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EXTENSÃO DO CURSO DE MEDICINA: IMPERTINÊNCIA E INCONSTITUCIONALIDADE - UMA ANÁLISE À LUZ DA TEORIA DOS LIMITES DOS LIMITES


Autoria:

Antônio Carlos Ferreira Dos Santos Filho


Advogado Criminal Graduado no Centro Universitário Norte Fluminense - UNIFLU (FDC)

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Resumo:

Abordagem objetiva sobre a inconstitucionalidade da Medida Provisória n.º 621/2013, que estendeu em dois anos a duração da graduação em medicina

Texto enviado ao JurisWay em 14/07/2013.



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EXTENSÃO DO CURSO DE MEDICINA: IMPERTINÊNCIA E INCONSTITUCIONALIDADE – UMA ANÁLISE À LUZ DA TEORIA DOS LIMITES DOS LIMITES

 

 

            No último dia nove, entrou em vigor a Medida Provisória n.º 621/2013, que institui o Programa Mais Médicos, estabelecendo, entre outras providências, novo arranjo para graduação em Medicina.

            De efeito, determina o artigo 4.º da norma que o curso de Medicina para os estudantes ingressantes após 1.º de janeiro de 2015 passará a ser composto por dois ciclos, sendo o primeiro equivalente à atual formatação do curso e o segundo “treinamento em serviço” na atenção básica à saúde e em urgência e emergência no âmbito do S.U.S, com duração mínima de dois anos.

            Apesar do conteúdo inusitado, a Medida parece ter sido bem recebida pela população[1], encontrando acolhida também de algumas vozes no meio jurídico[2], o que acreditamos derivar, porém, do seu caráter extremamente recente e da insatisfação despertada pela inegável precariedade que assola o serviço público de saúde brasileiro.

Ao nosso prisma, porém, a Medida Provisória n.º 621/2013 padece de inconstitucionalidades quanto à forma e conteúdo, sobre o que traçamos objetivas considerações nas linhas adiante.

Sob o enfoque formal, a mácula é de fácil constatação, saltando aos olhos a inobservância do requisito da urgência, imprescindível à utilização da via da Medida Provisória (CRFB, Artigo 62).

Isto porque o cenário desolador da saúde pública brasileira, distante de ser quadro recente, constitui situação protraída por longos anos, o que é incompatível com o pressuposto formal em tela.

Ora, a urgência que autoriza a excepcional e atípica atuação legislativa do Poder Executivo é aquela espontânea, causada pela iminência ou atualidade de determinado evento, circunstâncias que não se dessumem de um estado já consolidado de má prestação do serviço público.

Aliás, é bom que se diga que nenhuma das oito laudas da Exposição de Motivos da norma sob análise explicita a existência de urgência, a corroborar nossa argumentação.

Assim, ainda que a questão da saúde básica no Brasil reclame intervenção rápida, parece-nos que a delongada omissão estatal, que perpetuou o decadente funcionamento do serviço, impede que se cogite a presença da premência especial, requisito formal da Medida Provisória.

Assentado o vício de forma, passamos à análise da inconstitucionalidade material da norma, também em breves apontamentos.

A Constituição da República, na esteira de seu espírito garantista, construiu vigoroso arcabouço em torno do trabalho, estabelecendo o livre exercício de qualquer ofício como direito fundamental (CRFB, artigo 5.º, inciso XIII), além de entalhar múltiplas prerrogativas aos empregados e fundar a ordem econômica na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa (CRFB, artigo 170).  

É bem verdade, no entanto, que o próprio constituinte, no inciso XIII do catálogo fundamental, definiu expressamente reserva de restrição legislativa, possibilitando que, por meio de lei, fossem criadas condicionantes ao exercício profissional, o que, a princípio, tornaria possível imaginar que a eventual lei proveniente da Medida Provisória n.º 621/2013 não estaria inquinada de qualquer vício de conteúdo, pois materializadora da exceção traçada pela própria Lei Maior.

A questão das contenções legislativas a direitos fundamentais, todavia, não é tão simplória.

A rigor, à luz da melhor doutrina constitucionalista, constata-se que qualquer direito constitucional possui um núcleo duro, intocável, que não pode ser agredido por outra norma, ainda que se cuide de caso em que há reserva de restrição legislativa, contenção de segundo grau que se denominou “Teoria do limite dos limites”.

Acerca do tema, disserta com clareza Ana Maria D’Ávila Lopes, in verbis:

A garantia do conteúdo essencial é concebida como um limite à atividade limitadora dos direitos fundamentais, isto é, como o “limite dos limites”. O conteúdo essencial atua como uma fronteira que o legislador não pode ultrapassar, delimitando o espaço que não pode ser ‘invadido’ por uma lei sob o risco de ser declarada inconstitucional[3]

Dessarte, aplicando-se a referida teoria ao tema em debate tem-se que, muito embora possível o estabelecimento por meio de lei de condições ao exercício de uma profissão, nenhuma norma infraconstitucional pode conceber requisito que inviabilize o exercício esta, posto que romperia a célula essencial do direito fundamental ao livre exercício profissional.

Com efeito, a Medida Provisória n.º 621/2013, ao estender por mais dois anos a já alongada graduação de Medicina, parece-nos transcender os limites da autorização constitucional, haja vista que, a pretexto de tutelar a saúde pública, em verdade, cria grave óbice à formação de um médico.

Como se sabe, atualmente, a conclusão da formação em Medicina costuma demandar em média doze a quatorze anos, considerando-se o tempo empregado na realização de cursos pré-vestibulares, os seis anos de graduação e os outros seis ou mais não raros despendidos com especializações e residência.

Demais disto, também é de conhecimento geral que mínima parcela da população brasileira ultrapassa o ensino fundamental, obtendo o grau superior (de acordo com recente pesquisa realizada pelo I.B.G.E., apenas 7,9% da população[4]).

Outrossim, especificamente quanto ao curso de Medicina, há os gravames da insuficiência de vagas, destacado, aliás, na própria Exposição de Motivos da Medida Provisória[5], e do custo da graduação em instituições privadas, via de regra além possibilidades financeiras da média populacional.

Nesta ordem de ideias, embora haja muitas outras, parecem-nos bastantes estas premissas para se notar que a formação de um médico já é nas raias atuais algo extremamente excepcional e que, acaso conservada a extensão do curso, findará por beirar o impossível.

Em suma, o teor da medida provisória ensejará sobre a graduação em Medicina evasões, desistências e, por vezes, a própria inviabilidade financeira do curso, tudo a demonstrar ataque ao núcleo essencial da liberdade profissional, em transgressão ao postulado do limite dos limites.

Pior que isto, como corolário deste quadro, tem-se que a Medida Provisória também não conseguirá surtir o efeito pretendido de melhorar o serviço público de saúde, exatamente porque acaba por desestimular a graduação em Medicina.

Em desfecho, duplo é o vício que inquina a impertinente Medida Provisória n.º 621/2013, o que deve, portanto, ser reconhecido, à semelhança do que ocorreu no RE n.º 511.961/SP, que versava sobre a inconstitucionalidade da exigência de curso superior para a profissão de jornalista. 

 


 



[1] Diário da Manhã. População aprova estágio no SUS -Médicos são contra ocupação de 2 anos no SUS, mas população é favorável. Disponível em: .

[2] Atualidades do Direito. Extensão do curso de medicina é polêmica, mas constitucional. Disponível em:

[3] LOPES, Ana Maria D’Ávilla. A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n.º 164, p. 7-15, out/dez.2004

[4] SISTEMAMPA. Segundo o IBGE, 7,9% da população brasileira tem ensino superior completo. Disponível em:

[5] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Exposição de Motivos da Medida Provisória n.º 621, de 8 de julho de 2013. Disponível em:

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