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ATO INFRACIONAL, EXCLUSÃO SOCIAL E ADOLESCÊNCIA
Texto enviado ao JurisWay em 24/04/2014.
ATO INFRACIONAL, EXCLUSÃO SOCIAL E ADOLESCÊNCIA
Por Carlos Eduardo Rios do Amaral
A observância dos ditames de uma Justiça Social, como insculpida no caput do Art. 170 da nossa Constituição Federal vigente, implica dizer, em última análise, que a internação de jovens infratores não poderá ser fruto do acordo entre uma pequena sociedade elitista e o Estado, ambos apáticos quanto à questão da pobreza e suas mazelas.
Todo e qualquer atento Operador do Direito, que milita nas Varas e Juizados da Infância e da Juventude no Brasil, será categórico em afirmar que a maioria esmagadora dos processos dá conta de atos infracionais perpetrados por menores pobres, de famílias necessitadas, que habitam bairros mais periféricos dos Municípios.
Não se vê o filho do rico sentado no banco dos representados. Sequer é arrolado como testemunha o membro daquela família endinheirada. Quando muito, é aquela vítima que passa despercebida. Entre a malhação em sofisticadas academias de ginástica, passando pela badalação em bistrôs e boates, até o aconchego de seu aposento domiciliar – com TV a Cabo, Internet, Playstation e Split – , o mundo das cargas de pedra de crack, do porte de armamento letal de grosso calibre e da troca de tiros entre gangues rivais de bocas-de-fumo não pertencem ao Adolescente abastado.
É óbvio e evidente que a delinquência infanto-juvenil é consequência direta da omissão do Poder Público em promover efetivamente a erradicação da pobreza e da marginalização e em combater realmente às desigualdades sociais. A promoção do bem de todos, como objetivo fundamental de nossa República, não passa de um princípio fundamental adormecido em nossa Constituição Federal, para muitos desanimados, uma piada. Ocasionalmente, em ano eleitoral, pode se ver este postulado desfilando apressadamente por aí, em troca de votos.
Sem nenhuma autoestima, privado de uma sadia e harmônica convivência familiar, submerso sob um lixo cultural na música e na televisão, despertada precocemente sua vida sexual, tornando-se pai ainda na juventude, sem estudo e qualquer perspectiva profissional, não sabendo soletrar sequer o próprio nome, o adolescente das comunidades periféricas será oferecido em sacrifício aos deuses da improbidade e da imoralidade num ritual religioso macabro que consistirá em servir de corpo e alma ao tráfico de entorpecentes e drogas ilícitas até que uma bala prematuramente lhe atinja o crânio. Nesses rituais a jovem oblação raramente passa dos dezoitos anos de vida.
Sob essa perspectiva exsurge a hercúlea e colossal missão da Defensoria Pública em nosso País. O sentimento de um verdadeiro Estado Democrático de Direito deve se reger pelo ideal de que ricos e pobres devem se sentar à mesa das oportunidades e do respeito à dignidade da pessoa humana. Compete à Defensoria Pública, sem titubear, obstruir que os filhos humildes e necessitados desta Pátria, tão cambaleante e distorcida, sejam jogados para debaixo do tapete do desprezo ao ser humano em fase de desenvolvimento. Cabendo ainda a esta Instituição socorrer aqueles que já se encontram aprisionados entre o estofo e o assoalho dos palácios dos velhos e conhecidos prevaricadores e salteadores da República.
A edição da Lei Federal nº 12.594, de 2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, o Sinase, se propõe a advertir aos Municípios que deverão cumprir a sua parte na ressocialização de seus jovens munícipes em situação de conflito com a lei. Justamente aqueles moradores de comunidades abandonadas à própria sorte pelo Gestor Público municipal. À luz de uma desejada política judiciária de desinternação, escudada na salutar execução de Medidas Socioeducativas de Meio Aberto.
O Estatuto da Criança e do Adolescente fez sua parte, desde 1990, já proclamava que em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada. Com boa vontade política e eficiência administrativa, sabe-se bem, sempre haverá outra medida adequada, de meio aberto. A não ser que se oficialize uma política intolerante e segregante semelhante ao Ein Volk, ein Reich, ein Führer, de triste recordação na história recente da humanidade.
Chegará o dia em que os Agentes Públicos locais perceberão que o investimento na formação e educação de crianças e adolescentes será o bem-comum mais precioso de toda a sociedade, inclusive a bem do próprio Ente-Federativo que poderá volver seus programas e ações governamentais para outros setores sociais inovadores, poupando recursos públicos que seriam gastos tão-somente com atendimento socioeducativo em meio aberto. Onde há saber, estudo e oportunidade profissional a violência entra em extinção, apaga-se da vida do povo.
E a ausência da violência como elemento incrustado na vida de jovens e adolescentes, como resultado de uma política estatal verdadeiramente comprometida com a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, mais do que um anseio do Defensor Público, é sua luta.
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Carlos Eduardo Rios do Amaral é Defensor Público do Estado do Espírito Santo, Titular da 2ª Vara da Infância e da Juventude de Vila Velha
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