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Resumo:
Abordagem de diversos autores renomados na área, sobre um dos aspectos da soberania do Estado: o Poder de Tributar, suas limitações e até que ponto este pode induzir e interferir no comportamento dos cidadãos tributados.
Texto enviado ao JurisWay em 28/03/2016.
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1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo apresentar uma visão geral e esclarecedora sobre a extrafiscalidade e sua relação com as normas tributárias indutoras no Sistema Tributário Nacional. A extrafiscalidade consiste no uso de instrumentos tributários para se atingir finalidades não somente arrecadatórias, mas incentivadoras ou inibitórias de comportamentos; é mais do que a obtenção de receitas através de tributos, liga-se a valores constitucionais.
Como a extrafiscalidade decorre de normas que buscam induzir ou reprimir comportamentos, tratar-se-á, neste artigo, das normas tributárias indutoras, que têm caráter claramente extrafiscal. Neste sentido, tem-se a regra matriz de incidência tributaria, que é norma jurídico-tributária voltada a orientação de condutas, que traz em seu ânimo todos os elementos necessários à incidência tributária.
Assim, o âmbito funcional da norma tributária indutora associa-se à visão estrutural da norma, sendo deixada de lado a visão de Estado Fiscal e os tributos passam a não ser mais vistos como simples mecanismos de arrecadação de receitas, mas mecanismos de intervenção econômica e de indução de comportamentos.
2. AS NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS – ASPECTOS GERAIS
O Direito Tributário é o conjunto de normas jurídicas, regras, princípios e institutos que cuidam do Poder de Tributar, criando direitos e obrigações tanto para o contribuinte quanto para o Poder Tributante, do qual faz parte a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Este poder de penetrar nos patrimônios dos particulares é um dos aspectos da soberania do Estado. A base desta contribuição é o Tributo, que, de acordo com o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Em suma, o Estado (Poder Tributante) deve intervir de forma direta ou indireta sobre o domínio econômico.
As normas tributárias indutoras encontram-se numa zona um pouco nebulosa desse Direito, pois há uma divergência entre os autores sobre se elas possuem alguma característica que as diferenciem como categoria diversa das outras normas (arrecadatórias ou simplificadoras). Luís Eduardo Schoueri[1] afirma que por normas tributárias indutoras se entende um aspecto das normas tributárias, identificado a partir de uma de suas funções, a indutora.
Neste sentido, segundo Eros Grau[2], a intervenção do Estado no domínio econômico pode se dar por três formas/funções: por absorção, por direção ou por indução (esta é quando o Estado estimula/incentiva determinada conduta). Os incentivos fiscais são os instrumentos hábeis para esta indução econômica.
Assim, conforme bem ressalta Fabiana Pereira[3], não é difícil perceber que a atividade estatal consubstanciadora da tributação indutora é encargo que comporta uma árdua missão de contemplar a estrutura fiscal-econômica-regulatória sob uma perspectiva externa sem, no entanto, deixar-se olvidar das necessidades experimentadas internamente no sistema fiscal. Exatamente em virtude desse cenário, se faz premente não apenas a necessidade de compreensão do contexto global político-fiscal-econômico, mas também a construção da regra conducente a uma determinada atitude por parte da sociedade e dos agentes econômicos do mercado, ou seja, faz-se indispensável a compreensão da norma tributária indutora.
3. EXTRAFISCALIDADE DA NORMA TRIBUTÁRIA INDUTORA
De acordo com Leandro Paulsen[4], diz-se que se trata de um tributo com finalidade extrafiscal quando os efeitos extrafiscais são não apenas uma decorrência secundária da tributação, mas seu efeito principal, deliberadamente pretendido pelo legislador que se utiliza do tributo como instrumento para dissuadir ou incentivar determinadas condutas. Ataliba[5] também diz que consiste a extrafiscalidade no uso de instrumentos tributários para obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados. O conteúdo potencial da extrafiscalidade é extremamente amplo, por quanto a Constituição Federal contempla um número grande de valores e objetivos a que subordina o Estado Brasileiro, como exemplos: arts. 1º, 3º, 170, 193, 194, 196, 201, 205, 215, dentre outros.
Nesse sentido, Paulo de Barros Carvalho[6] completa:
Há tributos que se prestam, admiravelmente, para a introdução de expedientes extrafiscais. Outros, no entanto, inclinam-se mais ao setor da fiscalidade. Não existe, porém, entidade tributária que se possa dizer pura, no sentido de realizar tão-só a fiscalidade, ou, unicamente, a extrafiscalidade. Os dois objetivos convivem, harmônicos, na mesma figura impositiva, sendo apenas lícito verificar que, por vezes, um predomina sobre o outro.
Constituindo a extrafiscalidade no emprego de formulas jurídico-tributárias para a obtenção de metas que prevalecem sobre os fins simplesmente arrecadatórios de recursos monetários, o regime que há de dirigir tal atividade não poderia deixar de ser aquele próprio das exações tributárias. Significa, portanto, que, ao construir suas pretensões extrafiscais, deverá o legislador pautar-se inteiramente dentro dos parâmetros constitucionais [...]. Não tem cabimento aludir-se a regime especial, visto que o instrumento jurídico utilizado é invariavelmente o mesmo, modificando-se tão-somente a finalidade do seu manejo.
Assim, faz-se claro que as normas tributarias indutoras, exatamente por terem essa função de induzir, estão incluída no fenômeno da extrafiscalidade. Schoueri[7], por sua vez, entende as normas tributárias indutoras como espécie do gênero extrafiscalidade. Segundo ele:
O gênero da “extrafiscalidade” inclui todos os casos não vinculados nem à distribuição equitativa da carga tributária, nem à simplificação do sistema tributário. [...]. Inclui, neste sentido, além de normas com função indutora (que seria a extrafiscalidade em sentido estrito), outras que também se movem por razões não fiscais, mas desvinculadas da busca do impulsionamento econômico por parte do Estado.
A extrafiscalidade trata-se, pois, no sentido em que este artigo aborda, sobre as normas tributarias indutoras, de uma atuação governamental de forma indireta, moldando as condutas particulares, reprimindo ou induzindo comportamentos. Mas, de acordo com Marcus Gouvêa[8], há a extrafiscalidade “indireta” e a extrafiscalidade “direta”. A primeira pretende a realização de valores constitucionais mediante o comportamento induzido ou evitado; já na segunda, a consequência pretendida já coincide com o valor constitucional em prestígio. Nada impede, contudo, que um mesmo instituto apresente mais de um efeito extrafiscal.
4. NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS NO DIREITO TRIBUTÁRIO
Para Martha Leão[9], existem, em sentidos equivalentes, as expressões “função distributiva”, “função alocativa” e “função estabilizadora”. Função distributiva seria aquela vinculada à distribuição de renda, retirando mais de uns e aplicando em favor de outros menos favorecidos. A função alocativa ou indutora estaria ligada à noção de que a própria incidência do tributo não é neutra sobre a economia. O reflexo disso é a indução de comportamentos, afinal, a tributação se vincula a comportamentos humanos e a incidência tributária passa a ser um fator a ser considerado na própria decisão do agente econômico. Já a função estabilizadora teria em conta que a política fiscal deve ser formulada objetivando alcançar, ou manter, um elevado nível de emprego, uma razoável estabilidade de preços, o equilíbrio na balança de pagamentos e uma taxa aceitável de crescimento econômico. Essas funções não são isoladas, coexistem praticamente em todas as normas tributárias. Isso explica o porque de existir tanta dificuldade no reconhecimento das normas tributárias indutoras.
Em contrapartida, vários autores entendem as normas tributárias indutoras como ainda submetidas às amarras do Direito Tributário, esse é o caso de Geraldo Ataliba, que afirma (1990, p. 156-157 apud SCHOUERI, 2005, p. 225-226): “Não pode a extrafiscalidade servir de inovação mágica que arrede o conjunto de restrições que – em nome da organização estatal, moralidade política e direitos individuais – constitui o regime jurídico tributário. Entender de outra forma seria franquear perigosamente ao legislador ordinário as portas a um arbítrio ilimitado, atentatório do nosso regime constitucional. É, aliás, comum a invocação de pretextos tais como a necessidade de intervenção sobre o Domínio Econômico, para tentar validar exações diversas de que são exemplos os empréstimos compulsórios – ao arrepio das instâncias inescusáveis do regime constitucional”.
Por fim, como bem considera Fabiana Pereira[10], pode-se entender que o modelo de gestão estatal adotado modernamente revela que, por vezes, a atuação do governo é muito mais eficiente se se der de maneira indireta e não impositiva. E, neste sentido, lançar mão do mecanismo da extrafiscalidade acaba por ser um excelente meio de indução de comportamento econômico social.
5. CONCLUSÃO
Faz-se claro, após a exposição deste artigo, que a extrafiscalidade é característica inerente às normas tributarias com efeitos indutores. É possível verificar que a norma que veicula uma tributação indutora de comportamento transmite uma certa “mensagem” ao contribuinte, que é a de que se ele agir conforme a intenção do Estado, ele será beneficiado. Dessa forma, pode-se verificar que esta mensagem está presente no Sistema Tributário Nacional, previsto na Constituição Federal, principalmente no artigo 146 e seus incisos.
A norma tributária indutora, por causa de sua natureza dispositiva, apresenta várias conseqüências à hipótese – o contribuinte pode agir ou não de acordo com os interesses do Estado, desde que escolha uma via das que estão disponíveis.
Além disso, há dispositivos constitucionais que autorizam de modo claro a utilização extrafiscal de tributos, como: na outorga de competência relativa à contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE), visto que resta evidente que o intuito, através da tributação, é de viabilizar políticas econômicas ou influenciá-las no sentido da obtenção de efeitos econômicos desejados; na previsão de benefícios fiscais de incentivo regional (artigo 151, inciso I); na determinação de estímulo ao cooperativismo (artigos 146, III, “c” e 174, § 2º); na previsão de que os impostos IPTU e ITR sejam usados de modo a induzir o cumprimento da função social da propriedade (artigos 170, III e 182, § 4º, II); dentre outros.
Por fim, em suma, tem-se esclarecido que o controle da validade da tributação extrafiscal, de acordo com Leandro Paulsen[11], envolve a análise da concorrência das competências administrativa e tributária do ente político e a análise da adequação da tributação para influir no sentido pretendido, ou seja, da sua eficácia potencial para dissuadir as atividades indesejadas ou estimulas as atividades ideais/desejadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ATALIBA, Geraldo. IPTU: progressividade. Revista de Direito Público, v. 23, n. 93, 1990.
ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro, 1990. In: SCHOUERI, Luis Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 1ª ed., 2005.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 18ª ed., rev., atual. e ampl., 2007.
GOUVÊA, Marcos de Freitas. A extrafiscalidade no direito tributário e suas classificações. Disponível em:
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 9ª ed., 2004.
LEÃO, Martha Toribio. Critérios para o controle das normas tributárias indutoras: uma análise pautada no princípio da igualdade e na importância dos efeitos. Dissertação – Universidade de São Paulo. São Paulo, 2014.
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 4ª ed., rev., atual. e ampl., 2012.
PEREIRA, Fabiana Augusta de Araújo. Norma tributária indutora. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 11 mar. 2014. Disponível em:
SCHOUERI, Luis Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 1ª ed., 2005.
[1] SCHOUERI, Luis Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 1ª ed., 2005, p. 30.
[2] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 9ª ed., 2004, p. 85.
[3] PEREIRA, Fabiana Augusta de Araújo. Norma tributária indutora. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 11 mar. 2014. Disponível em:
[4] PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 4ª ed., rev., atual. e ampl., 2012, p. 13.
[5] ATALIBA, Geraldo. IPTU: progressividade. Revista de Direito Público, v. 23, n. 93, 1990, p. 233.
[6] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 18ª ed., rev., atual. e ampl., 2007, p. 245 e 246.
[7] SCHOUERI, Luis Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 1ª ed., 2005, p. 32 e 33.
[8] GOUVÊA, Marcos de Freitas. A extrafiscalidade no direito tributário e suas classificações. Disponível em:
[9] LEÃO, Martha Toribio. Critérios para o controle das normas tributárias indutoras: uma análise pautada no princípio da igualdade e na importância dos efeitos. Dissertação – Universidade de São Paulo. São Paulo, 2014. p. 6.
[10] PEREIRA, Fabiana Augusta de Araújo. Norma tributária indutora. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 11 mar. 2014. Disponível em:
[11] PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 4ª ed., rev., atual. e ampl., 2012, p. 15.
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