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 Sala dos Doutrinadores - Monografias
Autoria:

João Carlos Oliveira Dos Santos
Especialista em Direito Processual Civil com capacitação para o Ensino no Magistério Superior, especialista em Metodologia do Ensino na Educação Superior, Bacharel em Direito pela Faculdade Estácio do Amapá, Licenciado e Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Amapá. Professor de Sociologia Jurídica e Judiciária, Direito Empresarial e Fundamentos de Direito Empresarial da Faculdade Estácio do Amapá, Professor de Sociologia da Secretaria de Estado da Educação do Amapá

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Monografias Filosofia

ARGUMENTAÇÃO: UM INSTRUMENTO INDISPENSÁVEL NA ELABORAÇÃO DO DISCURSO JURÍDICO

Este estudo aborda a Argumentação como instrumento Indispensável na elaboração do Discurso Jurídico. A escolha do tema deu-se em virtude da falta de aprofundamento dos estudos das técnicas e estratégias de convencimento e persuasão no curso de Direit

Texto enviado ao JurisWay em 14/11/2015.

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INTRODUÇÃO

 

 

A argumentação jurídica vem ganhando destaque nas grades curriculares das faculdades de Direito, por proporcionar ao futuro profissional da área jurídica habilidades e competências para produzirem um discurso jurídico argumentativo.

O presente estudo tem como tema Argumentação Jurídica como instrumento indispensável na elaboração do discurso jurídico.

A escolha do tema deu-se em função das inúmeras críticas feita aos estudantes e advogados por meio de literatura especializada no que concerne à redação de seus discursos sem técnica nenhuma de argumentação jurídica para convencer e persuadir o auditório.

Vale ressaltar que no mundo globalizado os operadores do Direito recorrem cada vez mais aos modelos prontos de pareceres, recursos, petições, entre outras peças jurídicas disponíveis na internet para as mais variadas demandas judiciais. Em alguns casos só substituem o nome do cliente. O reflexo dessa prática é uma peça vestibular meramente narrativa dos fatos, sem a argumentação em prol de sua tese, não despertando no julgador o mínimo interesse em deferir os pedidos feitos na inicial. Diante do exposto indaga-se: qual a função das técnicas argumentativas na elaboração de uma petição inicial?

          A hipótese adotada pelo estudo em tela é a seguinte: sendo a petição inicial o primeiro contato que o juiz tem a respeito do caso concreto é evidente que tal peça deva ser elaborada, de forma a convencer o julgador dos pedidos feitos, nesse sentido, não basta apenas narrar os fatos, torna-se necessário utilizar técnicas de convencimento e persuasão para deixar a petição inicial mais clara e convincente, possibilitando dessa forma influir na decisão do magistrado. Partindo desse pressuposto afirma-se que é indispensável utilização das técnicas argumentativas na elaboração do discurso jurídico.

          O objetivo norteador deste trabalho é mostrar a indispensabilidade da argumentação na elaboração do discurso jurídico com base na sofística e na nova retórica apresentada por ChaimPerelman.

          A relevância do tema fundamenta-se na preocupação em preparar os estudantes e os futuros operadores do Direito para a produção de um discurso jurídico argumentativo, pois saber usar bem as palavras é fundamental para o sucesso na seara jurídica.

          A metodologia aplicada no estudo em comento consiste em uma extensa pesquisa em meio impresso e eletrônico referente ao tema em apreço.

          Finalmente para uma melhor compressão do estudo ele foi dividido didaticamente em quatro capítulos:

O Primeiro capítulo abordará a importância da argumentação jurídica e a sofística de Górgias, Isócrates até Aristóteles.

A argumentação jurídica do século XX é apresentada no segundo capitulo.

No terceiro será analisado os principais recursos lingüísticos empregados na produção do discurso jurídico e, finalmente será feita uma análise argumentativa de uma decisão judicial.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1. A IMPORTÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA

 

 

O homem é um ser, que necessariamente expressa seus sentimentos e sua visão de mundo através da palavra, seja ela oral ou escrita. Então, se comunicar tornou-se uma poderosa ferramenta para a sobrevivência humana, além de um instrumento imprescindível nas relações de poder. As pessoas que detém a habilidade comunicacional terão maiores probabilidades de sucesso, principalmente no campo profissional.

Vive-se a era da globalização na sociedade da informação que, exige cada vez mais, a produção e a disseminação do conhecimento numa rapidez nunca dantes vista pelo homem, afetando diretamente o mundo do trabalho que passou a exigir profissionais preparados e qualificados na arte de interagir com as pessoas.

Saber utilizar a palavra para persuadir e convencer, parece ser o grande desafio do século XXI para os profissionais da área jurídica que tem no uso da palavra a sua principal ferramenta de trabalho.

Preocupado com a formação desse profissional as Faculdades de Direito começaram a introduzir em suas grades curriculares uma disciplina específica voltada para ensinar os futuros operadores do Direito a fazerem um melhor uso da palavra, essa disciplina e denominada de Argumentação Jurídica.

De acordo com Fetzner (2008, p. 15), “os cursos de argumentação jurídica tem no Brasil o objetivo de aprofundar o estudo das técnicas e das estratégias de persuasão à disposição de quem lida com a produção de peças processuais”. È relevante dizer ainda, que o discurso jurídico tem por objetivo, não só persuadir, mas também convencer.

Essa preocupação é importante quando se observa que no mundo globalizado impulsionado pela telemática[1],a produção original do discurso esta cada vez mais difícil de ser encontrado no mundo jurídico, o que encontramos é a reprodução de um discurso pronto, irrefletido e  ineficiente  do ponto de vista argumentativo.

Nesse sentido Fetzner assim se manifestou:

 

É inquestionável o advento da informática e a necessidade crescente de uma produção cada vez mais acelerada na prática de qualquer profissional potencializaram o cenário predominante atual em que a produção (e não a reprodução) de conteúdos e de conhecimento se faz possível e muitas vezes inevitável, sem que haja a preocupação com a utilização consciente da linguagem. Uma das importantes críticas que se costuma fazer aos advogados na pratica forense, alias, é a redação de petições longas, com diversas citações de pertinência duvidosa, que apenas repetem desnecessariamente um mesmo conteúdo acessado pela internet e largamente reproduzido. Não há uma seleção apurada e criteriosa de fontes que estejam a serviço de uma proposta argumentativa. Chega-se a situação absurda de muitos profissionais terem uma coletânea de modelos armazenados em seu computador. (Ibidem, p. 16).

               

Ante o exposto fica clara a indispensabilidade da argumentação jurídica no cotidiano do operador do Direito.

Vale destacar que é preciso cada vez mais a utilização de um processo argumentativo que estimule a reflexão, a criticidade e o emprego da linguagem de forma coesa e articulada ao discurso a ser empregado nas peças processuais. A relevância da argumentação jurídica reside na necessidade de fundamentar as peças processuais escritas.

            Não seria exagero afirmar que os cursos de argumentação jurídica tentam resgatar uma formação retórica mais reflexiva e humanística por parte dos operadores do Direito, tal como ocorreu na Grécia Antiga, onde a retórica ou a arte de persuadir e convencer teve o seu apogeu nos memoráveis debates nas assembléias populares e nos tribunais, protagonizados pelos grandes filósofos denominados de sofistas.

 

1.1  Uma visão filosófica da argumentação: os sofistas

 

Durante a estruturação da democracia ateniense, a Grécia vivenciou um período de grande transformação, ocorrendo à participação popular nas decisões da pólis, sem a necessidade de provar riqueza ou titulo de nobreza, houve também a expansão das fronteiras gregas, o acúmulo de riquezas, a intensificação do comércio, a abertura das fronteiras para o contato com outros povos. A respeito disso, vale ressaltar que:

 

As transformações ocorridas na Grécia Antiga gerou uma necessidade de domínio de conhecimentos gerais para uso retórico, necessidade de domínio da técnica de falar para uso assemblear, entre outros. É nesse período, em que a voz passa a ecoar com maior importância, em que exsurge a necessidade de exercer a cidadania por meio do discurso, em que a técnica oratória define o homem público. (BITTAR, 2007, p. 75)

 

É nesse cenário que surge os primeiros filósofos, os sofistas. Esses pensadores têm um papel relevante para o conhecimento ocidental. São eles que colocam o homem pela primeira vez como centro das atenções, com toda a sua complexidade existencial e suas contrariedades psicológicas, moral, social, política e jurídica.

Nesse sentido o grande serviço dos sofistas foi voltar à filosofia para o estudo do homem, considerando quer como ser individual, quer como ser social (donde o seu interesse pela questão da justiça) alcançar os alicerces da educação sistemática dos jovens gregos. (Bittar, 2007, p. 73, Apud Pereira, 1993, p. 441).

Por serem os sofistas homens dotados de domínio da palavra, forneciam aos jovens gregos a técnica da oratória e da retórica como instrumentos de poder diante da assembléia e dos tribunais. A retórica transformou-se no principal meio para se aprender uma atividade política na Grécia Antiga, ou seja, quem pretendesse ser político teria necessariamente que dominar com maestria a arte de falar em público para poder convencer ou persuadir a sua platéia, caso contrário era considerado inabilitado para a vida pública.

A importância da retórica ensinada pelos sofistas na vida dos atenienses era tanta que Torres Neto, assim relatou:

 

A retórica na vida ateniense foi praticamente o único meio para se empreender uma atividade política (...),no campo jurídico mais ainda. Para agir diante dos tribunais, seja como acusado ou como acusador, era necessário se dirigir em pessoa aos juízes, embora a peça de defesa ou acusação que era exposta oralmente pudesse ter sido escrita por pessoas profissionalmente dedicadas a essa tarefa retórica. Numa cidade como Atenas, o conhecimento e o domínio da retórica não eram um simples adestramento em exercícios ornamentais da linguagem. Era um desiderato, um desejo amplamente aspirado como uma necessidade vital por todos aqueles que tivessem o projeto de vida de exercer a política, fato importante e comum a todos os cidadãos, e não restrito a uns poucos representantes, como ocorre na atualidade chamada democrática. Além disso, naquele tipo de democracia, o povo, formado por seus cidadãos e não apenas pelos juízes que ouviam as argumentações, decidia. Tal decisão se inclinava à proposta que o orador mais eloquente introduzisse. Portanto, um orador hábil era um político poderoso, que podia influenciar não só os conhecedores das leis e dos costumes, mas exercia seu domínio sobre os cidadãos comuns. Colocando de outra forma, era a retórica que, quase exclusivamente, propiciava que um cidadão chegasse a ser, de fato, influente e bem-sucedido. (José Lourenço Torres Neto. O papel dos sofistas no desenvolvimento histórico e retórico da persuasão. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=647>)

            É oportuno frisar que os sofistas foram os primeiros a introduzirem a retórica no campo jurídico e, sobretudo, eles se destacaram por serem pensadores e técnicos do uso da palavra para convencer e persuadir. Tendo como destaque: Górgias e Isócrates.

 

1.1.2 Górgias (484-375 a.C.)

 

Górgias notabilizou-se por discursar para uma Assembléia debatendo com os atenienses sobre a questão de uma aliança entre os leontinos e os atenienses contra Siracusa. Ganhou a admiração de todos os presentes no debate pela habilidade e vigor como se expressava, ficou famoso pela sua eloquência. De acordo com Machado (2010, p. 33),“sabia como ninguém improvisar discursos sobre qualquer assunto, foi mestre de retórica e sofista”.

 E continua a autora afirmando que: para Górgias a retórica é a ciência de falar bem. Seu lema em retórica era: “distinguir minuciosamente as palavras e assim obter a maior eficiência e força de persuasão”.

A essência da retórica de Górgias era a persuasão, seja no sentido “poético”, de encantar os ouvintes, seja no sentido da eloquência que faz compreender o discurso. Esse grande sofista tinha uma preocupação que chegava quase a uma obsessão, estudar os efeitos dos discursos nas emoções e paixões no público. Acreditava no poder da palavra, que podia “acalmar o medo, banir a aflição, produzir alegria ou intensificar a compaixão”, (Ibidem, p.35).

Para Górgias, a ilusão poética, como feitiço, levaria o homem fora da realidade, para os sonhos. A persuasão retórica, por sua vez, levaria à ação, conforme a vontade do orador. Górgias dizia sempre que: “A arte da persuasão ultrapassa todas as outras; ela faz de todas as coisas suas escravas por submissão espontânea, e não por violência”. E continua o mestre da eloquência dizendo que a persuasão retórica é aquela que se dá nos tribunais e nas diversas assembléias populares, sobre o que é justo e injusto.

Górgias foi o primeiro a realizar a separação entre filosofia e retórica, quando:

 

Fez da arte retórica uma disciplina independente de estudo, mas que era parte do raciocínio filosófico. No entanto, ao contrário da filosofia, a retórica gerava crença, e não ensinamento. Para Górgias, o orador deve possuir polymathia, ou seja, conhecimentos diversos, erudição, para que pudesse colocar-se sobre qualquer matéria e vencer qualquer debate. Assim, ele vai dar importância também ao conteúdo do discurso e não só ao estilo. A retórica devia persuadir pela forma e pelo conteúdo. (MACHADO, 2010, p.45)

           

E finaliza a autora afirmando que foi Górgias quem determinou os dois campos fundamentais da retórica antiga, a saber: a prática judiciária e a dialética filosófica. Górgias teve inúmeros discípulos que deram continuidade aos seus ensinamentos retóricos entre eles o que mais se destacou foi Isócrates.

 

1.1.3     Isócrates (436-338 a.C.)

 

Segundo Isócrates, a retórica seria um ramo da filosofia, mas superior a ela, que não produzia nenhum efeito útil. Isócrates foi um professor de eloquência. O curioso e que ele tinha a voz fraca e por ser muito tímido, passou a escrever discursos para serem apresentados por outras pessoas; nem por isso sua fama foi menor. Escrevendo, teve condições de apurar os estudos linguísticos. Seus discursos eram bem equilibrados, usando orações complexas e períodos cuidadosamente colocados. “Sem a ordenação das palavras não poderíamos conviver com os outros” dizia Isócrates. Evitava todo tipo de má combinação fonética entre as sílabas, nesse sentido é esclarecedor o trecho a seguir:

 

A palavra forma o homem, separa-o dos animais, permite a expressão da justiça, promove a cultura e a civilização. A capacidade discursiva é, pois, o sinal mais importante da razão humana. Se para Górgias a palavra significava persuasão, encantamento e orientação para a alma, em Isócrates ela é produtora de prudência ou sabedoria prática (phrónesis). (Ibidem, 2010, p. 50)

           

Para Isócrates a palavra era a chave para o homem desenvolver todo o seu potencial intelectual e sentimental, tanto que seu lema era: “aprender a falar bem é aprender a viver bem”. Isócrates acreditava que o uso retórico da palavra era indispensável para o homem aprender a pensar bem, a agir bem e a escrever bem.

Machado (2010) nos brinda com alguns pensamentos do ilustre professor de eloquência da Grécia Antiga:

         “É pelo logos que educamos os ignorantes e conhecemos os inteligentes”.

         “O emprego verdadeiro, justo e legal da palavra é a imagem de uma alma boa e justa”.

         “Precisamos passar aos outros as mesmas razões de convicção que demos a si próprios. (A primeira pessoa que deve acreditar no diz é você mesmo)”.

            Isócrates se posicionava contrário ao uso da palavra feita pelo logórafo (escritor profissional de discursos), para ele a arte retórica deveria servir a todos, esse posicionamento deixa claro a diferença entre a retórica de Górgias e a de Isócrates:

 

Enquanto Górgias enfatizou a função persuasiva da linguagem para a obtenção do poder político e dessa forma desenvolveu uma retórica com funções basicamente estilísticas. Isócrates viu na retórica um instrumento de educação ético-politica para promover a justiça, exprimir a glória e desenvolver a cultura. (ROHDEN, 1995, p. 514)         

As diferentes visões retóricas entre Górgias e Isócrates serviram de objeto de estudo para o maior de todos os retóricos, Aristóteles.

1.1.4A argumentação em Aristóteles (384-322 a.C)

            Aristóteles nasceu em Estagira, no norte da Grécia em 384 a.C, e morreu na ilha de Euboea em 322 a.C.

            Foi professor do curso de retórica na academia de Platão, onde começou a estudar teoricamente sobre a retórica que era vista na época, como técnica de utilização da palavra. Aristóteles começou a indagar as causas da persuasividade e utilizou as diferentes visões do uso do poder da linguagem para formular a ciência da retórica como uma verdadeira psicologia da informação.

            Nos dizeres de Silva (2007, p. 8) Aristóteles “foi o primeiro filósofo a expor uma teoria da argumentação, na retórica, encarando-a como uma arte que visava descobrir os meios de persuasão possível para os vários argumentos”.

            A autora afirma ainda que o objetivo da retórica aristotélica era obter uma comunicação mais eficaz para o Saber. A retórica tornou-se uma arte de falar de modo a persuadir e a convencer diversos auditórios.

Sendo baseada em critérios dialéticos, a retórica aristotélica torna-se a técnica de argumentação do verossímil, uma vez que as teses colocam-se como discutível no núcleo dos debates públicos.  Qualquer um pode apresentar contra-argumentos à tese do orador, que é forçado a apresentar novos argumentos a fim de manter a credibilidade de sua tese.

Aristóteles escreveu a celebre obra “A Retórica”, composta de três livros, o primeiro analisa e fundamenta os três gêneros retóricos: o deliberativo (que procura persuadir ou dissuadir) o segundo refere-se ao Judiciário(que acusa ou defende) e o terceiro é o epidítico (que elogia ou censura).

No segundo livro Aristóteles trata do plano emocional e sua relação com a recepção do discurso retórico.

Finalmente, no terceiro livro, o mestre da retórica observa o estilo e a composição do discurso retórico, além dos elementos como clareza, correção gramatical e ritmo, o uso da metáfora e as partes que compõem o discurso também se fazem presentes neste livro.

Com esta obra, Aristóteles lança as bases da retórica ocidental. Teoricamente, a evolução da retórica ao longo dos séculos representou muito mais um aperfeiçoamento de reflexão aristotélica sobre o tema, do que a construção verdadeiramente original até a segunda metade do século XX quando o mundo conheceu a obra de Chaim Perelman, intitulada Tratado da Argumentação: a nova retórica.

 

1.2. A argumentação jurídica na visão dos pensadores ocidentais do século xx.

1.2.1. Chaim Perelman(1912 – 1984)   

           

Perelman nasceu na Polônia, mas viveu desde sua adolescência na Bélgica, destacou-se principalmente por sua vocação intelectual consagrada a emancipação do raciocínio jurídico e da lógica do pensamento jurídico das tramas do positivismo que tomou conta das ciências jurídicas.

            Sua principal obra, “Tratado da Argumentação: a nova retórica”, elaborada com a colaboração de sua pesquisadora assistente Lucie Olbrechts-Tyteca, está vinculada a tradição retórica.Ela é uma ruptura com uma concepção da razão e do raciocínio oriunda de Descartes, para quem a evidência era a marca da razão, ou seja, só era racional o que poderia ser demonstrado. Perelman é contrário à visão de Descartes.

            Para se entender melhor a teoria da argumentação de Perelman é necessária que se faça a diferença entre argumentação e demonstração.

            A demonstração é típica de uma lógica formal que defende a adoção, no estudo das ciências sociais e humanas, do mesmo método utilizado nas ciências naturais e exatas, ou seja, limita-se ao exame dos meios de provas demonstrativos, No dizer do professor de Bruxelas:

 

Quando se trata de demonstrar uma proposição, basta indicar mediante quais procedimentos ela pode ser obtida como última expressão de uma sequencia dedutiva, cujos primeiros elementos são fornecidos por quem construiu o sistema axiomático dentro do qual se efetua a demonstração [...] Mas quando se trata de argumentar, de influenciar, por meio do discurso, a intensidade de adesão de um auditório a certas teses, já não é possível menosprezar completamente, considerando-as irrelevantes, as condições psíquicas e sociais sem as quais a argumentação ficaria sem objeto ou sem efeito. Pois toda argumentação visa à adesão dos espíritos e, por isso mesmo, pressupõe a existência de um contato intelectual.(PERELMAN, 2005, p. 16)     

           

O Tratado da Argumentação: a nova retórica coloca em cheque os tradicionais conceitos armazenados ao longo dos anos por uma forte tendência positivista que se abrigou nos meios jurídicos.

 A obra de Perelman causou enorme impacto, pois ela rompe com essa forma de pensamento ao preconizar que o objeto de sua teoria é a argumentação, causando confusão no meio jurídico.

A anarquia da nova retórica provoca o jurista a não pensar os fatos dentro dos ditames da lei, mas a pensar os fatos como ocorrências suscetíveis de valoração, ao lado das normas suscetíveis de valoração, justapostas a provas suscetíveis de valoração (...) que se chegam em argumentos  favoráveis ou contrários aos interesses em jogo em determinada causa, mas que, de qualquer forma, se revelam por meio do discurso e da prática judiciária. (BITTAR, 2007, p. 439)

            Diante do exposto pelos ilustres autores é possível entender que a teoria da argumentação de Perelman versa exclusivamente sobre o estudo das técnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar a adesão ante uma tese proposta, interessa para Perelman somente as técnicas que utilizam a linguagem para persuadir e para convencer.

A nova retórica reduz sua pesquisa exclusivamente aos meios de convencer e persuadir pela argumentação. A argumentação para Perelman é o modo por excelência de gerar convencimento e produzir persuasão mais usual nos meios jurídicos. É pelo discurso que se acessa a consciência do juiz, que se invadem suas perspectivas pessoais, para instalar o gérmen de uma possível decisão favorável a um determinado interesse jurídico. (Ibidem, 2007, p. 440)

            Além disso, destacam ainda os autores em relação à nova retórica perelmaniana:

A retórica em Perelman é um estudo que proporciona conhecimento a cerca dos meios argumentativos e dos auditórios disponíveis. Da adequação entre os instrumentos e expedientes retóricos e o auditório disponível surge à verdadeira sabedoria retórica, que não se confunde com a sabedoria lógico-abstrata de Aristóteles. Para Perelman a retórica pouco tem com abstração e muito tem com o uso do discurso, tem mais ainda relação com o estudo do auditório aos quais se dirigem os diversos gêneros discursivos. (Ibidem, 2007, p. 448)

            Partindo das colocações de Almeida e Bittar é possível distinguir os objetos de estudo da retórica aristotélica, da de Chaim Perelman. O objeto da retórica antiga era, acima de tudo, a arte de falar em público de modo persuasivo, referia-se, pois, ao uso da linguagem falada, do discurso, perante uma multidão reunida na praça pública.

            Perelman intitula sua obra Tratado da Argumentação: a nova retórica, porque ao contrario da retórica aristotélica não se limita a estudar os discursos orais, mais, principalmente a estrutura argumentativa dos discursos escritos, afirmando:

Conquanto seja verdade que a técnica do discurso público difere daquela da argumentação escrita, como nosso cuidado é analisar a argumentação, não podemos limitar-nos ao exame da técnica do discurso oral. Além disso, visto a importância e o papel modernos dos textos impressos, nossas análises se concentrarão, sobretudo neles. (...) deixaremos de lado a mnemotécnica e o estudo da elocução oratória. Tais problemas são da competência dos conservatórios e das escolas de arte dramática; dispensamo-nos de seu exame. (PERELMAN, 2005, p. 6-7)

            A nova retórica Perelmaniana foi à base para os estudos sobre argumentação jurídica no século XX, principalmente no que concerne ao poder de persuasão e convencimento através dos discursos escritos, neste campo do conhecimento, além de Perelman outros autores também se destacaram, entre eles encontram-se J.Habermas e Robert Alexy.

1.2.2 J. Habermas

 

Para Perelman, um Direito que se roga como legítimo só existe se houver na sua aplicação, produção e execução de normas jurídicas um acordo realizado entre os múltiplos atores sociais, acerca dos limites e das consequências das leis. Tal ajuste entre oradores e auditórios só se consuma por meio de um processo argumentativo embasado nas técnicas da retórica.

Além de Perelman, outro pensador introduz a comunicação como instrumento de legitimação do Direito, em intensa oposição ao padrão positivista, é o alemão Jürgen Habermas, filósofo e sociólogo, que nasceu a 18 de junho de 1929, em Düsseldorf, na Alemanha, e ficou conhecido no mundo acadêmico por ser autor da teoria do agir comunicacional que tem como objetivo reconstruir racionalmente os pressupostos implícitos no uso da linguagem.

As idéias de Habermas se assemelham em alguns pontos às de Perelman, distanciando-se, porém, quanto aos aspectos de fundamentos do Direito, pois enquanto o primeiro autor se filia à corrente neokantiana, o segundo flerta com o jusnaturalismo.

Segundo o próprio Habermas citado por Nogueira (2011), “em todos os atos de fala, que são as afirmações, promessas, ordens entre outros, dirigida à compreensão mútua, o falante constrói uma pretensão de validade, quer dizer pretende que o dito por ele seja válido num sentido amplo”. Isso significa dizer que todas as pessoas quando falam esperam que os ouvintes compreendam suas palavras como verdades.

Na visão de Goyard – Fabre (1999, p. 304) Habermas aprofunda sua teoria com o seguinte exemplo: “quando uma convenção ou um contrato são concluídos, o ato que os faz nascer implica o consentimento mútuo das partes, o que supõe uma prática comunicacional, portanto uma intercompreensão.”

Nesse sentido Habermas tematiza a discursividade que todo diálogo pressupõe, até mesmo aquele empregado no cotidiano jurídico. A teoria do agir comunicacional de Habermas torna-se compreensiva, quando passamos a entender as intenções implícitas nos atos de fala.

Nos atos de fala constatadores (afirmar, narrar, referir, explicar, prever, negar, impugnar e etc.), o falante pretende que o seu enunciado (aquilo que é pronunciado) seja verdadeiro. Nos atos de fala reguladores (como as ordens, as exigências, as advertências, as desculpas, as repressões, os conselhos), o que se pretende é que o ordenado, exigido etc. seja correto. Nos atos de fala representativos (revelar, descobrir, admitir, ocultar, despistar, enganar, expressar e etc.), pretende-se que o que se exprime seja sincero.(Clayton Ritnel Nogueira. A teoria discursiva de Jüngen Habermas. Disponível em:  http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1210. Acesso em: 20 de Out. 2012)

                È necessário lembrar que existem inúmeros atos de fala e todos eles fazem parte de uma ação comunicativa, portanto a proposta de Habermas  baseia-se na doutrina das pretensões de validade  implícita  nos atos de fala.

 Segundo Habermas citado por Alexy (2011, p. 113) um jogo de linguagem bem sucedido pressupõe o mutuo conhecimento de quatro pretensões de validade “se pretende a inelegibilidade da expressão, a verdade de seu conteúdo proposicional, a correção ou adequação do seu conteúdo performativo e a veracidade do falante”.

            Essas pretensões quando problematizadas passam a ser denominadas de Discurso, o que significa que o falante tem que utilizar argumentos para justificar seus atos de fala.

            A teoria do agir comunicacional de J. Habermas quando aplicada ao discurso jurídico serviu de base para a teoria da argumentação de Robert Alexy.

 

1.2.3 Alexy

           

Robert Alexy nasceu em Oldenburg na Alemanha em 09 de setembro de 1945, é um dos mais brilhantes jusfilósofo de seu país, recebeu o título de PhD em 1976 com a dissertação Uma teoria da Argumentação Jurídica, o trabalho de Alexy demonstra que a solidez de um Estado Democrático de Direito está ligado diretamente em consensos (acordos) passíveis de uma justificação discursiva segundo regras de argumentação.

            Alexy embasa seus estudos sob o ponto de vista procedimental, de como pode ser o discurso jurídico fundamentado racionalmente, buscando-se a correção de seus enunciados regulativos.

            Com arrimo na teoria do discurso prático racional, Alexy desenvolveu finalmente sua teoria da argumentação jurídica, demonstrando ser necessária a integração entre o discurso prático racional geral e o discurso jurídico. Aponta as formas e regras dos argumentos jurídicos.

            No que dizer respeito às regras do discurso pratico racional geral:

 

As regras que definem o discurso prático racional geral são distintas. Há regras que só regem no discurso pratico e regras que regem outros jogos de linguagem. Há obrigações, proibições e permissões.  Algumas regras exigem um cumprimento estrito e outras contêm exigências que só podem cumprir de forma aproximada. Além disso, há regras que regulam o comportamento no âmbito do discurso pratico e regras que determinam a transição para outras formas de discurso. (ALEXY, 2011, p. 186-7)

           

Alexy elabora o que seria para ele as regras fundamentais das formas de argumentação práticas racionais, a saber:

            (1.1) Nenhum falante pode contradizer-se.

            (1.2) Todo falante só pode afirmar aquilo em que ele mesmo acredita.

            (1.3) Todo falante que aplica um predicado (F) a um objeto (A) deve estar disposto a aplicar (F) também a qualquer objeto igual a (A) em todos os aspectos relevantes.

            (1.4) Diferentes falantes não podem usar a mesma expressão com diferentes significados.

            A primeira regra trata da regra da lógica, que é aplicada também as proposições normativas.  A segunda regra assegura a sinceridade da discussão. A terceira regra fala do uso de expressões pelo falante, e finalmente a última regra de argumentação prática racional proferida por Alexy refere-se ao uso de uma expressão com os mesmos significados por todos os falantes.

            No que diz respeito ao discurso jurídico, tratar-se:

 

De diferentes discussões jurídicas. Podem-se distinguir assim as discussões da Ciência do Direito (da dogmática), as deliberações dos juízes, os debates nos tribunais, o tratamento de questões jurídicas nos órgãos legislativos, em comissões e em comitês, a discussão de questões jurídicas (por exemplo, entre estudantes, entre advogados e entre juristas da administração ou de empresas), bem como a discussão sobre problemas jurídicos nos meios de comunicação em que surjam argumentos jurídicos. (Ibidem, 2011, p. 209)

 

            O discurso jurídico é um discurso especial ligado a práticas sociais de poder e por isso deve ser justificado (fundamentado), para isso o falante deve utilizar uma linguagem própria do mundo jurídico, uma linguagem precisa, formal, que tenha coesão e coerência, sobretudo, com poder de persuasão e convencimento. Tanto faz se o ato comunicativo jurídico sejam no âmbito da oralidade ou da escrita, os aspectos basilares que conduzem o discurso jurídico, são os recursos linguísticos empregados na produção discursiva.

 

 

2. OS PRINCIPAIS RECURSOS LINGUISTICOS EMPREGADOS NA PRODUÇÃO DO DISCURSO JURÍDICO

           

           

A elaboração de uma peça jurídica é um exercício de poder que se manifesta na utilização da palavra escrita através de um texto. O Direito tem como ferramenta principal o uso técnico e dinâmico da palavra, logo os estudantes e os profissionais da área jurídica devem ter uma preocupação a mais com o uso da língua portuguesa.

Para se entender o discurso jurídico e os recursos linguísticos nele utilizado com o propósito de convencer e persuadir, se faz necessário, esclarecer alguns conceitos tais como: discurso, texto e contexto.

 

2.1 O discurso

        

A formação discursiva é segundo Abaurre (2007, p.7) “um conjunto de temas (categorias ordenadas do mundo natural: alegria, medo, vergonha, honra etc.) e de termos (elementos que estabelecem uma relação com o mundo natural: mesa, carro, mulher etc.) que caracterizam uma visão de mundo especifica”.

            Dentro desta linha a autora define discurso como sendo:

 

O uso da língua em um contexto especifico, ou seja, a relação entre os usos da língua  e os fatores extra lingüísticos presentes no momento em que esse uso ocorre. Por isso o discurso é o espaço da materialização das formas ideológicas, sendo por elas determinados. Nesse sentido pode ser visto como uma abstração, por que corresponde à “voz” de um grupo social. (Ibidem, 2007, p. 10)

        

De acordo com Charaudeau (2008, p. 168) discurso é a “utilização, entre os homens, de signos sonoros articulados, para comunicar seus desejos e opiniões, sobre as coisas”.

Maurer (1993, p. 38-9) citado por Brito (2009, p. 2) vamos encontrar a seguinte definição para discurso: “é o conjunto de afirmações que, articuladas através da linguagem, expressam os valores e significados de um grupo social.”

Com base nos conceitos apresentados pode-se concluir que o discurso vem a ser um conjunto de valores e significados expressos oralmente pela fala e na escrita pelo texto.

 

 

2.2 O texto

 

 

Texto é “todo discurso fixado pela escritura”, Charaudeau (2008, p. 466). Para Damião (2007, p.7) o termo texto é proveniente de textus-us, vinculado ao verbo latino texcere (texto-is-texui-textum), com o sentido de tecer, entrelaçar, lembrando, por isso, o trabalho do tecelão em tecer os fios para obter uma obra prima harmônica.

Já vimos que o discurso é o meio que o homem usa para expor seus desejos e opiniões, bem como a ideologia de seu grupo, em sentido estrito pode-se entender texto como uma mensagem escrita (inclui a leitura), expressão articulada por meio de palavras. O texto é o espaço de materialização do discurso. Trata-se sempre de uma manifestação individual, do modo como o sujeito escolhe e estabelece os elementos de expressão de que dispõe para transmitir o seu discurso. Esses elementos ou informações são denominados de contexto.

 

2.3 O contexto

        

Todo texto faz referência a circunstâncias de natureza cultural, social e política que precisam ser conhecidas pelos leitores/ouvintes para que o sentido do texto seja construído. Nesse diapasão, Abaurre (2007, p. 24) define contexto como “o conjunto das circunstâncias (sociais, políticas, econômicas e culturais etc.) a que um texto se refere”. Em posicionamento semelhante à de Abaurre, Damião (2008, p. 108) afirma que o contexto “são todas as informações que acompanham o texto tornando-o compreensivo”.

Em síntese um contexto de um texto refere-se aos fatores extralinguísticos, toda vez que se produz um texto, precisa-se escolher quais as informações contextuais devem ser repassadas para que o sentido dele possa ser entendido por seus interlocutores. 

Sendo o texto um entrelaçamento de palavras advindas de uma dada situação (contexto) com o objetivo único de transmitir uma mensagem (discurso) sobre algo ou alguma coisa, é preciso que ele seja elaborado com base nos recursos linguísticos do idioma em que foi produzido o discurso, no caso em tela o português.

Existem inúmeros recursos linguísticos utilizados na elaboração de um discurso, no entanto nesse estudo serão tratados: a pontuação, a coesão e a coerência textual.

 

2.4 A pontuação

 

            De acordo com os ensinamentos de Fetzner (2008, p. 151) pontuação “é o emprego de sinais convencionais entre orações e partes de orações para estabelecer pausas e inflexões da voz (a entonação) na leitura”. Do mesmo modo Vonay afirma que:

(...) o emprego correto da pontuação é essencial a boa compreensão das mensagens dos discursos escritos e nunca seria demais insistir sobre o cuidado que se deve ter em relação a ela, tanto no ato de escrever como na leitura, pois a pontuação indica às pausas, a entonação, a medida da frase, mas pode também ter uma função expressiva.  (VANOY, 2007, P. 40)

 

            A pontuação segundo a autora tem uma função lógica, ela divide o discurso em grupos de palavras e impede, desta maneira os erros de interpretação. Como descrito abaixo:

 

Este aluno disse o professor é um incompetente.

Este aluno disse: o professor é um incompetente.

Este aluno, disse o professor, é um incompetente.

 

Observa-se que ocorreu uma variação de sentido mediante o emprego da pontuação, por isso deve-se estar atento quando da produção de um discurso, especialmente se o discurso for jurídico, pois o mesmo trata de conflito de interesses, o que exige uma redação clara, objetiva e, sobretudo persuasiva.

É oportuno também ressaltar o posicionamento de Xavier que afirma ser a função da pontuação, na linguagem escrita:

 

A reprodução aproximadamente das pausas da oralidade elocutiva. Daí que, para a inteligibilidade do pensamento, é imperioso saber empregar de modo convincente os sinais marcadores de pausas: vírgula, ponto e vírgula e ponto.  E os marcadores de entonação: dois pontos, ponto de interrogação, ponto de exclamação, reticências, aspas, parênteses e travessão. (XAVIER, 2010, p.208).

 

           

Nota-se que o autor apresenta a pontuação na produção do discurso escrito mostrando a importância de se saber usar esses marcadores para dar significado ao que se escreve.

Nesse sentido é imprescindível lembrarmos a lição de Rui Barbosa sobre o emprego correto da pontuação, dizia o grande causídico brasileiro: “nos momentos escritos da historia, ou da lei, um ponto, ou uma vírgula podem encerrar os destinos de um mandamento, de uma instituição, ou de uma verdade”.

            O uso correto da pontuação é indispensável para a produção de um discurso coeso, coerente cheio de sentido.

 

2.5 Coesão

 

            É pertinente salientar que quem vive do trabalho intelectual e de escrever devem sempre manter parte de seu tempo para um exame mais cuidadoso daquilo que escrevem, pois isso lhes confere melhores resultados em suas atuações profissionais, em especial o operador do direito que faz do uso da palavra sua principal ferramenta de trabalho.

            A produção escrita de uma peça jurídica implica um conflito de interesses que busca na decisão proferida pelo julgador o mínimo de justiça, nesse sentido a elaboração inadequada do texto jurídico ocasiona para o advogado a perda de credibilidade profissional.  Nesse sentido Silva assim se posiciona:

 

A exposição de pensamentos incoerentes e/ou desconexos levará quem quer que precise interpretar o texto de modo objetivo a deduções até mesmo contrárias àquelas visadas pelo próprio advogado. A conformidade entre as intenções do produtor – no caso em pauta, o advogado – e o correto entendimento pelo receptor -, o juiz – não é um fruto do acaso, mas de procedimentos vários. (SILVA, 2007, p.36)

 

A autora chama-nos a atenção para o uso de vários procedimentos que tornam o texto jurídico compreensivo para quem faz sua leitura, um desses procedimentos é a coesão. Palavra de origem latina sobrevinda do termo “cohaesionem” que significa união.

Fávero (2006, p.10) citando Beaugrande e Dressler(1981) afirma ser a coesão: “as palavras que ouvimos ou vemos ligados entre si dentro de uma sequência”.

Neste sentido esclarece Koch (2004, p. 16) “a coesão, por estabelecer relações de significados diz respeito ao conjunto de recursos semânticos por meio dos quais uma sentença se liga com a que vem antes”

Com base na definição dos autores citados anteriormente, vale ressaltar que o texto jurídico não é uma sequência de palavras desconexas, soltas e sem sentido, ao contrário o texto deve ser harmônico com elos coesivos, ou seja, recursos linguísticos que tenham como função ligar os termos de uma frase, de uma oração, de um período e que, portanto, contribuem para a constituição de um parágrafo.

Esses recursos são os conectivos os quais são representados pelas preposições, conjunções; pronomes; advérbios e locuções adverbiais.

Damião (2008, p. 129) apresentam os principais conectivos de coesão utilizados na produção de um texto jurídico:

 

Realce, inclusão, adição

Negação/ oposição

Afeto, afirmação,

além disso, ainda,

demais, ademais,

também,  vale lembrar,

pois, outrossim,

agora, de modo geral,

por iguais razões,

em rápidas pinceladas,

inclusive, até, é certo,

é porque, é inegável,...

 

embora, não obstante a isso, inobstante a isso,

de outra face, entretanto

no entanto, ao contrario disso, qual nada,

por outro lado, por outro enfoque, diferente disso, contudo, ...

 

felizmente, infelizmente,

ainda bem, obviamente,

em verdade, realmente,

em realidade, de igual forma, de mesmo modo que, da mesma sorte, de igual forma, ...

 

            Vale lembrar que esses conectivos frequentemente asseguram não só a coesão como também a coerência na produção do discurso jurídico.

 

 

 

2.6 Coerência

 

            Enquanto a coesão diz respeito ao modo como os elementos da superfície textual, isto é, as palavras e frases que compõem um texto encontram-se conectados entre si num encadeamento linear, por meio de dependência de ordem gramatical, a coerência é responsável pela continuidade dos significados no texto, não se apresenta, pois, como mero traço do texto, mas como resultado de uma complexa rede de fatores de ordem linguística, cognitiva e intencional.

            Partindo desse pressuposto, um texto é coerente:

 

Quando se pode extrair com perfeição o conteúdo significativo, sem qualquer ofensa as regras do raciocínio lógico. Assim, para que haja coerência num texto é necessário que suas passagens se coadune harmoniosamente, ou pelo menos que não se colidam. (TRUBILHANO, 2005, p.23)

 

 

            Com posicionamento parecido com o do autor citado, Damião e Henriques (2008, p. 1220) define coerência como “a adequação dos elementos textuais em busca de uma unidade, em que as idéias se compatibilizem”. Para sustentar tal definição os autores assim exemplificam:

O réu foi condenado a 5 anos e 3 meses, não lhes sendo concedido o beneplácito de um regime mais brando, devendo cumprir a pena em regime fechado.

            As penitenciarias de São Paulo não são adequadas e não oferecem condições satisfatórias, representando em análise última, a falência do sistema carcerário.

Nota-se que não existe coerência entre os parágrafos, uma vez que a falência do sistema carcerário de São Paulo não tem relação com a expectativa criada com a primeira idéia, que é a pena aplicada ao condenado.

            A importância da coerência no discurso jurídico é indispensável, tanto que Trubilhano assim relatou:

 

Um texto ao qual falte coerência não é propriamente um texto, stricto sensu, já que lhe falta o necessário e inerente poder comunicativo. Porém, há incoerências que por serem pequenas não viciam o texto por completo, sendo possível extrair-lhe o teor significativo, ainda que parcialmente prejudicado. Há incoerência, por exemplo, quando as idéias encadeadas na petição inicial levam à conclusão da possibilidade de determinado pedido, mas o autor pede outro.  Haverá incoerência, outrossim, se os fatos narrados forem controversos e conflitantes, ou aludam a fatos que não correspondam à realidade das coisas. (Ibedem. P.23)

 

A coerência, como bem colocou Trubilhano é imprescindível à comunicação, já que sua falta torna impossível o entendimento, em maior ou menor grau, da mensagem transmitida.

Observa-se, portanto, que os recursos linguísticos são imprescindíveis para a elaboração do discurso jurídico argumentativo, apto a convencer e persuadir o auditório de suas decisões com o teor de justiça.

 

3.  O DIREITO E ARGUMENTAÇÃO

3.1 Direito

           

Para um melhor entendimento do que venha a ser direito e argumentação é necessário o esclarecimento conceitual de tais termos.

            A palavra direito segundo o jusfilósofo brasileiro Miguel Reale (2002, p. 62) é: “o ordenamento jurídico, ou seja, o sistema de normas e regras jurídicas que traça aos homens determinada formas de comportamento, conferindo-lhes possibilidade de agir”.

            Embora o professor Reale tenha apresentado uma definição coerente para o vocábulo direito, ela não é universal, pois o termo direito tem significados variados entre eles pode-se destacar:

 

Etimologicamente a palavra direito é oriunda do adjetivo latino directus, a , um (qualidade do que esta conforme a reta, o que não tem inclinação, desvio ou curvatura).[...] Semanticamente  a palavra direito passou a ter significados vários: a qualidade de que esta conforme a reta, aquilo que esta conforme a lei, a própria lei, conjunto de leis, a ciência que estuda as leis. [...] Já a definição real aponta ser o direito o conjunto de normas de conduta social, imposto coercitivamente pelo Estado, para a realização da segurança, segundo os critérios de justiça. (NADER, 2008, p.75)

 

            A definição dada por Paulo Nader abrange os vários significados do termo direito empregados no mundo acadêmico, porém o direito aos olhos do homem comum aparece como um complicado mundo de contradições e coerências, pois em seu nome tanto se vêem respaldados as crenças em uma sociedade ordenada, quanto se agitam a desordem. Nesse sentido os ensinamentos de Ferraz Junior parece-nos prudente:

 

O direito contem ao mesmo tempo, as filosofias da obediência e da revolta, servindo para expressar e produzir aceitações do status quo, da situação existente, mas aparecendo também como sustentação moral da indignação e da rebelião. O direito, assim, de um lado protege-nos do poder arbitrário, exercido a margem de toda regulamentação, salva-nos da maioria caótica e do tirano ditatorial, dá a todos oportunidades iguais e, ao mesmo tempo, ampara os desfavorecidos. Por outro lado, é também um instrumento manipulável que frustra as aspirações dos menos privilegiados e permite o uso de técnicas de controle e de dominação que, por sua complexidade, é acessível apenas a uns poucos especialistas. (FERRAZ JUNIOR, 2008, p. 9-10)      

 

Pelas definições apresentadas o direito é simplesmente um fenômeno histórico-sociocultural, presentes em todas as sociedades com um objetivo de dirimir conflitos, manter a ordem e, sobretudo o equilíbrio do poder.

O direito se impõe as pessoas como bastião de justiça através da argumentação que é o instrumento utilizado para fundamentar as decisões jurídicas e dessa forma convencer e persuadir a sociedade de que tais decisões são legais e justas.

 

3.2 Argumentação

 

A argumentação é o uso da palavra de forma técnica e valorada, é um atocomunicacional onde se busca convencer e persuadir o oponente em um debate. É o instrumento indispensável de trabalho do operador do direito, tanto que para Chaiim Perelmam (2005, p. 17) “o mínimo indispensável à argumentação parece ser a existência de uma linguagem comum, de uma técnica que possibilite a comunicação. Para que uma argumentação se desenvolva, é preciso, de fato, que aqueles a quem ela se destina lhe preste alguma atenção”.

Para o autor, prender a atenção e o interesse de quem recebe uma mensagem é indispensável ao andamento da argumentação. Perelmam sustenta que é preciso ter consideração pela atenção do interlocutor, pelo seu consentimento, pela sua participação mental. O autor do Tratado da Argumentação: a nova retórica define argumentação “como a técnica de obter a adesão de um auditório que se procura influenciar, persuadir e convencer”.

            Com definição semelhante, porém, com mais detalhes Antônio Suarez Abreu (2006, p. 25), assim, define argumentação: “argumentar é, pois, em ultima análise, a arte de, gerenciando informações, convencer o outro de alguma coisa no plano das idéias e de gerenciando relação persuadi-lo, no plano das emoções, a fazer alguma coisa que desejamos que ela faça”.

            Partindo da definição dada por Suarez pode-se concluir que a argumentação e fundamental no trabalho do operador do direito principalmente na elaboração do discurso jurídico que tem por objetivo convencer através da palavra escrita e persuadir pela oralidade e vice- versa. Convence-se gerenciando informações e persuade-se gerenciando relações emotivas.

            Seguindo a mesma tendência dos autores citados anteriormente, Ingo Voese (2010, p. 28) leciona que a argumentação jurídica: “é uma atividade através da qual, valendo-se de recursos lógico-formal e de linguagem, alguém tenta convencer outrem que em determinado sentido ou tese é a melhor alternativa para a solução de um problema ou dificuldade”. 

            Voese afirma ainda que a argumentação jurídica não trabalha com verdades irrefutáveis e sim com sustentação de uma tese que se apóia em determinada versão dos fatos.

            Nesse sentido Mendonça (2007, p. 61-3) aponta os principais requisitos para se ter uma argumentação, são eles:

         Regras Básicas – diz o autor que na argumentação é necessário que se estabeleçam determinadas normas que disciplinem a relação entre o orador e o auditório, afim de que o processo de comunicação possa acontecer de maneira tal qual permita uma efetiva troca de informações e uma satisfatória compreensão pelo auditório da tese proposta pelo orador.

         Permeabilidade do auditório - é importante que exista uma permeabilidade do auditório, para o conhecimento da tese proposta pelo orador. Se não há, por parte do auditório, qualquer ânimo de permitir a exposição de idéias pelo orador ou mesmo disposição para o seu conhecimento, torna-se impossível o estabelecimento de qualquer processo retórico.

         Discurso compatível com o auditório – deve-se estar atento para o fato de que o processo decisório está submetido a outras variáveis, além do simples exercício retórico (...) o discurso utilizado deve necessariamente estar de acordo com as expectativas dos ouvintes. Daí,a relevância de se conhecer as condições psicológicas  e sociais do ambiente onde se trava o processo argumentativo, a fim de buscar as razões que justificam o triunfo de determinada tese

         Triunfo de uma causa – enquanto a demonstração tem a pretensão de formar um conhecimento “verdadeiro”, a argumentação tem como finalidade precípua a aceitação hegemônica de uma tese, por parte do auditório. Para a argumentação não existem teses falsas ou verdadeiras.

         Linguagem Comum – a linguagem utilizada num processo argumentativo deve ser compreensível por todos os membros do auditório. A linguagem demonstrativa se apresenta de maneira puramente formal, dedutiva, podendo ser símbolos (formulas matemáticas, por exemplo), mas certamente padronizada e continuamente reproduzida de modo idêntico, em face de qualquer auditório. A argumentação ao contrario lança mão da linguagem falada ou escrita, de complexidade variável, conforme o tipo de auditório a que se destina.   

            É com base nos fatos ocorridos no caso concreto que o operador do direito mostra toda a sua arte argumentativa para defender sua tese e proteger seu cliente das injustiças. E essa defesa é feita através da argumentação oral e escrita.

            .

3.2.1Argumentação Oral

 

A primeira referência ao poder da palavra usada para convencer e persuadir encontra-se na Bíblia: “no princípio era o verbo, e o verbo estava com Deus. E o verbo era Deus”. Tal afirmativa denota que a palavra exerce extraordinário poder sobre os homens.

Com o uso da palavra formaram-se as civilizações, desenvolveram-se as culturas, difundiram-se os valores, escreveram-se as histórias dos povos. Pela palavra, firmaram-se as bases do amor, da verdade, do perdão, do civismo, da cidadania, da Fé, e da justiça. A história do homem é a historia da evolução da palavra.

A arte de falar em público, ou seja, argumentar de forma convincente é uma exigência no mundo jurídico, tanto que o Estatuto da OAB (Lei nº 8.906 de 4/7/ 1994), em seu artigo 7º, IX, X, XI e XII que trata dos direitos do advogado, aponta algumas situações em que o profissional pode se manifestar oralmente:

 

IX – sustentar oralmente as razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, em instância judicial ou administrativa, pelo prazo de quinze minutos, salvo se prazo maior for concedido;

X – usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como replicar acusação ou censura que lhes forem feitas;

XI – reclamar, verbalmente ou por escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, contra a inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento;

XII – falar, sentado ou em pé, em juízo, tribunal ou órgão de deliberação coletiva da Administração Pública ou do poder legislativo. 

 

            Esses incisos são apenas alguns exemplos da relevância da oralidade para o advogado, como pode se observado no Estatuto da OAB, uma das formas para ter sucesso no universo jurídico e saber falar bem, pois a comunicação sempre será exigida. Operador do direito que não se comunicar bem dificilmente consegue êxito em sua profissão.

Nesse sentido segundo Polito (2008, p. 26) “o atributo mais importante para que se domine a oratória é a credibilidade”..

 

3.2.2 Credibilidade

 

            O operador do direito trabalha gerenciando informações, logo o seu grande objetivo é transmitir uma informação de tal forma que ela seja recebida pelo auditório como verdade. Para conseguir transmitir credibilidade em sua informação o emissor deve:

 

[...] agir com naturalidade, se a platéia perceber qualquer sinal de artificialismo no seu comportamento como orador, poderá desconfiar de seus propósitos e levantar barreiras aos argumentos que você defende [...] demonstrar interesse e envolvimento pela mensagem que transmite, falar com disposição, com energia, com envolvimento, com emoção [...] A credibilidade na área jurídica esta intimamente ligada ao conhecimento que você demonstrar ter sobre o assunto pela forma como você se expressa [...] o advogado deve demonstrar confiança ao falar, por isso é tão importante combater o medo de falar. (Ibidem, p. 29 - 47)

 

           

Portanto para ter credibilidade o operador do direito, deve agir com naturalidade, mostrar emoção e envolvimento na transmissão da mensagem, demonstrar conhecimento sobre o assunto que esteja tratando e, sobretudo ter confiança na sua fala.

 Nogueira citada por Figueiredo (2009, p. 54) tem um posicionamento idêntico ao de Polito ao afirmar que os pilares de uma comunicação persuasiva sejam:

 

         Credibilidade: para o autor é o suporte de consistência dos fundamentos empregados na defesa de uma tese oral;

         Coerência: os argumentos discursivos devem estar sempre interligados;

         Consistência: embasamento que resiste às criticas mais evidentes, ou seja, o orador deve dominar o tema do qual se propõe a defender oralmente;

         Congruência: o comportamento de quem fala deve estar em sintonia com o ambiente e o perfil das pessoas para qual se dirige. O discurso de um advogado palestrando na OAB sobre o mesmo tema.

Finalmente é importante frisar que uma comunicação argumentativa/persuasiva precisa de um vocabulário abrangente, pois a palavra é o núcleo do nosso raciocínio e sentimentos:

 

[...] possuir um extenso vocabulário é encontrar palavras com facilidade para identificar seus pensamentos, só assim, você terá uma poderosa arma para ser vitorioso como advogado. [...] ressalto que, enquanto o orador estiver preocupado com a palavra que vai dizer, com o verbo que irá conjugar, com o adjetivo e o substantivo que irão compor a frase que deverá refletir o seu pensamento, estará preso à forma da comunicação e sofrerá, com isso, um rebate de produtividade. (POLITO, 2008, p. 76).

 

Ante o exposto é oportuno lembrar que a oralidade também é uma técnica comunicacional/argumentativa que deve ser utilizada para convencer e persuadir um auditório.

Vale ressaltar também que a oralidade usada como técnica argumentativa é a expressão muita das vezes de um discurso escrito, logo, a argumentação jurídica utiliza tanto a oralidade quanto a escrita para persuadir e convencer.

O escopo principal deste trabalho é analisar a produção do discurso jurídico e as principais técnicas argumentativas empregadas nas peças processuais, pois, o primeiro contato que o julgador tem com a lide a ser analisada por ele, é uma produção escrita chamada Petição Inicial.  Daí a importância de uma peça bem redigida rica em argumentos que possam convencer e persuadir o magistrado.

 

 

3.2.3 Argumentação escrita

 

                        As pessoas escrevem para serem lidas (ouvidas), às vezes para serem respeitadas e também para exercer uma influência no ambiente em que vivem. Bourdieu (1977) citado por (Gnerre,1998, p. 5) diz que o poder da palavra é o poder de mobilizar a autoridade acumulada pelo escritor e concentrá-lo na sua produção escrita.

A elaboração de uma peça jurídica é um exercício de poder carregada de significados que se manifestam na utilização da palavra escrita e oral através de um enunciado, que tem por objetivo influenciar um determinado auditório, para alcançar êxito o sujeito produtor do discurso vale-se da argumentação, através das técnicas de convencimento e persuasão.

            Diante do exposto, torna-se necessário o esclarecimento conceitual dos termos em destaques para que o leitor se familiarize com cada um deles, evitando qualquer confusão quando da aplicação dessas palavras termos no desenvolvimento do estudo.

 

 

3.2.4 Enunciado

 

            O enunciado segundo Charaudeau (2008, p.1950) “é toda parte do discurso [..] é uma unidade da comunicação, é uma sequência verbal investida de sentido proferida por uma única pessoa antes”. Em outras palavras o enunciado é um conjunto de informações expressado verbalmente ou por escrito.

            No discurso jurídico o enunciado são os fatos concretos, uma situação descrita pelo orador com o objetivo de ter a adesão de um determinado auditório.

 

 

 

 

3.2.5 Auditório

           

O auditório é sempre o ouvinte ou leitor a quem se dirige o discurso argumentativo. Para Abreu (2006, p.41) o auditório é “o conjunto de pessoas que queremos convencer e persuadir”.

 Nesse sentido é preciso não confundir interlocutor com auditório: quando um advogado conversa com seu cliente, ele é o interlocutor, quando um advogado encaminha uma petição ao juiz, o magistrado é o auditório a ser convencido e/ou persuadido.

O auditório pode ser universal de um tamanho de um país, ou particular que podemos controlar. Então quem vai argumentar deve adaptar-se ao seu auditório.

Com colocações parecidas Perelman (2005, p. 22) define auditório como: “o conjunto daqueles que o orador quer influenciar com sua argumentação”.

 Nesse sentido é o auditório quem determina a qualidade da argumentação e o comportamento dos oradores, pois o discursador sempre terá que adaptar o seu discurso ao auditório que pretende convencer e persuadir com sua argumentação.

 

3.2.6 Argumentação

 

Quando estamos diante de um auditório tem-se um só objetivo convencer e persuadir através da argumentação, que vem a ser:

 

O modo de apresentar e de dispor os argumentos. Vale dizer os raciocínios destinados a provar ou refutar determinada posição, um ponto de vista ou uma tese qualquer. Seu objetivo é de convencer ou persuadir, mostrando que todos os argumentos tendem para uma única conclusão. (JUPIASSÙ, 1996, p. 15-6)

 

É sempre oportuno lembrar que o termo “argumento” está sempre associado a um contexto de prova e conserva uma conotação jurídica, ou seja, o advogado desenvolve os seus argumentos para persuadir e convencer, explicando amplamente o seu emprego em fórmulas já prontas.

 

3.2.7 Convencimento

 

Convencer significa gerenciar informações. É falar o que a outra pessoa espera ouvir, é demonstrar e provar através de informações que você esta correto em seus argumentos.  É como diz Abreu (2006, p.25) “construir algo no campo das idéias”. Isso significa dizer que quando se convence alguém, essa pessoa passa a pensar como a pessoa que a convenceu.

Um exemplo se faz necessário para dirimir qualquer duvida sobre o que vem a ser o convencimento: podem-se convencer as pessoas através de inúmeras informações e dados estatísticos de que o crime é algo nocivo a sociedade e a quem os pratica, no entanto, existem indivíduos que vão delinquir.

Perelman (2005, p. 31) afirma “ser o convencimento uma argumentação voltada para obter a adesão de um auditório universal”. Então, a diferença entre persuadir e convencer encontra-se, segundo Perelman, na natureza do auditório ao qual alguns argumentos podem ser submetidos com sucesso.

 

 

3.2.8     Persuasão

 

Na persuasão o individuo se contenta com razões, emotivas, afetivas, pessoais.

Persuadir em outras palavras significa conseguir que as pessoas façam aquilo que queremos, nesse caso “chama-se persuasiva uma argumentação que pretende valer só para um auditório particular”, (Perelman, 2005, p. 31).

A persuasão não tem por objetivo atingir o auditório universal, esse é o papel do convencimento. Na produção do discurso jurídico escrito o orador tem argumentos persuasivos à sua disposição.

 

3.3OS principais argumentos utilizados no discurso jurídico

           

            Argumentar é escolher de forma apropriada os argumentos que serão utilizados para dar coerência ao discurso. Nesse sentido nos ensina Voese:

 

 Entende-se por técnica argumentativa a produção de argumentos que tomam como orientação não o que é pertinente ao fato em avaliação, mas, relações lógicas, circunstanciais e situações de outras esferas das atividades humanas e que, por pressuposição, têm condições para exercer força de convencimento e persuasão: é quase como as técnicas argumentativas representassem um recurso que empresta prestigio e valores duma determinada prática para transformá-la em argumentos – no caso do direito em jurídicos. (VOESE, 2010, p. 51)

 

O autor deixa claro que as técnicas argumentativas são os fundamentos que estabelecem ligações entre a tese de adesão e a tese principal do orador. Essas técnicas compreendem dois grupos principais de argumentos: os argumentos quase lógicos e os argumentos fundamentados na estrutura do real.

Os argumentos quase lógicos aproximam-se dos esquemas formais da lógica e da matemática, apesar de apresentarem traços particulares ao campo da argumentação. Exatamente por isso são denominados “quase lógicos”, os principais argumentos dessa categoria são:

 

3.3.1 Argumentos quase lógicos

 

         Argumento do Ridículo – consiste em criar uma situação irônica, ao se adotar, de forma provisória, um argumento do outro, extraindo dele todas as condições, por mais estapafúrdias que sejam. Como exemplo

         Argumento da Identidade da Definição – esse argumento segundo Perelman é essencial na argumentação quase lógica, pois permite identificar os diversos elementos que são o objeto do discurso. Vale ressaltar que são as definições que identificam os elementos discursivos, nesse sentido é oportuno frisar que existem inúmeras categorias de definições, porém, as que mais são utilizadas no discurso jurídico conforme Abreu (2006, p. 57) são: 1) Definições Normativas  - elas indicam o sentido  que se quer dar a uma palavra em um determinado discurso e dependem de um acordo com o auditório.  2) As definições expressivas – são as mais utilizadas como técnicas argumentativas, uma vez que permitem a fixação de ponto de vista como teses de adesão inicial.

         Argumento da Regra da Justiça – essa técnica argumentativa que consiste em aplicar um tratamento idêntico a seres ou a situações que são integradas em uma mesma categoria.

         Argumento de Probabilidade - é uma técnica argumentativa bastante usada. Busca no modelo lógico-formal para valer-se das estatísticas e do cálculo de probabilidades.

         Argumento da Comparação - esse argumento tem o objetivo de comparar enquadrando uma imagem (do réu ou da vitima, por exemplo) ou a versão de um fato (um delito, por exemplo) dentro de uma sequência hierarquizada, cabendo ao argumentador à tarefa de fazer as escolhas de imagem ou versões com as quais organizara seu discurso.

Enquanto nos argumentos quase lógicos o orador se fundamenta em uma objetividade quase matemática, os argumentos baseados na estrutura do real não estão ligados a uma descrição objetiva dos fatos, mas a ponto de vistas, ou seja, a opiniões relativas a ele.

Voese (2010, p.15) corrobora com esse posicionamento afirmando que: “o Direito funda e caracteriza, pois, a sua prática admitindo o contraditório, ou seja, a heterogeneidade de sentidos que precisa, toda via, para não deixar de observar a coerência, a coesão e a congruência necessária à argumentação...”

Os principais argumentos baseados na estrutura do real são:

 

3.3.2 Argumentos baseados na estrutura do real

 

        Argumento do Vínculo Causal – uma argumentação pode estabelecer um vinculo causal entre:

1)    Dois acontecimentos sucessivos, nesse caso o argumentador faz uma relação entre os acontecimentos mostrando o vinculo causal entre eles, ou seja, se o primeiro acontecimento não existisse o segundo também não;

2)     Um acontecimento é uma causa determinante – sendo dado um acontecimento que não tenha se originado de outro fato anterior o argumentador tentará provar a existência do nexo causal em um determinado ponto do acontecimento;

3)    Um acontecimento e seus efeitos prováveis – nesse caso o argumentador pode construir uma relação causal entre o fato ocorrido e uma situação futura.

         Argumento Pragmático – o argumento pragmático fundamenta-se na relação de dois acontecimentos sucessivos por meio de um vínculo causal. A força do argumento pragmático está no fato de ele dizer respeito aos sentidos da vida, do cotidiano das pessoas, para queesse tipo de argumento funcione é necessário que o auditório concorde com o valor da consequência.

         Argumento do Desperdício – esse argumento consiste em dizer que, uma vez iniciado uma obra, é preciso ir até o fim para não perder o tempo e o investimento. Na seara jurídica, por exemplo, significa não perder a oportunidade de condenar ou de absolver alguém porque já existe meios, atender aos efeitos da decisão.

         Argumento de Direção - o argumento de direção consiste, essencialmente, no alerta contra o uso do procedimento das etapas: se você ceder esta vez, deverá ceder um pouco mais e talvez não paremos mais de ceder.

         Argumento da Superação - ao contrario do argumento de direção, que desperta o temor de que uma ação nos envolva num encandeamento de situações cujo desfecho se receia. Os argumentos da superação insistem na possibilidade de ir sempre mais longe num certo sentido, sem que se entreveja um limite nessa direção, e isso com um crescimento contínuo de valor.

         Argumento pelo exemplo – a argumentação pelo exemplo acontece quando sugerimos a imitação das ações de outras pessoas. O exemplo é uma argumentação, mas não uma prova: é um recurso para sustentar uma tese, principalmente na construção de uma generalização.

         Argumento da Analogia - a analogia é uma comparação que visa estabelecer semelhanças, o que, de certa forma na prática jurídica, aponta para uma igualdade de relações entre os indivíduos. Se o argumentador, por exemplo, escolher o seguinte enunciado: “agredir a mulher é como agredir o membro central da família e, por isso, a célula da sociedade”, estará construindo uma relação de semelhança. 

         Argumentação pelo Modelo ou pelo Antimodelo – a argumentação pelo modelo é uma variação da argumentação pelo exemplo. Os brasileiros costumam citar pelo como um modelo de atleta. O antimodelo fala naquilo que devemos evitar às vezes ao Antimodelo e mais eficaz que o modelo.

         Argumento da Autoridade – parte do pressuposto de que a citação de outrem possibilita usar o prestigio e a autoridade do enunciante citado, valorizando o citado como argumento. Para conseguir a adesão de uma tese, o argumentador busca, pois, dar à própria fala o prestígio e a autoridade de outrem, citando o que entende como conveniente a sustentação que esta fazendo.

Após esse rol exemplificativo sobre os dois grupos principais de argumentos: os argumentos quase lógicos e os argumentos fundamentados na estrutura do real,

vale lembrar que o discurso jurídico é fundamentado em questões reais do cotidiano humano, portanto, para encontrar um esquema argumentativo é preciso:

 

[...] interpretar as palavras do orador [...] enquanto o orador argumenta o ouvinte, por sua vez ficará inclinado a argumentar espontaneamente acerca desse discurso, a fim de tomar uma atitude a seu respeito, de determinar o credito que lhe deve dar. O ouvinte que recebe o argumento. (PERELMAN,     2005, p.2130)

 

           

O que Perelman quer repassar é o ato responsável que existe na argumentação jurídica, o ato de argumentar opera sobre valores e, portanto tem caráter eminentemente mediador das relações sociais. Uma análise argumentativa de uma peça processual mostrará como são empregadas as técnicas argumentativas na prática forense.

 

4. ANÁLISE ARGUMENTATIVA

 

 

            Vistos.

Dispensado o relatório, nos termos do artigo 492, do Código de Processo Penal.

Submetido a julgamento nesta data, o Colendo Conselho de Sentença reconheceu que o réu LINDEMBERG ALVES FERNANDES praticou o crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima (vítima Eloá Cristina Pimentel da Silva), o crime de homicídio tentado qualificado pelo motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima (vítima Nayara Rodrigues da Silva), o crime de homicídio qualificado tentado ( vítima Atos Antônio Valeriano), cinco crimes de cárcere privado e quatro crimes de disparo de arma de fogo.

 

Análise1 - Observa-se nesse primeiro parágrafo a utilização da narrativa dos fatos, sem destituída de argumentação.

 

Passo a dosar a pena:

 

O julgador deve, ao individualizar a pena, examinar com acuidade todos os elementos que dizem respeito ao fato e ao criminoso, obedecidos e sopesados todos os critérios estabelecidos no artigo 59 do Código Penal, para aplicar, de forma justa e equilibrada, a reprimenda que seja, proporcionalmente, necessária e suficiente para a reprovação do crime.

Análise 2 - Observa-se a preocupação do julgador em repassar para a sociedade uma pena que todos considerem justa a Lindemberg. Para tal, recorre ao argumento de autoridade citando o art. 59do CP, in verbis:

 

O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, bem como o comportamento da vitima estabelecera conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime...

           

            Com base na subsunção do fato a norma, o juiz em seu discurso que a pena aplicada a Lindemberg é justa.

Deve o Magistrado, atrelado a regras de majoração da pena, aumentá-la até o montante que considerar correto, tendo em vista as circunstâncias peculiares de cada caso, desde que o faça fundamentadamente e dentro dos parâmetros legais.

Análise 3 - Observa-se novamente a utilização do argumento de autoridade, ou seja, basta utilizar a lei seca e pronto à justiça foi feita.

A sociedade, atualmente, espera que o juiz se liberte do fetichismo da pena mínima, de modo a ajustar o quantum da sanção e a sua modalidade de acordo com a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias do crime, bem como o comportamento da vítima.

Análise 4 - O julgador para aplicar a pena máxima ao réu usa o argumento de direção, ao afirmar que se “o juiz não se libertar do fetichismo da pena mínima” nesse momento, irá continuar a aplicar penas irrisórias a crimes de repercussão social.

 

Pois bem.

 

Todas as condutas incriminadas, atribuídas ao réu e reconhecidas pelo Egrégio Conselho de Sentença incidem no mesmo juízo de reprovabilidade. Portanto, impõe-se uma única apreciação sobre as circunstâncias judiciais enunciadas no artigo 59 do Código Penal, evitando-se assim, repetições desnecessárias.

As circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal, não são totalmente favoráveis ao acusado, razão pela qual a pena base de cada crime será fixada acima do mínimo legal.

Análise 5 - Novamente o julgador usa o argumento de autoridade para justificar o aumento da pena base para cada crime cometido pelo réu.

Com efeito, a personalidade e conduta social apresentada pelo acusado, bem como as circunstâncias e consequências dos crimes demonstram conduta que extrapola o dolo normal previsto nos tipos penais, diferenciando-se dos demais casos similares, o que reclama reação severa, proporcional e seguramente eficaz.

(STF - RT 741/534).

Esta aferição encontra guarida no princípio da individualização da pena e deve ser realizada em cada caso concreto (CF/ 88, art.5º XLVI). Os crimes praticados atingiram o grau máximo de censurabilidade que a violação da lei penal pode atingir.

Na hipótese vertente, as circunstâncias delineadas nos autos demonstram que o réu agiu com frieza, premeditadamente, em razão de orgulho e egoísmo, sob a premissa de que Eloá não poderia, por vontade própria, terminar o relacionamento amoroso. Tal estado de espírito do agente constituiu a força que determinou a sua ação.

E, nesse contexto, envolveu não apenas tal vítima, mas também Nayara, Iago e Vitor, amigos que a acompanhavam na data em que o acusado invadiu o apartamento. Durante o cárcere privado, as vítimas, desarmadas e indefesas, permaneceram subjugadas pelo agente, sob intensa pressão psicológica, a par de agressões físicas contra todos perpetradas.

Durante a barbárie, o réu deu-se ao trabalho de, por telefone, dar entrevistas a apresentadores de televisão, reforçando, assim, seu comportamento audacioso e frieza assustadora. Lindenberg Alves Fernandes chegou a pendurar uma camiseta de time de futebol na janela da residência invadida.

Observa-se

Não posso olvidar, nesse contexto, as consequências no tocante aos familiares das vítimas.

Durante o cárcere privado, a angústia dos familiares, mormente de Eloá e Nayara, que por mais tempo permaneceram subjugadas pelo réu, que demonstrava constante oscilação emocional, agressividade, atingiu patamar insuportável diante da iminência de morte, tendo por ápice os disparos que foram à causa da morte de Eloá e das lesões sofridas por Nayara.

E depois dos fatos, as vítimas Nayara, Victor e Iago sofreram alterações nas atividades rotineiras, além de terem de se submeter a tratamentos psicológicos e psiquiátricos.

Ainda, além de eliminar a vida de uma jovem de 15 anos de idade e de quase matar Nayara e o bravo policial militar Atos Antônio Valeriano, o réu causou enorme transtorno para a comunidade e para o próprio Estado, que mobilizou grande aparato policial para tentar demovê-lo de sua bárbara e cruel intenção criminosa.

Os crimes tiveram enorme repercussão social e causaram grande comoção na população, estarrecida pelos dias de horror e pânico que o réu propiciou às indefesas vítimas.

Em suma, a culpabilidade, a personalidade do réu, seus egoísticos e abjetos motivos, as circunstâncias e nefastas consequências do crime impõem a esta a Julgadora, para a correta reprovação e prevenção de outros crimes, a fixação da pena, na primeira fase de aplicação, em seu patamar máximo cominada para cada delito, ou seja, 30 anos de reclusão para o crime de homicídio qualificado praticado contra Eloá; 30 anos para o crime de tentativa de homicídio qualificado praticado contra Nayara; 30 anos para o crime de tentativa de homicídio perpetrado contra a vítima Atos; 05 anos de reclusão para cada crime de cárcere privado (contra Iago, Vitor, Eloá e Nayara, por duas vezes) e de 04 anos de reclusão e pagamento de 360 (trezentos e sessenta dias multa) para cada crime de disparo de arma de fogo (quatro vezes).

Análise 6 - Nota-se que o enunciado (as informações do fato) narrado pela juíza esta embasado no Argumento quase lógico da Identidade e da Definição, cheio de definições expressivas que são as mais utilizadas como técnicas argumentativas, uma vez que permitem a fixação de ponto de vista como teses de adesão inicial.

Na segunda fase, não incidem agravantes. Presente a atenuante da confissão espontânea em relação aos crimes de disparo de arma de fogo descritos nas nona e décima séries e cárcere privado da vítima Eloá, reduzo as reprimendas em 1/6, o que perfaz 04(quatro) anos e 02 (dois) meses para o crime de cárcere privado e 03 anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 300dias multa, para cada um dos crimes de disparo de arma de fogo.

Não incidem causas de aumento de pena. Reconhecida a tentativa de homicídio contra Nayara, reduzo a pena no patamar mínimo de 1/3, tendo em vista o laudo pericial juntado a fls.678/679 e necessidade de futura intervenção cirúrgica para reconstrução dos ossos da face, concretizando-a em 20(vinte) anos de reclusão.

Em relação à tentativa de homicídio contra o policial militar Atos, aplico a redução máxima de 2/3, uma vez que a vítima não sofreu lesão corporal, o que perfaz 10 ( dez) anos de reclusão.

Os crimes foram praticados nos moldes do artigo 69, do Código Penal.Constatado que o réu agiu com desígnios autônomos, almejando dolosamente a produção de todos os resultados, voltados individual e autonomamente contra cada vítima, afasta-se qualquer das figuras aglutinadoras das penas (artigos 70 e 71 do Código Penal) e reconhecendo-se o concurso material de crimes, previsto no artigo 69, do Código Penal.

Somadas, as penas totalizam98 anos e 10 meses de reclusão e pagamento de 1320 dias–multa, o unitário no mínimo legal.

Para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade, fixo o regime inicialmente fechado. Incidem os artigos 33, §2º, “a”, do Código Penal,artigos 1º, inciso I, e 2º, §1º, ambos da Lei nº 8.072/90, em relação aos crimes dolosos contra a vida.

É, ademais, o único adequado à consecução das finalidades da sanção penal,

consideradas as circunstâncias em que os crimes foram praticados, que bem demonstraram ousadia,periculosidade do agente e personalidade inteiramente avessa aos preceitos que presidem a convivência social,bem como as consequências de suas condutas.

As ações, nos moldes em que reconhecidas pelo Conselho de Sentença, denotam personalidade agressiva, menosprezo pela integridade corporal, psicológica e pela própria vida das vítimas, o que exige pronta resposta penal. Como fundamentado na primeira etapa da dosimetria da pena, as circunstâncias judiciais são totalmente desfavoráveis ao réu (§3º do artigo33, do Código Penal).

E por tais razões não é possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou a concessão de sursis, diante do quantum fixado e da ausência dos requisitos subjetivos previstos nos incisos III, do art. 44 e II, do art. 77, ambos do Código Penal.

Saliento, ainda, a vedação prevista no artigo 69, parágrafo primeiro, do Código Penal, bem como que as benesses implicariam incentivo à reiteração das condutas e impunidade.

Em face da decisão resultante da vontade soberana dos Senhores Jurados, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado, para condenar LINDEMBERG ALVES FERNANDES, qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 121, parágrafo 2º,incisos I e IV (vítima Eloá), artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV, c.c. artigo 14, inciso II (vítima Nayara), artigo 121,parágrafo 2º, inciso V, c.c. artigo 14, inciso II, (vítima Atos),artigo 148, parágrafo 1º, inciso IV, por cinco vezes, (vítimas Eloá, Victor, Iago e Nayara, esta por duas vezes), todos do Código Penal, e artigo 15, caput, da Lei nº 10.826/03, por quatro vezes, à pena de 98 (anos) e 10 (meses) de reclusão e pagamento de 1320 dias-multa, no valor unitário mínimolegal.

O réu foi preso em flagrante encontrando-se detido até então. Nenhum sentido faria, pois, que após a condenação, viesse a ser solto, sobretudo quando os motivos que ensejaram o decreto da custódia cautelar (CPP, art.312), foram ainda mais reforçados pelo Tribunal do Júri, cuja decisão é soberana.

Denego a ele, assim, o direito de apelar em liberdade.

Recomende-se o réu na prisão em que se encontra recolhido. Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol de culpados.

No mais, tendo em vista a exibição em sessão plenária de colete à prova de balas, fato consignado em ata, artefato sujeito à regulamentação legal e específica e em não sendo exibida documentação relativa a tal instrumento, remeta-se cópia da ata da sessão plenária ao Ministério Público para ciência quanto ao ocorrido.

Ainda, também durante os debates, na presença de todas as partes e do público, a Defensora do réu Dra. Ana Lúcia Assad, de forma jocosa, irônica e desrespeitosa, aconselhou um membro do Poder Judiciário a “voltar a estudar”, fato exaustivamente divulgado pelos meios de comunicação.

Nestes termos, considerando a prática, em tese, de crime contra a honra e o disposto no parágrafo único do artigo 145, do Código Penal, determino a extração de cópia da presente decisão e remessa ao Ministério Público local, para providências eventualmente cabíveis à espécie.

Decisão publicada hoje, neste Plenário do Tribunal do Júri desta cidade, às 19: 52 horas, saindo os presentes intimados.

 

Custas na forma da lei.

 

Registre-se, cumpra-se e

 

Comunique-se.

 

Santo André, 16 de fevereiro de2012.

Sentença extraída do site  http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1049958-leia-a-integra-da-sentenca-judicial-que-condenou-lindemberg.shtml.

Os argumentos apresentados na sentença em analise são os quase lógicos mostrando que em tal peça processual o juiz lança mão da lei como instrumento para decisão do conflito. Os argumentos da sentença em tela representaram a sua fundamentação lógica tendo como função formular o entendimento adequado de regras de direito objetivo concernentes a espécie em julgamento.

 

 

 

           

 

           

 

CONCLUSÃO

           

 

Esse estudo demonstrou a indispensabilidade da argumentação na produção do discurso jurídico, seja ele oral ou escrito.

            Observou-se durante todo o trabalho que a argumentação jurídica não tem a pretensão de provar uma verdade inquestionável, ao contrário, ela busca a adesão do auditório.

            Essa adesão é conseguida com o emprego de técnicas argumentativas e com instrumentos linguísticos que de forma coerente torna o discurso mais convincente.

            É fundamental para entender a relevância da argumentação, diferenciar demonstração de argumentação.

            Trata-se de uma grande teoria no campo jurídico, pois permite uma visão de como se dar o convencimento das massas sobre as questões de justiça. Porém, através da teoria da argumentação o paradoxo entre direito e justiça passa a ser desvelado. Pois a argumentação mostra que nem sempre a aplicação pura e simples da lei é a aplicação de justiça.

O grande mérito do emprego de técnicas argumentativas nos discurso jurídico é estabelecer freio entre o legalismo acirrado próprio do positivismo jurídico.

Por fim é pertinente um estudo da argumentação jurídica para o direito pátrio por ela pode funcionar como um instrumento a ser utilizado para diminuir o grande abismo que tem entre o direito e a simples subsunção do fato a norma.

Como contribuição o trabalho deixa claro que é preciso que a formação acadêmica do futuro operador do direito não fique só no aprendizado das normas, do ordenamento jurídico.

É necessário que o futuro profissional da área jurídica consiga aprender a se expressar de forma clara, concisa e coerente os seus conhecimentos jurídicos. Para isso as faculdades de Direito devem dar a devida atenção ao ensinamento da argumentação jurídica nos cursos de Direito.

Portanto o debate esta lançado sobre a indispensabilidade da argumentação na produção do discurso jurídico, pois o futuro operador do direito não tem que ter somente qualidades morais e intelectuais para exercer seu mister. É preciso, sobretudo, dominar no mínimo o vernáculo pátrio, só assim teremos profissionais que saberão produzir discursos coerentes e convincentes de forma a aplicar a justiça a todos que dele necessite.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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[1] . É a união entre a telecomunicação e a informática.

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