Esta lei torna crime a pornografia e revanche, bem como a publicação de material pornográfico, como fotografias ou vídeos que contenham cenas consideradas pornográficas ou cenas de sexo explícito, se não houver ordem ou autorização da vítima, e dá outras providências.
O Congresso Nacional decreta:
Artigo 1º. Esta lei torna crime a pornografia de revanche, bem como a publicação de material pornográfico, como fotografias ou vídeos que contenham cenas consideradas pornográficas ou cenas de sexo explícito, se não houver ordem ou autorização válida e expressa da vítima.
Art. 2º. Caracteriza-se pornografia de revanche a distribuição, a difusão, a divulgação, a disponibilização, o oferecimento, a publicação, a proporção, a troca, a exibição, a transmissão, a entrega, a alienação ou a cessão, ainda que gratuitamente, com finalidade de vingança, por qualquer meio, de material pornográfico, como fotografias ou vídeos, originais, editados ou falsificados, obtidos no âmbito de relações domésticas, ou obtidos em razão da manutenção de algum relacionamento amoroso, afetivo ou de confiança, com ou sem habitualidade, se não houver a devida ordem ou autorização prévia, expressa, vigente e válida da vítima, acompanhada ou não de outras formas de violência.
Art. 3º. É válida a publicação e a difusão de material pornográfico se a finalidade for a obtenção de lucro, ou quando há finalidade artística, educativa ou cultural, desde que colhido o prévio, expresso e válido consentimento da pessoa com intimidade exposta.
Parágrafo único. É ilícita a distribuição, a difusão, a divulgação, a disponibilização, o oferecimento, a publicação, a proporção, a troca, a exibição, a transmissão, a entrega, a alienação ou a cessão, ainda que gratuitamente, de material pornográfico envolvendo criança, adolescente ou quando envolve pessoa incapacitada de consentir por si, por qualquer outra causa, transitória ou permanente, nos termos da lei civil.
Art. 4º. Distribuir, difundir, divulgar, disponibilizar, oferecer, publicar, proporcionar, trocar, exibir, transmitir, entregar, alienar ou ceder, ainda que gratuitamente, por qualquer meio, qualquer material pornográfico que envolva alguém que, para tanto, não tenha dado o seu consentimento:
Pena - Reclusão, de dois a oito anos, e multa.
§1º. A pena é aumentada de um a dois terços:
I - se o crime é praticado na presença de três ou mais pessoas, ou por meio que facilite a divulgação do material pornográfico;
II - se o material pornográfico for o resultado de uma edição ou falsificação;
III - se o agente valer-se de conta ou perfil falsos, em qualquer rede social, ou de página falsa hospedada na internet, para a prática do crime;
IV - se o crime for praticado por ascendente, descendente, irmão ou irmã, cônjuge, companheira ou companheiro da vítima, ou se o agente manteve ou mantém algum relacionamento amoroso, afetivo ou de confiança, com ou sem habitualidade, com a vítima, presente ou não a intenção de vingança;
V - se o agente induziu ou manteve a vítima em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento, para obter, para si ou para outrem, o material pornográfico;
VI - se do crime resulta danos de natureza material para a vítima.
VII - se a vítima é criança, adolescente, portadora de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não tendo o necessário discernimento para a prática do ato, ou se, por qualquer outra causa, transitória ou permanente, seja incapaz de oferecer resistência;
§ 2º. Se a vítima, em razão do crime, tenta suicidar-se.
Pena - reclusão, de três a dez anos, e multa.
§3º.Se a vítima, em razão do crime, suicidar-se.
Pena - reclusão, de quatro a doze anos, e multa.
§4º. Entende-se como material pornográfico qualquer fotografia ou vídeo, original, editado ou falsificado, ou qualquer outra forma de representação visual, ainda que impressa ou digitalizada, quando contém cena considerada pornográfica ou que registre ato de natureza sexual ou de sexo explícito.
§5º. O crime pode ser praticado através de qualquer meio de comunicação ou de armazenamento de dados, como um sistema de informática, telemático, de telefonia móvel, internet, ou através da entrega de discos ou cartões de memória, ou mesmo através de material impresso ou digitalizado.
§6º. O consentimento a que se refere o caput, para a exclusão da tipicidade da conduta, deve ser prévio, expresso, vigente e válido.
Art. 5º. Nos casos do art. 4º, caput, e §1º, incisos I a VI, somente se procede mediante representação.
Art. 6º. O juiz poderá ordenar ao provedor de serviço de e-mail, perfil de rede social, de hospedagem de site, de hospedagem de blog, de telefonia móvel ou qualquer outro prestador do serviço de propagação de informação, que remova, no prazo que indicar, o conteúdo que viola a intimidade da vítima, sob pena de multa.
Parágrafo único. Poderá o juiz estipular que a multa prevista neste artigo seja revertida em favor da vítima.
Art. 7º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificação / Exposição de Motivos
Com a ascensão da internet e suas tecnologias, as informações percorrem o mundo "virtual" de uma maneira rápida e fácil, mas se essas informações não forem controladas, danos por ser acarretados para muitas pessoas, danos estes muitas vezes irreparáveis, de que é exemplo a PORNOGRAFIA DE REVANCHE.
Por essa razão foi criado na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, campus Toledo, no Curso de Direito, o Grupo de Estudos e Prática em Direito Penal, sob a orientação do Professor Mestre José Roberto Moreira, que também é Promotor de Justiça no Estado do Paraná. O grupo teve suas atividades coordenadas pela acadêmica do citado curso, Jaqueline Aparecida Sampaio Serrute, tendo ainda como integrantes: Gabriele Casagrande, Izabelli Pacheco, Josiellen Kolling, Julia Paludo, Karen Umetsu, Kelly Correa, Larissa Luquine, Matheus Rohde, Mayte Schwingel, Paul Ricard e Rhaquel Tessele. O grupo foi constituído com o principal objetivo de estudar a pornografia de revanche, encontrar e apresentar soluções, notadamente para que, quiçá, seja criminalizada tal conduta.
Com o auge das redes sociais, uma foto ou vídeo com teor pornográfico podem ser divulgados de várias maneiras, muitas vezes sem a autorização da pessoa com intimidade exposta. Ao se tratar da pornografia de revanche, o material pornográfico, na maioria das vezes, é feito pela própria vítima ou em conjunto com o agressor, por conta de um relacionamento afetivo, amoroso ou de confiança. A publicação do material considerado pornográfico, sem autorização da vítima, só tem um objetivo: a VINGANÇA.
Geralmente a vingança ocorre após o fim do relacionamento, constituindo a principal causa desse crime. Muitas vezes o casal ou a pessoa se vê intimidada a tirar uma foto íntima ou a fazer um vídeo íntimo para agradar o parceiro enquanto o relacionamento está estável, mas, após o fim do relacionamento, aquele que não está contente com o seu término acaba divulgando essas fotos e vídeos íntimos para denegrir a imagem da vítima.
Após a publicação deste material a vítima sofre danos irreparáveis em sua dignidade, honra e intimidade. É indiscutível que a imagem de alguém nu em poses sensuais, ou na prática de sexo, pode ser considerada uma vergonha, quando a vítima não dá o seu consentimento prévio e válido. Por isso, o agressor, para denegrir a imagem da vítima, utiliza-se deste material para se vingar.
Com a pesquisa ficou constatado que, antes da publicação do material pornográfico, costuma ocorrer várias ameaças, onde o agressor chantageia, persegue e abusa da vítima para obter vantagem, ou pelo simples fato de querer voltar ao relacionamento, mesmo que mediante constrangimento. Desde esse momento em diante a vítima já está sofrendo a violência psicológica, a qual, muitas vezes por vergonha dos julgamentos dos outros, é oculta da comunidade e de seus parentes e amigos mais próximos.
No Brasil consumaram-se inúmeros casos de pornografia de revanche, muitos não denunciados por vergonha ou medo da vítima. Um dos casos que chamou a atenção foi o de uma adolescente de 16 anos que cometeu suicídio em sua própria casa utilizando-se do "fio da chapinha", após a divulgação não autorizada de seu vídeo íntimo. Onde a vítima provou a sua dor e lesão psicológica quando se utilizou de uma rede social para expressar os seus sentimentos de dor e angústia.
O grupo de estudos vem fazendo uma campanha de prevenção a essa conduta, para educar os hábitos das pessoas com o trato com a internet, como forma de reduzir o número de vítimas, para ensinar como se leva a notícia desse ilícito a conhecimento da autoridade competente, bem como para orientar as pessoas a não divulgar esse tipo de material e dar apoio para a vítima. Essa campanha ocorreu em vários colégios da Região Oeste do Paraná, tendo como público-alvo adolescentes de 12 a 18 anos. Aconteceu diretamente nas escolas, pois estas também precisam intervir e abrir espaços de diálogo, já que geralmente ficam abismadas e perdidas.
Essa lei não tem a intenção de punir somente a pessoa que fez a divulgação inicial da foto ou vídeo, mas, também aqueles que compartilham, divulgam, trocam, disponibilizam, publicam ou vendem o material pornográfico, com consciência de que a pessoa ali exposta não deu o seu devido consentimento.
Sabe-se que em muitos casos as fotos e vídeos são feitos através de uma relação afetiva e de confiança, abarcando o âmbito doméstico, mas a divulgação deste material está além desta relação, por isso aquele que de alguma forma contribui para a divulgação do material pornográfico sem autorização da vítima deve ser punido.
E também deverá ser punido quem obter o material pornográfico fora de uma relação doméstica, como, por exemplo, através de câmera instalada num banheiro público, não se punindo apenas a pornografia de revanche, conforme o artigo a seguir (grifo nosso):
Art. 4º. Distribuir, difundir, divulgar, disponibilizar, oferecer, publicar, proporcionar, trocar, exibir, transmitir, entregar, alienar ou ceder, ainda que gratuitamente, por qualquer meio, qualquer material pornográfico que envolva alguém que, para tanto, não tenha dado o seu consentimento:
Pena - Reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Além disso, incluem-se as causas de aumento de pena, para uma adequada individualização da pena, quando o fato reveste-se de circunstâncias mais graves, conforme consta nos seguintes trechos:
Art. 4º. §1º. A pena é aumentada de um a dois terços:
I - se o crime é praticado na presença de três ou mais pessoas, ou por meio que facilite a divulgação do material pornográfico;
Fez-se esta proposta com o objetivo de proteger a vítima da fácil propagação de suas fotos e vídeos. Muitas vezes o agressor, além de chantagear a vítima, envia a foto para outras pessoas de forma que este material se torne público de uma maneira muito rápida, podendo ser citado, como exemplo: enviar foto ou vídeo para grupos de whatsapp ou facebook. Não é preciso esperar muito tempo para que várias pessoas já tenham o devido conhecimento das fotos e vídeos.
II - se o material pornográfico for o resultado de uma edição ou falsificação;
Com os programas de edição de fotos e vídeos tornou-se fácil a edição e falsificação destes. São necessárias algumas noções básicas sobre o devido programa para se editar ou falsificar uma foto ou vídeo, de forma que o resultado final seja a imagem da pessoa nua ou em poses sexuais, ou ainda na prática de atos sexuais, expondo uma vítima que sequer forneceu para o agressor material pornográfico.
III - se o agente valer-se de conta ou perfil falsos, em qualquer rede social, ou de página falsa hospedada na internet, para a prática do crime;
A proposta deste aumento de pena está justificada na realidade, de que é exemplo o caso da Thamiris Mayumi Sato, de 21 anos, que denunciou o ex-namorado, um búlgaro de 26 anos, estudante na USP, por colocar no ar as suas fotos íntimas em um perfil falso no Facebook e ameaçá-la de morte após o fim do namoro (Fonte: Jornal do Campus USP, publicado em 7 de dezembro de 2013). O agressor, nesses casos, vale-se da facilidade em criar um perfil em uma rede social, um site falso, para divulgar as imagens da vítima, fazendo parecer que foi a própria vítima quem postou o material pornográfico, aumentando a exposição da intimidade da vítima.
IV - se o crime for praticado por ascendente, descendente, irmão ou irmã, cônjuge, companheira ou companheiro da vítima, ou se o agente manteve ou mantém algum relacionamento amoroso, afetivo ou de confiança, com ou sem habitualidade, com a vítima, presente ou não a intenção de vingança;
Essa conduta, na maioria dos casos é praticada por cônjuges, ex-cônjuges, ex-namorados ou ex-companheiros, que se valem da condição de coabitação ou de hospitalidade para obter tais registros, divulgando-os em redes sociais como forma de constrangimento à vítima. A circunstância que justifica o aumento de pena é clara, pois, nessas condições estará presente a confiança, ainda que por breve tempo, a qual é quebrada pelo agressor. Essa confiança deixa a vítima desprotegida, fazendo com que o agressor seja merecedor de pena mais elevada.
V - se o agente induziu ou manteve a vítima em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento, para obter, para si ou para outrem, o material pornográfico;
Nesse inciso a pretensão é punir rigorosamente o agente que engana ou leva a vítima em erro para ter a posse da foto ou vídeo. Ao se analisar os inúmeros casos de pornografia de revanche, ficaram constatados que os relacionamentos eram abusivos e que muitas vezes as fotos e vídeos eram feitos após muita insistência do agressor, muitas vezes "como uma prova de amor e confiança".
VI - se do crime resulta danos de natureza material para a vítima.
Em outubro de 2013, a estudante Goiana Francyelle Santos, mais conhecida como Fran, ficou famosa após um vídeo em que fazia sexo com um rapaz ter se espalhado rapidamente pelo aplicativo de celular Whatsapp (Fonte: Jornal do Campus USP, publicado em 7 de dezembro de 2013). A jovem fez um boletim de ocorrência contra o companheiro e garante que parou de trabalhar e estudar por causa do assédio que sofria ao sair de casa. Além do assédio, que pode fazer a vítima abandonar a sua vida profissional, pode, no caso concreto, verificar-se causar danos emergentes e lucros cessantes por conta da exposição da imagem da vítima.
VII - se a vítima é criança, adolescente ou portadora de doença mental, ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não tendo o necessário discernimento para a prática do ato, ou se, por qualquer outra causa, transitória ou permanente, seja incapaz de oferecer resistência;
É sabido que a criança, adolescente ou pessoa com doença mental, ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ou mesmo que esteja, por qualquer outra causa, ainda que transitória, incapaz de oferecer resistência, não tem, naquele momento, capacidade para decidir sobre o que é correto para sua vida, de modo que não tem noção das implicações que uma foto ou vídeo pornográfico pode acarretar para a sua vida. Deve-se punir rigorosamente quem se utiliza desta incapacidade para se obter este material, já que se vale de vítima mais vulnerável.
§ 2º. Se a vítima, em razão do crime, tenta suicidar-se.
Pena - reclusão, de três a dez anos, e multa.
§3º. Se a vítima, em razão do crime, suicidar-se.
Pena - reclusão, quatro a doze anos, e multa.
A tentativa e a prática do suicídio das vítimas de pornografia de revanche devem ser tratadas com tamanha rigorosidade que a pena impõe. Esta prática é resultado da exposição da vítima como culpada pelo crime que sofreu. Muitas das vítimas tentam e conseguem cometer o suicídio para se esconder e não envergonhar a família. Muitos dos relatos demonstram o abalo psicológico da vítima ao ponto de atentar contra a própria vida. Por isso, quando a vítima tenta ou comete o suicídio este crime deve ser apenado de acordo com a brutalidade das consequências.
As vitimas de pornografia de revanche sofrem muito quando esse material se dissemina nas redes sociais, ficam marcados e pagam um preço muito alto. Após a exposição da intimidade as vítimas são apedrejadas, sofrem preconceito, muitas dessas vítimas têm que mudar de cidade, deixar a escola, trabalho e vida social. Ao se olhar de 'fora' pensa-se que após se desconectar da internet fica tudo bem, mas não é assim, pois a vítima sofre e tende a ter pensamentos suicidas.
Após o estudo da realidade, o grupo de estudos e prática em Direito Penal resolveu minutar esse projeto de lei, para que, se ganhar a adesão de um membro do legislativo federal, seja discutido, com posterior deliberação pelo Congresso Nacional e, quiçá, aprovado. Espera-se, assim, que condutas criminosas como essas não sejam repetidas de forma tão bruta e dolorosa para a vítima, a qual muitas vezes está vulnerável por não haver a punição do agressor, justamente pela falta de um crime e de uma lei específica para protegê-la.