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Texto enviado ao JurisWay em 04/06/2013.
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Abismo entre recalls no Brasil e nos EUA pode ser superado com investimentos
Transparência das empresas também deixa a desejar
Duplo padrão de qualidade e comprometimento das companhias também é alvo de críticas
Na prateleira de supermercado nos EUA, alerta de recall do órgão americano de vigilância sanitária (FDA) Reprodução de internet
RIO - Falta de tudo um pouco para garantir mais segurança aos alimentos que chegam à mesa do consumidor brasileiro. Na avaliação de especialistas brasileiros e estrangeiros, o sistema de fiscalização é falho, os investimentos insuficientes, a informação ao consumidor de como agir não é clara e as empresas, por sua vez, ainda temem a transparência quando há falhas. Não à toa, há um abismo entre os números de recalls de alimentos registrados no Brasil e nos Estados Unidos: dez em uma década aqui e 40 em dois meses lá. E os EUA foram um dos primeiros países do mundo a desenvolver um modelo de recall.
— Deveria haver mais investimentos públicos para o desenvolvimento de uma estrutura para verificar os estabelecimentos manipuladores de alimentos, não só para punir, mas principalmente para educar — afirma o doutor em ciência e tecnologia de alimentos da Embrapa André de Souza Dutra, que ressalta que a Food and Drug Administration (FDA), a agência americana análoga à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é estatal.
Para o especialista, que também coordena o MBA em Gestão da Qualidade e Segurança dos Alimentos da Universidade Veiga de Almeida, a diferença gritante dos números se justifica pela estrutura de controle e vigilância de alimentos, que é muito melhor nos EUA:
— Lá, eles têm laboratórios de altíssima qualidade, que dão suporte não só ao país, mas também ao exterior. Os laboratórios são muito bem equipados e contam com recursos humanos altamente qualificados. No Brasil, cada estado tem um laboratório de referência para dar suporte às vigilâncias do estado e de seus municípios. No Rio, é o Noel Nutels que está literalmente sucateado.
Segundo Dutra, no Brasil não há um número maior de recalls porque não há um sistema de vigilância sanitária que consiga verificar tudo. Há, inclusive, municípios onde o sistema não existe.
De acordo com a doutora em alimentos e nutrição e professora da Unisantos Elizabete Lourenço da Costa, em termos gerais, há um compromisso do empresariado com a qualidade. Mas, como há pouca fiscalização, quem quiser agir de má-fé, consegue.
— Colocar aditivo num presunto para que dure mais é o tipo de falha que tem que ser identificada pela fiscalização. No curto prazo, não faz mal. Mas no longo pode causar um mal à saúde. Além disso, é uma forma de ganhar vantagem frente à concorrência — explica Elizabete.
No entanto, Anna Glayzer, que está à frente do programa de Nutrição, Inocuidade e Segurança Alimentar da Consumers International, entidade independente que reúne 220 organizações em 115 países, afirma que há diferenças em termos de comprometimento das empresas com a entrega de produtos saudáveis.
— Empresas diferentes têm padrões diferentes de comprometimento. Mas também já vimos uma mesma empresa agir de forma diferente em mais de um mercado. Nós pedimos, por exemplo, que os governos determinem padrões e metas de nutrição e que façam com que a política de alimentos seja seguida.
Na avaliação de Carlos Thadeu de Oliveira, diretor do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), um dos problemas no Brasil é, justamente, o fato de a indústria ainda querer localizar os problemas com alimentos como acidentes, algo normal, que pode acontecer em qualquer área. Ele lembra, porém, que as falhas vão muito além da contaminação.
— Há problemas, por exemplo, na rotulagem, informações pouco claras. Nos EUA, casos assim são motivos de recall — afirma Oliveira.
Segundo Anna, a forma como a indústria alimentícia age em termos de qualidade e boas práticas varia tremendamente de país a país. E a falta de uma estrutura sólida em termos de registro de problemas do setor é um risco para o consumidor.
— O recente escândalo da carne de cavalo na Europa, onde os padrões estão entre os mais altos do mundo, mostrou que mesmo os mais poderosos varejistas não têm a menor ideia do que integra sua rede de fornecedores — explica Anna. — Os sistemas de recall são uma parte importante de qualquer sistema nacional de segurança de alimentos bem desenvolvido. A Organização Mundial da Saúde (OMS) está à frente de um programa que tenta ajudar os governos que não têm um sistema bem desenvolvido, chamado Infosan.
Para a professora Elizabete, um sistema de recalls como o americano — altamente integrado e de fácil acesso — pode tornar a notificação mais eficiente para todas as partes.
A FDA deixa claro para o cidadão americano que ele deve entrar em contato com a agência caso identifique qualquer tipo de preocupação com alimentos. No Brasil, o consumidor, quando encontra algo estranho em um alimento, não sabe o que fazer, a quem recorrer: Anvisa, Ministério da Agricultura, Procon, vigilância sanitária estadual ou municipal.
“Destacamos para os consumidores, da forma mais clara e consistente possível, que eles devem entrar em contato com a FDA em qualquer situação de preocupação com alimentos”, explica a agência em entrevista por e-mail ao GLOBO. “Ele deve informar o problema à empresa, assim como ao FDA, por meio do preenchimento do relatório Medwatch.”
Para Anna, ter uma agência que lide especificamente com alimentos é uma boa estratégia na busca por qualidade e boas práticas no setor.
— Os sistemas variam em todo o mundo. As duas coisas mais importantes a se ter são: primeiro, uma agência independente da indústria de alimentos e que opere de forma aberta e transparente. Em segundo lugar, ter um sistema governamental que aja de forma unificada, para que os ministérios de Saúde, Agricultura e Comércio trabalhem juntos.
Recentemente, a Anvisa anunciou um novo modelo de recall de alimentos, que tenta dar conta das especificidades do setor, até então regulado exclusivamente pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). A iniciativa foi bem vista por especialistas, como o professor de Direito do Consumidor Ricardo Morishita, ex-diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça.
— Os produtos estão mais complexos e isso leva à necessidade de uma especialização maior, mais focada, nos produtos que possam trazer risco à saúde. É um processo de amadurecimento