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DA SÚMULA VINCULANTE 56 E DOS NOVOS PARADIGMAS PARA O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO


Autoria:

Elisângela Da Cunha Mendes


SOU FORMADA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E ESTE SEMESTRE ESTAREI CONCLUINDO O CURSO DE DIREITO NA FACULDADE PARAÍSO, NA CIDADE DE JUAZEIRO DO NORTE. SOU POLICIAL CIVIL E CONTINUAREI ATUANDO NA ÁREA POLICIAL, GALGANDO A APROVAÇÃO EM UM CONCURSO PARA DELEGADA DE POLÍCIA CIVIL OU POLÍCIA FEDERAL.

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Texto enviado ao JurisWay em 18/03/2017.

Última edição/atualização em 23/03/2017.



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DA SÚMULA VINCULANTE Nº 56 E DOS NOVOS PARADIGMAS PARA O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO.

 

 

AUTORES: Elisângela da Cunha Mendes

Luiz Enéas Costa Evangelista                   

                    Polivânia Maria e Silva de Oliveira

 

Acadêmicos do Curso de Direito da Faculdade Paraíso do Ceará - FAP

 

1 INTRODUÇÃO

 

            A prestação da segurança pública é dever do Estado. Que por conseguinte, os problemas enfrentados pela ineficiência estrutural do sistema penitenciário são reflexos da inoperância do próprio Estado no exercício de seu direito de punir.

            A pena é consequência natural imposta pelo Estado quando alguém pratica uma infração penal. Quando o agente comete um fato típico, ilícito e culpável, abre-se a possibilidade para o Estado de fazer valer o seu ius puniendi (GRECO, 2007).

            Dessa forma, o objetivo das penas, especificamente, a pena privativamente de liberdade é realizar a segregação do criminoso da sociedade. No entanto, as penas tem a dupla função de punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva. Dessa forma, punindo-o pelo crime cometido, bem como ressocializá-lo.

             No Brasil, adota-se o sistema progressivo de cumprimento de pena. Assim, de acordo com o Código Penal Brasileiro (CPB) e a Lei de Execução Penal (LEP), as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva (regimes: fechado, semiaberto e aberto), com a transferência do apenado de regime mais gravoso para menos gravoso tão logo ele preencha os requisitos legais.

            No entanto, já há bastante tempo, é possível se observar grandes críticas no que concerne à dificuldade de aplicação desse sistema normativo dentro da realidade social e administrativa brasileira, em face da ineficiência estrutural do sistema penitenciário brasileiro, principalmente, no cumprimento da pena em estabelecimento penal adequado quando da progressão do regime prisional do apenado.

Na prática, contudo, é muito comum que não existam colônias agrícolas e industriais e casas de albergado, unidades prisionais previstas na Lei como sendo as adequadas para o cumprimento da pena, respectivamente, nos regimes semiaberto e aberto. Desse modo, confrontando diretamente com o enunciado da Súmula Vinculante nº 56 do Supremo Tribunal Federal (STF), que assegura que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso.

            Destarte, o presente projeto de pesquisa tem como objetivo geral, analisar a aplicabilidade da Súmula Vinculante nº 56, tendo em vista a ineficiência estrutural do sistema penitenciário brasileiro, concernente à progressão do regime prisional adequado para o apenado.

            Com o surgimento da Súmula Vinculante nº 56, estabelece um novo instrumento jurisprudencial e de observância cogente capaz de amenizar injustiças inerentes da própria prática estrutural do sistema prisional.

            Verificada a não existência de estabelecimento penal adequado para o cumprimento da pena, o STF decidiu que os juízes da execução penal, no caso concreto, possuem competência para qualificar se tais estabelecimentos onde os presos do regime semiaberto e aberto ficam podem ser enquadrados como "estabelecimento similar" ou "estabelecimento adequado", (RE 641.320/RS).

             Assim, os presos do regime semiaberto podem ficar em outra unidade prisional que não seja colônia agrícola ou industrial, desde que se trate de estabelecimento similar (adequado às características do semiaberto).

            Outrossim, os presos do regime aberto podem cumprir pena em outra unidade prisional que não seja casa de albergado, desde que se trate de um estabelecimento adequado. No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado.

            Então, constatada a ausência de estabelecimento penal adequado para o cumprimento da pena e não havendo, também, estabelecimento similar ou estabelecimento adequado, ou seja,  (com características apropriadas para os regimes: semiaberto e aberto), nessa hipótese, aplica-se os parâmetros fixados no RE 641.320/RS.

            O objetivo das medidas acima é o de que surjam novas vagas nos regimes semiaberto e aberto. As vagas nesses regimes não são inexistentes, são insuficientes. Assim, de um modo geral, a falta de vagas decorre do fato de que já há um sentenciado ocupando o lugar.

            Dessa forma, o STF determinou, como alternativa para resolver o problema, antecipar a saída de sentenciados que já estão no regime semiaberto ou aberto, abrindo vaga para aquele que acaba de progredir.

 

1 DA PENA

1.1 Conceito de pena      

           

            A aplicação das penas em sua concepção inicial, era feita com a natureza aflitiva, onde os corpos das pessoas que praticavam os delitos penais eram os responsáveis pelo mal praticado. Com isso, existiam todos os tipos de penas, como por exemplo, a tortura, o açoite, o esquartejamento, etc.

            No entanto, com o decorrer dos tempos, passou-se a defender a primazia da dignidade da pessoa humana, impondo limites na aplicação  das penas pelo Estado. Assim, hodiernamente, as penas estão divididas em três modalidades diferentes, como é o caso das privativas de liberdade, restritivas de direito e a multa, ou seja, um grande avanço na história das penas, demonstrando-se uma visão bem mais humanista das penas.   

            Capez (2013, p. 385), em síntese doutrinária, conceitua pena em:

 

Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade.

 

            Nucci (2009) conceitua pena como sendo a sanção imposta pelo Estado, através da ação penal, ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e a prevenção a novos crimes.

            O tipo de sanção penal adotado no sistema penitenciário brasileiro, comporta duas espécies: a Pena e a Medida de Segurança. No caso do nosso trabalho, devido ao direcionamento da pesquisa, importará trabalhar sobre a primeira espécie, qual seja, a Pena. Em outro momento oportuno, abordaremos sobre as medidas de segurança.

 

1.1.2 Finalidades da pena

            A pena imposta aos condenados, não apresenta apenas um caráter punitivo, ou seja, não tem apenas a finalidade de punir, mas também de prevenir a prática de novos delitos. A doutrina para facilitar o estudo sobre as finalidades da pena, costuma dividir em três teorias explicativas, vejamos.

            a) Teoria absoluta ou da retribuição: a finalidade da pena é punir o autor  de uma infração penal. A pena é a retribuição do mal injusto, praticado pelo criminoso, pelo mal justo previsto no ordenamento jurídico (punitur quia peccatum est).

            b) Teoria relativa, finalista, utilitária ou da prevenção: a pena tem um fim prático e imediato de prevenção geral ou especial do crime (punitur ne peccetur). A prevenção é especial porque a pena objetiva a readaptação e a segregação sociais do criminoso como meios de impedi-los de voltar a delinquir. A prevenção geral é representada pela intimidação dirigida ao ambiente social (as pessoas não delinquem porque têm medo de receber a punição).

            c) Teoria mista, eclética, intermediária ou conciliatória: a pena tem a dupla função punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva (punitur quia peccatum est et ne peccetur). É o modelo adotado pelo vigente ordenamento jurídico penal brasileiro.

 

1.1.3 Características da pena

            Antes da aplicação da sanção penal, deverão ser observados os princípios e garantias penais fundamentais expressamente descritos na nossa legislação vigente. Trata-se de um modelo normativo de direito, que obedece a estrita legalidade, típico do Estado Democrático de Direito, voltado a minimizar a violência e maximizar a liberdade, impondo limites à função punitiva do Estado (NUCCI, 2009).

            Então, vejamos:

            Legalidade: entende-se por esse princípio que a pena deve estar prevista em lei vigente, assim, não se admitindo que seja cominada em regulamento ou ato normativo infralegal (CPB, art. 1º, e CF,art. 5º, XXXIX).

            Anterioridade: para ser legitimamente tipificada a infração penal, a lei já deve estar em vigor na época em que for praticada (CPB, art. 1º, e CF, art. 5º, XXXIX).

            Personalidade: a pena não pode passar da pessoa do condenado, não podendo outra pessoa pagar por delitos penais de outra (CF, art. 5º, XLV).

            Individualidade: a imposição e o cumprimento da penalidade aplicada, deverão ser individualizados de acordo com a culpabilidade e o mérito do sentenciado (CF, art. 5º, XLVI).

            Proporcionalidade: a pena deve ser proporcional ao crime praticado pelo apenado (CF, art. 5º, XLVI e XLVII).

            Humanidade: em regra, não são admitidas as penas de morte (apenas em caso de guerra declarada), perpétuas (CPB, art. 75), de trabalhos forçados, de banimento e cruéis (CF, art. 5º, XLVII). É o modelo adotado pelo nosso ordenamento jurídico penal. Este princípio e garantia constitucional vêm sendo muito difundida modernamente, em face da própria evolução do sistema penitenciário e também amparados pela convenção internacional de direitos humanos que promove uma visão mais humanistas das penas.

 

1.1.4 Espécies de pena

            As penas são divididas em três espécies, que são a privativa de liberdade, a restritiva de direitos e a de multa. Nesse aspecto, temos que tais espécies foram definidas expressamente por meio do art. 32 do CPB.

            Assim, as penas privativas de liberdade é prevista para os crimes nos quais cominem sanções de reclusão ou detenção. Com isso, a aplicação de uma pena privativa de liberdade pode ocorrer tanto no crime, como também nas contravenções penais, já que há previsão legal no qual determina para esta, os casos da prisão simples.

            Já em relação às penas restritivas de direitos, podemos aduzir que de acordo com a nova redação imposta pela Lei 9.714/98, o art. 43 do Código Penal Brasileiro (CPB), passaram a prever cinco modalidades de penas restritivas de direitos, quais sejam: a prestação pecuniária; a perda de bens e valores; a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; a interdição temporária de alguns dos direitos da pessoa; e por fim, a limitação de fim de semana.

            A multa é outra espécie de pena e geralmente é aplicada devido a sua natureza pecuniária, onde é feito o cálculo com base em dias-multa, que possui o mínimo em 10 (dez) dias multas e o seu máximo em 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, conforme preceitua o art. 49 do CPB.

            Após essa breve explanação sobre as espécies de pena, passaremos a analisar mais profundamente sobre as penas privativas de liberdade, que é a que se direciona de forma mais específica para o nosso trabalho.

 

2 DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

2.1 Reclusão e detenção

            As penas privativas de liberdade têm sua previsão legal no art. 33 do CPB. Vejamos tal dispositivo:

Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º - Considera-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. (Incluído pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

 

            As penas privativas de liberdade são aquelas no qual retira do preso o seu direito à locomoção, na medida em que, ele vai cumprir a pena em um determinado local por um período de tempo. Então, dentro do CPB é adotado dois tipos de penas privativas de liberdade, que são as de reclusão e as de detenção. Nesse aspecto, podemos demonstrar ter as penas privativas de liberdade o seu preceito secundário previsto na norma penal.

            As penas de reclusão e detenção possuem algumas distinções, tais como no aspecto do cumprimento de pena, pois nas penas de reclusão o regime pode ser o fechado, o semiaberto ou o aberto. Já nas penas de detenção os regimes são o semiaberto e o aberto, podendo ir para o fechado apenas em casos de necessidade.

            Desta forma, a aplicação da pena consistirá na fase posterior ao da sentença pronunciada pelo juízo julgador, no qual acaba concluindo que o autor realmente praticou todos os elementos do crime.

            Assim, na aplicação da pena o CPB, por meio do seu art. 68 (cálculo da pena), adotou o sistema trifásico de aplicação, onde o primeiro estágio a ser observados, são os critérios circunstanciais devidamente estabelecidos no próprio art. 59, do CPB, como o da aferição da culpabilidade, da conduta social, dos antecedentes, da personalidade do agente, etc. Nestes critérios o juiz vai fixar uma pena-base para que só assim possa prosseguir para o segundo estágio.

            O segundo estágio será aquele onde são verificados se o agente possui alguma circunstância na qual possa atenuar ou agravar a pena. No terceiro e último estágio, o juiz passa para a verificação que aumentam ou então diminuem a própria pena.

            Em relação ao regime inicial de cumprimento de pena, de acordo com o art. 110 da Lei de Execução penal (LEP), o juiz deverá estabelecer na sentença o regime inicial de cumprimento da pena, com observância do art. 33 do CPB, o qual estabelece distinção quanto à pena de reclusão e de detenção.

            A determinação para o regime de cumprimento inicial da pena é estabelecido de acordo com apena na qual foi imposta pelo julgador, depois de feita a fixação da pena. Nesse contexto, o próprio art. 33, § 2º do CPB, estabeleceu devidamente que as penas privativas de liberdade fossem executadas de maneira progressiva.

 

2.2 Regimes penitenciários iniciais da pena de reclusão

            Os regimes penitenciários da pena de reclusão, definem os parâmetros de pena para cada tipo de regime. O regime inicial de cumprimento de pena será o fechado para aquelas pessoas nas quais foram condenadas a uma pena de reclusão superior a oitos anos. Já  o regime semiaberto é destinado aos presos não reincidentes, cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oitos anos. O regime aberto será destinado aos presos condenados não reincidentes, e que a pena aplicada seja igual ou inferior a quatro anos.

 

2.3 Regimes penitenciários iniciais da pena de detenção

            Se a pena for superior a quatro anos, inicia em regime semiaberto. Já se a pena for igual ou inferior a quatro anos, inicia em regime aberto. No entanto, se o  condenado for reincidente, inicia no regime mais gravoso existente, ou seja, no semiaberto.

 

3 DA SÚMULA VINCULANTE Nº 56 E DA SUA APLICABILIDADE

 

3.1 Execução Penal

3.1.2 Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena

            Como vistos acima, de acordo com a Lei (Código Penal Brasileiro - CPB e a Lei nº 7.210/84 - LEP), existem três regimes de cumprimento de pena (fechado, semiaberto e aberto), que obedecem e seguem às regras do art. 33, do CPB e 110 e ss. da LEP, ou seja, de acordo com a pena cominada, serão definidos os regimes iniciais de cumprimento da pena.

            Observa-se que na prática, contudo, é muito comum que não existam colônias agrícolas e industriais e casas de albergado, unidades prisionais previstas na Lei como sendo as adequadas para o cumprimento da pena, respectivamente, nos regimes semiaberto e aberto. Desse modo, confrontando diretamente com o enunciado da Súmula Vinculante nº 56 do Supremo Tribunal Federal (STF), que assegura que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso.

Vejamos o que nos diz a redação da Súmula Vinculante nº 56 - STF:

 

Súmula Vinculante nº 56: a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS. Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/05/2016 (repercussão geral), (Informativo 825).

STF. Plenário. Aprovada em 29/06/2016.   

 

 

3.1.3 Análise da primeira parte do enunciado da Súmula nº 56 - STF

           

            A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso. Ocorre que, no Brasil, adota-se o sistema progressivo de cumprimento de pena. Assim, de acordo com o CPB e a LEP, as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, com a transferência do apenado de regime mais gravoso para menos gravoso tão logo ele preencha os requisitos legais.

            Ressalva-se, no entanto, que já há bastante tempo, é possível se observar grandes críticas no que concerne à dificuldade de aplicação desse sistema normativo dentro da realidade social e administrativa brasileira, em face da ineficiência estrutural do sistema penitenciário brasileiro, principalmente, no cumprimento da pena em estabelecimento penal adequado quando da progressão do regime prisional do apenado.

            Desse modo, os presos dos referidos regimes estão sendo mantidos nos mesmos estabelecimentos que os presos em regime fechado e provisórios. Essa situação viola duas garantias constitucionais da mais alta relevância:

            a) a individualização da pena (art. 5º XLVI, CF) e;

            b) a legalidade ( art. 5º XXXIX, CF).

             A manutenção do condenado em regime mais gravoso do que é devido caracteriza-se como "excesso de execução", havendo, no caso, violação ao direito do apenado. Veja a explicação de Cavalcante (2016) sobre o tema:

Vale ressaltar que não é possível "relativizar" esse direito do condenado com base em argumentos ligados à manutenção da segurança pública. A proteção à integridade da pessoa e ao seu patrimônio contra agressões injustas está na raiz da própria ideia de Estado Constitucional. A execução de penas corporais em nome da segurança pública só se justifica se for feita com observância da estrita legalidade. Permitir que o Estado execute a pena de forma excessiva é negar não só o princípio da legalidade, mas a própria dignidade humana dos condenados (art. 1º, III, da CF/88). Por mais grave que seja o crime, a condenação não retira a humanidade da pessoa condenada. Ainda que privados de liberdade e dos direitos políticos, os condenados não se tornam simples objetos de direito (art. 5º, XLIX, da CF/88).

 

3.1.4 Conceito de "estabelecimento similar" e "estabelecimento adequado"

                De acordo com o CPB, ao tratar sobre os regimes semiaberto e aberto, prevê o seguinte:

Art. 33 (...)

§ 1º - Considera-se:

b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

 

            Como facilmente se percebe, há importantes discussões e controversas acerca do que vêm a ser estabelecimento similar e estabelecimento adequado. A Lei de Execuções Penais trata do tema nos artigos 91 a 95, mas também não dar uma definição em que consistem tais estabelecimentos.

            Na prática, existem pouquíssimas colônias agrícolas e industriais no país. Dessa forma, alguns Estados mantêm os presos do regime semiaberto em estabelecimentos similares, ou seja, unidades prisionais diferentes do regime semiaberto, onde os presos possuem um pouco mais de liberdade.

            Outrossim, em muitos Estados não existem casas de albergado e os detentos que estão no regime aberto ficam em unidades diferentes dos demais presos. Então, há discussão se essa prática é válida ou não.

            O STF no RE 641.320/RS, decidiu que os magistrados possuem competência para verificar, no caso concreto, se tais estabelecimentos onde os presos do regime semiaberto e aberto ficam podem ser enquadrados como "estabelecimento similar" ou "estabelecimento adequado".

            Dessa forma, os presos do regime semiaberto podem ficar em outra unidade prisional que não seja colônia agrícola ou industrial, desde que se trate de estabelecimento similar (adequado às características do regime semiaberto).

            Assim, de igual forma, os presos do regime aberto podem cumprir pena em outra unidade prisional que não seja casa de albergado, desde que se trate de um estabelecimento adequado para tal regime.

            Veja como o STF resumiu este entendimento em uma tese:

Os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, §1º, “b” e “c”, do CP). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado. STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Informativo 825).

 

 

                Então, como podemos observar os juízes da execução penal, observando-se e amparando-se em casos concretos, podem qualificar como adequados ou não os estabelecimentos penais destinados aos apenados dos regimes semiaberto e aberto. Porém, ressalva-se que não deverá haver presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado em um alojamento conjunto.

3.1.5 Déficit de vagas no estabelecimento adequado e parâmetros adotados no RE 641.320/RS (parte final da Súmula Vinculante nº 56 - STF)

                O STF, adotou alguns parâmetros ou "saídas" em caso de déficit de vagas no estabelecimento adequado, vejamos:

1) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas;

2) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas;

3) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progrida ao regime aberto.

STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Informativo 825).

           

            Nota-se, de acordo com os parâmetros fixados acima pelo STF, que o objetivo das medidas é o de que surjam novas vagas nos regimes semiaberto e aberto.

            As vagas nos regimes semiaberto e aberto não são inexistentes, são insuficientes. Assim, de um modo geral, a falta de vagas decorre do fato de que já há um sentenciado ocupando o lugar, (CAVALCANTE, 2016)

            Dessa forma, o STF determinou, como alternativa para resolver o problema, antecipar a saída de sentenciados que já estão no regime semiaberto ou aberto, abrindo vaga para aquele que acaba de progredir.

            Veja um exemplo trazido por Cavalcante (2016), de como essas medidas fazem surgir vaga no regime semiaberto:

João estava cumprindo pena no regime fechado e progrediu para o regime semiaberto.

Ocorre que não há vagas na unidade prisional destinada ao regime semiaberto.

João não poderá continuar cumprindo pena no fechado porque haveria excesso de execução.

Nestes casos, o que acontecia normalmente é que João seria colocado em prisão domiciliar. No entanto, o STF afirmou que essa alternativa (prisão domiciliar) não deve ser a primeira opção para o caso.

Diante disso, o STF entendeu que o juiz das execuções penais deverá antecipar a saída de um detento que já estava no regime semiaberto, fazendo com que surja a vaga para João.

Em nosso exemplo, Francisco, que estava cumprindo pena no regime semiaberto, só teria direito de ir para o regime aberto em 2018. No entanto, para dar lugar a João, Francisco receberá o benefício da "saída antecipada" e ficará em liberdade eletronicamente monitorada, ou seja, ficará livre para trabalhar e estudar, recolhendo-se em casa nos dias de folgas, sendo sempre monitorado com tornozeleira eletrônica.

Com isso, surgirá mais uma vaga no regime semiaberto e esta será ocupada por João.

 

 

           

            Com isso faz surgir outra discussão. E se a ausência de vaga for no regime aberto? Ex: O apenado progrediu para o regime aberto, mas não há vagas, o que fazer? Nesse caso, o STF decidiu que se aplica o 3º parâmetro fixado no RE 641.320/RS. Vejamos o exemplo trazido por Cavalcante (2016):

 

Neste caso, o Juiz deverá conceder a um preso que está no regime aberto a possibilidade de cumprir o restante da pena não mais no regime aberto (pena privativa de liberdade), mas sim por meio de pena restritiva de direitos e/ou estudo. Ex: Tiago, que estava no regime aberto, só acabaria de cumprir sua pena em 2018. No entanto, para dar lugar a Pedro, o Juiz oferece a ele a oportunidade de sair do regime aberto e cumprir penas restritivas de direito e/ou estudo. Com isso, surgirá nova vaga no aberto. Assim, se não há estabelecimentos adequados ao regime aberto, a melhor alternativa não é a prisão domiciliar, mas a substituição da pena privativa de liberdade que resta a cumprir por penas restritivas de direito e/ou estudo.

 

 

            Destaca-se que os benefícios devem ser concedidos aos detentos que estão mais próximos de progredir ou de acabar a pena. Vale ressaltar que os apenados que serão beneficiados com a saída antecipada ou com as penas alternativas deverão ser escolhidos com base em critérios isonômicos.

            Assim, tais benefícios deverão ser deferidos aos sentenciados que satisfaçam os requisitos subjetivos (bom comportamento) e que estejam mais próximos de satisfazer o requisito objetivo, ou seja, aqueles que estão mais próximos de progredir ou de encerrar a pena, (Cavalcante, 2016).

            Para tanto, o STF determinou que o CNJ faça um "Cadastro Nacional de Presos", com as informações sobre a execução penal de cada um deles. Isso permitirá verificar os apenados com expectativa de progredir ou de encerrar a pena no menor tempo e, em consequência, organizar a fila de saída com observação da igualdade.

            Por que o STF afirma que a prisão domiciliar não pode ser a primeira opção, devendo-se adotar as medidas acima propostas? Cavalcante (2016), explica que segundo o STF, a prisão domiciliar apresenta vários inconvenientes, e assim às  resumem:

1º) Para ter esse benefício, cabe ao condenado providenciar uma casa, na qual vai ser acolhido. Nem sempre ele tem meios para manter essa residência. Nem sempre tem uma família que o acolha.

2º) O recolhimento domiciliar puro e simples, em tempo integral, gera dificuldades de caráter econômico e social. O sentenciado passa a necessitar de terceiros para satisfazer todas as suas necessidades – comida, vestuário, lazer. De certa forma, há uma transferência da punição para a família, que terá que fazer todas as atividades externas do sentenciado. Surge a necessidade de constante comunicação com os órgãos de execução da pena, para controlar saídas indispensáveis – atendimento médico, manutenção da casa etc.

3º) Existe uma dificuldade grande de fiscalização se o apenado está realmente cumprindo a restrição imposta.

4º) A prisão domiciliar pura e simples não garante a ressocialização porque é extremamente difícil para o apenado conseguir um emprego no qual ele trabalhe apenas em casa.

 

 

 

            Nota-se que o STF em suas justificativas, utiliza-se de argumentos vivenciados na atual realidade pelos condenados e também pelos seus familiares, demonstrando assim, as dificuldades da implementação da prisão domiciliar para os apenados desprovidos de recursos financeiros.   

           

3.1.6 Apelo do STF ao Legislador

            Observa-se que no julgamento do RE 641.320/RS, conforme entendimento de  Cavalcante (2016), o STF adotou a chamada técnica do "apelo ao legislador" solicitando que o Congresso Nacional avalie a possibilidade de promover mudanças na Lei com o objetivo de:

i) reformular a legislação de execução penal, adequando-a à realidade, sem abrir mão de parâmetros rígidos de respeito aos direitos fundamentais;

ii) compatibilizar os estabelecimentos penais à atual realidade;

iii) impedir o contingenciamento do FUNPEN;

iv) facilitar a construção de unidades funcionalmente adequadas – pequenas, capilarizadas;

v) permitir o aproveitamento da mão-de-obra dos presos nas obras de civis em estabelecimentos penais;

vi) limitar o número máximo de presos por habitante, em cada unidade da federação, e revisar a escala penal, especialmente para o tráfico de pequenas quantidades de droga, para permitir o planejamento da gestão da massa carcerária e a destinação dos recursos necessários e suficientes para tanto, sob pena de responsabilidade dos administradores públicos;

vii) fomentar o trabalho e estudo do preso, mediante envolvimento de entidades que recebem recursos públicos, notadamente os serviços sociais autônomos;

viii) destinar as verbas decorrentes da prestação pecuniária para criação de postos de trabalho e estudo no sistema prisional.

               

               

            Conclui-se que na decisão, o STF também adotou a técnica de interpretação conforme a Constituição Federal de 1988 para:

            a) excluir qualquer interpretação que permita o contingenciamento do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), criado pela Lei Complementar 79/94;

            b) estabelecer que a utilização de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) para financiar centrais de monitoração eletrônica e penas alternativas é compatível com a interpretação do art. 3º da LC 79/94.

3.1.7 Medidas que o STF determinou ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ

            A fim de tentar minimizar os problemas acima expostos e conseguir implementar as teses que foram definidas, o STF determinou que o CNJ apresente:

            i) projeto de estruturação do Cadastro Nacional de Presos, com etapas e prazos de implementação, devendo o banco de dados conter informações suficientes para identificar os mais próximos da progressão ou extinção da pena;

            ii) relatório sobre a implantação das centrais de monitoração e penas alternativas, acompanhado, se for o caso, de projeto de medidas ulteriores para desenvolvimento dessas estruturas;

            iii) projeto para reduzir ou eliminar o tempo de análise de progressões de regime ou outros benefícios que possam levar à liberdade;

            iv) relatório, que deverá avaliar (a) a adoção de estabelecimentos penais alternativos; (b) o fomento à oferta de trabalho e o estudo para os sentenciados; (c) a facilitação da tarefa das unidades da Federação na obtenção e acompanhamento dos financiamentos com recursos do FUNPEN; (d) a adoção de melhorias da administração judiciária ligada à execução penal.

            Como é cediço, o tema destaca-se diante de sua atualidade, pela grande relevância em face da ineficiência estrutural do sistema penitenciário brasileiro na prática da execução penal e da necessidade da aplicabilidade da Súmula Vinculante nº 56 como um instrumento normativo de defesa e proteção dos direitos e garantias constitucionais de mais alta relevância dos apenados e que poderá ser eficaz no combate às ilegalidades provenientes da ausência de proteção dos órgãos do Poder Administrativo e Judiciário do Estado.

4 REFERÊNCIAS

 

BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos Delitos e das Penas. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

 

BRASIL. Código Penal. Disponívem em: . Acesso em 20 de out. 2016.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em 20 de out. 2016.

 

BRASIL. Súmula Vinculante n° 56. Disponível em: . Acesso em 20 de out. de 2016.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal - Parte Geral. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

 

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Súmula Vinculante nº 56 Comentada. Direito Processual penal - Execução Penal - Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena, out. 2016. Disponível em:< http://www.dizerodireito.com.br/2016/08/sumula-vinculante-56-comentada.html>. Acesso em: 20 de out. de 2016.

 

DIZER O DIREITO: Súmula Vinculante nº 56 Comentada. Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena, out. 2016. Disponível em:< http://www.dizerodireito.com.br/2016/08/sumula-vinculante-56-comentada.html>. Acesso em: 20 de out. de 2016.  

 

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 36. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

GIL, Antonio Carlos. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas, 1999.

GRECCO, Rogério. Curso de Direito Penal - Parte Geral. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

MARCONI, M. A.; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica: ciência e conhecimento científico; métodos científicos; teoria, hipóteses e variáveis; metodologia jurídica. São Paulo: Atlas, 2009.

 

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal - Parte Geral : Parte Especial. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

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