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Utilização de provas ilícitas na persecução penal


Autoria:

Laís Moreschi

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Resumo:

Esse artigo foi elaborado pelos alunos Laís Moreschi, Matheus Fernandes, Marco Antonio Fonseca, Panmella Pires e Rachel Souza do 5º Período da Faculdade UNIPAC - Uberlândia.

Texto enviado ao JurisWay em 25/05/2012.

Última edição/atualização em 28/05/2012.



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Utilização de Provas Ilícitas na Persecução Penal 

Sumário:

1. Introdução 2. Provas 3. Persecução Penal 4. Direitos constitucionais tutelados 5. Direitos da vítima 6. Direito de punir do Estado 7. Direito a liberdade do réu 8. Lei 11.690/08 - Alteração do CPP, Título VII 9. As provas lícitas no Direito Processual Penal 10.  Doutrina 11. Jurisprudencia 12. As provas ilícitas no direito comparado 13. Conclusão.  

1.    INTRODUÇÃO

 O tema do presente trabalho é de grande importância para a proteção efetiva dos direitos e garantias individuais, pois trata de uma limitação no que se refere ao direito à prova. É de importante relevância também, no contexto sócio-jurídico, pois confronta os direitos e garantias individuais, com direitos de outros indivíduos e direitos e garantias da coletividade.

Apesar de a vedação da utilização de provas ilícitas no processo, estar prevista expressamente na Constituição Federal de 1988, tem sido polêmica a interpretação de seu art. 5º, inciso LVI[1], já que, não raras vezes, faz-se necessário que as provas ilícitas ao serem levadas a apreciação do magistrado, sejam por este confrontadas com outros direitos materiais mais importantes que a referida norma.

O trabalho esclarecerá os diferentes pontos entre a admissibilidade das provas ilícitas no processo penal e sua vedação, buscando a forma mais adequada para a interpretação do princípio constitucional, estabelecendo um equilíbrio que resguarde tanto os direitos e garantias individuais como os da coletividade.

Inicialmente, será apresentada a teoria da prova, tratando do seu conceito e classificações, bem como da sua diferença com a prova ilegítima. Será abordada também a teoria da persecução penal com suas determinadas fases.

Em seguida, serão apresentadas as garantias individuais, as garantias estruturais e as garantias do processo penal, dentre os direitos constitucionais tutelados, explicando de forma geral, cada uma das garantias. Além disso, serão confrontados os direitos da vítima, com o direito à liberdade do réu e o direito de punir do Estado.

Posteriormente, serão expostas as jurisprudências e as correntes doutrinárias acerca da inadmissibilidade da prova ilícita, bem como as correntes doutrinárias que defendem a admissibilidade, adentrando a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada e a Doutrina da proporcionalidade.

Finalmente, será exposta a correlação com outros países, demonstrando a teoria adotada por eles quanto à utilização de provas ilícitas e a conclusão do grupo acerca do tema tratado.

 2.         PROVAS

             De acordo com o dicionário da língua portuguesa, prova é “aquilo que serve para estabelecer uma verdade por verificação ou demonstração, ou ainda aquilo que mostra ou confirma a verdade de um fato”.

Levando em consideração este conceito, será abordada a prova utilizada durante a persecução penal, pois é através dela que se forma o convencimento do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa.

            Ao conceituar prova, Greco Filho escreveu em sua obra que, “A prova é todo elemento que pode levar o conhecimento de um fato a alguém. O direito processual regula os meios de prova, que são instrumentos que trazem os elementos de prova aos autos. No processo, a prova é todo meio destinado a convencer o juiz a respeito da verdade de uma situação de fato. A palavra ‘prova’ é originária do latim probatio, que por sua vez emana do verbo probare, com o significado de examinar, persuadir, demonstrar”. (2010, p. 185/186)

            Quanto ao objeto da prova, Greco Filho, se posiciona afirmando que “O objeto da prova são os fatos. Nem todos os fatos, porém, devem ser submetidos à atividade probatória. Em primeiro lugar, apenas os fatos pertinentes ao processo é que suscitam o interesse da parte em demonstrá-lo; os fatos impertinentes, isto é, não relacionados com a causa, devem ter sua prova recusada pelo juiz, sob pena de se desenvolver a atividade inútil”. (2010, p. 187)

            Ainda com relação ao objeto, as provas podem ser classificadas em diretas, quando ela recai sobre o fato probando, ou indiretas, quando é demonstrado outro fato e, através de indução, chega-se à conclusão do fato que se pretende provar. Esta última, chamada também de prova indiciária, é tratada no art. 239 do Código de Processo Civil. Vejamos: “Art. 239.  Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.”

            Greco Filho ainda conceitua meios de prova como “os instrumentos pessoais ou materiais aptos a trazer ao processo a convicção da existência ou inexistência de um fato”.  (2010, p. 199)

            A forma de prova é o meio pelo qual ela é produzida, e pode ser classificada em testemunhal, documental e material.Quanto ao ônus da prova, dispõe o Código de Processo Penal no art. 156: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício”.

 2.1.            Provas ilegais: Ilícitas e Ilegítimas

             A prova ilegítima ofende regra de direito processual, o momento de sua produção é intraprocessual e é declarada nula pelo juiz, devendo ser renovada ou retificada, conforme dispõe o art. 573 do Código de Processo Penal.

A prova ilícita é aquela que viola regra de direito material e é obtida em momento extraprocessual, além de ser inadmissível, não podendo, assim, ser juntada aos autos. Considera-se provas ilícitas aquelas obtidas com violação da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem, do domicílio e das comunicações, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, conforme prevê o art. 5º, inciso XII da Constituição Federal de 1988.

As provas ilícitas são espécies de “provas vedadas”, pois não podem ser levadas a juízo ou invocadas como fundamento de um direito, por disposição de lei. Pelo mesmo motivo, a prova ilícita é uma espécie de prova ilegal, assim como a prova ilegítima. Como as provas ilícitas são obtidas violando regra de direito material e as provas ilegítimas são produzidas ofendendo direito processual, determinadas provas ilícitas podem, ao mesmo tempo, ser ilegítimas, se sua produção em juízo também for impedida por lei processual.

Exemplificando a diferença entre provas ilícitas e ilegítimas, podemos citar a confissão mediante tortura na fase de investigação como prova ilícita, diferente da confissão em juízo, sem intervenção de advogado, que é prova ilegítima.

 .

2.2.            Interceptação Telefônica e gravação clandestina

 No âmbito jurídico, as interceptações são entendidas como ato de interferência nas comunicações telefônicas, para impedi-las, com consequências penais, ou apenas para tomar conhecimento.

O art. 5º, inciso XII da Constituição Federal de 1988 dispõe que “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

A Lei 9.296 de 1996, que regulamentou o inciso referido, tratou da interceptação telefônica em sentido estrito, feita sem o conhecimento dos interlocutores e tratou também da escuta telefônica, realizada com a anuência de um dos interlocutores. A interceptação realizada com autorização judicial, nos termos desta lei é considerada prova lícita e admissível. Esta exceção da inviolabilidade é apenas em relação às comunicações telefônicas, com finalidade de investigação criminal e instrução processual penal. As outras formas de inviolabilidade previstas pela Constituição são absolutas.

A lei não regulamentou as interceptações ambientais, que é configurada pela captação de conversa por um gravador colocado por terceiro, sem o conhecimento de ambas as parte. Não regulamentou também as gravações clandestinas, caracterizada quando um dos interlocutores grava a própria conversa com outra pessoa, sem o conhecimento desta. Não sendo a interceptação autorizada judicialmente, constitui prova ilícita, sendo admissível apenas em benefício da defesa, conforme dispõe o art. 10[2] da mesma lei.

 3.                  PERSECUÇÃO PENAL

 A persecução penal é a atividade que consiste em investigar, processar, comprovar e julgar uma infração penal e engloba duas fases: a investigação criminal e o processo penal. A primeira fase é um procedimento preliminar, de caráter administrativo, que reúne provas. A segunda fase é o procedimento principal, de caráter jurisdicional. Cada uma das fases será tratada a seguir, de forma geral, mas esclarecedora.

 3.1.            Inquérito policial

 3.1.1.  Conceito:

Inquérito policial é um procedimento administrativo, preparatório da ação penal, consistente em um conjunto de diligências realizado pela policia investigativa para a apuração da infração penal e sua autoria, presidido pela autoridade policial, a fim de fornecer elementos de informação para que o titular da ação penal possa ingressar em juízo.

 3.1.2.  Natureza jurídica

Trata-se de procedimento administrativo. Não é processo judicial, nem processo administrativo. Portanto, eventuais vícios constantes do inquérito policial não afetam a ação penal a que deram origem. Afinal só existe nulidade durante a fase judicial.

 3.1.3.  Polícia Judiciária e Polícia Investigativa

Policia Judiciária é a polícia que atua auxiliando o poder judiciário, no cumprimento de ordens de busca e apreensão, mandado de prisão etc. Policia Investigativa é a polícia quando atua na apuração de infrações penais e de sua autoria. A polícia judiciária e a investigativa são a mesma polícia, porém ora exerce função de polícia investigativa, ora de polícia judiciária. Essa distinção não é feita pelo Código de Processo Penal.

 3.1.4.  Características do Inquérito Policial

O inquérito policial tem as seguintes características:

         Peça Escrita, conforme dispõe o art. 9º do Código de Processo Penal: “Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade”. Para alguns doutrinadores, há a possibilidade de ser gravado, fundamentando-se esta técnica no art. 405, § 1º do referido Código[3].

         Peça Dispensável: O titular da ação penal pode dispensar o Inquérito Policial se contar com peças de informação que contenham elementos quanto à autoria e à materialidade, fundamentando-se no art. 39, § 5º do Código de Processo Penal: “O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias”.

         Caráter Sigiloso, com fundamento no art. 20 do Código de Processo Penal “a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”. No entanto, tem acesso ao Inquérito Policial, o juiz, o MP e o advogado, pela garantia do art. 5º, LXIII, CF[4]. Este acesso refere-se às informações já introduzidas nos autos do inquérito policial e não em relação às diligências em andamento. A Súmula Vinculante nº 14[5], trata do direito do defensor de ter acesso amplo aos elementos de prova que já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão de competência de polícia judiciária.

         Caráter Inquisitivo/inquisitorial: De acordo com a doutrina majoritária, no inquérito policial não há acusação, portanto não há contraditório, nem ampla defesa.

         Informativo: Visa à colheita de elementos de informação. Os Elementos de Informação são aqueles colhidos na fase investigatória. No momento do colhimento não há contraditório nem ampla defesa. São colhidos sem a participação do juiz e prestam-se para a fundamentação de Medidas Cautelares e também para a formação da opinio delicti, que nada mais é que a opinião do titular da ação penal. A expressão “exclusivamente” do art. 155 do Código de Processo Penal[6] significa que os elementos de informação isoladamente considerados, não são aptos a fundamentar uma sentença condenatória. No entanto não devem ser completamente ignorados, podendo se somar a prova produzida em juízo servindo como mais um elemento na formação da convicção do juiz.

         Indisponível: Conforme dispõe o art. 17 do Código de Processo Penal[7] a Autoridade Policial não pode arquivar o Inquérito Policial.

 3.1.5.  Valor probatório

O inquérito policial visa apenas fornecer elementos necessários para a propositura da ação e seu valor probatório é relativo, visto que os elementos de informação não são colhidos na presença do Magistrado e não há contraditório e ampla defesa. Porém, é admitida a validade em juízo das provas periciais impossíveis de serem postergadas.

Provas colhidas oralmente no inquérito policial valem apenas como indício e devem ser confirmadas em juízo. Com relação às confissões extrajudiciais de testemunhas, possíveis de serem refeitas com direito ao contraditório, não podem inspirar a condenação do réu.

 3.1.6.  Prazo para conclusão

Nos termos do art. 10 do Código de Processo Penal, o inquérito policial deve ser concluído no prazo de 30 dias, contados a partir da instauração, se o indiciado estiver solto. Se ele estiver preso, o prazo para conclusão do inquérito será de 10 dias, contados da data da efetivação da prisão.

Em se tratando da nova Lei de Drogas (Lei 11.343/06), o prazo para conclusão é de 30 dias se o indivíduo estiver preso e de 90 dias, se estiver em liberdade.

Excepcionalmente, a autoridade terá o prazo de até 60 dias para conclusão do inquérito, pois no caso de decretação de prisão temporária, especialmente nos crime hediondos e equiparados, há a possibilidade de manter o indiciado preso por 30 dias prorrogáveis por mais 30.

 3.1.7.  Encerramento do Inquérito Policial

Após a conclusão das investigações, a autoridade policial deverá fazer relatório minucioso daquilo que tiver apurado no inquérito policial, sem expor opiniões ou julgamentos, e deverá indicar as testemunhas que não foram ouvidas e as diligencias que não foram realizadas, conforme estabelece o art. 10, §§ 1º e 2º do Código de Processo Penal. A autoridade pode fornecer a classificação jurídica do fato, mas tal classificação não vincula o Ministério Público.

A 2ª parte do § 1º, art. 10 do Código de Processo Penal[8], estabelece que após elaboração do relatório, a autoridade deverá remeter os autos ao juiz competente. O art. 11[9] do mesmo código dispõe que os instrumentos do crime e os objetos que interessarem à prova, deverão acompanhar os autos do inquérito. Após recebimento do inquérito policial, o juiz competente deverá encaminhar ao membro do Ministério Público. Este analisará se o crime é de ação pública ou privada.

Sendo crime de ação privada, o art. 19[10] do código citado, estabelece que se deva aguardar a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal. O prazo para exercer o direito de queixa ou representação é de 6 meses, sob pena de decadência. A vítima pode também, pedir o arquivamento dos autos, renunciando assim, tacitamente, ao direito de queixa.

Por outro lado, se o crime for de ação pública, o membro do Ministério Público, tem as seguintes opções:

         Requerer a remessa dos autos ao juízo competente, quando o inquérito policial não está no juízo competente.

         Requerer a extinção da punibilidade. Se esta for extinta pelo juiz, há coisa julgada material.

         Oferecer denuncia, no caso de haver prova de materialidade e indícios de autoria. Na dúvida, o MP oferece a denúncia.

         Requerer novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia, com fulcro no art. 16 do Código de Processo Penal[11].

         Requerer o arquivamento do inquérito policial, que só pode ser determinado pelo juiz se houver requerimento do MP. Se o juiz concordar com o arquivamento, o inquérito policial é arquivado, fazendo coisa julgada formal, e só poderá ser desarquivado no caso de surgimento de novas provas, conforme prevê o art. 18[12]. Se o juiz discordar do arquivamento, os autos são remetidos ao Procurador Geral de Justiça no âmbito estadual ou à Câmara de Coordenação e Revisão, no âmbito federal.

 3.2.            Ação penal

 3.2.1.  Conceito

            Ação penal consiste no direito do Ministério Público (Estado-acusação) ou do ofendido, ingressar em juízo, solicitando a manifestação do Poder Judiciário sobre a causa.

 3.2.2.  Espécies de Ação Penal

A doutrina nomeia a Classificação da Ação Penal de subjetiva, pois leva em consideração o seu titular, para fazer a classificação. A distinção está na legitimidade de agir. Desta forma, temos:

a)                 Ação Penal Pública: Promovida pelo Ministério Público. A petição inicial da ação penal pública é a denúncia, que deve preencher os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal. Nos termos do art. 46 do mesmo Código, o prazo para oferecimento da denúncia é de 5 dias se o réu estiver preso e de 15 dias se estiver solto.

         Condicionada: é condicionada à representação da vítima ou de seu representante legal ou, em casos excepcionais, requisição do Ministro da Justiça. O prazo para representação é de 6 meses, contados a partir do conhecimento da suposta autoria delitiva. Essa representação não vincula o membro do MP para o oferecimento da denúncia, apenas autoriza a possibilidade desta. Para a requisição por parte do Ministro da Justiça, a lei não estabelece prazo.

         Incondicionada: neste caso, o Ministério Público não necessita de autorização ou manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal, para que a ação seja iniciada. Caracterizado o crime, o MP já é livre para propor a ação penal. Mesmo que a vítima, porventura, perdoe o seu ofensor, este fato é irrelevante. O MP prosseguirá com a ação penal, dependendo do seu interesse. A Ação Pública Incondicionada é a regra. Se a norma não expressar sobre a ação penal cabível para o delito, a ação será pública incondicionada.

 b)                 Ação Penal Privada: Iniciada pelo ofendido. A petição inicial da ação penal privada é a queixa crime. O prazo para queixa crime é de 6 meses, decadencial, a contar do conhecimento da autoria delitiva.

         Exclusiva: Casos em que a lei prevê expressamente que a ação penal será privada.

         Personalíssima: a doutrina classificava usualmente, dois delitos do Código Penal como sendo de ação penal privada personalíssima, em virtude da impossibilidade sucessória no pólo ativo da lide. Porém, após a revogação do crime de adultério, apenas o delito de induzimento a erro essencial, previsto no art. 236 do Código de Processo Civil, é considerado ação penal personalíssima.

         Subsidiária da Pública: excepcionalmente, em hipóteses em que a ação penal seria a princípio pública, havendo inércia do MP, há a possibilidade da vítima ou seu representante legal oferecer a queixa. Mesmo ocorrendo a substituição, esta ação penal não perde sua natureza de pública. O prazo para oferecimento da queixa é de 6 meses e começa a contar no primeiro dia após o término do prazo do MP. Durante o prazo da vítima e seu representante legal, a legitimidade deles e do MP é concorrente.

4.                  DIREITOS CONSTITUCIONAIS TUTELADOS

 4.1.            Garantias Individuais

 4.1.1.  Imparcialidade Do Juiz

Para que a relação processual seja exercida de forma válida e justa é indispensável a imparcialidade do juiz. As partes tem o direito de exigir um juiz imparcial, sem vínculos no processo, que o conduza de forma neutra. Para assegurar essa imparcialidade a Constituição prevê garantias aos juízes como: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio e vedações como: exercer outras funções, receber custas ou participações em processos e dedicar-se a atividade político partidária, entre outras. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, no seu Artigo X diz que: “Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um Tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ela”.

 4.1.2.  Ampla Defesa

Princípio fundamentado constitucionalmente pelo Art.5, LV, segundo o qual deve ser assegurado ao réu todos os meios legais para sua defesa.  Dentre eles, o acesso aos autos, possibilidade de apresentação de razões e documentos, produção de provas testemunhais ou periciais e conhecimento dos fundamentos e motivação da decisão proferida. Esse princípio concede ao réu direitos exclusivos como o ajuizamento de revisão criminal (vedado à acusação) e a possibilidade de verificar a eficiência da defesa pelo magistrado.

 4.1.3.  Direitos Do Pobre

            Para garantir os direitos dos pobres de agir e de defender-se em condições de igualdade com outros indivíduos é importante a isenção de custas processuais e a defesa gratuita, conforme assegurado pela Leis 1.060/50, 7.115/83 e 7.510/86. Essa gratuidade visa garantir igualdade no acesso à justiça e não deve se tornar uma vantagem, nem abuso do direito de demandar em relação aos indivíduos que se utilizam da justiça paga e, portanto, assumem o risco de ter que arcar com as custas da demanda.

 4.1.4.  Juiz Natural

Esse princípio busca assegurar a independência, a imparcialidade do juiz e impedir o Estado de direcionar o julgamento. Para tanto, o juiz competente para o julgamento da causa deve ser previamente instituído pela lei, antes da ocorrência do crime, conforme art. 5°, LIII da Constituição Federal: “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”.

A Constituição veda os tribunais de exceção, que escolhem o juiz após a ocorrência do fato, especificamente para processar determinados indivíduos devido a enorme possibilidade de não ser imparcial. Não podemos confundir tribunal de exceção com a criação de algumas varas especializadas, permanentes, que são devidamente constituídas e organizadas pela própria Constituição, pois estas não são específicas para determinado delito e sim genéricas e válidas para todos os casos relativos à mesma matéria. É vedado o juízo de exceção e não o juízo especializado.

 4.1.5.  Inércia

Em respeito à liberdade do indivíduo, a jurisdição é inerte, devendo a parte interessada provocar o judiciário. O judiciário não pode agir de ofício, é preciso que o interessado leve a questão para apreciação. Segundo o art. 2 do CPC: “Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais”.

A jurisdição só atuará se for instigada pela parte. Depois de proposta a demanda passa a vigorar o principio do impulso oficial, onde o juiz tem que dar movimento à ação penal.

 4.1.6.  Contraditório

            Esse princípio visa manter um equilíbrio na relação processual entre acusação e defesa, pois para cada alegação ou prova apresentada por uma parte, a outra tem direito a manifestação. Contraditório é a possibilidade de a parte contradizer tudo o que foi dito pela outra. É assegurado as partes o direito de convencer o juiz.

 4.1.7.  Oralidade

            Princípio processual onde a técnica oral deve prevalecer sobre o demorado procedimento escrito, concentrando a instrução e julgamento no menor número possível de atos processuais, tornando mais célere o processo.

Visa exaltar o princípio da concentração (onde tudo deve ocorrer no menor número de audiências possíveis); o princípio da imediatidade (onde o juiz tem contato direto com o material a ser julgado, sem intermédio de outras pessoas); o princípio da identidade física do juiz (o juiz que colhe as provas e inicia o processo, deve ser o mesmo que julga a causa, vinculando-se ao processo).

 4.1.8.  Coisa Julgada

            Prevista pela CF no art. 5°, XXXVI: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.      É a decisão da Justiça que não aceita mais recurso no processo. É o pronunciamento final do julgador, colocando fim ao litígio, devido ao trânsito em julgado ou ao esgotamento dos recursos, tornando, em tese, imutável a decisão.

A coisa julgada é garantia fundamental do processo, onde aquele a quem o juiz atribuiu o pleno gozo de um direito poderá usufruí-lo plenamente sem ser mais molestado pelo adversário.

 4.2.            Garantias Estruturais

 4.2.1.  Impessoalidade da Jurisdição

A Justiça deve ser impessoal, a serviço da liberdade e da dignidade humana. Para tanto necessita-se de magistrados idôneos, com capacidade de julgar objetivamente e fazer valer a impessoalidade da jurisdição. A jurisdição é exercida em favor do povo, através dos juízes movidos pelos ditames da lei.

 4.2.2.  Permanência da Jurisdição

Por ser serviço público essencial, o acesso a justiça deve estar ao alcance do indivíduo. Para isso o exercício da jurisdição deve ser através de órgãos permanentes, de caráter efetivo que possam ser encontrados pelo indivíduo quando necessitarem.

 4.2.3.  Independência dos Juízes

O juiz tem o dever de ser imparcial no exercício da jurisdição, e para isso o Estado tem o dever de proporcionar as garantias de independência em relação a qualquer outra autoridade pública e a pressões individuais ou coletivas.

O dever de respeitar a lei não constitui restrição à independência do juiz.

 4.2.4.      Motivação das Decisões

O princípio da motivação das decisões diz que toda decisão deve ser fundamentada sob pena de nulidade absoluta. Está previsto no art. 93, IX da Constituição: “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e, fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.

Toda decisão deve ser fundamentada sob pena de nulidade absoluta.A fundamentação da sentença, mostrando a lógica utilizada pelo juiz para chegar a decisão é uma garantia de justiça, pois a sentença pode ser analisada e questionada se for caso.

4.2.5.  Igualdade Concreta

No princípio da Igualdade Concreta as partes tem que ter as mesmas oportunidades de manifestação. Desse princípio decorre a “paridade das armas”, ou seja, a igualdade das partes, onde o juiz para assegurar essa igualdade deve suprir as deficiências da parte em desvantagem, de modo que estas se apresentem concretamente nas mesmas condições de igualdade de acesso à tutela jurisdicional.

 4.2.6.  Inexistência de Obstáculos Ilegítimos

Obstáculos impostos por interesses alheios ao exercício da jurisdição não podem dificultar o acesso à Justiça. São inadmissíveis prazos não razoáveis e ônus patrimoniais exagerados (como custas, advogados, perícias).

 4.2.7.  Efetividade Qualitativa

Não basta assegurar o acesso à ordem jurisdicional e ao procedimento, é necessário também extrair da regra processual a sua máxima efetividade.

 4.2.8.  Procedimento Legal, Flexível e Previsível

O procedimento deve ser legal, isso quer dizer que seu rito deve ser regido por lei, no intuito de garantir a igualdade de tratamento dos indivíduos perante os órgãos jurisdicionais. Deve ser flexível, facultando ao juiz uma margem de variação para que ele possa estabelecer paridade concreta de armas e permitir as partes fazer valer o seu direito. Deve ser previsível para que as partes possam montar sua estratégia de atuação de acordo com o desenvolvimento do processo.

 4.2.9.  Publicidade

Pelo princípio da publicidade todos os atos processuais devem ser públicos. Essa publicidade é garantia importante do processo democrático. As exceções estão previstas no art. 5°, LX da Constituição Federal: “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.

 4.2.10.               Legalidade Estrita no Exercício do Poder de Coerção

Para formar a sua convicção o juiz pode utilizar meios não previstos em lei, desde que sejam idôneos. Já no exercício do poder de coerção, somente poderá impor as partes as sanções previstas em lei.

 4.2.11.               Respeito à Dignidade Humana

O princípio da dignidade da pessoa humana é um direito fundamental previsto no art. 1°, III da CF que legitima e ao mesmo tempo limita a persecução penal. A incidência desse princípio aprimora o processo penal. Todos os direitos fundamentais dos sujeitos do processo devem sem respeitados, protegendo os indivíduos das agressões do Estado ou de terceiros.

 4.3.            Garantias Do Processo Penal

 4.3.1.  Direito à Autodefesa

Garantia do acusado de participar pessoalmente dos atos do processo. O acusado pode defender-se pessoalmente ou através de um defensor.

A autodefesa desdobra-se em três garantias fundamentais: a) direito de audiência: que é o direito do acusado de ser ouvido, de se defender perante o juiz. O interrogatório é um exercício desse direito, onde o réu pode contar sua versão, argumentar, negar, silenciar-se, entre outros; b) direito de presença: é o direito do acusado de estar presente em todos os atos processuais; c) direito de postulação pessoal: é o direito do acusado de pessoalmente levar adiante a sua defesa através de recursos, incidentes processuais ou ações autônomas de impugnação. Estes atos postulatórios facultados ao réu são expressamente previstos em lei.

A autodefesa é voluntária, não podendo o acusado ser forçado a exercê-la, e somente ele pode dispor desse direito.

 4.3.2.  Direito a um Defensor

Todo acusado tem direito a assistência de um advogado. Essa assistência é necessária, portanto, se o acusado não constituir um advogado, deve ser designado um para ele. Advogado e acusado tem ainda o direito de se comunicarem reservadamente e de forma inviolável, seja pessoalmente, por carta ou ligações telefônicas.

 4.3.3.  Contraditório na Investigação Preliminar

Segundo Leonardo Greco:“O indiciado ou suspeito, durante a investigação preliminar, tem o direito de participar e de influir na colheita de todas as provas que não possam ser repetidas no processo judicial, como as perícias. O contraditório participativo, que é característico do Estado Democrático Contemporâneo, assegura ao acusado o direito de intervir em todos os atos probatórios para influir na produção das provas e assim influir eficazmente na decisão que vai apreciá-las.” (Greco, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O processo justo).

 4.3.4.  Proibição de Auto Incriminação

Ninguém é obrigado a se auto incriminar. A Constituição assegura esse direito no art. 5°, LXIII: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.

 4.3.5.  Identificação e Inquirição das Testemunhas

O réu poderá inquirir as testemunhas de acusação e quantas da defesa achar necessário para exercer a plenitude de sua defesa. A lei não limita numericamente a quantidade de testemunhas que podem ser ouvidas. Além disso, ninguém pode ser condenado por base em depoimentos de testemunhas de identidade desconhecida ou com depoimentos tomados em sigilo.

4.3.6.  Princípio Acusatório

Para garantir o caráter imparcial, objetivo e independente do julgamento torna-se necessário uma distinção entre entidade julgadora e entidade acusadora, estipulando ainda uma paridade entre acusação e defesa. Esta igualdade só será relevante nas fases seguintes ao inquérito, na fase de instrução e na fase de julgamento. Nesta fase o Ministério Público e o acusado têm os mesmos direitos, assegurado pelo princípio do acusatório.

 4.3.7.  Condições para o Pleno Exercício da Defesa

Ao acusado deve ser assegurada não somente uma defesa ampla, mas também plena, completa, perfeita. No processo criminal o réu tem assegurado o princípio da plenitude da defesa, com vasta possibilidade de se defender, através provas, contestações, etc.

É necessário um tempo para que o acusado possa recolher todas as provas, escolher e instruir o seu advogado e atuar de modo eficaz na prática dos atos de defesa. A busca de provas de interesse do acusado deve ser procedida de ofício pelo juiz.

 4.3.8.  Controle Judicial de Medidas Restritivas

Medidas restritivas que invadam a liberdade do indivíduo ou restrinjam direitos devem ser adotadas com observância da reserva legal e da reserva da jurisdição. A reserva legal implica a necessidade de previsão legal e a reserva da jurisdição, por sua vez, significa a necessidade de controle judicial da sua legalidade, necessidade, proporcionalidade com a gravidade da infração e adequação.

 4.3.9.  Ônus Probatório da Acusação

            Todo acusado é presumido inocente até que seja declarado culpado por sentença condenatória com transito em julgado, portanto, cabe a acusação o ônus da prova e não a defesa. Para quebrar a presunção de inocência a acusação deve evidenciar com provas a culpa do réu. As provas devem ser suficientes e consistentes, pois em caso de dúvida prevalece o estado de inocência (in dubio pro reo).

4.3.10.               Duplo Grau de Jurisdição

É um direito que a parte condenada tem de recorrer da condenação em uma instância superior. Presume-se que possibilidade de erro seja reduzida, já que a matéria será revista por outro órgão, aumentando as chances da certeza jurídica.

 4.3.11.               Proibição de Provas Ilícitas

A presunção de inocência e a defesa da liberdade pessoal levam a proibição de utilização de provas ilícita, como disposto no art. 5°, inciso LVI, da Constituição Federal: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.  O processo penal deve ser formado em torno da produção de provas legais e legítimas.  É inadmissível prova ilícita obtida com ofensa a integridade física ou psicológica do indivíduo.

Quanto à aceitação da prova produzida ilicitamente, há duas teorias: a da prova ilícita por derivação e a da proporcionalidade, que serão comentadas neste trabalho.

 5.                  DIREITOS DAVÍTIMA

             Segundo o dicionário jurídico de Plácido e Silva, o conceito de vítima é:“Do latim victima, geralmente entende-se toda pessoa que é sacrificada em seus interesses, que sofre um dano ou é atingida por qualquer mal. E sem fugir ao sentido comum, na linguagem penal designa o sujeito passivo de um delito ou de uma contravenção. É, assim, o ofendido, o ferido, o assassinado, o prejudicado, o burlado”.

Desta forma, no que se concerne no presente momento, entende-se por vitimas as pessoas que, individual ou coletivamente tenham sofrido um prejuízo, nomeadamente um atentado à sua integridade física e um sofrimento de ordem moral, uma perda material, ou um grave atentado aos seus direitos fundamentais, como consequência de atos ou de omissões violadores das leis vigor num Estado membro, incluindo as que proíbem o abuso de poder.  

No ano de 2008, foi publicada a Lei 11.690, incluindo alguns direitos para a vítima, no art. 201 do Código de Processo Penal, que após a alteração ficou com o seguinte texto:

“Art. 201.  Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. (...)

        § 2o  O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem.

        § 3o  As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico.

        § 4o  Antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado espaço separado para o ofendido.

        § 5o  Se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado.

        § 6o  O juiz tomará as providências necessárias à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o segredo de justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de comunicação.”

Outros artigos dispersos no Código de Processo Penal também atribuem direitos ao ofendido, dentre os quais podemos destacar:

         Art. 14: permite o requerimento de diligencias, pela vítima ou seu representante.

         Art. 168: fornece à vítima, o direito de requerer o exame complementar, em caso de lesões corporais, onde o primeiro exame pericial tiver sido incompleto.

         Art. 217: permite que a vítima preste depoimento separadamente do réu, se a presença deste puder causar humilhação, medo ou constrangimento.

Além dos direitos garantidos pelo Código de Processo Civil e por determinadas leis, as vítimas contam com a Lei 9.807/99, que estabelece normas para a organização e manutenção de programas especiais de proteção às vítimas e testemunhas ameaçadas. Tal proteção é garantida as pessoas que sofrem ameaças, por terem colaborado ou prestado declarações em investigação criminal ou processo penal. Conforme art. 7º da referida lei, esta proteção inclui segurança na residência ou transferência para um local compatível com a proteção, escolta e segurança nos deslocamentos da residência, preservação da identidade, apoio e assistência social, médica e psicológica, dentre outras.

 6.                  DIREITO DE PUNIR DO ESTADO

            ,A principal finalidade do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos essenciais, como a vida, a liberdade, a integridade física, a honra, o patrimônio. Tal proteção é efetivada com a incriminação de determinadas condutas, que se praticadas, poderão ser punidas com a aplicação da pena prevista no tipo penal.

As penas aplicadas em cada caso tem função de ressocialização de indivíduos praticantes de ilícitos penais, com também, exerce a função de proteção da comunidade, ao privar o autor de sua liberdade, evitando assim, que este faça novas vítimas. A pena criminal tem ainda, função de intimidação, desestimulando a prática de crimes, na medida em que a pena imposta ao condenado causa em outros indivíduos o temor de ser punido, além de aumentar a credibilidade do Estado perante a sociedade.

O art. 144 da Constituição Federal de 1988 o direito de punir ao Estado, ao estabelecer que “a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (...)”.

Enquanto detentor do direito de punir, o Estado impõe restrições aos direitos do criminoso, colocando em confronto a ação do Estado contra o criminoso e a defesa da sociedade. Portanto, a intervenção estatal é legítima, quando se opõe aos direitos individuais para preservar interesses sociais.

 

 

 

7.                  DIREITO À LIBERDADE DO RÉU

 A Constituição Federal de 1988, no caput do art. 5º dispõe que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)”. Visando tutelar essa liberdade individual já prevista no caput do art. 5º, o princípio da presunção da inocência está previsto no inciso LVII do mesmo artigo, dispondo que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Em defesa da sociedade, a liberdade individual, pode e deve sofrer restrições, por exemplo, nos casos de prisão cautelar. Atualmente, os três tipos de prisão possíveis antes do transito em julgado da sentença penal condenatória, são:

a)      Prisão em flagrante: qualquer pessoa pode dar a voz de prisão em flagrante e autoridade policial tem o dever de prender, aquele que estiver praticando ato criminoso. Imediatamente após a prisão, a autoridade policial deve comunicá-la ao juiz criminal, que pode relaxar a prisão se entender que ela é ilegal ou se não forem observados os direitos do preso. Nos crimes suscetíveis de fiança, será dada a liberdade ao preso após a apresentação desta. Nos crimes inafiançáveis, o preso também será colocado em liberdade, se não for o caso de decretação judicial de prisão preventiva.

b)     Prisão temporária: a polícia pode requerer ao juiz a decretação de prisão temporária, quando esta for necessária para as investigações do inquérito policial, quando o indiciado não possuir residência fixa ou não fornecer esclarecimentos da sua identidade, ou ainda, quando houver fundadas razoes de sua autoria ou participação em determinados crimes.

c)      Prisão preventiva: a prisão preventiva pode ser decretada judicialmente em qualquer fase da persecução penal (fase de investigação e instrução criminal), com fulcro no art. 311 do Código de Processo Penal[13]. Conforme art. 312 desteCódigo[14], para a decretação da prisão preventiva, ela deve ser fundamentada da seguinte forma: como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Visando evitar a prisão antes do transito em julgado, resguardando assim, as garantias constitucionais de liberdade individual, há o instituto da Liberdade Provisória, fundada no art. 5º, inciso LXVI da Constituição Federal de 1988, que assim dispõe: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.

Nos crimes em que a liberdade é concedida com o pagamento de fiança, a lei não desampara o réu com condição econômica inferior, estabelecendo no art. 350 do Código de Processo Penal, que “nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando a situação econômica do preso, poderá conceder-lhe liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328 deste Código e a outras medidas cautelares, se for o caso”.

 8.                  LEI 11.690/2008- ALTERAÇAO DO CPP, TITULO VII

             Em 11 de agosto de 2008, entrou em vigor a Lei 11.690, que alterou principalmente os artigos do Titulo VII do livro I do CPP, que trata das provas. Seguindo nesta linha de raciocínio, comecemos pelo artigo 155 do referido código.

            O antigo art. 155 se tornou no presente parágrafo único do novo art. 155, onde em seu caput, retirou ensinamento há muito consagrado tanto na doutrina quanto na jurisprudência, pelo qual o magistrado não pode levar a cabo uma condenação penal, com base no seu convencimento nas provas colhidas exclusivamente na fase do inquérito policial.

            O art. 156 acrescenta-se o texto do inciso I, pelo qual o juiz poderá de oficio, mesmo antes de iniciada a ação penal, ordenar a produção antecipada de provas, que considerar urgente e relevante.

            No atual artigo 157, fora legalizado a vedação às provas ilícitas, ou seja, provas desta natureza devem ser desconsideradas pelo magistrado no momento da sentença. É importante salientar os §§ 1° e 3°. No § 1°, tudo que se origina da prova ilícita também deve ser considerado ilícito, não sendo utilizado. No § 3°, o legislador trabalhou com mínima hipótese, com juízo de probabilidade, o que, em processo penal e na esfera penal em geral não é aconselhável.

            O texto do art. 159, diz que o exame de corpo de delito e as pericias serão feitas por um perito oficial, com diploma em curso superior, podendo o juiz designar mais de um perito quando a pericia for complexa e abranger diversas áreas de conhecimento. Consagra a lei ao permitir no processo penal o assistente técnico das partes.

            No art. 201, as novidades estão ligadas à proteção da dignidade humana, fundamento da Republica Federativa do Brasil, e dos direitos da personalidade, consagrando os atuais estudos da vitimologia.  Agora determina a lei que o ofendido será comunicado sobre o ingresso e a saída do acusado da prisão.

            Quanto à oitiva das testemunhas, adicionou-se um parágrafo único no disposto no art. 210, de modo que, antes e durante a realização da audiência, serão reservados espaços separados para as testemunhas de acusação e de defesa, visando garantir a incomunicabilidade, prevista no caput do art. 210.

            Importante novidade traz o art. 212, que prevê, à inquirição das testemunhas, onde as partes formularão as perguntas diretamente às testemunhas, podendo o juiz não admitir perguntas que puderem induzir a testemunha a uma resposta ou não tiver relação com a causa, ou haver repetição do que já fora posto. No § único, o juiz poderá completar as perguntas não esclarecidas.

            E por fim o art. 217, reformado pela lei 11.690/08, admitindo a oitiva de testemunhas por videoconferência.

 9.                  AS PROVAS LÍCITAS NO DIREITO PROCESSUAL PENAL

 No Código de Processo Penal, a partir do Título IV são elencadas as provas que poderão ser utilizadas no processo com a finalidade de orientar o juiz na busca da verdade dos fatos. Segue abaixo uma divisão superficial da disposição das provas e seus respectivos artigos:

                    Arts. 158 a 184 do CPP estão elencadas as Perícias em geral, que sofreram modificações significativas pela Lei 11.690.

                    Art. 185 a 196: está disposto do Interrogatório do acusado, que sofreu alteração com as Leis 10.792/03 e 11.900/09.

                    Art. 197 a 200 regula a Confissão.

                    Art. 201 dispõe das Perguntas ao ofendido, que tem a redação determinada pela Lei 11.690/98.

                    Art. 202 a 225 contemplam das Testemunhas, alterada pela Lei 11.690 e 11.900.

                    Art. 226 a 228 regula Reconhecimento das pessoas e coisas.

                    Art. 229 e 230 disciplina a Acareação.

                    Art. 231 a 238 trata dos Documentos.

                    Art. 239 refere-se aos Indícios.

                    Art. 240 a 250 regula a Busca e apreensão.

Vale ressaltar que os meios de prova existentes no Código de Processo Penal não são taxativos, comportando no processo meios de provas atípicos ou inominados, pois sua finalidade é a busca da verdade real, para isso amplia-se essa categoria desde que a produção de prova atípica não viole direito Constitucional ou normas processuais gerais.  

 10.              DOUTRINA

 Para a doutrina, no curso do processo penal, faz-se necessário analisar os princípios que o regem, bem como as suas fases, mas principalmente na produção de provas, visto que é fundamentada nas provas produzidas e apresentadas em juízo que a sentença será proferida.

De acordo com o Direito Processual Penal brasileiro, em regra, o juiz deve valer-se do livre convencimento, ou seja, deverá utilizar como fundamento para sua sentença as provas produzidas sob contraditório judicial, no entanto remanescem exceções do sistema que são as Teorias da íntima convicção e prova tarifada (quando a lei estabelece o valor de cada prova, ficando o julgador restrito a observância de tais valores).

Sabemos que desde os primórdios da história do Direito, a apreciação das provas passa por fases, que são moldadas de acordo com os costumes, governo, conveniência e convicções de cada época. Atualmente no mundo prevalecem três regramentos: o do livre convencimento do juiz (que é aquele em que o juiz possui liberdade na aferição das provas, no entanto deve fundamentar sua decisão); o da prova legal e o da íntima convicção (onde o juiz julga de acordo com critérios subjetivos e empíricos e não tem necessidade de exteriorizar as razões de sua decisão).

Em relação ao sistema do Livre convencimento do juiz, previsto no art. 155 do CPP, podemos concluir que se a provas forem licitas e legítimas poderão também ser inominadas, ou seja, não precisam estar previstas no Código. O juiz pode, a seu critério valorar as provas de acordo com a necessidade de motivação (a sentença deve conter indicação dos motivos de fato e de direito que a motivaram) e as provas devem constar nos autos do processo (o juiz deve basear-se nas provas constantes nos autos).

E principalmente, para que o juiz do processo penal profira sentença condenatória, as provas nas quais se fundam a sentença devem ter sido produzidas observando as garantias constitucionais de dois princípios que são pilares do Direito, a ampla defesa e o contraditório. No entanto, é permitido ao juiz, a utilização das provas que foram obtidas em fase extrajudicial, mas esses fatos não podem ser o exclusivo motivo para o convencimento do juiz. Mesmo nas provas urgentes, deve-se assegurar o contraditório sob pena de perecimento.

Segundo Norberto Avena, as provas lícitas e legítimas poderão ser utilizadas como fundamento para condenação ainda que produzidas em fase de investigação criminal e sem as garantias constitucionais do contraditório e ampla defesa (2011, p. 476).

Trataremos agora de alguns princípios que regem o Processo Penal, considerados essenciais para o desenvolvimento do tema em questão, e de observância importantíssima na produção das provas, garantindo assim que a verdade pronunciada pelo Judiciário seja a mais próxima possível do fato que realmente aconteceu, e quando a verdade não for possível, que não prejudique, nem cause transtorno e sofrimento excessivo às partes.

O princípio do contraditório confere ao processo estrutura dialética. Toda prova produzida por uma das partes pode e deve haver uma contraprova da outra parte. A comunhão das provas diz respeito às provas que foram juntadas aos autos pertence ao processo, e após juntadas, as duas partes podem usá-la da forma que lhes for mais conveniente. Por esse princípio a Doutrina entende que, após a inquirição de testemunhas arroladas, a parte que as inquiriu não pode mais desistir da prova oral, visto que a partir do momento em que as provas estão nos autos, estas pertencem ao processo, e somente poderão ser retiradas se houver concordância da parte contrária.

A Oralidade regulamenta que sempre que possível as provas devem ser produzidas oralmente na presença do juiz que julgará a ação, visto que dessa forma permite-se maior participação do juiz, o que não ocorre se apenas for juntada ao processo declaração escrita das testemunhas. O princípio da oralidade se sustenta em dois outros princípios, o da Concentração onde requer que a produção de prova oral seja produzida, de acordo com as possibilidades, em apenas uma audiência; e o princípio da Imediação, que justifica a necessidade da presença do juiz no momento da produção de provas, pois assim permite a valoração de aspectos importantes e relevantes que influenciarão a fundamentação da sentença. 

A Publicidade tem grande valor devido à importância do objeto que o Processo Penal lida e sua relevância aos indivíduos e sociedade, sendo assim nada mais coerente que os atos praticados no decorrer do processo sejam públicos, inclusive e principalmente a produção de provas, garantindo ao cidadão a confiança na justiça. O princípio da Autorresponsabilidade das partes trata de responsabilizar as partes por sua inatividade, erro e negligencia na produção das provas e todas as conseqüências que advir dessas falhas.

Outro princípio importante e que não pode ser posto de lado na elaboração desse trabalho é o da Não autoincriminação (Nemo tenetur se detegere), sendo este princípio uma das maiores garantias ao réu nos mais variados tipos de ações penais, significando que o acusado não está obrigado a produzir provas contra si. E por último e não menos importante a Ampla defesa, que serviu para amplificar a participação do acusado no processo penal, garantindo assim a efetiva participação, e não meramente a participação.

Atendo-nos ao tema do presente trabalho sobre a produção de prova ilícita no percurso processual penal, em nossa legislação no art. 157 do CPP, é fatídico que as provas ilícitas não devem ser aceitas, caso em que ocorreria a violação de direitos constitucionais brasileiros. Neste sentido, Pacelli declara de forma sucinta que a inadmissibilidade da prova ilícita é dirigida ao Estado. (2009, p. 293)

 

 

10.1.        Teoria da Proporcionalidade

 

Para que as provas produzidas atinjam seu objetivo que é a reconstrução do ato delituoso, e declarem assim a verdade real, estas não podem violar os direitos do acusado, e nem deixar impune um criminoso, é necessário que se faça uso da Proporcionalidade para solucionar o conflito gigantesco que se forma. A lei não pode ser permissiva, e deve ter força coercitiva, mas a força coercitiva jamais deve impor-se sobre aquele que ainda é apenas acusado. A lei deve impor-se apenas sobre o comprovadamente culpado.

Com certeza a liberdade do indivíduo deve prevalecer sobre qualquer outro bem tutelado, devendo esta ser privada ou restringida em ocasiões excepcionais. É um ultraje que o Estado permita a privação da liberdade de alguém baseado em provas obtidas ilicitamente, e que viola clara e evidente os direitos consagrados por nossa Constituição, principalmente o art. 5º, LVI, em que é vedada a admissão de prova obtida ilicitamente.

A Proporcionalidade é muito utilizada quando há produção de prova antecipada, visto que essa modalidade somente deve ocorrer em caráter excepcional, exigindo três requisitos:

                    Necessidade: a antecipação das provas deve evitar o sacrifício de outros bens jurídicos para ser considerada necessária.

                    Adequação: ela deve ser apta, útil e suficiente para alcançar o fim visado.

                    Proporcionalidade estrito senso: deve haver um sopesamento por parte do juiz entre os princípios da imparcialidade do juiz, garantias constitucionais e irredutibilidade dos vencimentos versus o princípio da verdade real, determinando de acordo com o caso concreto qual deve prevalecer. 

Ávila preceitua:

“O dever de proporcionalidade, então, estabelece uma estrutura formal de aplicação dos princípios envolvidos: o meio escolhido deve ser adequado, necessário e não excessivo. Sobre a medida de excesso considerada inválida o dever de proporcionalidade nada diz. Só a análise diante do caso concreto e diante da relevância que o ordenamento jurídico atribui a determinados bens jurídicos (p. ex. vida, dignidade, liberdade, propriedade) pode revelar o excesso da medida. A aplicação concreta só se completa com um conteúdo, até porque os fins só podem ser estabelecidos em contato com normas substanciais. O que importa, entretanto, é que não é o dever de proporcionalidade em si que estabelece a medida substancial da excessividade, mas sua aplicação conjunta com outros princípios materiais. Vale dizer: o dever de proporcionalidade, ao contrário do que pretende Larenz, seria um princípio ou critério formal, como bem assinalou Kaufmann”.[15]

 10.2.        Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada

 A Teoria dos frutos da Árvore envenenada, com origem no direito norte americano refere-se às provas ilícitas por derivação, a doutrina brasileira refere-se a elas como as que possuem caráter de ilicitude por serem obtidas de maneira ou por meio ilícito, mas que puderam ser concluídas de forma lícita e obter um resultado favorável à acusação.

A teoria supramencionada é apenas uma aplicação da inadmissibilidade das provas ilícitas já consagradas por nossa Constituição e pelo CPP no art. 157 que foi alterado pela Lei 11.690 conforme já exposto.

A doutrina através dessa teoria expõe que se admissível provas obtidas a partir de outras ilícitas, a ilicitude da primeira seria facilmente contornada, e isso não pode acontecer. As provas ilícitas não são permitidas e não se admitirá qualquer prova que venha a ser conhecida através desta.

O STF em várias ocasiões se posicionou e reconheceu a pertinência da Teoria dos Frutos da Arvore envenenada. No entanto, no art.157, §2º há uma exceção, sendo admitidas provas derivadas desde que não evidenciado o nexo de causalidade entre elas, ou ainda quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente.

Para a comprovação da derivação das provas, sempre será analisado o caso concreto, pois pode acontecer que as provas obtidas através de uma escuta telefônica, por exemplo, já estivessem de fácil alcance às autoridade, ou até mesmo que já estivesse marcada tal investigação, ou ainda, que fosse possível descobrir inevitavelmente  por outra fonte independente.

Como assevera Pacell, “a ilicitude da prova, é mais que uma violação à intimidade dos interessados, revelar-se-ia clausula de permanente imunidade em relação ao fato”.

Interpretando essa teoria em absoluto, alguns delitos jamais poderiam ser apurados, se a informação da qual resulta a denúncia resultasse de prova obtida ilicitamente, antes mesmo de qualquer procedimento investigatório. Por essa razão, pode se dizer que, esse problema torna-se do Estado, vez que foi o responsável pela violação de direitos na busca das provas.

Mas ocorre que se prevalecer esse entendimento inflexível, será muito fácil ao agente do crime furtar-se à ação penal, portanto, para adequada tutela dos direitos individuais das partes envolvidas, deve-se recorrer ao critério da razoabilidade ou proporcionalidade.

 10.3.        Teoria do encontro fortuito de Provas

 Outra importante teoria estudada por nossa doutrina é a do Encontro fortuito de Provas, esse encontro fortuito ocorre quando, durante a investigação regular e autorizada de um crime, encontra-se provas de outro crime, faz-se o uso da mesma premissa da teoria dos frutos da arvore envenenada, considerando uma violação à privacidade e intimidade, visto que, tal investigação não estaria autorizada, e o crime não seria descoberto se não fosse a busca por outro crime, e a autorização dada àquele.

Pensamos, porém, no quanto é necessário a prudência para aplicar tal teoria. O Direito Penal não pode salvaguardar atitudes criminosas. Quando há permissão para interceptação telefônica, por exemplo, o juiz o faz fundamentando sua decisão, e principalmente baseando em presentes e fortes indícios de atos criminosos. Sendo assim, parte da doutrina entende que uma vez franqueada a violação dos direitos à privacidade e à intimidade, não há razão para a recusa de provas de outros crimes que eventualmente sejam descobertas. Neste sentido Pacelli aduz que “uma vez autorizada a intervenção, e esta feita legalmente obtém prova de crime não se trata mais de justificar medida mas sim de aplicar a lei”.

O STF pronunciou seguindo essa linha de pensamento, reconhecendo a licitude das provas obtidas pela investigação legal de outro crime.

10.4.        Teoria do Juiz Justiceiro e o Juiz Samambaia

 Essa teoria foi desenvolvida pela análise do polêmico tema que é a atuação, postura e papel do julgador perante as provas do processo. Tema que retornou à tona com a Lei 11.690/2008 entre outras, que restringe a atuação do juiz, para garantir a imparcialidade deste ao proferir a sentença.

Sobrevieram muitas críticas de que com essa mudança processual penal o “juiz tornou-se uma verdadeira samambaia na sala de audiência, sendo assim mero elemento ilustrativo para a realização da solenidade”. Este pensamento é de minoria da doutrina, vez que ainda foram assegurados ao julgador possibilidades de iniciativas probatórias.

E por isso surgem críticas de todos os lados, e também de que o juiz tendo postura ativa conflita com os basilares princípios ordenadores do processo penal, dizendo ainda que quando o juiz toma a iniciativa abandona a imparcialidade que deveria ter, tomando partido e julgando o caso sem justiça que se espera da Lei.

Juiz Samambaia, com a Lei 11.690/08, o CPP adota que as perguntas dirigidas às testemunhas não precisa mais passar pelo magistrado, podendo ser feitas diretamente. Cabe ao juiz apenas admitir ou não os questionamentos e complementar ponto não esclarecido pelas partes. Alguns doutrinadores, como Nucci, dizem que essa atitude torna o juiz em samambaia durante a audiência.

No entanto a maioria discorda dessa posição, afirmando assim que “essa distância do juiz na produção de provas vai garantir o real controle sobre a realização das provas pertencentes às partes, permitindo que o juiz exerça a função de garantir os direitos fundamentais do acusado”, é o que Leciona Busato[16].

Juiz Justiceiro, nessa concepção, admite-se a iniciativa do juiz para a produção de provas por este visar o encontro da verdade real. Alguns até elevam a verdade real como princípio no processo penal, que deve ser buscada a qualquer preço.

No entanto, para Nucci e Mirabete prelecionam que o princípio da verdade real estabelece o ius puniendi que deve ser exercido contra aquele que praticou a infração penal e nos exatos limites de sua culpa.

Observamos que ao dar ao juiz tal poder, de buscar a verdade independente da forma que irá realização tal ação, verificamos resquícios inquisitoriais que afronta os ideais de nossa Constituição, e também se assim o fosse, as provas ilícitas seriam aceitas. Pois neste caso, o juiz passa a atuar como herói, e garantidor da justiça e vê no réu o vilão, que deve ser punido para que a verdade vença. Neste momento o juiz toma parte de acusador, saindo do pólo julgador da ação e abandonando sua imparcialidade.

De acordo com o exposto, tanto a visão do juiz samambaia quanto a do juiz justiceiro são equivocadas e descartáveis para o nosso sistema. Devendo o julgador contemporâneo estar ciente de que seu papel e sua atuação devem estar sempre em total e absoluta harmonia com os preceitos constitucionais. Não sendo permitido no processo penal nem um juiz inerte e tampouco um demasiadamente ativo.  

 Concluímos então este estudo com a certeza de que em nosso Código Processual Penal não podem ser admitidas provas ilícitas por serem consideras uma afronta à dignidade e aos direitos fundamentais do cidadão.

O Estado não pode permitir que uma pessoa seja condenada por um crime, no qual todas as provas obtidas que o incriminam foram obtidas ilicitamente. O Estado perderia seu status de garantidor da segurança jurídica no exato momento da condenação. E sendo assim, quando as provas incriminadoras forem ilícitas, não havendo suficientes provas lícitas e indícios para condenar o réu, este deve ser absolvido.

E por fim, a doutrina entende quatro situações em que haverá admissão de provas ilícitas na persecução penal, a primeira delas é quando as provas ilícitas ou ilegítimas juntadas ao processo forem produzidas pelo acusado, ou o beneficiem. E não poderia ser de outra forma, pois a prova está sendo obtida pelo próprio interessado, caso que será de exclusão de ilicitude, tendo por justificação o estado de necessidade.

A segunda hipótese, que já foi mencionada anteriormente é quando a prova obtida por derivação também pudesse ser obtida por meio independente. A terceira causa de admissão, supõe que estas não possuem nexo de causalidade comprovado, e seriam obtidas por outro meio.

A quarta e não menos importante exceção ao princípio da inadmissibilidade da prova ilícita é quando a prova de um crime é obtida durante a investigação autorizada de outro crime.

 

11.              JURISPRUDENCIA

 Superior Tribunal de Justiça

Habeas Corpus nº 160.646/SP (2010/0015138-3)

Relator: Ministro Jorge Mussi

Impetrante: José Luis Mendes de Oliveira Lima e outros

Impetrado: Tribunal Regional Federal da 3ª Região

Paciente: Paulo BadihChehin

EMENTA:

HABEAS CORPUS - QUEBRA DE SIGILO FISCAL REALIZADA DIRETAMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - REQUISIÇÃO DE CÓPIAS DE DECLARAÇÕES DE IMPOSTO DE RENDA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - ILICITUDE DA PROVA - DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS - CONCESSÃO DA ORDEM.

 

1.                  Considerando o art. 129, inciso VI, da Constituição Federal, e o art. 8º, incisos II, IV e § 2º, da Lei Complementar nº 75/1993, há quem sustente ser possível ao Ministério Público requerer, diretamente, sem prévia autorização judicial, a quebra de sigilo bancário ou fiscal.

2.                  No entanto, numa interpretação consentânea com o Estado Democrático de Direito, esta concepção não se mostra a mais acertada, uma vez que o Ministério Público é parte no processo penal, e embora seja entidade vocacionada à defesa da ordem jurídica, representando a sociedade como um todo, não atua de forma totalmente imparcial, ou seja, não possui a necessária isenção para decidir sobre a imprescindibilidade ou não da medida que excepciona os sigilos fiscal e bancário.

3.                  A mesma Lei Complementar nº 75/1993 - apontada por alguns como a fonte da legitimação para a requisição direta pelo Ministério Público de informações contidas na esfera de privacidade dos cidadãos - dispõe, na alínea a do inciso XVIII do art. 6º, competir ao órgão ministerial representar pela quebra do sigilo de dados.

4.                  O sigilo fiscal se insere no direito à privacidade protegido constitucionalmente nos incisos X e XII do art. 5º da Carta Federal, cuja quebra configura restrição a uma liberdade pública, razão pela qual, para que se mostre legítima, se exige a demonstração ao Poder Judiciário da existência de fundados e excepcionais motivos que justifiquem a sua adoção.

5.                  É evidente a ilicitude da requisição feita diretamente pelo órgão ministerial à Secretaria de Receita Federal, por meio da qual foram encaminhadas cópias das declarações de rendimentos do paciente e dos demais investigados no feito.

6.                  Conquanto sejam nulas as declarações de Imposto de Renda anexadas à medida cautelar de sequestro, não foi juntada ao presente mandamus a íntegra do mencionado procedimento, tampouco o inteiro teor da ação penal na qual a citada documentação teria sido utilizada, de modo que este sodalício não pode verificar quais "provas e atos judiciais" estariam por ela contaminados, exame que deverá ser realizado pelo Juízo Federal responsável pelo feito.

7.                  Ordem concedida para determinar o desentranhamento das provas decorrentes da quebra do sigilo fiscal realizada pelo Ministério Público sem autorização judicial, cabendo ao Magistrado de origem verificar quais outros elementos de convicção e decisões proferidas na ação penal em tela e na medida cautelar de sequestro estão contaminados pela ilicitude ora reconhecida.

 

RECURSO EM HABEAS CORPUS - CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E DE LAVAGEM DE DINHEIRO - INVESTIGAÇÕES PRELIMINARES - QUEBRA DO SIGILO FISCAL DO INVESTIGADO - INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - REQUISIÇÃO FEITA PELO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL - ILICITUDE DA PROVA - DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS - TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL - IMPOSSIBILIDADE - EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO NÃO CONTAMINADOS PELA PROVA ILÍCITA - DADO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

 12.              AS PROVAS ILÍCITAS NO DIREITO COMPARADO

 12.1.        As provas ilícitas no processo penal norte americano

             O direito norte americano é baseado na common law (direito comum) que, em suma, trata-se do conjunto de precedentes jurídicos que vincula as futuras decisões dos tribunais e juízes. Os magistrados, destarte, criam e aperfeiçoam o direito, tornando as jurisprudências uma fonte de direito mais sólida que a própria lei.

            Tal estrutura jurídica, que inevitavelmente inspirou o próprio Sistema Judicial norte-americano, difere-se do civil law, que tem como principal fonte de direito a Lei, aplicado no Brasil. Enquanto no sistema brasileiro os operadores do direito, mormente, buscam no texto legal os preceitos para defender determinado ponto de vista, no sistema norte americano (common law) o principal núcleo de pesquisa e estruturação de argumentações baseia-se em decisões proferidas anteriormente pelo poder judiciário.

            Outro aspecto forte do direito norte-americano merecedor de destaque é o Federalismo limitado existente nos EUA, no qual a Constituição traz em seu texto os limites do poder federal perante o poder estadual. Depreende-se com isso que os Estados possuem uma soberania muito maior que a observada no Brasil, que por sua vez possui um poder federal concentrado e que vincula os entes federativos.

            Apesar das discrepâncias aludidas, o direito norte-americano comporta muitas semelhanças com o brasileiro, ao passo que a quarta emenda à Constituição norte-americana dispõe várias garantias como a inviolabilidade de documentos, pessoas e residências contra buscas e apreensões arbitrárias que só podem ser permitidas mediante ordem judicial fundamentada. No mesmo diapasão, a quinta emenda à Constituição dos EUA estabelece a garantia do devido processo legal (dueprocessoflaw), a liberdade individual e o princípio da não autoincriminação.

            A jurisprudência advinda da Suprema Corte norte-americana acerca da inadmissibilidade de provas no processo penal obtidas por meios ilícitos, estes entendidos como os que violem as garantias constitucionais supramencionadas, foi denominada de exclusionaryrules (normas de exclusão). Tais regras apontavam para o dever de se desconsiderar no processo as provas auferidas ilicitamente, frente ao desrespeito das garantias individuais dos cidadãos.

            Inicialmente, devido a uma interpretação restrita do princípio federativo, a Suprema Corte afirmava não serem aplicáveis as exclusionaryrules às provas obtidas por agentes policiais estaduais. Tal interpretação baseava-se na vontade do legislador constitucional de proteger os cidadãos norte-americanos da opressão do poder federal e para garantir a autonomia dos Estados.

            A ampliação da aplicabilidade das exclusionaryrules foi possível com a promulgação da 14ª emenda, que estendeu o devido processo legal aos estados, ensejando que a jurisprudência da inadmissibilidade de provas ilícitas também fosse aplicada aos atos da polícia estadual. Os entendimentos reiterados que formaram as regras em análise sempre tiveram o fito de limitar o poder estatal, contendo eventuais ações ilícitas dos agentes em prol das garantias individuais dos cidadãos.

 12.2.        Provas ilícitas no processo penal italiano.

             Foram sob ideologias contrastantes, datas do final do séc. XIX até as primeiras décadas do séc. XX, que se consolidaram a maioria das normas penais e processuais penais italianas, vigentes até a presente data. A mescla de pensamentos liberais e autoritários constituiu um emaranhado de leis, muitas vezes contraditórias, que regulavam o sistema jurídico penal da Itália.

            Apesar de manterem tradicionalmente o sistema inquisitório, no qual a pessoa do acusador se confunde com a do julgador, desde o período pós-guerra o sistema processual penal italiano sofreu modificações com caráter garantidor, aproximando seus métodos ao sistema acusatório, empregado no Brasil e considerado pela doutrina majoritária como mais justo. Com efeito, o juiz foi afastado da fase preparatória (anterior a fase judicial) que passou a ser de responsabilidade exclusiva do Ministério Público e da Polícia.

            Neste sentido, foi retirada do poder do juiz a possibilidade das provas colhidas na fase pré-judicial, isoladamente, constituírem fundamentos suficientes para uma condenação. Tal medida, que respeita o contraditório judicial, mostra o nítido caráter de proteção das garantias constitucionais do cidadão em detrimento do poder persecutório estatal.

            O processo penal da Itália, em suma, é basicamente dividido entre a audiência preliminar e o julgamento, incumbidas as partes da iniciativa das provas. Esta tarefa cabe apenas excepcionalmente ao tribunal, vedada tal possibilidade na fase anterior à judiciária, suavizando assim o princípio da verdade real e reservando ao magistrado, salvo em hipóteses de lesão às garantias fundamentais, a posição de expectador da disputa travada entre acusação e defesa.

            Contudo, apesar da notável aproximação do processo penal italiano do sistema acusatório, que garante o contraditório judicial, ainda existem discrepâncias em sua legislação que permitem a produção de provas que desrespeitam os princípios da publicidade e ampla defesa. Destarte, ainda se encontra distante a possibilidade do processo penal italiano respeitar plenamente o princípio do contraditório e do devido processo legal, tão importantes para o equilíbrio entre a acusação e a defesa no âmbito da ação penal.

            Acerca da utilização de provas ilícitas na persecução penal, o legislador italiano possui posicionamento semelhante ao brasileiro afirmando, via de regra, sua inadmissibilidade. Destarte, dispõe o CPP italiano em seu art. 191 que as provas produzidas com violação da proibição estabelecida em lei não podem ser utilizadas. A inadmissibilidade pode ser declarada pelo magistrado à qualquer tempo do processo, inclusive de ofício.

 12.3.        Provas ilícitas no processo penal alemão.

             O Processo penal alemão, que sofreu influências do “Movimento Científico” carregado de ideais iluministas, optou pela publicidade e oralidade de seus procedimentos e condicionou a atividade jurisdicional à iniciativa dos interessados, apesar da acusação ser exercida por agente governamental. As principais funções do processo - acusação, defesa e julgamento – encontram-se descentralizadas em figuras diversas, característica do sistema acusatório.

            A persecução penal é dividida basicamente em três fases: uma preparatória, incumbida ao Ministério Público; uma intermediária que depende do oferecimento de acusação após a fase preparatória; uma principal (judicial), regida pela publicidade e oralidade. A primeira fase, de cunho eminentemente secreto, conta com mínima participação do acusado, protegidos os direitos fundamentais deste.

            Deste modo, a segunda fase, que fica adstrita ao resultado da primeira, destina-se a apurar a existência de fundamentos fáticos que justifiquem a acusação. Se tal fase intermediária for aceita pelo tribunal surge, consequentemente, a fase principal, marcada pela divisão de funções, a oralidade e publicidade do processo e a iniciativa das partes quanto à produção de provas. Contudo, possui o tribunal a liberdade de obter todos os meios de prova que considerar relevante ou necessário, desde que não tome, ex officio, decisões de iniciativa atribuídas exclusivamente às partes.

            Assim como o direito processual penal italiano, o alemão proíbe expressamente a ilicitude acerca da produção de provas, inadmitindo qualquer tipo de violência ou promessa de recompensa na obtenção de informações do acusado durante a persecução penal. Neste diapasão, o legislador alemão também proibiu a utilização de provas no processo obtidas mediante violações às regras aludidas.

13.  CONCLUSÃO

 Desde o séc. XIII, mais precisamente em 1.215 com promulgação da Magna Carta pelo rei João Sem Terra, tivemos a inserção de um princípio importantíssimo que norteia o Direito, mormente o Direito processual: O devido processo legal. Doravante, por todo o mundo, tal preceito, oriundo do direito anglo-saxão, contou com a aderência de vários países com o objetivo de garantir que os bens de um cidadão, no sentido amplo, não fossem violados sem a observância de todos os procedimentos legais pertinentes.

            O tema do presente trabalho guarda proximidade com a defesa do princípio mencionado, pois, inadmitir a utilização de provas ilícitas na persecução penal é garantir o devido trâmite do processo resguardando os direitos individuais dos cidadãos. Neste sentido, coibir a utilização de provas obtidas em desrespeito aos direitos constitucionais é tornar devido o processo através do qual se apura a eventual ocorrência de um delito.

            O Estado, como garantidor do bem-estar social e consequentemente respeitador das leis que o regem, não pode se valer das ilicitudes que ele mesmo tenta extirpar do seio da sociedade com o intuito de se fazer "justiça". Não é coerente, nem mesmo razoável, que o suposto mantenedor da paz social utilize meios, para instruir o processo penal, que não coadunem com a ética e o respeito as suas normas estruturantes.

            A não observância das normas materiais no colhimento de provas, numa visão panorâmica, fere o sentido do próprio constitucionalismo moderno, que nas sábias palavras de Canotilho "é uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos". Com efeito, não obstante ao dever do Estado de aplicar, quando necessário, sanções penais aos indivíduos que cometeram delitos, não se olvida da necessidade hodierna da proteção dos direitos individuais em detrimento do poder punitivo do Estado. Afinal, numa eventual ponderação entre o interesse de punir do Estado e os direitos constitucionais dos indivíduos, adquiridos à duras penas, acreditamos serem estes de maior relevância que aquele.

            Num olhar rápido pela história brasileira percebe-se que não há muito tempo em que confissões eram arrancadas por torturas e ameaças e que as punições eram arbitrariamente aplicadas, em flagrante desrespeito ao devido processo legal, sob o discurso soturno da proteção da sociedade contra a criminalidade. Neste sentido, é válido citar  o caso dos irmãos Naves, conhecido como o maior erro do judiciário brasileiro, em que uma família humilde e trabalhadora foi torturada física e psicologicamente por um crime que jamais existiu, sob o argumento vil e macabro de que a sensação de segurança imputada à sociedade justificaria a punição severa de inocentes.

            Ainda nesta mesma linha de raciocínio, inesquecível e vergonhoso foi o período ditatorial militar, em que cidadãos eram torturados e mortos sob o escudo perverso e tirânico do dever de proteção do Estado contra aqueles que não concordavam com suas diretrizes. Épocas negras como as mencionadas acima, em que a opressão do Estado tirava vidas e destruía famílias, não devem jamais ser esquecidas sob pena de regredirmos à barbárie que assolou o Brasil em nítido e intenso desrespeito a dignidade humana.

            Em que pese o nosso país, principalmente com o advento da Constituição Federal de 1988, ter evoluído no sentido de garantir o devido processo legal, no que concerne o processo penal inclusive, diariamente ainda tomamos conhecimento de atrocidades cometidas por autoridades durante a persecução penal. Tais violações, como escutas telefônicas clandestinas, a coação física na busca de uma confissão forçada, entre outras manobras sub-reptícias em busca da suposta verdade, não podem ser admitidas sob pena de se motivar as autoridades à lesão deliberada das leis que resguardam a população.

            É inolvidável, portanto, a possibilidade e necessidade de o Estado cumprir seus deveres de proteção da sociedade, bem como da aplicação das sanções penais, quando estas se fizerem necessárias, sem precisar utilizar de violações às normas protetoras dos indivíduos. O Estado, resultante da reunião social, foi criado para defender os interesses da sociedade e deve observar as leis que regem esta, sob pena de perder um de seus mais importantes objetivos e deveres: a busca da harmonia social.

            Ademais, a importância do assunto tratado pelo nosso trabalho cinge-se, além da coerência e ética esperadas do Estado em relação aos jurisdicionados, no escopo pedagógico da inadmissibilidade de provas ilícitas com o fito de desincentivar as autoridades, incumbidas da investigação e acusação no âmbito jurídico-penal, de cometer ilicitudes na produção probatória contra o acusado. A ética e a observância do Estado em relação as normas basilares da sociedade, além de garantir a harmonia social e a defesa do devido processo legal, em última análise, ensejam o desenvolvimento do, quiçá, mais importante princípio que norteia o Direito atualmente: A Dignidade da Pessoa Humana.

 

14.  REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

AZEVEDO E SOUZA, Bernardo. KESSLER DE OLIVEIRA, Daniel. Revista síntese: Direito Penal e Processual Penal XI. nº 70, out. e nov. 2011.

AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo penal: esquematizado. 3ª Ed. São Paulo: Método, 2011.

GANDRA, Thiago Grazziane. Reforma processual penal - Lei 11.690/08 e as provas no CPP. Disponível em . Acesso: 23 abr. 2012.

GOMES, Geder Luiz Rocha. O conflito entre a defesa social e o respeito às garantias fundamentais. Disponível em . Acesso: 24 abr. 2012.

GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 8ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.

GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O processo justo. Disponível em http://scholar.googleusercontent.com/scholar. Acesso: 23 abr. 2012.

MAZZAFERA, Ana Carolina Araújo; LIMA, Silas Oliveira de; ALCÂNTARA, Renata Tavares. A Condição da vítima no âmbito do novo código de processo penal. Disponível em . Acesso: 22 abr. 2012

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 3ªEd. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

PACELLI DE OLIVEIRA, Eugênio. Curso de processo penal. 11ª Ed. Rio de Janeiro: Lumes Juris, 2009.

SILVA, De Plácido E. Vocabulário jurídico. 11ªEd. Forense.

“Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder”. Disponível em . Acesso: 22 abr. 2012

 


 [1]LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;

[2]Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

[3]§ 1º - Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.

 [4] LXIII - O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.

 [5]É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

[6] Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

 [7]Art. 17.  A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito.

[8] § 1º - A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente.

 [9]Art. 11.  Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova, acompanharão os autos do inquérito.

 [10] Art. 19.  Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

[11]Art. 16.  O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia.

 [12]Art. 18.  Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.

[13]Art. 311.  Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

 [14]Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

[15] STEINMETZ, Wilson Antônio, apud. ÁVILA, Humberto Bergmann. In Op. Cit., p. 158.

[16] BUSATO, Paulo Cesar. De magistrados, inquisidores, promotores de justiça e samambaias: um estudo sobre os sujeitos no processo em um sistema acusatório. 

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