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INTRODUÇÃO
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O presente artigo tem como objetivo analisar a prescrição penal, e assim demonstrar como o tempo cronológico tem considerável importância no mundo do direito. Seus efeitos jurídicos, a perda e a aquisição dos direitos dependem, muitas vezes do seu transcurso.
No campo penal, é fator de grande relevância, uma vez que impõe ao Estado, a necessidade de observar o seu curso para que dentro dos prazos determinados pela norma jurídica, os conflitos ocasionados pela prática do delito.
Se o Estado, através de seus órgãos, não conseguir em tempo oportuno realizar suas atividade jurídicas, seja para punir, após a ação delituosa ou executar a pena imposta, depois de decisão condenatória final, perderá o direito de fazê-lo em decorrência da prescrição penal.
A prescrição penal – causa impeditiva ou da execução de uma sanção – encontra-se ramificada em duas categorias, quais sejam, a prescrição da pretensão punitiva, caracterizada pela perda, por parte do Estado, do poder-dever de apreciar a causa e infligir a punição cabível, e a prescrição da pretensão executória, que representa a perda, pelo Estado, se seu poder-dever de executar a sanção anteriormente aplicada.
Trata-se de uma limitação ao poder-dever do Estado, ao jus persequendi primeiro e à pretensão execução mais tarde, ditada em atenção aos efeitos tempo, pelo simples transcurso, solve situações jurídicas e lhes empresta caracteres definitivos.
Assim, através da prescrição, o autor de uma infração penal pode ter extinta a sua punibilidade e consequentemente livrar-se de sofrer as sanções previstas pela norma penal.
Cuida-se de forma de extinção da punibilidade com previsão legislativa no art. 107, IV, do Código Penal, juntamente com a decadência e a perempção.
CONCEITO
São muitos os conceitos encontrados na doutrina, assim passa-se a seguir, a transcrição de alguns deles.
Para Aníbal Bruno, “a prescrição no Direito Penal é esta ação extintva da punibilidade que exerce o decurso do tempo, quando inerte o poder público na repressão do crime”.
Magalhães de Noronha diz que “o jus puniendi do Estado extingui-se também pela prescrição. Esta é a perda do direito de punir, pelo decurso do tempo; ou, noutras palavras, o Estado por sua inércia ou inatividade, perde o direito de punir. Não tendo exercido a pretensão punitiva no prazo fixado em lei, desaparece o jus puniedi”.
Basileu Garcia leciona que “a prescrição é a renúncia do Estado a punir a infração, em face do decurso do tempo”.
Já Damásio E. de Jesus prescreve que “prescrição penal é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória durante certo tempo”.
Desse modo, a prescrição pode ser definida como a perda sofrida pelo Estado, pelo não exercício dentro de determinados lapsos temporais; do direito de punir o infrator de um preceito penal.
NATUREZA JURÍDICA
Quanto a natureza jurídica da prescrição, existem controvérsias, pois alguns defendem que as normas que regulam a prescrição são de direito substantivo ou de natureza processual.
Os que sustentam que a prescrição é instituto de direito processual penal, entendem que ela suspende ou impede o desenrolar do processo. É um obstáculo ao início ou prosseguimento da persecução criminal.
Para o que defendem que a prescrição possui natureza penal, esses crêem que ela tem fundamento na essência e no fim da pena, extinguindo o poder de punir do Estado.
Além disso, existe uma teoria eclética que diz que a prescrição possui caracteres materiais e processuais. Onde a prescrição, por um lado, representa a perda do interesse na perseguição e no castigo, porque, com o decurso do tempo, desaparecem as razões que justifiquem a pena. E por outro lado, a prescrição impede o desenrolar do processo.
Assim, entendendo-se que as normas são de natureza processual, a lei nova que amplia o prazo prescricional tem aplicação imediata (art. 2º do Código de Processo Pena). Caso seja de direito substantivo não pode ser aplicada a lei nova mais grave, isso porque deve-se observar o princípio da reserva legal (art. 1º do Código Penal).
Destarte, diante da breve análise das controvérsias, creio que a prescrição é de natureza material, visto que o próprio Código Penal declara que ela é causa de extinção da punibilidade (art. 107, IV, 1ª parte, do CP) e esta pertence ao direito material e não processual. Esta também é a posição dominante na doutrina na doutrina nacional.
FUNDAMENTOS
Apesar da crítica de alguns juristas, como Cesare Beccaria o qual dizia que a fuga subtrai ao castigo, devendo alguns crimes serem imprescritíveis, a existência da prescrição, em nossa legislação penal, encontra amparo nos seguintes argumentos:
a) Não se pode admitir que alguém fique eternamente sob ameaça da ação penal, ou sujeito indefinidamente aos seus efeitos, antes de ser proferida a sentença, ou reconhecida a culpa.
b) A decorrência de longo lapso de tempo, sem que o réu haja praticado outro delito, esta a indicar que por si mesmo ele foi capaz de alcançar o fim que a pena tem em vista, que é o de sua readaptação ou reajustamento.
c) A apuração da verdade real poderia ser dificultada na ação penal prolongada, pois haveria um enfraquecimento e dispersão de provas, de modo que a sentença que viria a ser proferida não mais corresponderia à verdade do fato criminoso.
d) O retardamento da ação poderia ensejar ao inocente a impossibilidade de se defender.
e) A pena aplicada depois de muitos anos após o fato, tornaria a sanção sem finalidade social. O crime seria esquecido, desapareceria o alarde o social, desaparecendo também o interesse em punir.
f) A inércia dos órgãos jurisdicionais da punição levam o réu a adquirir o direito de não ser punido. É um castigo à negligência da autoridade. Isso é demonstrado pela legislação através da prescrição retroativa, punindo a mora na tramitação do processo criminal.
ESPÉCIES DE PRESCRIÇÃO
As espécies de prescrição existentes na legislação penal brasileira são:
1) Prescrição da pretensão punitiva.
É verificada antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos § 1º do art. 110 (CP, art. 109);
2) Prescrição de pretensão executória.
Ocorre após o transito em julgado da sentença condenatória e vem disciplinada no art. 110, “caput”, do Código Penal.
Embora sejam duas as espécies básicas de prescrição, ela pode ocorrer de formas diferentes, senão vejamos:
a) Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita, art. 109. Conforme dito anteriormente, praticada a infração penal surge para o Estado o direito de punir. Para fazer valer esse direito, o Estado através de seus órgãos deve iniciar a ação penal. Ocorre que, essa pretensão punitiva deve ser exercida dentro de certos prazos fixados em lei, e se assim não for, haverá a prescrição.
A prescrição da pretensão punitiva somente ocorre antes do transito em julgado da sentença condenatória, de tal forma que ela pode ser alegada a qualquer momento, antes ou durante a ação penal, de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes.
Além disso, a pretensão punitiva deve ser verificada de acordo com o máximo da pena privativa de liberdade prevista em abstrato para a infração penal, de acordo com as regras do art. 109 do Código Penal, conforme se observa do quadro abaixo:
|
PENA MÁXIMA PRAZO PRESCRICIONAL |
a) inferior a 1 ano 3 anos |
b) de 1 a 2 anos 4 anos |
c) de 2 a 4 anos 8 anos |
d) de 4 a 8 anos 12 anos |
e) de 8 a 12 anos 16 anos |
f) superior a 12 anos 20 anos |
Fonte: Código Penal
Assim, se a ação pena não for iniciada dentro do prazo fixado, será reconhecida a ocorrência da prescrição durante o curso da ação, e o juiz decretará a extinção da punibilidade, e assim, o acusado não é responsabilizado, se nome não é inscrito no rol dos culpados nem é considerado reincidente. Não respondendo pelas custas processuais.
b) Sentença condenatória, § 1º do art. 110, combinado com o art. 109. Nos termos do art. 109, caput, do CP, a prescrição da pretensão punitiva, salvo a exceção do § 1º do art. 110 do mesmo estatuto, é regulada pelo máximo da sanção privativa de liberdade cominada ao crime. Existe porém, uma primeira hipótese, em que, não obstante trata-se de prescrição punitiva, não é pena em abstrato que regula o prazo, mas sim a pena imposta na sentença. É o que prevê o art. 110, § 1º, in verbis:
Art. 110. [...]
§ 1º - A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à denúncia ou queixa.
Ou seja, neste parágrafo está inscrita outra forma de prescrição chamada de intercorrente ou superveniente à sentença condenatória. Trata-se aqui, de espécie de prescrição da pretensão punitiva, visto que também ocorre antes de transitar em julgado a sentença. Embora a sentença tenha sido condenatória, não chegou a ser definitiva, pois lhe cabe recurso, isto é, ainda não passou em julgado para ambas as partes. Por isso, não se trata de prescrição depois de transitar em julgado a sentença final condenatória, mas de prescrição verificada antes do trânsito em julgado. A prescrição subsequente, não se baseia no máximo da pena abstratamente fixado em lei, mas na pena que a sentença condenatória julgou ser merecida pelo réu.
c) Prescrição retroativa. Foi publicado em 06/05/ 2010 a Lei 12.234 que alterou os art. 109 e 110 do Código Penal que para extinguir a prescrição retroativa, mas apenas em relação a etapa da investigação criminal (período entre a data do crime e do recebimento da denúncia). Portanto, ela continua a subsistir em relação à fase da instrução processual (momento entre o recebimento da ação penal e prolação da sentença).
d) Prescrição da pretensão executória, art. 110 do “caput”. Na prescrição executória a condenação já se tornou definitiva tanto para a acusação como para a defesa. Como já é conhecida a pena concreta merecida pelo réu, será ela que servirá para regular o prazo prescricional, e não mais o máximo da pena abstratamente prevista em lei para o crime.
Assim, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o Estado adquire a pretensão executória ou o direito de executar a pena imposta. Porém, seu exercício é limitado pelo tempo. Se a execução da sanção penal não se inicia dentro de certo período, ocorrerá a perda desse direito pela prescrição da pretensão executória.
Nesses casos, dispõe o art. 112 do Código Penal que a prescrição começa a correr:
I) do dia em que passa em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;
II) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.
Na data em que a sentença passar em julgado para a acusação, independentemente da intimação do réu, já se inicia a contagem da prescrição executória, embora dependa ela ainda, do transito em julgado também para a defesa.
Mas é preciso ressaltar que, ao contrário do que ocorre com a prescrição da pretensão punitiva, a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória, subsistirão os efeitos da sentença condenatória, como o lançamento do réu no rol dos culpados, pagamentos de custas processuais e reincidência. Assim, embora tenha desaparecido a pretensão executória ou direito de execução, a sentença pode ser executada no cível para efeito de reparação de danos.
e) Prescrição antecipada: Essa forma de prescrição não possui previsão legal, mas vem sendo admitida por grande parte da doutrina. Nesse caso cita-se o exemplo de Gonçalves (2005, p. 195):
Suponha-se que uma pessoa tenha sido indiciada em inquérito policial por crime de periclitação da vida (art. 132), cuja pena de detenção é de 3 meses a 1 ano. Assim, o crime prescreve, pela pena em abstrato, em 4 anos. O promotor de justiça, entretanto, ao receber o inquérito policial, 3 anos após a consumação do crime, percebe que o acusado é primário e que o crime não se revestiu de especial gravidade, de forma que o juiz ao prolatar a sentença, certamente não aplicará a pena máxima de 1 ano. Dessa forma, considerando que a pena fixada na sentença será inferior a 1 ano, será inevitável, em caso a prescrição retroativa, pois, pela pena aplicada, a prescrição teria ocorrido após 2 anos.
Alguns entendem que essa prescrição não deve ser considerada por não haver previsão lega nesse sentido. Por outro lado, os que a defendem com base na inexistência de um dever de agir por parte do órgão acusador.
Oportuno frisar, que as três primeiras formas pertencem à espécie de prescrição da pretensão punitiva e a última forma refere-se a espécie de prescrição da pretensão executória.
Considerando-se as formas prescricionais existentes, enfatiza-se que a prescrição propriamente dita regula-se pela pena máxima cominada ao deito. As demais, a retroativa, a superveniente e a executória regulam-se pela pena aplicada.
CONCLUSÃO
Por fim, cabe ressaltar que o instituto da prescrição penal é admitido pela maioria dos penalistas e consagrado pela generalidade dos Códigos.
Como visto, a causa principal e primária da prescrição é o tempo, aliado à inércia do Estado, que através de seus órgãos componentes, não exercitou a pretensão punitiva, ou ainda deixou de executar a pena em tempo oportuno.
Como exposto no presente artigo o decurso do tempo possui efeitos relevantes no ordenamento jurídico operando o nascimento, alternação, transmissão ou perda de direitos.
No campo penal, o transcurso do tempo incide sobre a sobre a conveniência política de ser mantida a persecução penal contra o autor de uma infração ou de ser executada a sanção, em face do lapso temporal determinado pela norma.
Além disso, a quantidade de tempo decorrido após o cometimento do delito, ou após a sentença condenatória não executada, que gera a dispersão ou dificuldade de provas, o esquecimento dos fatos, a perda do interesse no castigo ou a inutilidade social da sanção, a desnecessidade de defesa social, a perda do clamor público contra o delito e o deliquente, os perigos de erros e injustiças, a dificuldade de defesa do réu, a consolidação dos fatos, e as vezes, a emenda e transformação psíquica do criminoso.
Tais efeitos, que derivam do tempo, é que induzem o Estado a abdicar e renunciar o jus puniendi.
Por derradeiro, cumpre sinalar que a prescrição somente extingue a pretensão punitiva ou executória, deixando inatingíveis a tipicidade e a antijuricidade do fato. Da mesma forma, ela não exclui o juízo da culpabilidade. Em face dela, o fato subsiste típico e ilícito, de autoria de um sujeito eventualmente culpado. A possibilidade jurídica de aplicação da sanção (a punibilidade), é que se extingue pelo decurso do tempo.
Comentários e Opiniões
1) Laise (29/06/2015 às 20:53:33) ![]() Prezada Cinara, apesar de nesse momento eu não dispor de tempo, pois estou em estudos intensivos, não poderia em gratidão, deixar de comentar com seu texto espetacular dando-lhe meus sinceros PARABÉNS pela maestria na exposição desse complexo tema, o qual dificilmente é explicado por meio de texto de uma maneira que seja possível a compreensão tal como foi através desse seu. PARABÉNS mesmo e obrigada por ter compartilhado seu conhecimento de forma tão útil. Meus sinceros agradecmentos. | |
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