que adotamos ainda o entendimento de BANDEIRA de
MELO (2006, apud. PIRES, 2007, p.2), segundo o qual “podemos entender os
princípios como normas hipotéticas fundamentais, que estão acima de todas as leis”.
3.2.2 Conceitos de Razoabilidade e Proporcionalidade
A primeira coisa que se deve abordar aqui para tratar desses dois
princípios é o fato de que são, realmente, dois princípios, em nossa opinião e na
49
opinião dos autores que decidiram por se aprofundar melhor no tema. Dizemos isso
porque muitos autores limitam-se a afirmar que “Proporcionalidade” e
“Razoabilidade” são a mesma coisa. Fossem sinônimos, não iria o legislador, no
artigo 2º da Lei 9.784 (BRASIL, 1999) assim dispor: “A Administração Pública
obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação,
razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório,
segurança jurídica, interesse público e eficiência”.
Exemplo de doutrinador que considera sinônimos os dois princípios é
GILMAR MENDES (2009, p. 142-143), que assim expressa sua opinião:
Utilizado, de ordinário, para aferir a legitimidade das restrições de direitos –
muito embora possa aplicar-se, também, para dizer do equilíbrio na
concessão de poderes, privilégios ou benefícios – o princípio da
proporcionalidade ou da razoabilidade, em essência, consubstancia uma
pauta de natureza axiológica que emana diretamente das idéias de justiça,
eqüidade, bom senso, prudência, moderação, justa medida, proibição de
excesso, direito justo e valores afins; precede e condiciona a positivação
jurídica, inclusive a de nível constitucional; e ainda, enquanto princípio geral
do direito, serve de regra de interpretação para todo ordenamento jurídico.
Para nós parece óbvio que o legislador não teria porque usar sinônimos
nesse dispositivo. Ele está citando vários princípios e coloca a Razoabilidade e a
Proporcionalidade, a nosso ver propositalmente, lado a lado – não como sinônimos,
mas como dois princípios diferentes.
ÁVILA (?, apud. PIRES, 2007, p. 3), não se conformando com a confusão
feita entre os dois princípios escreveu: “É um problema fenomênico porque, se há
dois fenômenos distintos a considerar, porque chamá-los da mesma forma? Não há
razão para isso. É banalizar a linguagem, deixando de tirar proveito dela”.
A confusão talvez se dê, porque muitos pensam que aquilo que é
proporcional é razoável e vice-versa. No entanto, um bom exemplo, dado por PIRES
(2007, p. 3) é o disposto no artigo 5º, inciso XLVII, alínea “a” da Constituição
Federal, segundo o qual “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra
declarada [...]. Para muitos autores, o dispositivo é proporcional, no entanto, para o
senso comum, não é razoável que haja pena de morte sob qualquer hipótese em um
país que prega a paz e o respeito.
Partindo do pressuposto de que Razoabilidade e Proporcionalidade são
Princípios Gerais do Direito, com conceitos distintos e tem esse condão de
50
superioridade em relação às normas e regras jurídicas, servindo de base para elas,
passemos a conceituá-los e diferenciá-los.
Tratando um pouco da origem dos dois princípios, temos PIRES (2007, p.
1) que explica que o princípio da Razoabilidade teve origem nos Estados Unidos da
América, com o “due processo of Law”, em meados de 1.215, constando na sua
Carta Magna. Já o princípio da Proporcionalidade, originou-se na Europa, mais
precisamente na Alemanha, entre os séculos XII e XVIII, quando surgiram as teorias
jusnaturalistas na Inglaterra.
Aponta ainda o autor (PIRES 2007, p. 1) que ambos os princípios
(Razoabilidade e Proporcionalidade) surgiram na intenção de barrar o poder
desenfreado do Estado Formal de Direito, ao trazer para o novo Estado Democrático
de Direito, a busca pelo respeito à dignidade da pessoa humana, pelo direito ao
devido processo legal e assim, e ao longo dos anos construindo um Estado
moderno, respeitando a declaração do homem e do cidadão e a nova mensagem
trazida pela Revolução Francesa: “liberdade, igualdade e fraternidade”.
BARROSO (2006, p. 362) assim complementa o escorço histórico dado
por PIRES:
A idéia de razoabilidade remonta ao sistema jurídico anglo-saxão, tendo
especial destaque no direito norte-americano, como desdobramento do
conceito de devido processo legal substantivo. O princípio foi desenvolvido,
como próprio do sistema do Common Law, através de precedentes
sucessivos, sem maior preocupação com uma formulação doutrinária
sistemática. Já a noção de proporcionalidade vem associada ao sistema
jurídico alemão, cujas raízes romano-germânicas conduziram a um
desenvolvimento dogmático mais analítico e ordenado. De parte isto, devese
registrar que o princípio, nos Estados Unidos, foi antes de tudo, um
instrumento de direito constitucional, funcionando como um critério de
aferição da constitucionalidade de determinadas leis. Já na Alemanha, o
conceito evoluiu a partir do direito administrativo, como mecanismo de
controle dos atos do Executivo. Sem embargo de origem e do
desenvolvimento diversos, um e outro abrigam os mesmos valores
subjacentes: racionalidade, justiça, medida adequada, senso cumum,
rejeição aos atos arbitrários ou caprichosos. Por essa razão, razoabilidade e
proporcionalidade são conceitos próximos o suficiente para serem
intercambíveis.
Registre-se que Barroso, na citação supra, diz que são conceitos
“próximos”, mas não iguais. Então, tendo essa noção histórica e sabendo que os
princípios não são um só, mas dois, vejamos o conceito diferenciador apontado por
PIRES (2007, p. 2):
51
A razoabilidade se manifesta quando existe uma norma, atitude, resolução,
atos e outros que são irrazoáveis, ou seja, foge do senso comum. Já o
princípio da Proporcionalidade é consultado com o intuito de sacrificar uma
regra ou um princípio em relação a outro, com o interesse de buscar a
melhor solução entre as partes, por ex.: os princípios individuais em prol dos
coletivos, já que a sociedade (o conjunto) precisa de maior proteção
jurídica.
Completa PIRES (2007, p. 3):
[...] manifesto no entender que o Princípio da Proporcionalidade é
manifestado quando colocamos em ponderação, dois princípios ou normas
e suprimimos uma em relação a outra, no intuito de assegurar o
cumprimento e o respeito aos direitos fundamentais expressos na
Constituição Federal. Já, para o princípio da Razoabilidade fica-me
entendido a sua convocação quando as normas e atitudes fugirem do senso
comum.
Para tentar diferenciar os dois princípios ÁVILA (2005, p. 85) sustenta:
A razoabilidade somente é aplicável em situações em que se manifeste um
conflito entre o geral e o individual, entre a norma e a realidade por ela
regulada, e entre um critério e uma medida. Sua aplicabilidade é
condicionada à existência de elementos específicos (geral e individual,
norma e realidade, critério e medida). A proporcionalidade somente é
aplicável nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um
meio e um fim. Sua aplicabilidade está condicionada à existência de
elementos específicos (meio e fim).
Argumenta ÁVILA (2005, p.100) para definir a Razoabilidade:
A razoabilidade estrutura a aplicação de outras normas, princípios e regras,
notadamente das regras. A razoabilidade é usada com vários sentidos.
Fala-se em razoabilidade de uma alegação, razoabilidade de uma
interpretação, razoabilidade de uma restrição, razoabilidade do fim legal,
razoabilidade da função legislativa. Enfim, a razoabilidade é utilizada em
vários contextos e com várias finalidades.
Insiste ainda o autor (ÁVILA, 2005, p. 101):
Relativamente à razoabilidade, dentre tantas acepções, três se destacam.
Primeiro, a razoabilidade é utilizada como diretriz que exige a relação das
normas gerais com as individualidades do caso concreto, quer mostrando
sob qual perspectiva a norma deve ser aplicada, quer indicando em quais
hipóteses o caso individual, em virtude de suas especificidades, deixa de se
enquadrar na norma geral. Segundo, a razoabilidade é empregada como
diretriz que exige uma vinculação das normas jurídicas com o mundo ao
qual elas fazem referência, seja reclamando a existência de um suporte
empírico e adequado a qualquer ato jurídico, seja demandando uma relação
congruente entre a medida adotada e o fim que ela pretende atingir.
Terceiro, a razoabilidade é utilizada como diretriz que exige a relação de
equivalência entre duas grandezas.
52
Já para definir a Proporcionalidade, ÁVILA (2005, p. 115-116) aduz:
O postulado da proporcionalidade não se confunde com a idéia de
proporção em suas mais variadas manifestações. Ele se aplica apenas a
situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos
empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa
proceder aos três exames fundamentais: o da adequação (o meio promove
o fim?), o da necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente
adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do(s)
direito(s) fundamentais afetados?) e o da proporcionalidade em sentido
estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às
desvantagens provocadas pela adoção do meio?).
E completa o autor:
A proporcionalidade constitui-se em um postulado normativo aplicativo,
decorrente do caráter principiai(sic) das normas e da função distributiva do
Direito, cuja aplicação, porém, depende do imbricamento entre bens
jurídicos e da existência de uma relação meio/fim intersubjetivamente
controlável. Se não houver uma relação meio/fim devidamente estruturada,
então - nas palavras de Hartmut Maurer - cai o exame de proporcionalidade,
pela falta de pontos de referência, no vazio.
Expostas todas essas considerações, temos por concluir que os princípios
da Razoabilidade e da Proporcionalidade são mesmo distintos e que é possível
analisar a possibilidade de sua aplicabilidade quando da apreciação do pedido de
Assistência Judiciária, posto que a depender de cada caso, o julgador pode tentar
olhar sob a ótica do “entre a norma e a realidade por ela regulada” e sob a égide do
“meio e fim”.
4 A CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA SOB A ÓTICA DOS
PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE
O objetivo principal do presente estudo é saber se a aplicação dos
princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade pode acabar com os abusos
cometidos pelos cidadãos e magistrados quando do pedido de Assistência Judiciária
Gratuita e sua respectiva análise.
53
4.1 CONSIDERAÇÕES NECESSÁRIAS
Para analisarmos a possibilidade de aplicação dos princípios aqui
tratados, temos que algumas considerações acerca de temas que tem relação com o
benefício da Assistência Judiciária Gratuita devem antes ser feitas.
4.1.1 O que significa ser pobre na acepção jurídica do termo
CRUZ (2003) analisa os vocábulos “necessitado e pobre” sob quatro
aspectos: à luz da Lei 1.060, à luz do código de processo penal, à luz do dicionário
Aurélio e à luz do entendimento jurídico. Acompanharemos a ordem de sua análise
aqui, para discorrer sobre os vocábulos, excluindo o entendimento do dicionário
Aurélio, por não acharmos pertinente.
4.1.1.1 À luz da Lei 1.060
Como já dissemos aqui, o Parágrafo Único do artigo 1º, da LAJ considera
“necessitado para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe
permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do
sustento próprio ou da família.
Assim, temos que a lei não define exatamente até onde vai esse
“prejuízo” e esse “sustento” - se é só em relação aos alimentos, se abrange
educação, lazer, etc.
4.1.1.2 À luz do Código de Processo Penal
54
O §1º do artigo 32, do Código de Processo Penal, dispõe que “considerarse-
á pobre a pessoa que não puder prover às despesas do processo sem privar-se
dos recursos indispensáveis ao próprio sustento e da família”.
Novamente o legislador não define até que ponto vai esse sustento,
apenas adicionando as palavras “recursos indispensáveis”, que ainda assim acaba
sendo uma regra um tanto subjetiva.
4.1.1.3 À luz do entendimento jurídico
PEDRO NUNES (1979, apud. CRUZ, 2003), define juridicamente a
palavra “pobre” ao ensinar que ele é:
[...] todo indivíduo cujos recursos pecuniários não lhe permitem suportar as
despesas de um pleito judicial, para fazer valer um direito seu ou de pessoa
sob sua responsabilidade, sem que se prive de algum dos elementos
indispensáveis de que ordinariamente dispõe para a subsistência própria,
ou da família.
CRUZ (2003) completa o entendimento acima ao argumentar que “pobre
é aquele a quem não basta o que é seu”.
Analisando esses dispositivos legais e entendimentos da doutrina, o que
percebemos é que “necessitado” e “pobre”, juridicamente falando, não tem
significado diferente, sendo expressões sinônimas. Porém, a lei não estabelece
critérios objetivos. A depender da família e do seu padrão de vida, esse “prejuízo”,
esses “recursos indispensáveis” e esse “sustento” poderiam ser bem diferentes.
Para nós, é aí que tomam lugar a Razoabilidade e a Proporcionalidade.
4.1.2 Consideração do Patrimônio e da Renda pelo magistrado para conceder
ou não o benefício da Justiça Gratuita
Nas palavras de PIERRE (2008):
55
O patrimônio daquele que postula a gratuidade, não é parâmetro para se
determinar à condição de necessitado. Entretanto, não é o que se vê na
prática; pois até hoje encontramos casos que vão de encontro ao espírito do
constitucional, como exemplo, onde o requerente do benefício da gratuidade
de justiça possui bens que lhe vieram por herança ou doação, e o mesmo
encontrando-se desempregado ou ganhando um salário mínimo que é
utilizado na sua subsistência; e que diante da posse dos bens lhe sendo
negado o direito à gratuidade de justiça por alguns Magistrados que
entendem que para exercitar tal direito a pessoa não possa ter qualquer tipo
de patrimônio, não sendo isto o que diz a Lei 1.060/50.
Ainda que detentor de bens, se os rendimentos da parte não lhe são
suficientes para arcar com custas e honorários sem prejuízo de sustento, tal
propriedade não é empecilho à concessão da gratuidade. Não é nem um
pouco razoável pretender que a pessoa se desfaça do imóvel que mora
para arcar com os custos do processo. Nem se deve presumir que a
propriedade sobre um imóvel seja sinal exterior de riqueza, apto a afastar o
benefício.
Partilhamos do entendimento acima por acreditarmos que o patrimônio
não pode ser considerado para o deferimento ou indeferimento da Justiça Gratuita,
ou seja, ninguém pode ser obrigado a vender aquilo que possui para custear um
processo judicial. A renda sim, pensamos que deve ser considerada, e, de acordo
com o caso concreto, verificar se o pagamento das custas não vai interferir no
sustento da parte ou sua família.
Para fundamentar nosso entendimento trazemos a ementa da recente
decisão proferida pelo Egrégio Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul (RIO
GRANDE DO SUL, 1995) nos autos da Apelação Cível n.º 70038749123, que teve
como relator o Desembargador Roberto Carvalho Fraga:
APELAÇÃO CIVEL. IMPUGNAÇÃO A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
GRATUITA. 1. A simples existência de patrimônio, especialmente o
imobiliário, não permite inferir que a parte tenha liquidez de
rendimentos. Ademais, não é razoável exigir da parte que se desfaça
dos seus bens a fim de que tenha acesso ao Poder Judiciário. 2. O
impugnante não se desincumbiu do seu ônus de demonstrar que a parte
beneficiária de AJG tem a possibilidade de arcar com as despesas do
processo sem o prejuízo do seu sustento e de sua família. APELAÇÃO
IMPROVIDA. (grifo nosso)
É pertinente dizer que não existe na Constituição ou na lei
infraconstitucional uma renda per capita determinada para a concessão ou não do
benefício da gratuidade. Portanto, não há qualquer requisito objetivo a ser
considerado pelo magistrado para o deferimento ou indeferimento do pedido, que
fica atrelado ao seu livre-convencimento e muitas vezes, profere decisões injustas
por não se ater aos princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade.
56
4.1.3 Natureza Jurídica das Custas Processuais
O Desembargador ROGÉRIO MEDEIROS do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais, no julgamento do Agravo de Instrumento n.°
1.0450.08.005844-6/001, no qual foi Relator, proferiu interessante decisão que
versava sobre a Assistência Judiciária Gratuita. Dentre suas considerações, tratou
de definir a natureza jurídica das custas processuais. Para isso, valeu-se da doutrina
e da lei. Seguiremos seu ensinamento para discorrer sobre o tema, utilizando as
mesmas fontes de pesquisa, até chegarmos à conclusão que buscamos.
Segundo o Código Tributário Nacional (CTN) (BRASIL, 1966) em seu
artigo 3º, tributo: "É toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor
nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e
cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada".
Para ALIOMAR BALEEIRO (1981, p. 63): "O tributo constitui obrigação 'ex
lege'. Não há tributo sem lei que o decrete, definindo-lhe o fato gerador da
obrigação".
O Código Tributário Nacional (BRASIL, 1966) ainda dispõe em seu artigo
5º que “Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”. E em seu
artigo 16 que “Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação
independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.”
No artigo 77 o CTN ainda define as taxas, fazendo um complemento no
Parágrafo Único:
As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos
Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato
gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou
potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte
ou posto à sua disposição.
Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador
idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do
capital das empresas.
Por fim, no artigo 81 o Código dispõe:
A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito
Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é
instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra
valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como
limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel
beneficiado.
57
No que se refere à taxa, BALEEIRO ensina (op. cit., p. 328):
"É sempre uma técnica fiscal de repartição da despesa com um serviço
público especial e mensurável pelo grupo restrito das pessoas que se
aproveitam de tal serviço, ou o provocaram ou o têm ao seu dispor. (...) A
taxa tem, pois, como 'causa' jurídica e fato gerador a prestação efetiva ou
potencial dum serviço específico ao contribuinte, ou a compensação deste à
Fazenda Pública por lhe ter provocado, por ato ou fato seu, despesa
também especial e mensurável".
Analisando os dispositivos acima citados e o entendimento do doutrinador
Baleeiro é possível concluir que a natureza jurídica das custas processuais é
tributária, mais precisamente como sendo uma espécie de taxa, paga ao Poder
Judiciário para obter a prestação dos serviços prestados pelos órgãos a ele
vinculados.
O Desembargador (BRASIL, 2008), após citar as fontes aqui
reproduzidas, sinalizou em seu voto que:
A função legislativa liga-se aos fenômenos de formação do Direito,
enquanto as outras duas, administrativa e jurisdicional, se prendem à fase
de sua realização. Legislar (editar o direito positivo), administrar (aplicar a
lei de ofício) e julgar (aplicar a lei contenciosamente) são três fases da
atividade estatal, que se completam e a esgotam em extensão. O exercício
dessas funções é distribuído pelos órgãos denominados Poder Legislativo,
Poder Executivo e Poder Judiciário. É de notar, porém, que cada um desses
órgãos não exerce, de modo exclusivo, a função que nominalmente lhe
corresponde, e sim tem nela a sua competência principal ou predominante.
Assim, acompanhamos o entendimento do Desembargador de que a
natureza jurídica das custas processuais é tributária. E para nós, a isenção da taxa
(preparo e custas) deverá obedecer aos Princípios da Razoabilidade e da
Proporcionalidade.
4.2 APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA
PROPORCIONALIDADE NA APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITA
A já citada decisão no julgamento do Agravo de Instrumento n.°
1.0450.08.005844-6/001, do Tribunal do Estado de Minas Gerais, na qual foi Relator
o Desembargador ROGÉRIO MEDEIROS, versa sobre a aplicação dos Princípios da
58
Razoabilidade e Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita. Extrai-se do voto do Relator:
[...]À luz da razoabilidade, os atos administrativos, bem como os
jurisdicionais, ganham plena justificação teleológica, concretizam o Direito e
dão-lhe vida, ao realizarem, efetivamente, a proteção e a promoção dos
interesses por ele destacados e garantidos em tese.
Os princípios da razoabilidade e proporcionalidade foram acolhidos pela Lei
Federal nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, dispondo sobre o processo
administrativo no âmbito da Administração Pública federal:
"Art.2º - A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios
da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade,
moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse
público e eficiência.
"Parágrafo único: "Nos processos administrativos serão observados, entre
outros, os critérios de: (...) VI - adequação entre meios e fins, vedada a
imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas
estritamente necessárias ao atendimento do interesse público".
A jurisprudência prestigia o princípio sob comento, na apreciação dos
pedidos de concessão dos benefícios da assistência judiciária:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA.
INDEFERIMENTO. Cabe ao juiz examinar a razoabilidade da concessão da
gratuidade da justiça, considerando os elementos que evidenciem a
condição de necessidade do requerente, se este se faz representar por
advogado particular e não pela Defensoria Pública. Inexistindo
comprovação dos rendimentos do agravante, tampouco de dificuldade
financeira é de ser indeferido o benefício. Seguimento negado. Decisão
liminar" (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento
nº 70022556815, des. Orlando Heemann Júnior, julg. 13.12.2007) [...].
Sem querer desrespeitar o indiscutível saber jurídico do magistrado,
cremos que não foi dada a correta aplicação ao princípio nessa decisão. Isso
porque, conforme vimos ao estudar sobre o Princípio da Razoabilidade e
Proporcionalidade no capítulo 3, nos parece ter havido uma confusão entre os dois
princípios.
É que há três ocasiões para aplicar o Princípio da Razoabilidade, que são
quando houver conflito: a) entre direito geral e individual; b) entre a norma e a
realidade por ela regulada; e c) entre um critério e uma medida – duas grandezas. E
só se fala em análise de meio e de fim na aplicação do Princípio da
Proporcionalidade, quando então, deverão ser observados três critérios: a) o da
adequação (o meio promove o fim?); b) o da necessidade (dentre outros meios
disponíveis para a promoção do fim, há outro menos restritivo dos direitos
fundamentais?); e c) o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens
trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela
59
adoção do meio?). Saliente-se que nesse parágrafo parafraseamos os conceitos de
Ávila já dados por nós quando tratamos dos conceitos desses princípios.
Relembrando isso, podemos verificar que na decisão acima o
Desembargador parece tornar os dois princípios um só, além de estabelecer critérios
diversos dos que deveria ter aplicado. Mais adiante formularemos nossos próprios
critérios, observando os de Ávila.
Vejamos agora outra decisão em que foram observados os Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita. Tal decisão foi proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado de
Sergipe (SERGIPE, 2007) no julgamento da Apelação Cível n. 0643/2006, no qual
foi Relatora a Desembargadora Marilza Maynard Salgado de Carvalho. Extrai-se do
voto da Desembargadora:
[...]No entanto, por entender ser notória a insuficiência de Defensores
Públicos a suprir a demanda populacional por um maior acesso ao
Judiciário, é que entendo aplicável, no presente caso, os princípios
constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, a sopesar os
interesses constitucionais em conflito.
Ao ponderarmos, de um lado, acerca dos princípios do acesso à Justiça,
preconizado no art. 5º, XXXV, e, seu cumprimento com a assistência
jurídica integral e gratuita aos necessitados, prevista no art. 5º, inciso
LXXIV, e, de outro, o cumprimento ao devido processo legal, com sua
abrangência nos princípios do contraditório e da ampla defesa, temos que
não seria razoável privilegiarmos o formalismo, quando se tem como pública
e notória a problemática da ausência de Defensores no Estado,
notadamente na comarca de Poço Verde.[...].
Assim, não há que se falar em desobediência aos limites subjetivos ou
objetivos da coisa julgada, uma vez que a ausência de citação do Estado de
Sergipe restou superada diante da notoriedade da ausência de Defensores
em quantitativo suficiente no Estado de Sergipe, dever do Estado e garantia
constitucional, frise-se, bem como pela ponderação dos princípios
constitucionais em conflito, não sendo razoável e proporcional privilegiar o
formalismo em detrimento do acesso ao Judiciário.[...]
Essa Apelação deu-se em detrimento do não pagamento de honorários
advocatícios por parte do Estado quando não supre a carência de defensores
dativos em lugar de públicos.
Quando falamos de sucumbência e expomos o entendimento de DIDIER
JUNIOR e OLIVEIRA (segundo o qual estar-se-ia violando os princípios da Ampla
Defesa e Contraditório, além do Devido Processo Legal, ao permitir que uma
sentença que dispensou o beneficiário da gratuidade do pagamento das verbas de
sucumbência servisse de título executivo contra o Estado), afirmamos ser possível
60
reivindicar os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade. Explica-se agora,
o porquê.
É que, conforme dito pela Desembargadora no acórdão supra, existem
outros princípios a serem observados: o Acesso à Justiça e a Assistência Jurídica
Integral. Sendo que colocados esses dois princípios em detrimento do Devido
Processo Legal, Contraditório e Ampla Defesa, os primeiros se sobrepõem aos
segundos: os formalismos são menos importantes que o dever do Estado de garantir
o Acesso ao Judiciário àqueles que necessitam de seu auxílio para tal.
Ademais, os honorários devem ser pagos ao advogado que postula em
juízo. Ele depende deles para sobreviver. Ele não é um Defensor Público e se o
Estado não tem Defensoria Pública, não pode se eximir de pagar os serviços
daqueles que cumprem o dever que era seu de defender os necessitados, conforme
os ditames da Constituição Federal.
Este é, na verdade, um dos conflitos de normas e mesmo princípios em
que poderiam ser aplicadas a Razoabilidade e a Proporcionalidade. O que a
Desembargadora fez, segundo entendemos, foi atender aos critérios de aplicação
dos dois princípios. Aplicou a Razoabilidade: a) sobrepesando os Princípios e
colocando o Acesso à Justiça acima do Devido Processo Legal, por considerar que
àquele defende o interesse geral, enquanto este, no caso analisado, defendia o
interesse apenas formal; b) analisando a norma e a realidade por ela aplicada, ao
considerar que a realidade do estado de Sergipe, por não ter Defensoria Pública,
não poderia ser regulada por norma regulatória da Defensoria Pública; e c)
colocando duas grandezas lado a lado: o direito aos honorários do advogado e o
direito ao Acesso à Justiça da parte.
Quanto a Proporcionalidade, a relatora analisou: a) a adequação, ao
verificar que o meio de exigir do Estado o pagamento dos honorários do advogado
promoveria não um, mas dois fins: o acesso à justiça e a remuneração de um
trabalhador; b) a necessidade, pois os meios disponíveis para a promoção do fim
Acesso à Justiça eram a parte ter um representante legal gratuitamente e a isenção
de custas, e para a remuneração do procurador, ou se exigia o pagamento do
Estado ou o da parte, sendo a menos restritiva dos direitos fundamentais afetados
exigir do Estado – que deveria ter a Defensoria Pública e era o único culpado se o
fim Acesso à Justiça não fosse obtido; e c) o da proporcionalidade em sentido
estrito, ao ver que as vantagens trazidas pelo fim correspondem as desvantagens
61
provocadas pelo meio adotado, pois o advogado receberia, a parte poderia obter o
Acesso à Justiça e o Estado como responsável por assegurar o segundo direito, não
teria como fazê-lo sem custear o primeiro.
É sabido por nós que há, além da garantia constitucional de Acesso ao
Judiciário (Acesso à Justiça) e do direito aos honorários advocatícios, o direito do
Estado de tributar, a norma infraconstitucional que versa sobre a assistência
judiciária gratuita não exigindo prova de necessidade para a concessão do benefício
e a norma constitucional que exige a prova de necessidade para a concessão de
Assistência Jurídica Gratuita. São vários os atritos entre normas e princípios que
envolvem o tema. É preciso, portanto, buscar de acordo com o caso, a solução mais
adequada e para tal, é importante valer-se o magistrado dos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade.
Elenquemos todos os princípios, direitos e normas que podem estar
envolvidos quando da apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita,
salientando que vários outros podem ainda ser encontrados no mundo jurídico, mas
estes são os que numa singela análise da Constituição Federal, Lei de Assistência
Judiciária Gratuita e Código de Processo Civil encontramos:
a) Princípio do Acesso à Justiça;
b) Direito do Estado de Tributar;
c) Norma Infraconstitucional dispensando prova da necessidade;
d) Norma Constitucional exigindo prova da necessidade;
e) Direito aos honorários advocatícios;
f) Direito à Assistência Judiciária Gratuita;
Os Princípios/Direitos/Normas elencados quase sempre podem entrar em
conflito entre si, e ainda, com alguns fundamentos, objetivos, direitos e garantias
fundamentais, e, direitos sociais da República Federativa do Brasil previstos na
Constituição Federal (BRASIL, 1988), dentre os quais podemos citar:
a) Fundamentos previstos no artigo 1º, da CF: cidadania (inciso II), dignidade da
pessoa humana (inciso III) e valores sociais do trabalho (inciso IV).
b) Objetivos fundamentais previstos no artigo 3º, da CF: construir uma sociedade
livre, JUSTA e SOLIDÁRIA (inciso I) e “erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais” (inciso III).
c) Direitos e Garantias Fundamentais previstas no artigo 5º da CF: igualdade (caput),
propriedade (inciso XXII) e herança (inciso XXX).
62
Assim, é possível perceber a possibilidade, ou melhor, o dever do
magistrado de aplicar o Princípio da Razoabilidade quando aprecia o pedido de
Assistência Judiciária Gratuita (pois sempre haverá conflitos entre direito geral e
individual; entre norma e realidade; e deverá analisar sempre duas grandezas, por
exemplo, Acesso à Justiça e Direito do Estado de tributar). O mesmo se pode
afirmar quanto ao Princípio da Proporcionalidade, pois para uma acertada decisão,
necessariamente o juiz deverá observar os três critérios que levarão à sentença
mais proporcional possível: a) o da adequação (o meio promove o fim?), por
exemplo, “a isenção de custas e honorários advocatícios, ou seja, a Assistência
Judiciária Gratuita promove o fim Acesso à Justiça?”; b) o da necessidade (dentre
outros meios disponíveis para a promoção do fim, há outro menos restritivo dos
direitos fundamentais?), por exemplo, “se o Estado tem o dever de prover a
gratuidade da Justiça, e pode isentar a parte das custas, não é melhor que o faça,
para que ele não tenha que vender sua propriedade para ver-se defendido em um
processo, assegurando-se assim vários princípios?”; e c) o da proporcionalidade em
sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às
desvantagens provocadas pela adoção do meio?), não é mais vantajoso para o País
ver-se livre das desigualdades sociais e da pobreza em vez de pensar apenas em
cobrar um tributo?
Reafirmamos: não é apenas possível a aplicação dos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita, é sim, um dever que o magistrado tem. Nas palavras de NALINI
(2000, p. 18):
Até os mais ortodoxos na formação dogmática positivista não aceitam hoje
que o juiz seja a boca a pronunciar as palavras da lei. É reconhecida a
tarefa integradora que todo aplicador da lei desempenha quando vai
concretizá-la. Se o juiz não se substitui ao legislador, ao menos viu
ampliada a margem para uma interpretação criativa, principalmente quando
a lei deixa de ser expressão necessária que se extrai da natureza das
coisas para ser uma resposta conjuntural, contingente e possível, a uma
série de demandas casuísticas e localizadas temporal e espacialmente.
Já não existe espaço, no Brasil, para o juiz omisso, para o juiz burocrata,
compilador de jurisprudência ou distanciado do consenso jurídico, aquela
idéia palpável do que é justo ou injusto numa sociedade heterogênea e
imersa em iniqüidade.
É preciso que o juiz não se prenda somente a letra “fria” da lei, que muda
todos os dias e não é absoluta. É preciso sensibilidade por parte de um profissional
63
que lida todos os dias não apenas com os direitos, mas com a vida das pessoas.
Parecem-nos tão automáticas algumas decisões sobre a Assistência Judiciária
Gratuita (como as atuais do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que adotou o
entendimento segundo o qual tem direito ao benefício aquele cuja renda não seja
superior a dez salários mínimos), que não podemos nos conformar com a atual
situação. É preciso em primeiro lugar, analisar o caso concreto, pois uma pessoa
pode ter nove filhos e perceber renda de dez salários mínimos não sendo ela
suficiente para o sustento da sua família. Basear-se no comprovante de rendimentos
de uma pessoa? Os magistrados não podem perder de vista que nossa constituição
é chamada cidadã. Concordamos piamente com o que NALINI (2000, p. 22) afirma:
Muita vez não tem o juiz consciência de que também integra a sociedade
massificada e de que o produto do seu trabalho já não é mais do que um
bem de consumo. A sentença é um bem de consumo que deve atender uma
demanda cada vez mais complexa e exigente. Demanda que não se
conforma com posturas clássicas, de arcaísmo que não levou em
consideração as profundas alterações da sociedade neste século.
O operador jurídico afeiçoado às posturas mais arcaicas, fruto daquela
faculdade de Direito que não se renovou, não tem noção destas
transformações e vive sob permanente estado de perplexidade ou apatia.
Não passa de um burocrata, cuja atuação apenas por acaso resolve os
conflitos, mas que não raro os intensifica.[...]o conflito continua a existir e o
juiz mantém a sua consciência em paz, pois se valeu do processo para não
enfrentar a dificuldade de entrar no mérito.
Completa o autor (NALINI, 2000, p. 26):
Não obstante a enorme carga de trabalho que lhe é, de regra, atribuída,
imprescindível que o juiz encontre condições de prosseguir –
sistematicamente – seus estudos, sem deixar de exigir sempre mais de si.
[...] O magistrado integra uma elite que só chegou ao desempenho de uma
função qualificada, considerada expressão da soberania estatal, graças à
exclusão de tantos outros milhões, despossuídos e desprotegidos pelo
sistema. E diferencialmente aquinhoado por este, parece razoável que a
nacionalidade dele exija um plus no desempenho da função, no exercício da
cidadania e na produção intelectual de alternativas de aperfeiçoamento de
sua missão e de toda a sociedade.
Acertada também a opinião de MELO (2004):
O Estado avoca a si o poder de conceder Justiça. Esta mesma justiça cujo
caráter é primordial na sociedade e que, tem por escopo resolver os
conflitos sociais, evitando que cada um faça por si a sua própria justiça.
Talvez por seu caráter de serviço público, assim como educação, saúde e
tantos outros assegurados por nossa Carta Magna e, em verdade, não
devidamente prestado pelo Estado, cria um sentimento de descrédito no
seio da sociedade. [...]
64
Enfim, os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, se
corretamente entendidos e aplicados, podem verdadeiramente eliminar os abusos
cometidos pelos cidadãos e magistrados. Se o Poder Judiciário, por meio de seus
principais representantes – os juízes – tornar-se mais eficaz e equilibrado, as
pessoas acreditarão mais na justiça e não irão querer aproveitar-se dela. As
pessoas se sentem lesadas pelo Poder Público e de tanto verem seus
representantes e os guardadores de seus direitos agirem com irresponsabilidade,
não querem apenas elas pagarem tributos e não ter o retorno esperado. É preciso
que todo o sistema mude.
4.2.1 É possível fixar requisitos objetivos para a concessão da Assistência
Judiciária Gratuita?
Ante o exposto até aqui, torna-se desnecessária a resposta a essa
pergunta, pois não há que se falar em requisitos objetivos quando se deve observar
caso a caso, norma a norma, conflito a conflito. Requisitos objetivos como o de
limitar a renda ou analisar o patrimônio da pessoa para conceder ou não o benefício
só gera mais injustiça e não é o que queremos.
4.3 BONS EXEMPLOS DE JULGAMENTOS QUE ENVOLVEM O BENEFÍCIO
São vários os julgamentos que são exemplos de sensibilidade do
magistrado quando da apreciação do pedido de Assistência Judiciária Gratuita.
Merece destaque o Desembargador Palma Bisson, do Tribunal de Justiça de São
Paulo. Dois julgados seus, já citados aqui, encontram-se anexos ao presente
trabalho de conclusão de curso.
4.4 O DEVER DO ESTADO DE PROVER A JUSTIÇA GRATUITA INDEPENDENTE
DO PAGAMENTO DE CUSTAS
65
No mais das vezes nos perguntamos por que entre tantos serviços
públicos considerados primordiais, os quais são fornecidos pelo Estado
independente do pagamento de custas, à exemplo da saúde e educação, não está o
Acesso ao Poder Judiciário.
DINAMARCO (2001, p. 629-630) argumenta no sentido de que:
O processo custa dinheiro. Não passaria de ingênua utopia a aspiração a
um sistema processual inteiramente solidário e coexistencial, realizado de
modo altruísta por membros da comunidade e sem custos para quem quer
fosse. A realidade é a necessidade de despender recursos financeiros, quer
para o exercício da jurisdição pelo Estado, quer para a defesa dos
interesses das partes. As pessoas que atuam como juízes, auxiliares ou
defensores fazem dessas atividades profissão e devem ser remuneradas.
Os prédios, instalações, equipamento e material consumível, indispensáveis
ao exercício da jurisdição, têm também o seu custo.
Não concordamos com a opinião do doutrinador. Educação e saúde
também custam dinheiro. Professores, material escolar, médicos e remédios são
alguns dos gastos que o Estado tem para prover esses serviços. De igual forma, o
Estado poderia, em nosso entendimento, custear a Justiça. Por óbvio é de se
verificar que a remuneração dos profissionais do Judiciário é bem mais elevada que
a dos professores, por exemplo, o que é um tanto desproporcional (mas isso já nos
levaria a um debate de todo político que não nos convém agora).
Para nós é acertado o entendimento de MELO (2004) sobre o assunto:
[...]o Estado tem o dever de conceder a todos o acesso ao Judiciário sem a
necessidade de antecipação das despesas processuais. Seria absurdo,
para dizer o mínimo, que o ingresso em juízo fosse possível apenas aos
que detêm situação econômica abastada. A função do Estado-Juiz é decidir
os litígios e trazer a paz social nas relações intersubjetivas, logo esta
máxima estaria prejudicada, se a maioria da população pobre não pudesse
defender seus direito(sic).
A luta da população por saúde, educação, trabalho, segurança, dentre
outras, deveria incluir outra reivindicação, qual seja, a de Justiça Gratuita
para todos. A Justiça é monopólio do Estado, logo seu acesso deveria ser
livre e gratuita para aqueles que pleiteasse(sic) tal benefício. Se a
campanha por justiça gratuita prosperar, podemos até sugerir um "slogan":
JUSTIÇA GRATUITA PARA TODOS!
Porém, enquanto isso não for possível, tenhamos em mente apenas que
o Acesso à Justiça não poderá se dar apenas ante a possibilidade econômica da
parte de custear as despesas do processo, sob pena de recairmos em um
66
retrocesso imperdoável e totalmente contrário aos objetivos da Constituição Federal
mais acolhedora dos necessitados de que se teve notícia até hoje no Brasil.
67
5 CONCLUSÃO
O presente trabalho versou sobre a Aplicação dos Princípios da
Razoabilidade e da Proporcionalidade na apreciação do pedido de Assistência
Judiciária Gratuita, fazendo-se uma abordagem jurídico-crítica.
A pesquisa teve início discorrendo-se sobre o Princípio do Acesso à
Justiça, ao se questionar se Acesso à Justiça é sinônimo de Acesso ao Poder
Judiciário e constatar que o segundo está dentro do primeiro, mas não é o bastante
para tornar o acesso efetivo.
Objetivando uma melhor compreensão sobre o tema buscou-se primeiro
estudar os conceitos dados as terminologias Assistência Judiciária Gratuita, Justiça
Gratuita e Assistência Jurídica Gratuita, sendo constatado que a doutrina e
jurisprudência divergem bastante, ora tornando as expressões sinônimas, ora
diferenciando-as com um sentido totalmente contrário ao dado por outro doutrinador.
Adotada a opção de utilizar as expressões Assistência Judiciária Gratuita
e Justiça Gratuita como sinônimas, embora tendo-se constatado que não era o mais
didático a se fazer, buscou-se especificar o objeto e abrangência do benefício,
requisitos e forma legal para o requerer, entre outras peculiaridades.
Após, buscou-se compreender um pouco sobre cada elemento do sistema
normativo, afim de que se identificassem dentro dele os princípios e se pudesse
investigar sobre os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade. De início
verificou-se que ambos são confundidos pela proximidade de conceitos e maneira
de aplicação, mas por fim se pode compreender a correta forma de aplicação dos
princípios considerados os respectivos critérios.
Chegou-se a conclusão de que é possível combater os abusos nos
pedidos, concessões e não concessões da Assistência Judiciária Gratuita por meio
da correta aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade,
garantindo-se o Acesso à Justiça, o direito aos honorários advocatícios e vários
outros direitos fundamentais.
Além disso, vimos que não podem ser observados critérios específicos
para decidir a concessão ou não do benefício da gratuidade, posto que se poderia
assim, como já o é, dar lugar, ainda, a mais injustiças.
68
Por fim, discorreu-se acerca do dever do Estado de prover a Justiça
independente do pagamento de custas, chegando-se a conclusão de que, como
outros serviços públicos, o Acesso ao Poder Judiciário deveria ser prestado a
qualquer um, gratuitamente. Porém, enquanto isso não ocorrer, a melhor forma de
permitir esse acesso é através da Assistência Judiciária Gratuita, que terá melhor
performance no mundo jurídico, se os juízes, ao apreciar o pedido, observarem os
critérios de aplicação dos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade.
Constatada a relevância do tema aqui proposto, temos que o estudo
acerca do mesmo precisa continuar e ser aprofundado, afim de que se chegue o
mais perto possível do efetivo Acesso à Justiça.
69
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