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O Ativismo Judicial


Autoria:

Diogo Dimas Bento Serafim


Aluno da Faculdade Paraíso do Ceará - FAP/Ce, Estagiário do Ministério Público Fedederal em Juazeiro do Norte

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Resumo:

O presente artigo visa analisar o Ativismo Judicial, discorrendo sobre suas raízes históricas e seu crescimento no Brasil

Texto enviado ao JurisWay em 09/12/2011.

Última edição/atualização em 13/12/2011.



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O Ativismo Judicial

Nos Estados desenvolvidos, é inegável a dominância do modelo de Estado Democrático de Direito, fundada em uma Constituição dotada de supremacia hierárquica. Porém, existem Constituições formais que estruturam a maior parte desses Estados, não se vinculando apenas à idéia de democracia a serviço de uma construção de uma sociedade livre, justa e igualitária, e, portanto, diante desse quadro, o Estado não pode ser mero espectador do jogo social, dele devendo participar ativamente.

Um Estado atuante é necessário Poderes atuantes. Do Poderes estatais, o Judiciário sempre foi o de atuação mais tímida, sempre preso a sua clássica função jurisdicional. A missão de tornar efetivo a supremacia da Constituição nos moldes de Konrad Hesse alterou profundamente esse quadro, convertendo o Poder Judiciário em protagonistas das transformações sociais almejado pelo Constituinte originário. Essa condição, de um lado, sepultou a concepção, de um lado, sepultou a concepção de um Judiciário estático e descompromissado, mas, de outro, trouxe à tona o fenômeno conhecido como Ativismo Judicial.

Nos últimos anos, houve um crescimento na atuação do Poder Judiciário para resolver contendas políticas e sociais, quebrando um paradigma acerca da atuação do juiz, que segundo a doutrina de Montesquieu, que será melhor abordado nesse item, era visto apenas como “boca da lei”. Nessa maior atuação do órgão jurisdicional, seus críticos questionam essa atividade, muitas vezes enfatizando a sua característica antidemocrática, já que os magistrados algumas vezes anulam atos de agentes políticos eleitos pelo povo, seja do Poder Executivo ou Legislativo, surgindo tensões entre o processo político majoritário e a interpretação constitucional. Essa atividade a doutrina denomina como Ativismo Judicial. Sobre esse aspecto, Luís Roberto Barroso1 assim expõe:


O plano da justificação política lida, substancialmente, com a questão da separação de Poderes e da legitimação democrática das decisões judiciais. É no seu âmbito que se procuram resolver as tensões que muitas vezes se desenvolvem entre o processo político majoritário - feito de eleições, debate público. Congresso, Chefes do Executivo - e a interpretação constitucional. Essa tensão se instaura tanto quando o Judiciário invalida atos dos outros dois Poderes – e.g., na declaração de inconstitucionalidade - como quando atua na ausência de manifestação expressa do legislador, por via da construção jurídica, da mutação constitucional ou da integração das omissões constitucionais. É nesse ambiente que se colocam discussões como ativismo judicial e autocontenção, supremacia judicial, supremacia legislativa e populismo constitucional, dificuldade contramajoritária e soberania popular


Segundo o mesmo autor, a idéia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: a) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; b) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; c) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas.

Os constitucionalistas em sua maioria atribui a origem do Ativismo Judicial a doutrina norte-americana, devido a grande atuação da Suprema Corte daquele país nas questões políticas e sociais, os denominados Hard Cases (Casos Difíceis) cujas decisões são parâmetros não só para todo o Poder Judiciário mas como toda a sociedade.

As origens do ativismo judicial remontam à jurisprudência norte- americana. Registre-se que o ativismo foi, em um primeiro momento, de natureza conservadora. Foi na atuação proativa da Suprema Corte que os setores mais reacionários encontraram amparo para a segregação racial (Dred Scott X Sanford, 1857) e para a invalidação das leis sociais em geral (Era Lochner, 1905-1937), culminando no confronto entre o presidente Roosevelt e a corte, com a mudança da orientação jurisprudencial contrária ao intervencionismo estatal (West Coast X Parrish, 1937). A situação se inverteu completamente a partir da década de 50, quando a Suprema Corte, sob a presidência de Warren (1953-1969) e nos primeiros anos da Corte Burger (até 1973), produziu jurisprudência progressista em matéria de direitos fundamentais, sobretudo envolvendo negros (Brown X Board of Education, 1954), acusados em processo criminal (Miranda X Arizona, 1966) e mulheres (Richardson X Frontiero, 1973), assim como no tocante ao direito de privacidade (Griswold X Connecticut, 1965) e de interrupção da gestação (Roe X Wade, 1973).

No Brasil, também ocorre cada vez mais o mesmo fenômeno, principalmente na atuação do Supremo Tribunal Federal, que também atuas em questões políticas (delimitação da fidelidade partidária) e sociais (determinação de postura do poder público para custear tratamentos de saúde), utilizando-se tanto das sua jurisprudência do instituto da Súmulas Vinculante. Conforme diz Luís Roberto Barroso2:


O Judiciário, no Brasil recente, tem exibido, em determinadas situações, uma posição claramente ativista. Não é difícil ilustrar a tese. Veja-se, em primeiro lugar, um caso de aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário: o da fidelidade partidária. O STF, em nome do princípio democrático, declarou que a vaga no Congresso pertence ao partido político. Criou, assim, uma nova hipótese de perda de mandato parlamentar, além das que se encontram expressamente previstas no texto constitucional. Por igual, a extensão da vedação do nepotismo aos Poderes Legislativo e Executivo, com a expedição de súmula vinculante, após o julgamento de um único caso, também assumiu uma conotação quase normativa. O que a corte fez foi, em nome dos princípios da moralidade e da impessoalidade, extrair uma vedação que não estava explicitada em qualquer regra constitucional ou infraconstitucional expressa.

(…)

Por fim, na categoria de ativismo mediante imposição de condutas ou de abstenções ao poder público, notadamente em matéria de políticas públicas, o exemplo mais notório provavelmente é o da distribuição de medicamentos e determinação de terapias mediante decisão judicial. A matéria ainda não foi apreciada a fundo pelo Supremo Tribunal Federal, exceto em pedidos de suspensão de segurança. Todavia, nas Justiças estadual e federal em todo o país, multiplicam-se decisões que condenam a União, o estado ou o município — por vezes, os três solidariamente — a custear medicamentos e terapias que não constam das listas e protocolos do Ministério da Saúde ou das Secretarias estaduais e municipais. Em alguns casos, os tratamentos exigidos são experimentais ou devem ser realizados no exterior.


A doutrina explica que o oposto do ativismo é a autocontenção judicial, conduta pela qual o Judiciário procura reduzir ao mínimo sua interferência nas ações dos outros Poderes. Por essa linha, juízes e tribunais evitam aplicar diretamente a Constituição a situações que não estejam no seu âmbito de incidência expressa, aguardando o pronunciamento do legislador ordinário, utilizam critérios rígidos e conservadores para a declaração de inconstitucionalidade de leis e atos normativos e abstêm-se de interferir na definição das políticas públicas. Até o advento da Constituição de 1988, essa era a inequívoca linha de atuação de juízes e tribunais no Brasil.

A principal diferença metodológica entre as duas posições está em que, em princípio, o ativismo judicial procura extrair o máximo das potencialidades do texto constitucional, sem, contudo invadir o campo da criação livre do Direito. A autocontenção, por sua vez, restringe o espaço de incidência da Constituição em favor do legislador ordinário. Ativistas e não ativistas, todavia, não contestam o que se denomina supremacia judicial: o reconhecimento de que deve caber ao Judiciário a última palavra acerca da interpretação da Constituição e das leis.

Trata-se, portanto, de uma questão de limitação da atuação de juízes e tribunais. Diversa é a tese defendida nos últimos anos por alguns teóricos constitucionais norte-americanos, denominada constitucionalismo popular ou populista, que defende uma ainda indefinida “retirada da Constituição dos tribunais” e consequente revalorização dos espaços genuinamente políticos de deliberação pública. Analisando a doutrina contramajoritária, Luís Roberto Barroso3 assim aduz:


Uma das grandes questões subjacentes à legitimação democrática do Poder Judiciário é a denominada dificuldade contramajoritária. Os membros do Poder Legislativo e o Chefe do Poder Executivo são agentes públicos eleitos, investidos em seus cargos pelo batismo da vontade popular. O mesmo não se passa com os membros do Poder Judiciário, cuja investidura se dá, como regra geral, por critérios essencialmente técnicos, sem eleição popular. A atividade criativa do Judiciário e, sobretudo, sua competência para invalidar atos dos outros Poderes, devem ser confrontadas com o argumento da falta de justo título democrático.


Qual seria então a justificativa que o Poder Judiciário usaria para fundamentar a sua sobreposição à vontade dos agentes políticos eleitos pelo povo advindos dos Poderes Executivo e Legislativo? A resposta para essa pergunta já foi amplamente debatida pela doutrina constitucionalista e hoje é assim respondida: com o amadurecimento da Teoria Constitucional, chegou-se a conclusão de que na confluência de ideias que produz o constitucionalismo democrático, a Constituição deve desempenhar dois grandes papéis, quais sejam, assegurar as regras do jogo democrático, propiciando a participação política ampla e o governo da maioria e proteger valores e direitos fundamentais, mesmo que contra a vontade circunstancial de quem tem mais votos. Luís Roberto Barroso4 explana a questão:


A Constituição deve desempenhar dois grandes papéis. Um deles é assegurar as regras do jogo democrático, propiciando a participação política ampla e o governo da maioria. Mas a democracia não se resume ao princípio majoritário. Se houver oito católicos e dois muçulmanos em uma sala, não poderá o primeiro grupo deliberar jogar o segundo pela janela! pelo simples fato de estar em maior número. Aí está o segundo grande papel de uma Constituição: proteger valores e direitos fundamentais, mesmo que contra a vontade circunstancial de quem tem mais votos. Ativismo e contenção judicial desenvolvem uma trajetória pendular nos diferentes países democráticos. Há situações em que o processo político majoritário fica emperrado pela obstrução de forças políticas minoritárias, mas influentes,ou por vicissitudes históricas da tramitação legislativa. De outras vezes, direitos fundamentais de um grupo politicamente menos expressivo podem ser sufocados. Nesses cenários, somente o Judiciário e, mais especificamente, o tribunal constitucional pode fazer avançar o processo político e social, ao menos com a urgência esperável.


Por fim, para reforçar e justificar a maior atuação por parte dos juízes, deve-se superar o que a doutrina denomina “O mito de Montesquieu”. Tal consiste na máxima rigidez do princípio da separação dos poderes, o qual segundo o clássico modelo exposto pelo Filósofo francês, os juízes seriam apenas a “boca da lei”, tendo apenas o papel de aplicar a lei sem qualquer juízo sobre sua razoabilidade, proporcionalidade ou ideal de justiça e pacificação da sociedade. Virgílio Afonso da Silva5 assim sintetiza a discussão sobre a teoria da separação dos poderes e o ativismo judicial:

 

Um dos principais argumentos que sustentam um dos lados da discussão acima delineada é a referência à teoria da separação de poderes. No Brasil, como em muitos outros países da América Latina, essa teoria é muitas vezes encarada de forma estanque e rígida. No modelo liberal clássico, no qual os juízes podiam ser considerados como simples "boca da lei", seria impossível imaginar que o Judiciário pudesse intervir na realização de políticas públicas e, em alguns casos, até mesmo corrigi-las ou defini-las. Mas o que é compreendido como a "teoria da separação de poderes" é, no entanto, uma simples visão enviesada das idéias de Montesquieu, aplicada a um regime presidencialista, em uma sociedade que é infinitamente mais complexa do que aquela que Montesquieu tinha como paradigma.


1 BARROSO, Luís Roberto, Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 2011, pág.345

2 BARROSO, Luís Roberto, Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 2011, pág. 347

3 BARROSO, Luís Roberto, Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 2011, pág.348

4 Op. Cit. Pág. 252

5 SILVA, Luís Virgílio Afonso da, O Judiciário e as Políticas Públicas: entre transformação social e obstáculo à realização dos direitos sociais.Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008: 587-599.

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