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 Sala dos Doutrinadores - Opinião
Monografias Direito de Família

Uniões poliafetivas: a necessidade de reconhecimento no Brasil

O presente artigo visa discutir sobre a necessidade de reconhecimento das uniões poliafetivas pelo ordenamento jurídico, esclarecendo as diferenças entre essas relações e poligamia.

Texto enviado ao JurisWay em 03/04/2017.

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UNIÕES POLIAFETIVAS: A NECESSIDADE DE RECONHECIMENTO NO BRASIL


Laís de Oliveira Pimentel

Graduanda em Direito pela FAFRAM.

 Palavras-chave: Uniões poliafetivas; Reconhecimento; Evolução Social.

 

INTRODUÇÃO

A sociedade vive em constante evolução e, por conta disso, o Direito deve seguir essas mutações e criar novos institutos que consigam acompanhar esse desenvolvimento social. Nós, seres humanos, dotados de peculiaridades que nos tornam diferentes uns dos outros, necessitamos que o ordenamento jurídico estabeleça regras, de acordo com a observâncias desses múltiplos comportamentos, para que todos, sem exceção, sejam protegidos pela lei. Segundo Maria Berenice Dias,

[...]o Direito visa abarcar todas as situações fáticas em seu âmbito de regulamentação. Daí a instituição de modelos preestabelecidos de relações juridicamente relevantes, a sustentar o mito da completude do ordenamento. Entretanto, ainda que a lei tente prever todas as situações dignas de tutela, as relações sociais são muito mais ricas e amplas do que é possível conter uma legislação. (DIAS, 2015, p.28)

Caso não exista, em determinadas situações, regras positivadas que a abranjam, não é permitida a omissão do judiciário em face destas, incumbindo ao juiz exercer a função de legislador, dentro dos limites estabelecidos, utilizando-se das fontes do direito, a fim de preencher essas lacunas existentes na legislação, conforme previsto no art. 4º, LINDB, pois a ausência de lei não significa dizer ausência do direito (DIAS, 2015).

A importância dessa abordagem está diretamente relacionada com o tema que será abordado ao decorrer deste trabalho, pois a mudança das pessoas no modo em que se relacionam em sociedade, levou ao surgimento de relacionamentos que não se encontram previstos em nossa legislação, forçando nosso Poder Judiciário posicionar-se frente a elas, uma vez que estão, a cada dia que passa, mais presentes em nosso cotidiano.

As polêmicas “uniões poliafetivas” têm causado certo reboliço, não só no meio jurídico, mas também no meio social, tendo em vista que o conservadorismo tradicionalista ainda se encontra enraizado em nossa cultura. Porém, gostando ou não, essas uniões estão fazem parte de nossa realidade, e não adianta dar de ombros, pois, como dito anteriormente, é necessário que o Direito acompanhe todos os tipos de situações, já que elas são, também, dignas de tutela.

O objetivo deste trabalho é discutir sobre a necessidade da implementação de políticas públicas para o reconhecimento e proteção das uniões poliafetivas no Brasil, analisando, de forma sucinta, as problemáticas que envolvem o assunto. Para tanto, foi realizada uma revisão bibliográfica crítica, com o uso de artigos científicos, fontes do Direito e livros para a execução da pesquisa bibliográfica.

FAMÍLIAS: NOVOS ARRANJOS E O RECONHECIMENTO DA UNIÃO POLIAFETIVA

A família é um dos institutos mais antigos da civilização, sendo considerada a base da sociedade, estando ligada diretamente às transformações sociais, recebendo, por isso, uma relevante proteção estatal, conforme previsto no art. 226 da CF/88.

A partir daí, vemos o importante avanço da nossa legislação, pois, em contraposição ao Código Civil de 1916, no qual retratava de forma discriminatória, que família era só aquela reconhecida pelo matrimônio, após a promulgação da Constituição Federal em 1988, foram reconhecidas, também, as uniões estáveis e os núcleos familiares formados por qualquer dos pais e seus descendentes (monoparentalidade).

O Estado se viu obrigado a proteger todos os tipos de uniões, principalmente as poliafetivas, isto é, aquelas decorrentes da união de vários afetos, pois elas também necessitam de aparato jurídico.

Em 2012, foi divulgada a notícia de que havia sido realizada a escritura reconhecendo a união entre um homem e duas mulheres, na cidade de Tupã, localizada no interior de São Paulo. A primeira do país, segundo a tabeliã Cláudia do Nascimento Domingues que realizou o feito. Esse acontecimento foi visto por muitos como inexistente, indecente e totalmente contrário à moral e os bons costumes. Entretanto, é uma realidade que existe e muitos procuram não ver. Conforme leciona Maria Berenice,

Negar a existência de famílias poliafetivas como entidade familiar é simplesmente impor a exclusão de todos os direitos no âmbito do direito das famílias e sucessório. Pelo jeito, nenhum de seus integrantes poderia receber alimentos, herdar, ter participação sobre os bens adquiridos em comum. (DIAS, 2015, p. 139).

A cartorária protagonista deste acontecimento afirmou que considera que não se trata de um casamento eis que, civilmente são pessoas solteiras. Entende não passar de um contrato entre três pessoas, não existindo proibição expressa na Lei de uma união estável envolvendo mais de duas pessoas, advertindo que para o Direito Privado aquilo que não é proibido lhes é permitido. 

O que pretendeu a cartorária foi conferir a essa união os mesmos direitos atribuídos à união estável, a fim de conferir igualdade aos protagonistas deste episódio, tendo em vista que a lei é omissa quanto à questão, não a proibindo expressamente.

BIGAMIA, UNIÃO POLIAFETIVA E MONOGAMIA À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

É muito comum que confundam a bigamia com a união poliafetiva, pois a linha que as separam é tênue, porém, não é difícil se identificar as diferenças entre ambas. O Código Civil, em seu art. 1521, inciso VI, veda expressamente o casamento de pessoas que já contraíram matrimônio. Isto é, pessoas já casadas não podem se casar novamente, sendo defeso a bigamia no ordenamento jurídico brasileiro.

O Código Penal tipificou a conduta como sendo criminosa, conforme previsão expressa em seu art. 235, caput, punindo com pena de reclusão, de dois a seis anos, quem contrair, sendo casado, novo casamento. Conforme aborda Rogério Sanches Cunha, o que se tutela aqui é o casamento monogâmico (ordem jurídica matrimonial) e, consequentemente, a organização da família, considerada a base da sociedade (CUNHA, 2016).

É nesse ponto que a bigamia e as uniões poliafetivas se diferem, uma vez que na primeira é necessário que uma pessoa já casada contraia outro casamento e a segunda, nada mais é que, três ou mais pessoas, não casadas, vivendo juntas em união estável.

Friedrich Engels diz em sua obra “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” que:

[...] A monogamia não aparece na história, portanto, absolutamente, como uma reconciliação entre o homem e a mulher e, menos ainda, como a forma mais elevada de matrimônio. Pelo contrário, ela surge sob a forma de escravização de um sexo pelo outro, como proclamação de um conflito entre os sexos, ignorado, até então, na pré-história. Num velho manuscrito inédito, redigido em 1846 por Marx e por mim, encontro a seguinte frase: "A primeira divisão do trabalho é a que se fez entre o homem e a mulher para a procriação dos filhos”. Hoje posso acrescentar: o primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre o homem e a mulher, na monogamia; e a primeira opressão de classes, com a opressão do sexo feminino pelo masculino. A monogamia foi um grande progresso histórico, mas, ao mesmo tempo, iniciou, juntamente com a escravidão e as riquezas privadas, aquele período, que dura até nossos dias, no qual cada progresso é simultaneamente um retrocesso relativo, e o bem-estar e o desenvolvimento de uns se verificam às custas da dor e da repressão de outros. É a forma celular da sociedade civilizada, na qual já podemos estudar a natureza das contradições e dos antagonismos que atingem seu pleno desenvolvimento nessa sociedade. (ENGELS, 1884, s.p).

Há tempos, a monogamia é vista como padrão, pois é considerada é um valor socialmente consolidado e historicamente acolhido. Por isso há a dificuldade em aceitação de outras formas de relacionamento que não sigam esses critérios.

Todavia, como os institutos da bigamia e união poliafetiva não se confundem, não podemos atribuir ao segundo sua inconstitucionalidade ou proibição, uma vez que o que se proíbe legalmente é o casamento de pessoa já casada e não a convivência em união estável entre três ou mais pessoas.

CONCLUSÃO

Família é o que se forma pelo amor familiar, ou seja, o amor que vise a uma comunhão plena de vida de forma pública, contínua e duradoura. Conforme afirmado pelo Ministro Fux no julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277, que:

O que faz uma família é, sobretudo, o amor – não a mera afeição entre os indivíduos, mas o verdadeiro amor familiar, que estabelece relações de afeto, assistência e suporte recíprocos entre os integrantes do grupo. O que faz uma família é a comunhão, a existência de um projeto coletivo, permanente e duradouro de vida em comum. O que faz uma família é a identidade, a certeza de seus integrantes quanto à existência de um vínculo inquebrantável que os une e que os identifica uns perante os outros e cada um deles perante a sociedade. Presentes esses três requisitos, tem-se uma família, incidindo, com isso, a respectiva proteção constitucional.

As uniões poliafetivas são realidade em nosso país e elas também merecem a devida proteção em nosso ordenamento jurídico. O maior problema para que essa questão seja pacificada é fazer com que uma sociedade extremamente conservadora como a nossa as vejam como elas realmente são, uma forma real de relacionamento entre pessoas que se amam, pois é possível que uma pessoa ame duas ou mais ao mesmo tempo.  

É necessário a implementação de políticas públicas em nosso país para que os direitos dessas famílias sejam protegidos, observando os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da pluralidade das entidades familiares, da afetividade e da felicidade.

Não é justo que os que convivam nessa situação continuem na clandestinidade, por isso o Estado, como órgão responsável pela seguridade e proteção dos direitos de todos, deve reconhecer essa nova forma de relacionamento, conscientizando a população de que essa situação já faz parte de nosso cotidiano, tentando fielmente desconstruir os preconceitos enraizados em nossa cultura, que apenas considera como modelo convencional, aquela família formada por pai, mãe e filhos.

Diante a inércia do Poder Judiciário acerca do tema, as pesquisas realizadas com o intuito de desmitificar a promiscuidade e imoralidade que assolam o assunto restam-se, de certo modo, prejudicadas. Por isso, é necessária maior participação do referido órgão judiciário para colaborar com a ruptura e desconstrução desses paradigmas tão atuais.

A metamorfose social que não para de acontecer nem sequer um minuto precisa ser protegida pelo Direito, a fim de que não seja permitida a prática de injustiças às pessoas que mereçam, sem exceções, o mesmo aparato legal e reconhecimento que outras têm.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal, parte especial (arts. 121 ao 361). 8. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2016.

VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. União estável poliafetiva: constitucionalidade. Revista Jus Navigandi. Teresina, ano 17, n. 3395, 2012. Disponível em: . Acesso em: 2 nov. 2016.

VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti.  Famílias paralelas e poliafetivas devem ser reconhecidas pelo Judiciário. Revista Consultor Jurídico. São Paulo, 2014. Disponível em: . Acesso em: 2 nov. 2016.

TIZZO, Luís Gustavo Liberato; BERTOLINI, Priscila Caroline Gomes. Das uniões poliafetivas hoje: uma análise à luz da publicização do privado e do acesso à justiça. Revista Publica Direito. São Paulo. Disponível em: . Acesso em 2 nov. 2016.

SÁ, Camila Franchi de Souza; VIECILI, Mariza. As Novas Famílias: Relações Poliafetivas. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, v. 5, n.1, 2014. Disponível em: . Acesso em 2 nov. 2016.

 ENGELS, Friedrich. A Origem da família, da propriedade privada e do Estado. Rio de Janeiro: Editora Vitória, 1964. Disponível em . Acesso em 2 nov. 2016. 

Importante:
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