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POR MICHEL ALECRIM
Rio - Fenômenos atípicos no clima não estão causando apenas flagelos aos desabrigados nas regiões afetadas. As catástrofes recentes no País também prejudicaram a produção de alimentos, aumentando os preços e pressionando a inflação este ano. Leite, batata, tomate, açúcar, feijão carioca e arroz estão entre os produtos que mais tiveram subida de preços. O Rio de Janeiro é um dos estados em que os valores sofreram com altas, o que fixou os índices locais acima dos do País.
Segundo o IBGE, os itens alimentação e bebidas foram os principais responsáveis pela alta de preços. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) — que mede o custo de vida das famílias com renda até 40 salários mínimos (R$ 20.400) — ficou em 2,65% nos quatro primeiros meses do ano, o que acendeu o sinal de alerta no Banco Central. Só o grupo dos alimentos contribuiu com 1,17 ponto percentual para o índice. No Rio, a inflação foi ainda maior (3,28%), sendo que 1,32 ponto percentual veio da alimentação, que ficou 5,83% mais cara.
A alta desses produtos tem peso maior para as famílias de baixa renda. Tanto que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), limitado a quem ganha até seis salários mínimos (R$ 3.060), foi ainda mais elevado: chegou a 3,05%, no País, e 3,55%, no Rio. Os fluminenses que se situam nessa faixa de renda estão gastando 6,38% a mais com a alimentação da família.
O produto que mais encareceu o custo de vida este ano foi o leite, pelo peso que tem no orçamento. O alimento é considerado essencial, principalmente para as crianças, e as famílias são obrigadas a reorganizar as despesas para que ele não falte na geladeira.
A queda na produção foi provocada por chuvas em excesso nas regiões produtoras de São Paulo e estiagem em Minas Gerais, o que não é normal no verão. Como no outono é normal a baixa produtividade, vai demorar para os preços voltarem aos níveis anteriores.
Elevação do preço do leite foi a mais intensa desde 95
A crise na produção de leite é uma das piores dos últimos anos. Levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da unidade da USP de Piracicaba mostra que, desde 1995, o preço ao produtor nunca tinha tido alta tão forte como a verificada no primeiro quadrimestre deste ano.
O carioca, por exemplo, está pagando quase 30% a mais pelo leite pasteurizado. O produto também pressiona derivados, que não subiram tanto por influência dos importados, mas o café da manhã e o lanche foram impactados. Por conta da importância do leite para a alimentação, os consumidores enfrentam dificuldade em substituí-lo. O técnico em laboratório Paulo Henrique da Silva, 42 anos, lamenta o aumento. “Tenho uma mãe idosa, que precisa desse alimento. Não tenho como substituir. O que faço é comprar o mínimo possível, esperando uma promoção”, conta o consumidor.
Já a dona de casa Ana Paula Silva Santos, 36 anos, prefere diminuir seu consumo a cortar o leite da filha: “Eu troco por um suco, mas ela não pode ficar sem ele”. As maiores variações percentuais, no entanto, foram do tomate (72,52%) e a batata inglesa (65,69%) — lavouras duramente castigadas pelas chuvas.
Pesquisa e mudança de cardápio
Com o clima é imprevisível, para driblar as altas de preços dos alimentos, as famílias precisam, muitas vezes, mudar seu cardápio. Segundo o economista André Braz, do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia) da FGV, a tendência é que os preços se normalizem, mas o consumidor tem importante papel. Além de pesquisar, é preciso tentar substituir produtos para influenciar a lei de oferta e procura. “Se o consumidor exercitar para valer seu poder, evita aumentos abusivos”, explica.
O Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) da Unicamp, além de desenvolver trabalhos na área, busca auxiliar os agricultores com informações. A diretora Ana Maria Ávila admite, no entanto, que há situações em que as perdas são inevitáveis. É o caso das inundações que atingiram plantações de batata, estragadas no verão, prejudicando a colheita agora no outono. A laranja também teve sua floração prejudicada, refletindo nos preços. A banana é outro exemplo disso.
“Tivemos em 2009 e início de 2010 um período bastante atípico. O inverno passado já foi marcado por chuvas fortes, o que não é típico. Mas é cedo para afirmar que as mudanças vieram para ficar. O que ocorreu mostra é quanto somos vulneráveis às alterações climáticas”, afirma a pesquisadora.
O professor do Departamento de Meteorologia da UFRJ Isimar Santos ressalta o fato de que a “loucura” no tempo não ocorreu só no Brasil. Várias partes do mundo foram afetadas por fenômenos atípicos. Segundo ele, o quadro condiz com o que cientistas preveem para as próximas décadas com o aquecimento global.
“Ainda não temos certeza, mas o que está acontecendo pode ser prenúncio de consequências do efeito estufa. As plantas são muito sensíveis às alterações e sentiriam efeitos diretamente. As consequências econômicas seriam drásticas”, alerta.
Já o presidente da Bolsa de Gêneros Alimentícios do Mercado São Sebastião, José de Sousa, critica o peso dado aos alimentos na inflação. Segundo ele, o brasileiro tem comprometido pouco da sua renda com a alimentação. “Já culparam o xuxu pela inflação, depois foi a vez do tomate. O problema são os impostos”, disse.
A comerciante Vandersi Fiúza, 47 anos, diz que tem dificuldade para se adaptar à falta de alguns produtos. “Podemos trocar uma verdura por outra, mas todos os meus temperos levam tomate”, explica.
A aposentada Maria Tercília de Sá, 65, também sente no bolso os efeitos do clima: “Compro um pouco menos, passo o cartão, parcelo, seleciono melhor. Mas não tenho como abrir mão de alguns produtos”.
Substituição sem perda de nutrientes
A substituição de alimentos que estão temporariamente mais caros por outros que contêm os mesmos nutrientes pode ser alternativa para equilibrar o orçamento sem prejudicar a qualidade de vida. A nutricionista Wilma Amorim ensina que a melhor saída é trocar de vegetais que pertencem ao mesmo grupo. “Variar o cardápio é sempre bom. A batata, por exemplo, pode ser substituída por um creme de milho. Já o arroz rende mais que o macarrão. Por isso, é importante dosar o uso na quantidade certa”, diz Wilma.
Apesar de mais barato, ela não indica o consumo de macarrão instantâneo: “É pré-cozido na gordura e jamais deve substituir o arroz”. Já o tomate, que teve importante contribuição para a inflação, pode ser substituído nas saladas pela beterraba. A nutricionista lembra que o licopeno, antioxidante encontrado principalmente no tomate, também está na melancia e goiaba.
Segundo ela, o leite não pode faltar na cesta básica. O iogurte e o queijo até poderiam substituir o produto, mas são caros. “O leite é a principal fonte de cálcio do ser humano. Não adianta economizar agora e ficar doente depois”, ressalta.