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ÉTICA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: NEPOTISMO, Uma conduta Ética?


Autoria:

Bianca Moreira Serra Serejo


Estudante do Quinto ano do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco-UNDB.

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Resumo:

Conceitua-se Nepotismo e, através dos conceitos de Ética e Moral, e ainda, norteando-se por princípios constitucionais, analisa-se a sua nocividade à Administração Pública brasileira.

Texto enviado ao JurisWay em 11/11/2010.



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1 INTRODUÇÃO

 

É indiscutível que há a necessidade, em todos os segmentos sociais, quer na política, quer na administração pública, no judiciário, e, principalmente, nas relações interpessoais diárias, de um código de condutas que possa nortear e selar a organização e o equilíbrio social. Um conjunto de princípios, valores, direitos e deveres que possam tornar nítido o liame subjetivo de onde termina um direito pessoal e onde começa o direito do próximo.

Desde Sócrates, com o surgimento da Ética Socrática, e talvez muito antes disso, iniciou-se a solidificação dos valores éticos em si, vários foram os intelectuais que defenderam a existência de um Código de Ética e de Moral. Com a codificação das leis e o surgimento do Direito positivo, tornou-se imprescindível a fusão entre valor e norma, de modo que a letra da lei não se transformasse em “letra morta”, obsoleta, e, sim, pudesse refletir os valores e anseios da sociedade, de modo a manter o equilíbrio das relações sociais.

Com a evolução da política, direito e sociologia, e com a solidificação da figura do Estado, fez-se necessário a manutenção de tais valores, com o intuito de proteger os direitos e garantias sociais e de frear a corrupção nos Três Poderes, fator forte e presente, que é nocivo para o bom funcionamento de uma sociedade.

O Nepotismo, termo utilizado para designar o favorecimento de parentes em detrimento de pessoas mais qualificadas, principalmente no que diz respeito à nomeação para cargos públicos, é considerado uma forma de quebra do Código Ético e Moral, e, no âmbito da Administração Pública fere nitidamente o Princípio da Moralidade.

No presente artigo, pretende-se estudar a evolução do conceito de ética, para que se possa, oportunamente, analisar a nocividade do Nepotismo na Administração Pública, e de como a prática desta conduta vai de encontro com valores éticos e morais.

 

2 HISTÓRICO DA ÉTICA: Sócrates, Aristóteles, Maquiavel, Hobbes, Rousseau, Kant e Marx.

 

A respeito de Sócrates e de sua contribuição filosófica muito já se discutiu, visto que tal filósofo não deixou nada escrito, e as fontes mais importantes de informações sobre ele vêm dos escritos de Platão. Sua vivência foi sua obra, e seu testemunho foi de grande contribuição para a ética e a filosofia.

Sócrates estudava a natureza humana e suas implicações ético-sociais. Sua dedicação à causa da educação das almas objetivava o bem da cidade. Para este pensador as leis deveriam ser obedecidas pois tal obediência era, para ele, o limite entre a civilização e a barbárie, e é nela que residem as idéas de ordem e coesão que garantem a existência e a manutenção do corpo social. Seu conceito de Ética:

 

[...] residia no conhecimento e na felicidade, ou seja, em primeiro lugar a ética significava conhecimento, necessário para julgar acerca do bem o do mal. Em segundo lugar a felicidade, que pouco tem a ver com posse de bens materiais, e sim com a semelhança com o que é valorizado pelos deuses. Ou seja, a ética socrática reune bem como orespeito às nosrmas vigentes,a busca da verdade, o engajamento do cidadão nos interesses da sociedade.[1]

 

Ironicamente foi durante o governo de restauração democrática, período em que deveria primar pela liberdade e justiça, que Sócrates foi condenado à morte sob a acusação de negar as divindades da cidade e criar outras, além de corromper a juventude com seus ensinamentos. Mas foi justamente nesse momento que se solidificou os valores éticos e morais por ele disceminados, pois, apesar de ter a possibilidade de fugir para não morrer, Sócrates decidiu enfrentar seus julgadores e se submeter à aplicação da lei, confirmando o valor desta como elemento de ordem do todo (pois vislumbrava nas leis um conjunto de preceitos de obediência incontornável, não obstante posssam estas serem justas ou injustas),em proteção ao Bem Comum. E, tal condenação só veio a demonstrar a relatividade de todo julgamento não pautado no verdadeiro senso de justiça.

Sobre o valor e a eficácia da lei sustentado por Sócrates ensina Bittar e Almeida[2]:

 

O ato de descumprimento da sentença imposta pela cidade representava para Sócrates a derrogação de um princípio básico do governo das leis: a eficácia. A eficácia das leis comprometida, a desordem social haveria de reinar como princípio, uma vez que cada qual cumpriria ou descumpriria as regras sociais de acordo com suas convicções própias; mas, para Sócrates, o débito social é incontornável. Assim, a inderrogabilidade do valor das leis ganhou força de princípio dogmático, coercitivo e vinculativo para todo aquele que se pudesse considerar um bom cidadão. A justiça política,que se fazia viva por meio das leis positivas, representou entre os gregos, a orientação da vida do próprio indivíduo. Sócrates serviu-se de sua própria experiência para fazer com que a verdade acerca do justo e do injusto viesse à tona. A lei interna que encontra guarida no interior de cada ser, lei moral por excelência, poderia julgar acerca da justiça ou da injustiça de uma lei positiiva, e a respeito disso opinar,mas esse juízo não poderia ultrapassar os limites da crítica, a ponto de lesar a legislação política pelo descumprimento. Ou seja, para Sócrates, com base num juízo moral não se pode derrogar leis positivas. O foro interior e individual deveria submeter-se ao exterior e geral em benefício da coletividade.

 

Para Sócrates a moralidade e a legalidade caminham juntas para a realização do bem social. E, ética seria a busca da verdade, felicidade, e o respeito às leis, consequentemente à coletividade ( que está acima da ética do indivíduo), devendo respeitar o princípio da anulação de um mal pelo seu contrário, assim da injustiça com um ato de justiça. Logo, a lição da ética socrática é uma lição de justiça.

Em Aristóteles (livro Ethica Nichomachea), a Justiça é o ponto principal de suas análises, logo, cabe à Ética investigar e definir o que é justo e o que é injusto. Ou seja, dentro da filosofia aristotélica a investigação ética não se destina à especulação ou à produção, mas à prática, à perquirição em torno do fim da ação humana, onde o conhecimento ético, ou seja, o conhecimento do justo e do injusto, do bom e do mau , é o ponto de partida para que uma ação converta-se em ação justa (de acordo com o que é justo) ou boa (de acordo com o que é melhor)[3].

A política, por ser, para ele, a mais importante das ciências práticas, deve ser orientada pela ética, que tem a função de traçar as normas adequadas e suficientes para a realização do Bem Comum. Neste sentido pode-se afirmar que:

 

[...]os conceitos éticos e políticos aparecem condicionados um pelo outro, pois, o Bem que a todos alcança afeta o bem de cada indivíduo, assim como o bem de cada indivíduo acaba convertendo-se no Bem de toda a sociedade. Logo, ao contrário do que defendia Sócrates, em Aristóteles, uma vez que o bem do todo é coincidente com o bem das partes, o indivíduo não se encontra inteiramente absorvido pelo Estado a ponto de sacrificar a sua esfera particular em prol da esfera pública[4].

 

Ao final da Idade Média européia, com o choque inevitável de civilizações que, até então viviam isoladas umas das outras, surge uma nova era histórica, mundando valores religiosos e éticos, cujas características essenciais representam a negação do velho mundo.

Nicolau Maquiavel manifestou a primeira grande ruptura no sistema ético tradicional, que englobava num todo harmônico, religião, moral e direito. Tal atitude deve-se ao fato do descontentamento de Maquiavel com a ganância do clero e dos nobres, os quais pautavam-se no individualismo e na utilização do poder público como forma de ascenção e manutenção do poder. A completa dilapidação da ética tradicional, que foi efeito da destruição das antigas estruturas de poder, influenciou no ceticismo de Maquiavel quanto à bondade natural dos homens e à sua capacidade de viver espontaneamente em paz com os seus semelhantes. Inovou ao sustentar, sem eufemismos que, a ética que rege a vida pública é especial, cujos valores supremos são a estabilidade interna e a independência externa da sociedade política. Logo, deve o Direito servir a essa finalidade maior, e o cumprimento dos preceitos de moral individual e dos ensinamentos religiosos devem ser submetidos às exigência de respeito à ordem e à manutenção da segurança[5].

Por prender-se ao que “é”, e não ao que “deve ser”, ou seja, por ser realista, Maquiavel defende que só há lugar para juízos de fato, nunca para juízos de valor. Logo, a consciência ética dos cidadãos, e o seu comportamente efetivo, baseados nos padrões de dever-ser estabelecidos na vida social, não são fatos reais que influenciem decisivamente no jogo do poder[6].

Percebe-se então que a ética em Maquiavel está focada nas atitudes a serem tomadas pelo príncipe para manutenção do Poder e harmonia do Estado, bem diferente da ética conceituada no Mundo Antigo por Sócrates e Platão, que visavam o Bem Comum, coletivo.

Á medida em que a organização social se torna mais complexa com a evolução da política, economia e do Direito, os conceitos de Ética e Moral vão sofrendo alterações, de modo a refletir os novos anseios sociais. Em pleno século XVII, Jean-Jacques Rousseau surge com um discurso oponente ao de Thomas Hobbes, pois, enquanto para Hobbes o centro da referência de ética é sempre o indivíduo e este, assim como Maquiavel, acredita na maldade intrínseca da natureza humana, para Rousseau o centro de referência da ética é a comunidade e sustenta a bondade natural do homem.[7]

Para Hobbes a legitimação da política está sempre acima do povo, situando-se no órgão que concentra todos os poderes, objetivando a garantia individual. Já em Rousseau, a legitimação da ordem política está no próprio povo soberano, afim de proteger a liberdade de todos (acreditava na restauração dos valores da ordem tradicional, dos antigos costumes, “devastados” pela modernidade).

Kant, admirador de Rousseau, convergia em vários aspectos com a linha depensamento deste:

 

Partindo do postulado da existência de uma vontade livre como atributo essencial do ser humano, Rousseau e Kant procuraram fugir do relativismo moral difundido na Europa após o desaparecimento da civilização medieva. Era preciso encontrar um fundamento absoluto para a ética; e esse fundamento foi apresentado por Rousseaus e Kant como uma lei superior: a vontade geral e o imperativo categórico. Outro traço comum é a recusa de fundar a ética no método empírico. Para Rousseau era necessário afastar todos os fatos para a construção da ética. E Kant, partindo do pressuposto da separação radical entre o mundo do ser e do dever-ser, rejeita categoricamente o método de se procurar justificar a lei moral pelos costumes, ou pelo exemplo das boas ações.[8]

 

Mas na linha de construção do conceito de ética dos dois filósofos também havia divergências. Para Rousseau, a apreensão da verdade moral é feita antes pelos sentimentos do que pela razão, acreditando que o maior erro dos moralistar era tomar o homem como um ser essencialmente racional, desprovido de emoções. Kant, ao contrário, sustentou que somente a razão pura, isto é, livre de qualquer influência emotiva ou sentimental, é capaz de encontrar as grandes leis da ética.

Em Rousseau, a sociedade moderna corrompeu os costumes antigos, e para ele, o homem nasce bom, mas o progresso desenvolve na sociedade um fomento da corrupção. Defendia a moral existente outrora em Roma e Esparta e, condenava a moral mercantil de favorecimento dos hábitos de luxos, uma ética voltada para a legitimação dos interesses burgueses e individuais, e que suprimia a pureza da ética baseada nos costumes, no patriotismo[9].

Ainda em Kant, o objetivo de suas reflexões éticas consiste em descbrir os princípios trancendentais, puros, do comportamente moral, que independem da experiência (empirismo), mas sim a condiciona. Afirma que só a virtude, ou seja, a vontade moralmente boa, nos torna dignos de ser felizes. Logo, o homem pode alcançar a felicidade por vários caminhos, mas o moralmente digno é o caminho das virtudes.

Segundo COMPARATO:

 

Foi imerso em um cenário que predominava a força econômica, a luta de classes como o móvel da sociedade, a opressão do frágil proletariado pela burguesia e a servilização do homem pelo trabalho, que Marx, no seu conceito de ética, despertou para um forte crítica social. A ética marxista leva em consideração a totalidade do ser, do existir do homem como ser histórico. Tal crítica tem uma dimensão propositiva, como possibilidade e necessidade histórica de "superar o estado atual de coisas" no processo de construção da "emancipação humana universal". Logo, a ética crítica marxista, de base histórica, de perspectiva transformadora está ligada à educação da classe trabalhadora, como produção de homens conscientes e livres, capazes de conhecer, intervir e apropriar-se do processo de produção material e espiritual ao longo do movimento histórico da humanidade[10].

 

3. ÉTICA: conceito, fundamentos e princípios.

 

Depois da construção do histórico das variações ético-morais ao longo da história, torna-se perceptível que o conceito de ética varia de acordo com o meio social, político, seja para quebrar com o modelo político-social vigente, seja para mantê-lo. Em pleno século XXI, a ética, apesar das mudanças sociais, políticas, econômicas e religiosas, é “a ciência do comportamento moral do homem em sociedade”[11].

Miguel Reale apud Nalini explica brilhantemente porque a ética é uma ciência, e faz a distinção entre ética e moral:

É ciência pois tem objeto próprio, leis prórpias e método próprio [...]. O objeto da Ética é a moral. A moral é um dos aspectos do comportamento humano. A expressão moral deriva da palavra mores, com o sentido de costumes, conjunto de normas adquiridas pelo hábito reiterado de sua prática. Com exatidão, o objeto da ética é a moralidade positiva, ou seja, o conjunto de regras de comportamente e formas de vida através das quais tende o homem a realizar o valor do bem. A distinção conceitual não elimina o uso sinônimo das duas expressões. A origem etimológica de Ética é o vocábulo grego ‘ethos’, a significar morada. Mas també quer dizer ‘modo de ser’, ‘caráter’. Esse ‘modo de ser’ é a aquisição de características resultantes da nossa forma de vida. A reiteração de certo hábitos nos faz virtuosos ou viciados. A moral deriva da palavra romana mores, com sentido de costumes[12].

 

Destarte, apesar de etimologicamente, ambas significarem costumes, suas conceituações são diferentes, pois a ética seria uma teoria, ciência dos costumes. Já a moral não é ciência, e sim objeto da ciência (ética). E, como ciência que é, a ética objetiva extrair dos fatos morais, os princípios derais a ele aplicáveis.

A ética é doutrina do valor do bem e da conduta humana que tem por objetivo realizar esse valor, e tem por princípios a busca da verdade, da justiça e do amor[13]. Logo, o complexo de normas éticas está baseada em valores, estes desginados de valores do bom.

 

3.1. Ética e o Estado

 

O Estado como pessoa é uma ficção formulada pelos homens com o objeivo de organizar a sociedade e disciplinar o poder, afim de que todos possam se realizar em plenitude, atingindo seus objetivos particulares.

Para que tal objetivo se consolide, o Estado mantém e difunde a moral, além de possuir seu valor ético, afim de realizar o “mínimo ético’ da convivência humana. Este ‘mínimo ético’ é garantido pela instituição de uma ordem jurídica, através de suas normas positivadas.

Para Nalini:

 

Há uma justificação moral para o exercício do instrumento de poder de que dispõe e há um caráter moral em seu uso. Pois ele põe um dique ao predomínio dos elementos menos menos humanos da natureza do homem em benefício da verdadeira humanidade. O Estado é, pois, a autodefesa di espírito humano ao assegurar a existênciaverdadeiramente humana dentro da vida coletiva. O Estado não é a idéia ética universal, mas é instrumento para se atingir o objetivo ético da criatura humana[14].

 

Destarte, o Estado, através de seu ‘código de ética’ objetiva a possibilidade de perssecussão dos interesses individuais, de modo a proteger o bem coletivo.

 

3.2. A ética e o Direito

 

Relembrando o que fora dito anteriormente, a ética é senão a ciência do comportamento moral do homem na sociedade. E, o Direito serve, também, como instrumento para garantir o ‘mínimo ético’. Logo, o comportamento que ultrapassar os limites morais, sofrerá sanções do Direito.

O Direito não deve ser somente entendido como sanção, mas também como conjunto de normas de dever-ser e, portanto, instrumento de organização social que traz em seu bojo normas constitucionais e civis, que fixam direitos e deveres do Estado (lato sensu) e dos cidadãos, e normas administrativas, com o objetivo de organizar a administração pública. Com relação ao Direito Positivo, é perceptível a quantidade de normas éticas inseridas em várias áreas do Direito bem como em suas normas jurídicas postivas, como no Direito Constitucional, no Direito Penal, Direito Civil, Direito Administrativo.

 

4.0. NEPOTISMO E A ÉTICA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A palavra Nepotismo vem do latim nepos, que significa ‘neto’ ou ‘descendente’[15]. Mas, seu significado moderno é utilizado para designar o favorecimento de parentes em detrimento de outras pessoas, principalmente no que diz respeito à nomeação e elevação a cargos públicos. De acordo com o Dicionário Jurídico[16] o verbete significa favoritismo, patronato. Nepotismo ocorre quando, por exemplo, um funcionário é promovido por ter relações de parentesco com aquele que o promove, havendo pessoas mais qualificadas e mais merecedoras da promoção.

 

4.1. Princípios Constituicionais da Administração Pública

A administração Pública, tanto em sentido subjetivo quando no sentido objetivo, está sobre o manto dos Princípios Constitucionais, que são a base de todo o ordenamento jurídico, de modo a garantir o bom funcionamento da administração e proteger as garantias e direitos fundamentais dos administrados. De acordo com o artigo 37 da Carta Magna de 1988

Art.37. A Administração Pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, e também ao seguinte: [...]

 

De acordo com o Princípio do Impessoalidade, todos os administrados devem ser tratados sem discriminação, sejam elas benéficas ou detrimentosas. Deve-se ressaltar que, a execeção a esse princípio será possível quando houver necessidade de manter o Princípio da supremacia do Interesse Público sobre o Privado, ou seja, quando houver necessidade de garantir os interesses coletivos.

Celso Antônio Bandeira de Mello sustenta que “o princípio em causa, não é senão o próprio pincípio da igualdade e da isonomia”[17].

De acordo com o Princípio da Moralidade Administrativa, também afetado pela prática de Nepotismo, a administração e seus agentes têm que atuar em conformidade com os princípios éticos, e, violá-los implica na própria violação do Direito, logo, o ato imoral configura-se ilícito, tornando a conduta viciada, inválida. Tal princípio compreende em seu âmbito, os chamados Princípios da lealdade e da boa-fé.

Jesús Gonzáles Peres citado por Celso Antônio Bandeira de Mello leciona:

Segundo os cânones da lealdade e da boa-fé, a Administração haverá de proceder em relação aos administrados com sinceridade e lhaneza, sendo-lhe interdito qualquer comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira a confundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte dos cidadãos.[18]

 

Os instrimentos capazes de combater os atos imorais são a Ação Popular, que pode ser impetrada por qualquer cidadão capaz, e a Ação Civil Pública, impetrada pelo Ministério Público. Reconhecida a imoralidade dos atos administrativos são sanções a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, declaração de indisponibilidade dos bens e obrigação de ressarcir o erário.

O Princípio da eficiência, de fácil entendimento em virtude do seu próprio nome, objetiva algo mais do que desejável, a eficiência no funcionamento da Administração Pública. Vale ressaltar, que a consolidação deste princípio só é possível se estiver em consonância com o princípioo da Legalidade e com os demais princípios, como exemplo o da Publicidade, Supremacia do Interesse Público sobre o Privado, da Razoabilidade, Proporcionalidade.

 

4.1. Controle do Nepotismo na Administração Pública

Ao se verificar a realidade atual de nosso país, constatamos que a conduta antiética e imoral tem corroído a credibilidade da Administração Pública. Mas o amadurecimento democrático brasileiro permitiu que tal problema pudesse ser discutido sob o prisma do interesse público e visando atender aos reclames éticos da sociedade para que se possa expurgar práticas prejudiciais à nação.

O combate ao Nepotismo não deveria ter sido travado se existisse moral. Mas como o bom costume caiu em desuso, os imorais necessitam que a moral seja projetada pela norma legal, para que sob o princípio da legalidade estrita, sejam tipificados, e só assim, seguidos. Mesmo que a CF/88 no seu art. 37 disponha, como já dito oportunamente, que entre outros princípios gerais, a Administração baseie sua atividade obedecendo a moralidade e a impessoalidade, mesmo assim, necessita-se da bilateralidade do Direito para que se elimine os “cânceres” administrativos.

Quanto às argumentações favoráveis ao Nepotismo percebe-se uma confusão preconcebida entre confiança e parentesco. Muitos argúem que a questão do parentesco traz a credibilidade e que, pelo fato de não haver previsão legal contra o Nepotismo na Administração Pública, esta conduta seria lícita.

Em voto proferido acerca do Agravo de Instrumento nº. 4930-2008, o Desembargador Marcelo Carvalho, do TJ-MA, posicionou-se brilhantemente:

Se, por um lado é certa a inviabilidade de aplicação da Res. 07/2005, do CNJ, no âmbito dos Poderes Executivo e Legislativo, não menos correto é afirmar que o nepotismo vai de encontro aos ideais de justiça e ao sentimento de repulsa do povo brasileiro frente aos privilégios aos quais está associada a sua prática. Em verdade, os que defendem ser possível o nepotismo nas esferas do Executivo e Legislativo embasam-se na ausência de qualquer vedação legal nesse sentido. Afirmam que, ao contrário do que ocorre em relação ao Judiciário, inexiste, nos demais Poderes, ato normativo que proíba a nomeação de parentes para o exercício de cargos comissionados. Alegam que o constituinte originário, ao prever os cargos em comissão, deixou de contemplar qualquer ressalva quanto aos possíveis ocupantes, não cabendo assim, ao intérprete da norma fazê-lo. Abraçam-se à estrita legalidade. Ocorre, contudo, que referidas teses, ao traduzirem apego exarcebado ao formalismo legal, conduzem à segundo plano dogma norteador do direito, qual seja, a realidade e vontade social. Necessário se faz, neste ponto, o afastamento da mera formalidade tecnicista. As regras não podem ser visualizadas como um fim em si mesmas. Devem, sim, servir ao homem, na busca de suas aspirações. Não se pode admitir a utilização da norma para preservação de iniqüidades e benesse em favor de grupos ou classes. [...] Princípio é o começo de tudo. É o alicerce. [...]quando desprezado dá ensejo ao completo esboroamento da construção intelectual. Os princípios atuam como vetores para soluções interpretativas. [...] O princípio da legalidade adquiriu nova dimensão com a ascensão do Princípio da Moralidade ao status constitucional. Há necessidade dos atos administrativos estarem de acordo com os princípios éticos e morais norteadores da Administração Pública. [...] a nomeação para o exercício de cargos comissionados de parentes da autoridade nomeante vai de encontro aos preceitos da lealdade, honestidade, probidade e boa-fé. Isto se dá porque difícil é crer que esta exigirá de seu filho, sobrinho, pai ou mãe o mesmo desempenho ou produtividade que imporia a quem com ele não mantivesse estreita relação. A eficiência do serviço público seria prejudicada [...].

 

Diante da quantidade de demandas impetradas no judiciário contra o nepotismo na Administração Pública, o STF editou a Súmula Vinculante nº. 13. O ministro Ricardo Lewandowski, relator do RE 579.951-4 que deu origem à súmula, assim se manifestou a respeito da falta de lei que regulamente o nepotismo:

"(...) o Plenário desta Corte já se manifestou a respeito da proibição ao nepotismo, antes mesmo do advento da Resolução 7/2005 do CNJ, conforme se depreende da ementa do julgamento do MS 23.780/MA, em que foi Relator o Ministro Joaquim Barbosa, verbis:

'MANDADO DE SEGURANÇA. NEPOTISMO. CARGO EM COMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA.

A proibição do preenchimento de cargos em comissão por cônjuges e parentes de servidores públicos é medida que homenageia e concretiza o princípio da moralidade administrativa, o qual deve nortear toda a Administração Pública, em qualquer esfera do poder. Mandado de segurança denegado' (grifei). De fato, embora existam diversos atos normativos no plano federal que vedam o nepotismo, inclusive no âmbito desta Corte, tal não significa que apenas leis em sentido formal ou outros diplomas regulamentares sejam aptos a coibir a nefasta e anti-republicana prática do nepotismo. É que os princípios constitucionais, longe de configurarem meras recomendações de caráter moral ou ético, consubstanciam regras jurídicas de caráter prescritivo, hierarquicamente superiores às demais e 'positivamente vinculantes', como ensina Gomes Canotilho. (...). Por oportuna, relembro aqui a conhecida e sempre atual lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo a qual '(...) violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda estrutura nelas esforçada'.  Ora, tendo em conta a expressiva densidade axiológica e a elevada carga normativa que encerram os princípios abrigados no caput do art. 37 da Constituição, não há como deixar de concluir que a proibição do nepotismo independe de norma secundária que obste formalmente essa reprovável conduta”[19]

 

A Súmula nº. 13 foi elaborada nos seguintes termos:

"A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal".

 

 A referida súmula vinculou seu efeito a toda Administração Pública, que, a partir da data de sua publicação, deve rever os seus quadros de cargos em comissão ou de confiança, e adequá-los conforme o entendimento firmado pelo STF.

A respeito do Nepotismo cruzado, que se caracteriza pelo emprego de familiares entre dois agentes públicos, como troca de favor, podemos, a fim de expurgá-lo, aplicar os mesmos argumentos utilizados para defenestrar o Nepotismo, pois nesta forma cruzada, caracteriza-se também, em virtude do favorecimento individual através da má-fe, afronta aos princípios da moralidade, impessoalidade, lealdade e boa-fé.

Destarte, é pacífico que o Nepotismo viola a ética e a moral, bem como os princípios constitucionais aqui citados.

 

5 CONCLUSÃO

 

Foi primordial, durante este artigo, vislumbrar o histórico e a evolução do conceito de ética, pois ética, como se pôde perceber, varia de acordo com o contexto social, econômico e político de uma determinada sociedade. Mister ainda, foi diferenciar a ética da moral, e estudar sua incidência no mundo contemporâneo e seus reflexos na sociedade, na política, e, principalmente no Direito. Só então, foi possível proceder à analise da possível ética e moralidade na prática do Nepotismo na Administração Pública.

Destarte, restou claro que s agentes públicos devem visar o interesse público, não a satisfação de seus interesses pessoais ou familiares. A prática do nepotismo é injustificável em nossa realidade, é imoral e fere a ética institucional que deve reger os Poderes de Estado, e por ferir o senso de razoabilidade da comunidade ao utilizar de cargos públicos para o favorecimento familiar.

Deve-se consagrar a supremacia da Constituição e de seus princípios, afastando qualquer possibilidade de nomeação de parentes da autoridade nomeante, pois afrontaria a ética, ignorando os valores morais dos indivíduos, o que acarretaria na perda de legitimidade daqueles que têm a missão de gerir os interesses do Estado. Logo, a defesa da moralidade administrativa está intimamente ligada à idéia de proteção à probidade na administração pública.

É preciso também que se tenha a integral observância dos preceitos morais e éticos de razoabilidade e justiça, pois a moralidade constitui pressuposto de validade de todo ato do poder público.

Logo, a inobservância dos princípios insculpidos no art.37 da Constituição, transformaria a norma em letra morta e mais ainda, a imoralidade estaria armada, pois o nepotismo é senão, um pálido reflexo da falta de moral e ética, que está profundamente entranhado na máquina pública.

 



[1] BITTAR, Eduardo C. B., e Guilherme Assis de Almeida. Curso de Filosofia do Direito. 4ª Edição. Editora Atlas, 2006. p. 64 – 70.

[2] BITTAR, Eduardo C. B., e Guilherme Assis de Almeida. Curso de Filosofia do Direito. 4ª Edição. p.73.

[3] BITTAR, Eduardo C. B., e Guilherme Assis de Almeida. Curso de Filosofia do Direito. 4ª Edição. p.92.

[4] BITTAR, Eduardo C. B., e Guilherme Assis de Almeida. Curso de Filosofia do Direito. 4ª Edição. p.93.

[5] COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. Companhia das Letras Editora. São Paul-SP, 2006. p.155-165.

[6] COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. p.155-165

[7] COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. p.229.

[8] idem. p.230.

[9] idem. p.240.

[10] COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. p.332.

[11] VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez apud JOSÉ RENATO NALINI. Ética Geral e Profissional. Editora RT, 6ª edição, 2008, São Paulo-SP. P.28.

[12] REALE, Miguel apud JOSÉ RENATO NALINI. Ética Geral e Profissional. p.28-29.

[13] COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. p.520.

[14] NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. p.237-238.

[16]HILDEBRAND, Antonio Roberto. Dicionário Jurídico. JH Mizuno Editora, São Paulo-SP, 2005. p. 208.

[17] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Editora Malheiros. São Paulo-SP, 15ª edição, 2003. pág. 104.

[18]PERES, Jesús Gonzáles apud Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo. Editora Malheiros. São Paulo-SP, 15ª edição, 2003. pág. 109.

[19] Disponível em http://www.stf.gov.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE579951.pdf. Acesso em outubro 2008.

 

 

REFERÊNCIAS

 

BITTAR, Eduardo C. B., e Guilherme Assis de Almeida. Curso de Filosofia do Direito. 4ª Edição. Editora Atlas, 2006.

 

COMPARATO, Fábio Konder. Ética, Moral e Religião no mundo moderno. Companhia das Letras Editora. São Paul-SP, 2006.

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