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O USO ABUSIVO DA PUBLICIDADE COMO FORMA DE VIOLAÇÃO DOS DIREITOS INFANTOJUVENIS: UM ESTUDO SOB A ÓTICA DO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO ESPECIAL


Autoria:

Nayara Curvelo


Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Pará - UFPA. Ex-estagiária do Ministério Público do Trabalho da 8ª Região.

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Resumo:

Este artigo versa sobre o uso abusivo da publicidade, especificamente a direcionada às crianças e adolescentes, capaz de induzi-los a se comportar de maneira reprovável e até prejudicial à sua saúde ou segurança, em clara violação de seus direitos.

Texto enviado ao JurisWay em 08/04/2012.

Última edição/atualização em 29/05/2012.



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Resumo. Este artigo versa sobre o uso abusivo da publicidade, especificamente a direcionada às crianças e adolescentes, capaz de induzi-los a se comportar de maneira reprovável e até prejudicial à sua saúde ou segurança, em clara violação de seus direitos. Tal prática merece ser banida com a observância do princípio da prevenção especial que respalda e orienta, sobretudo, a atuação dos órgãos incumbidos de proteger o consumidor.

 

Palavras-chave: uso abusivo; publicidade; crianças e adolescentes; princípio da prevenção especial; consumidor. 

 

1. Introdução

Antes de analisar propriamente os casos específicos de violação dos direitos das crianças e dos adolescentes, é importante compreender o contexto em que se inserem e os meios disponíveis para o combate a essa prática. Por isso, é necessário apresentar, preliminarmente, uma noção do que seja o princípio da prevenção especial, o seu elo com a publicidade abusiva e de que forma uma base principiológica bem consolidada pode influir na redução desse quadro infrator.

Assim, com parâmetro nessa questão, o artigo versa sobre os impactos negativos da publicidade abusiva na formação cultural, moral, ética e familiar desses jovens e como os órgãos incumbidos de regulamentar, fiscalizar, receber denúncias e ajuizar ações vem se posicionando em relação aos recentes episódios de transgressão, em que pese o arcabouço legislativo, ético e regulamentar já estar solidificado no tocante a esse tema.

 

2. Do princípio da prevenção especial

O princípio da prevenção especial reza que o Poder Público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, conforme apregoa o art. 74 do Estatuto da Criança e do Adolescente, como forma de prevenir a ameaça ou lesão aos direitos da criança e do adolescente (art. 70, ECA). 

Pela leitura do artigo, depreendemos que, conquanto a Carta Magna consagre a inviolabilidade do direito à liberdade referida no seu art. 5º, caput, esta não pode ser exercida de forma absoluta em detrimento de outros direitos e garantias fundamentais, quais sejam, o zelo pela integridade moral e psicológica e o respeito ao seu pleno desenvolvimento (art. 17, ECA).

Diante da colisão de direitos fundamentais, é necessário ponderar os prejuízos que a ausência de cada um acarretará aos seus titulares, devendo o intérprete solucionar o conflito com base na razoabilidade que o caso concreto exige.

Assim, o bom-senso do julgador inclinará à preferência pela dignidade humana do menor, até porque a sua condição de ser em desenvolvimento requer do Estado um amparo mais eficaz e  prioritário. Daí porque o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que as diversões e os espetáculos devem conter informações sobre a natureza e a faixa etária do público a que se destinam, sob pena de responsabilidade da pessoa física ou jurídica.

Desse modo, crianças e adolescentes, como seres em desenvolvimento e, portanto, mais passíveis de inúmeras influências, devem receber tratamento adequado a sua capacidade de absorver informações para que não sofram possíveis danos, seja em sua personalidade, seja em seu desenvolvimento como cidadão consciente.  

Tomando como parâmetro este fator, o art. 76 do ECA surge justamente para acautelar os efeitos maléficos proporcionados pelos programas de TV, sem dúvida, os maiores responsáveis por distorcer valores e propagar condutas antiéticas como corretas, além de divulgar massivamente o consumo. Portanto, a finalidade precípua do mencionado artigo é proporcionar o desenvolvimento da cultura pautada na educação, nas artes e na informação de qualidade.  

De outro lado, o Poder Público não pode agir de modo imperioso, sem contrabalancear os efeitos negativos e positivos da exposição a tais eventos, por isso é importante uma maior representatividade do Conselho para discutir essas questões e alcançar a solução mais proporcional. 

 

3.  A publicidade abusiva em confronto com os direitos da criança e do adolescente

A publicidade abusiva, vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, não está sempre atrelada ao produto ou ao serviço, mas fundamentalmente às implicações decorrentes da propaganda, que pode ocasionar ao consumidor transtornos, constrangimentos e até riscos para a própria saúde e para a vida, principalmente em se tratando de crianças que, em certa fase, ainda não conseguem distinguir a ficção da vida real.

Não bastasse isso, a publicidade abusiva pode se tornar um veículo da discriminação e, como tal, deve ser terminantemente censurado. Nesse sentido leciona o doutrinador Rizzatto Nunes:

 

Por isso, a publicidade comercial não pode de maneira alguma agir de forma discriminatória. Há anúncios feitos com o propósito de criar polêmicas, para com isso conseguir espaço publicitário grátis. Se a polêmica estiver relacionada à discriminação, o anúncio é pura e simplesmente abusivo (NUNES, 2011, p. 565).  

 

Para configurar a índole abusiva, não é imprescindível uma lesão concreta, pois a mera existência de perigo abstrato é suficiente para caracterizar o dano potencial desse anúncio, haja vista que ele apresenta todos os elementos necessários para a ocorrência de um prejuízo futuro, motivo pelo qual não deve/deveria ser divulgado.

A matéria é tratada no § 2º do art. 37 do CDC, que assim reza:

 

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.

 

Da análise dos anúncios dirigidos especificamente às crianças e aos adolescentes, temos que eles devem atender a preceitos mínimos determinados pela Resolução do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar), no art. 37 do Código de Regulamentação, como a devida atenção às características psicológicas dos menores.

Na prática, ainda é muito desconsiderado pelos publicitários que, pelo contrário, utilizam todos os mecanismos possíveis para aguçar o desejo e alimentar ao máximo o imaginário daquela criança que, na hipótese de não conseguir o brinquedo dos sonhos, não só perturbará seus pais como também a si próprio. Realmente, não há de ser diferente, pois o consumo ainda está muito entrelaçado à idéia de felicidade, como se uma fosse pressuposto da outra.  Nessa esteira, o deputado federal Orlando Fantazzini (PSOL - SP) relata:

 

Nós vivemos numa sociedade de uma desigualdade social enorme. A programação da televisão chega nas casas das famílias que têm um alto padrão de vida e dos miseráveis. Quando você instiga uma criança a praticamente exigir dos seus pais, que muitas vezes sequer têm os recursos para dar o sustento, algum tipo de produto, cria um problema psicológico tanto para a criança quanto para a família

 

Confrontando a essa realidade, tramita desde 2001, um projeto de lei do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) que altera o Código de Defesa do Consumidor, proibindo a publicidade de produtos infantis. Contudo, há divergências, segundo a deputada federal Maria do Carmo Lara (PT-MG), a maioria não concorda com a proibição total, uma vez se tratar de medida por demais extrema.

A relatora recomenda a aprovação da matéria sob a forma de uma lei específica para regulamentar a publicidade infantil, em vez de alterar o Código. Além disso, esse substitutivo proíbe qualquer espécie de publicidade direcionada à criança em qualquer horário e mídia, salvo no caso de campanhas de utilidade pública voltadas ao desenvolvimento do menor.

O Código também prescreve que o respeito à inocência, credibilidade e inexperiência destes consumidores mirins deve ser priorizado na política publicitária, embora seja em boa parte ignorada, pois os anúncios utilizam esse fator como alvo principal para alcançar o máximo consumo, utilizando a criança, principalmente meninas, como fórmula para aumentar as vendas.

Exemplo disso são os slogans utilizados pelas empresas para explorar a inexperiência da criança, como em frases do gênero: “"O poder que você tem de colorir o mundo", dos Calçados Pampili; "Quer?" do Danoninho; "Criança gosta de comprar roupa sim!" das Lojas Avenidas; “Seja o que você quiser”, das Bonecas Barbie.

Ademais, o supramencionado artigo também veda a mensagem que propale o sentimento de inferioridade no caso de o menor não adquirir o produto em questão. É o caso do comercial  das Tesourinhas Mickey e Minnie da Mundial, cuja frase chave é “Eu tenho, você não tem”.

Nele, uma garotinha, loira e de olhos azuis, segura a tesourinha e a exibe inúmeras vezes enquanto canta: “Eu tenho, você não tem”, em nítido caráter discriminatório, e, como se não bastasse, a menina ainda mostra a língua, um gesto comum entre crianças quando pretendem se afrontar. Ora, não só induz a criança a se sentir inferiorizada se não adquirir aquele produto, como também estimula sentimentos egoísticos e competitivos, do tipo “eu tenho e não empresto” ou “eu sou melhor do que você porque tenho isso”.

Esse sentimento de inferioridade também é muito propalado entre as meninas diante de qualquer comercial da Barbie, que estimula a vaidade e adota os mesmos padrões de beleza já impostos pela sociedade e que elas, como crianças imaturas e pouco vividas, sentem-se frustradas quando não estão enquadradas nesse modelo 

O mesmo instrumento regulamentador também não admite mensagem que estimule o menor a constranger seus responsáveis ou terceiros. O tão famoso comercial “Compre baton, compre baton. Seu filho merece” induz a criança a exigir dos seus pais o chocolate, além de ser uma péssima referência alimentícia.  Esse é o entendimento de Davi Severino dos Santos:

 

A publicidade dirigida a crianças deve ser veraz e claramente identificável como tal; não deve aprovar a violência ou aceitar comportamentos que contrariem as regras gerais de comportamento social; não se podem criar situações que passem a impressão de que alguém pode ganhar prestígio com a posse de bens de consumo, que enfraqueçam a autoridade dos pais, contribuam para situações perigosas para a criança, ou que incentivem as crianças a pressionarem outras pessoas a adquirirem bens (SANTOS, 2005) (g.n).

 

Outro ponto suscitado é a proibição a mensagens que transmitam modelos e comportamentos apresentados principalmente por menores que trabalhem nos anúncios. Típico exemplo disso são os comerciais que veiculam o brinquedo associado à imagem do artista, como o caso do comercial da marca Vissi que relaciona a boneca à artista do SBT, Maisa. Além disso, o comercial, de 2008, também visa atingir o público masculino exibindo dinossauros, motos e o Super Max que, segundo a  apresentadora mirim, destina-se a “Meninos poderosos e legais”. Está evidenciada, portanto, a influência que esses artistas exercem sobre as crianças.   

Os anúncios publicitários também não podem sugerir ou apresentar distorções psicológicas ou comportamentos sociais condenáveis. O comercial da marca Claro (Promoção de Natal 2007) incorreu nessa grave infração. Nele, duas meninas aparecem segurando seus celulares, próximas a uma árvore de natal. De repente, uma delas recebe um torpedo do namoradinho e comenta: "Menino gruda no pé, né? Agora com a promoção da Claro a 6 centavos o minuto, ele liga toda hora."  A outra amiga diz que é muita pressão e a garotinha concorda e reclama que daqui a pouco ele vai querer casar, mesmo assim está desesperadamente apaixonada.

Não precisa ser um psicólogo renomado, um jurista ou um sociólogo para perceber que há algo condenável nesse anúncio publicitário, o quão abusiva é a referida propaganda.  Além de incitar o consumo tecnológico cada vez mais cedo, o mais grave é estimular a erotização precoce, como se algo socialmente natural e permitido fosse. Há, assim, evidente afronta ao art. 71, ECA, que, em linhas gerais, exige programação cultural, publicitária, educacional e artística compatível com sua condição de pessoa em desenvolvimento.

No sentido de evitar a distorção de conceitos entre os jovens, existe um Projeto de Lei, de nº 4440/2008, de autoria do Deputado Celso Russomano que considera abusiva a publicidade que induz a criança a desrespeitar valores éticos, da pessoa e da família. Nesse diapasão se posiciona Heloísa Mello:

  

Através da noção de abusividade, o legislador logrou reprimir condutas que, se não conflitam diretamente com o texto legal, inobservam valores fundamentais do ordenamento, sendo potencialmente danosas (MELLO, 2000, p. 129).

 

Por fim, é condenável, em qualquer hipótese, mensagem que não se preocupe com a segurança e com as regras de boas maneiras. Em2009, aempresa Nutrigás S/A, fornecedora de botijões de gás de cozinha divulgou propaganda com crianças fantasiadas de botijão de gás, com muitas cores e melodias do gênero “chegou seu amiguinho” e “vem dançar com a gente, gargalhar e ficar contente”.  Como veremos posteriormente, essa publicidade gerou temor e apreensão nos pais e ensejou inúmeras reclamações perante o Procon.

Destarte, cabe aos pais e responsáveis pelas crianças orientá-las e acompanhar seu desenvolvimento, pois, diante de tantas armadilhas que a TV e a internet proporcionam,  nem sempre o Poder Público põe em prática de imediato o art. 76 do ECA ou fiscalizam devidamente o conteúdo disposto nessas propagandas, cujo poder de influência  é impressionante.

 

4. O posicionamento do Judiciário brasileiro e dos órgãos de controle da publicidade diante de tais violações

Na estrutura privada de controle da Publicidade no Brasil encontra-se o CONAR (Comissão Nacional de Autorregulamentação) e, do outro lado, no setor público, atuam o Procon (Procuradoria de Defesa do Consumidor) e o Ministério Público.

No tocante à última propaganda exemplificada, o Procon Estadual exigiu que a empresa suspendesse a propaganda do ar por infringir o art. 6º, IV, e art. 37 do Código de Defesa do Consumidor e o art. 14 do Decreto Federal 2181/97 e realizasse uma contrapropaganda com efeito reverso para indicar os perigos que o botijão de gás pode ocasionar.

Contudo, ao contrário do que fora determinado, a empresa produziu outra propaganda, com idêntico teor, utilizando crianças e a artista infantil Maisa, do SBT. Diante disso,  o Procon enviou outra notificação para que suspendesse a nova propaganda, uma vez que o objeto em questão é inflamável e oferece potencial risco à saúde e à vida.

Além disso, o Procon recebeu muitas reclamações de pais e responsáveis que, em seus relatos, declararam ser surpreendidos com os filhos brincando com o botijão de gás, o que gerou imenso nervosismo e preocupação.

Em virtude da quantidade significativa de reclamações e a persistência da empresa na infração, o Procon Estadual/ES ajuizou Ação Civil Pública em face da empresa Nutrigás S/A,  na qual foi concedida liminar para suspender a transmissão da propaganda.

Em outra situação, o Procon/SP multou o Mc Donald’s em R$ 3,19 milhões por prática abusiva na venda do produto Mc Lanche Feliz, uma vez que, para adquirir o brinde, tão desejado pela criança até mais do que o próprio lanche, ela deveria comprar o sanduíche e seus acompanhamentos. Logo, a rede americana incidiu na vedação do art. 39, I, CDC que trata da “venda casada”, pois obrigava o consumidor a adquirir certo produto por estar, na verdade, interessado em outro, no caso o brinquedo. Além disso, a exigência estimula as crianças a adotarem péssimos hábitos de vida e prejuízos futuros à saúde.    

A denúncia foi feita em 2010 pelo Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana, que alegou a prática de “venda casada”, em proveito da vulnerabilidade infantil. O Procon assevera que, desde a data da denúncia, o Mc Donald’s realizou mais de 18 campanhas desse gênero, cujo preço do Kit está por volta dos R$ 13,00.

Em contraponto, a rede garante que segue os parâmetros legais na comunicação com a clientela e um rígido código de autorregulamentação publicitária e ressalta que os brinquedos podem ser vendidos separadamente. Contudo, essa alternativa não fica muito evidenciada na publicidade, além do que o TAC firmado pela empresa com o Ministério Público não esclarece a proporção entre os preços, de modo que é mais vantajoso comprar o lanche em conjunto com o brinde.  A empresa ainda pode recorrer da decisão.

Por fim, o caso de uma propaganda transmitida nas rádios brasileiras gerou tamanha repercussão que o Ministério Público de Santa Catarina ingressou com Ação Civil Pública contra a Editora Abril em face da publicidade abusiva da Revista Quatro Rodas.

Na propaganda, uma adolescente pede ao seu pai autorização para trazer o namorado para dormir em casa e praticar sexo selvagem capaz de acordar a vizinhança. Logo após, o pai responde aliviado: “Ufa, achei que ela ia me pedir o carro!”. Há, portanto, uma inversão de valores, pois o bem material se sobrepõe à formação moral da filha.

Diante disso, o Ministério Público fundamentou sua ação nos artigos 6º, IV e 37, § 2º, da Lei n. 8.078/90 c/c artigo 19, caput, e artigo 37 do Código de Autorregulamentação Publicitária do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária – CONAR e  nos valores éticos e jurídicos insculpidos nas regras do CONAR e do CDC, vez que ofende a estrutura e o poder familiar.

O Promotor de Justiça Fábio de Souza Trajano argumenta que essa espécie de publicidade:

 

Incentiva a valorização de bens materiais em detrimento da boa formação, e o desrespeito ao ambiente familiar, notadamente pela capacidade de influenciar as crianças e adolescentes a se comportarem de forma semelhante, pois a personagem tem a voz de adolescente. (g.n)

 

O Juiz de Direito Domingos Paludo, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, concedeu, no dia 23/09/2005, o pedido de liminar solicitado pelo Ministério Público Estadual para determinar a suspensão da propaganda nas rádios nacionais, sob pena de incidir em multa no caso de descumprimento. A decisão foi concedida in audita altera parte, ou seja, sem ouvir a parte contrária, dispensando-se a sua citação e, consequentemente, a sua defesa.

 

5. Considerações Finais

Indubitavelmente, a publicidade está tão atrelada ao capitalismo que é impossível imaginar a existência de uma sem a outra. Por isso, o Código de Defesa do Consumidor, percebendo que esse elo é quase indestrutível, regulamenta a publicidade, não para exterminá-la, mas para impor limitações imprescindíveis. Assim, expõe, de modo exemplificativo, as hipóteses em que ocorre o uso abusivo com  intuito de intimidar as empresas a não incorrem nessas situações, até porque o problema não reside exatamente na publicidade, mas sim no seu uso inadequado.

Uso impróprio esse agravado quando dirigido às crianças e adolescentes, pois, enquanto seres em desenvolvimento, inexperientes e com análise crítica mais reduzida, estão mais vulneráveis às armadilhas e aos objetivos da publicidade abusiva, qual seja, o de consumir ilimitadamente. Mas não só isso, visto que são também responsáveis por deturpar valores morais, éticos e familiares, embora não seja o intuito central. Em virtude disso, o art. 37, § 2º, do CDC prevê uma especial proteção aos menores e o art. 38, do mesmo diploma legal, estatui que cabe ao anunciante o ônus da prova da veracidade e da correção da publicidade.

Em suma, para que esses dispositivos sejam observados e colocados em prática, faz-se mister a atuação incisiva dos órgãos voltados à proteção do consumidor, visto que, sem a devida fiscalização, sem a aplicação de penalidades e  medidas preventivas, o texto da lei torna-se ineficaz e perde a finalidade para a qual foi criada: impedir a violação desenfreada de direitos.  

 

6. Referências Bibliográficas

DE LIMA, Maria Juliana Rodrigues. Aspectos destacados da publicidade no código de defesa do consumidor.  Monografia apresentada à banca  examinadora do Curso de Graduação em  Direito da Universidade Federal de Santa Catarina 2009. Disponível em: < http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/33712-43864-1-PB.pdf> Acesso em: 09 fev. 2012.

 

FERNANDES, Vivian. McDonald’s é multado em R$ 3 milhões por propaganda abusiva ao público infantil. Rádio agência NP, 2011. Disponível em: < http://radioagencianp.com.br/10422-mcdonalds-e-multado-em-3-milhoes-por-propaganda abusiva-ao-publico-infantil> Acesso em: 07 fev. 2012.

 

JÚNIOR, Hélio Santiago Ramos. A tutela jurídica do consumidor e a publicidade abusiva em rede.  Infojur. Apresentado no 1º Encontro de Escola Superior de Propaganda e Marketing: a mídia e o consumidor do futuro, SP, 2005. Disponível em: <http://www.infojur.ufsc.br/aires/arquivos/artigo%20consumidor%20helio.pdf> Acesso em: 8 fev. 2012.

 

MELLO, Heloísa Carpena Vieira de. Prevenção de riscos no controle da publicidade abusiva. In: Revista de Direito do Consumidor. Ano 9, n. 35. São Paulo: RT, 2000. pp. 123-131.

 

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RS. Publicidade Abusiva. IDEC, 2006. Disponível em: <http://www.mp.rs.gov.br/consumidor/noticias/id7126.htm> Acesso em: 07 fev. 2012.

 

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. 6ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

SALOMÃO, Lídia. A publicidade abusiva. Jurisway. Belo Horizonte, 2008. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/cursosentrar.asp?id_curso=954> Acesso em: 06 fev. 2012.

PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA. PSDB, Paraná, 2011. Disponível em: <http://www.psdb-pr.org.br/noticia.php?idnoticia=213> Acesso em: 07 fev. 2012.


 

SAMPAIO, Fernanda Tiosso. As abusividades da publicidade e o público infantil. Monografia apresentada como requisito parcial de Conclusão de Curso para obtenção do Grau Bacharel em Direito, Presidente Prudente/SP, 2008. Disponível em: < http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/681/752> Acesso em: 07 fev. 2012.

 

SANTOS, Davi Severino dos. A regulação jurídica da publicidade na sociedade de consumo. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4004>. Acesso em: 8 fev. 2012.

 

SEREDA, Alessandra; BONFIM, Débora Salazar et al. Sociedade e consumo: análise de propagandas que influenciam o consumismo infantil. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2359, 16 dez. 2009. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/14028>. Acesso em: 06 fev. 2012.

 

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