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A CODIFICAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO
Governador do Estado de Minas Gerais utilizou aeronave oficial para buscar filho em festa de reveillon. Saiba um pouco mais acerca do caso à luz dos princípios da legalidade e moralidade.
Texto enviado ao JurisWay em 03/01/2017.
O portal globo.com noticiou que no dia 01 de Janeiro de 2017 o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, utilizou um helicóptero de propriedade do estado para buscar seu filho, após uma festa de réveillon, em um condomínio no lago de Furnas.
O próprio governador, segundo o portal de notícias, utilizou-se das redes sociais para se defender, tendo em vista a repercussão que o fato ganhou. Na nota divulgada ele deixa claro que a utilização do helicóptero é prevista em decreto e não há nada de ilegal na situação.
O caso deixa algumas questões no ar: Havendo decreto regulamentador o ato é legal? E quanto a moralidade?
Pois bem, me proponho a analisar a situação sob duas bases principiológias: a legalidade e a moralidade.
Legalidade
O princípio da legalidade consiste no dever do administrador público de agir conforme a lei e o direito. Significa dizer, ao gestor público é permitido realizar tudo o que a lei prevê. O silêncio da lei deve ser interpretado como uma proibição.
O governador de Minas alega que agiu dentro da legalidade, uma vez que existe um decreto que autoriza a utilização das aeronaves oficiais do estado para o transporte do governador e seus familiares.
O decreto a que se refere o governador é o 44028 de 2005. De fato, o referido decreto regulamenta tal utilização e classifica as aeronaves do estado em dois grupos:
- Aeronaves de transporte especial – para atendimento ao governador em deslocamentos de qualquer natureza (art. 3º §1º)
- Aeronaves de transporte geral – para atendimento ao vice-governador e demais autoridades em missão oficial (art. 3º §2º)
Ressalte-se que este decreto foi alterado no ano de 2016 pelo próprio governador Fernando Pimentel. A alteração incluiu o art. 9º-A na referida norma. Tal dispositivo acrescentado suspende por 01 ano (em razão da crise financeira) a utilização das aeronaves oficiais.
O que de relevante existe nessa alteração é que ela alcança apenas as aeronaves de transporte geral, ou seja, aquelas que atuam em missões oficiais. Permaneceu liberada, portanto, a utilização da aeronave para transporte de qualquer natureza do governador.
Outro ponto de destaque no referido decreto é que o seu art. 2º, assim dispõe:
Art. 2º - A utilização das aeronaves oficiais será feita, exclusivamente, no âmbito da administração pública estadual, direta e indireta, para desempenho de atividades próprias dos serviços públicos.
Percebam como são contraditórias as disposições do referido decreto.
Por um lado determina a utilização das aeronaves oficiais apenas em situações atinentes aos serviços públicos e por outro lado libera a utilização pelo governador para transporte de qualquer natureza.
De toda maneira, a aeronave é para utilização do governador e não do governador e sua família. Se assim fosse, deveríamos assumir que a administração pública retrocedeu aos tempos do patrimonialismo, já superado há muito pelo sistema burocrático e pela atual administração gerencial.
Noutro norte, a Constituição Federal traz em seu bojo de maneira implícita o supra-princípio da Supremacia do Interesse Público, norteador da atividade pública, que por si só já retiraria a legitimidade não só da utilização da aeronave, mas do próprio decreto autorizador.
Ademais, o transporte do governador citado na reportagem afronta diretamente o decreto 47101 de 2016 que decreta situação de calamidade financeira no estado.
O art. 1º desse decreto assim dispõe:
Art. 1º – Fica decretada a SITUAÇÃO DE CALAMIDADE FINANCEIRA no âmbito do Estado em razão do crescente déficit financeiro decorrente do histórico crescimento de despesas para as quais as receitas originárias, derivadas e transferidas têm sido insuficientes dado o severo momento econômico mundial e nacional que compromete a capacidade de investimento e o custeio para a manutenção dos serviços públicos.
No referido ato normativo, o Governador deixa claro na exposição dos motivos, que as medidas de contenção dos gastos e as demais referentes à arrecadação ainda não foram capazes de reverte o quadro financeiro.
O que reforça a tese de que despesas não essenciais realizadas violam o decreto de calamidade ainda que tenham outra base legal, pois o estado vive um momento de exceção.
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Moralidade
É fato notório a crise econômico-financeira vivenciada pela União e pelos estados. Sobretudo, o estado de Minas Gerais, que seguindo o exemplo do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, decretou calamidade financeira.
O decreto de calamidade financeira assinado pelo atual governador, na prática, reconhece o caos financeiro do estado e admite as dificuldades para honrar seus compromissos, inclusive frente aos servidores, que amargam o parcelamento de seus vencimentos.
Assim, no enfrentamento à crise vários cortes foram feitos no orçamento e em programas de extrema relevância à população. Contudo, a aeronave de uso irrestrito de qualquer natureza do governador permaneceu intocada pelas limitações.
Já me manifestei aqui no Jusbrasil acerca dos decretos de calamidade financeira publicados por alguns governadores. Expressei que na minha opinião, eles não gozam de um valor jurídico específico, porque não possuem previsão legal.
Na prática o citado decreto visa apenas expor a grave situação do estado e preparar a comunidade e a estrutura administrativa para pesadas medidas de contenção e readequação da máquina pública.
Destarte, qualquer medida que se caracteriza como despesa não voltada às atividades essenciais do estado caracteriza-se como ilegítima, pois viola a moralidade administrativa, lastreada pelo decreto de calamidade.
A título de exemplo, o fato ora noticiado equivaleria à hipótese em que o estado adquire um novo e luxuoso veículo para o gabinete do governador, em um momento em que há decreto de calamidade pública em virtude de enchentes que deixaram milhares desabrigados. O ato em si não é ilegal, mas fere de morte a moralidade administrativa estampada no art. 37 caput da Constituição Federal de 88.
A moralidade se refere à ética, decoro, lealdade, probidade e boa-fé na condução do aparato público. O respeito a estes preceitos é o mínimo que se espera do chefe do executivo ou de qualquer outro agente político.
Considerações Finais
Penso que existe a possibilidade de o Governador sofrer sanções pelo fato noticiado, pois, ainda que haja decreto autorizador, a utilização da aeronave para a finalidade ora em comento, desvirtua a finalidade maior a ser alcançada pelos entes públicos, a satisfação do interesse público.
Se é para enfrentarmos a crise, que todos nós suportemos os seus reflexos, administradores e administrados. Apenar apenas os administrados e servidores com as medidas de contenção subverte os princípios norteadores de um Estado Democrático de Direito.
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