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Ser pai é ter caráter
Por Carlos Eduardo Rios do Amaral
“Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”. Esta conhecida frase do livro O Pequeno Príncipe, do célebre autor francês Antoine de Saint-Exupéry, sintetiza perfeitamente o que seja a chamada paternidade socioafetiva.
Levando para o indigesto juridiquês, a paternidade socioafetiva seria aquela situação de fato onde a criança é e sempre foi tratada por alguém como filho e este reconhece naquele a figura do pai. O menor é amado, criado, educado e protegido ao longo dos anos por indivíduo que o aceita definitivamente como filho. Mesmo contra a existência de registro civil em sentido contrário ou diante da inexistência desse assento paterno.
Doutrina e jurisprudência brasileiras chancelam a questão da paternidade socioafetiva, declarando por diversas vezes a improcedência de ações negatórias de paternidade fundamentadas unicamente em exames de DNA. Nas preciosas palavras do Ministro Luis Felipe Salomão do STJ (REsp 1059214/RS):
“Em conformidade com os princípios do Código Civil de 2002 e da Constituição Federal de 1988, o êxito em ação negatória de paternidade depende da demonstração, a um só tempo, da inexistência de origem biológica e também de que não tenha sido constituído o estado de filiação, fortemente marcado pelas relações socioafetivas e edificado na convivência familiar. Vale dizer que a pretensão voltada à impugnação da paternidade não pode prosperar, quando fundada apenas na origem genética, mas em aberto conflito com a paternidade socioafetiva”.
Pois bem. Fixado este entendimento, revelo um dos diversos artifícios usados por muitos agressores domésticos quando deferida medidas protetivas de urgência contra os mesmos. Qual seja, ameaçam propor ação negatória de paternidade como vingança de se verem processados nos dispositivos da Lei Maria da Penha. Noutras palavras, condicionam a manutenção da paternidade socioafetiva à mulher sofrer calada dentro de casa, suportar todo tipo de sofrimento, abuso e humilhação em silêncio.
Muitas vezes o índice da maldade humana surpreende mesmo aos mais avisados. E o que a criança tem a ver com a digladiação dos pais? Ou melhor, como o pai-agressor encoraja-se para usar o filho como estratégia para resgatar sua vítima de volta para a masmorra doméstica?
Usar o mero exame de DNA, isoladamente, para apagar toda uma história verdadeira de amor, afeto, brincadeiras e envolvimento com uma criança, ao longo de anos, não causa abalo apenas ao postulado constitucional da dignidade da pessoa humana, como também afronta aos próprios valores éticos do comportamento humano universal.
Ser pai é mais do que uma condição biológica ou de masculinidade. Ser pai é ter caráter.
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Carlos Eduardo Rios do Amaral, Defensor Público do Estado do Espírito Santo, é titular do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa Dos Direitos Individuais e Coletivos da Mulher (NUDEM) da Capital
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