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RETROATIVIDADE DA LEI Nº. 12.015/2009


Autoria:

Francisco Afonso Jawsnicker


Assessor de Desembargador do TJMT, Professor da Universidade Federal de Mato Grosso, Coordenador Regional do IBCCRIM, Especialista em Direito Penal, autor da obra Prescrição Penal Antecipada, editada pela Editora Juruá, já na 2ª edição.

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Resumo:

O artigo, publicado originariamente na coluna Direito e Cidadania, do jornal Diário de Cuiabá, analisa a retroatividade da Lei nº. 12.015/09, que modificou o Código Penal, no título que trata dos crimes contra a dignidade sexual.

Texto enviado ao JurisWay em 05/08/2010.



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O jornalista Rogério Pagnan, na Folha de São Paulo de 15 de junho de 2010, publicou reportagem que informa que a nova legislação sobre crimes sexuais, que pretendia ser mais rígida e definiu o atentado violento ao pudor também como estupro, tornou mais brandas as penas contra criminosos.
Esse efeito indesejado – admitindo que a intenção do legislador, com a Lei nº. 12.015, de 7 de agosto de 2009, foi realmente endurecer o tratamento dado aos autores de crimes contra a dignidade sexual – decorre do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (grifei).
No mesmo sentido, o artigo 2º do Código Penal prevê que ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória, enquanto o parágrafo único acrescenta que a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
A Lei nº. 12.015/2009 é mais benéfica e, logo, retroage, na medida em que reuniu num único artigo ações que antes dela eram previstas em dois artigos. Explico melhor: antes havia o crime de estupro, previsto no artigo 213, e o de atentado violento ao pudor, previsto no artigo 214. Aquele artigo incriminava a ação de constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça, enquanto este incriminava a ação de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Hoje, existe o crime de estupro, previsto no artigo 213, que incrimina a conduta de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
Desse modo, antes da Lei nº. 12.015/2009, se o agente, num mesmo contexto fático, constrangesse uma mulher à conjunção carnal e à prática de outro ato libidinoso qualquer, responderia por dois crimes – estupro e atentado violento ao pudor – e, logo, estaria sujeito a duas penas. Com a Lei nº. 12.015/2009, o agente responderá por crime único.
Para ilustrar a hipótese, invoco a decisão proferida pela 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em 24 de setembro de 2009, no julgamento da Apelação nº. 70027829517, cujo acórdão foi publicado no DJRS de
No caso em questão, de acordo com a narrativa contida na denúncia, o réu foi denunciado porque, durante a madrugada, em uma estrada vicinal, no interior do veículo Gol que dirigia, constrangeu a vítima a praticar com ele conjunção carnal, mediante violência física, consistente em socos, tapas, bem como batendo a cabeça da vítima contra o veículo em que se encontravam, provocando nela as lesões corporais. Além disso, o denunciado, nas mesmas condições de tempo e lugar, constrangeu a vítima a praticar com ele atos libidinosos diversos da conjunção carnal, consistente em introduzir o pênis no ânus da ofendida, constrangendo-a ao sexo anal, além de também obrigá-la ao sexo oral, tudo mediante violência física contra a vítima, que era agredida a socos pelo denunciado quando tentava esboçar qualquer reação ou negativa.
Por conta desses fatos, o réu foi condenado em primeira instância a 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado, como incurso nos artigos 213, caput, e 214, caput, na forma do artigo 71, caput, todos do Código Penal.
No julgamento das apelações interpostas pela acusação e pela defesa, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou provimento ao recurso da acusação e deu provimento parcial ao recurso interposto pela defesa, para reduzir a pena a 7 (sete) anos e 7 (sete) meses de reclusão, também no regime inicial fechado.
Essa pena, no entanto, seria majorada, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça, julgando recurso especial interposto pela acusação, afastara a continuidade delitiva (artigo 71, caput, do Código Penal) e reconhecera a ocorrência de concurso material (artigo 69 do Código Penal), determinando em conseqüência o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para adequação da pena imposta.
Ao retomar o julgamento da causa, para cumprir a decisão do Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acabou reconhecendo a superveniência de legislação mais benéfica ao acusado, uma vez comparada à decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, já transitada em julgado e a qual se deve dar cumprimento.
O Desembargador Nereu José Giacomolli, no voto que proferiu como relator desse recurso, observou que a nova redação do artigo 213 do Código Penal, já em vigor, tornou o tipo penal de estupro um crime de ação múltipla, cuja consumação pode se dar tanto pela prática de uma única conduta dentre as previstas como proibidas, quanto pela prática de todas elas, havendo, sempre que praticadas contra uma mesma vítima e em um mesmo contexto fático, um crime único (grifo no original).
Analisando o caso concreto, em que ao acusado são imputadas três condutas diferentes praticadas contra a mesma vítima e em uma mesma situação de fato (constrangimento à prática de conjunção carnal, à prática de ato libidinoso diverso de conjunção carnal [sexo oral] e a permitir que com a vítima fossem praticados atos libidinosos diversos da conjunção carnal [coito anal]), concluiu pelo reconhecimento de um único delito de estupro, pela retroatividade da Lei nº. 12.015/2009, porquanto essa situação afigura-se mais favorável ao acusado, antes condenado pela prática dos delitos de atentado violento ao pudor e estupro em concurso material, o que certamente resultaria em um apenamento infinitamente maior.
O Tribunal de Justiça de São Paulo segue a mesma orientação: Outrossim, a nova Lei 12.015, de 07 de agosto de 2009 alterou o Título VI da parte especial do Código Penal (Decreto-Lei n°. 2.848, de 07 de dezembro de 1940). Entre as mudanças, alterou o artigo 213 do estatuto repressivo, incluindo, ali, o ato libidinoso diverso da conjunção carnal (ou atentado violento ao pudor), que antes era tipificado no artigo 214, que foi revogado, expressamente, pelo artigo 7º da citada lei modificadora. Assim, o cúmulo material entre as duas práticas criminosas, que era reconhecido por forte corrente da Jurisprudência, a qual foi acolhida, com ênfase no processo movido ao ora peticionário, atualmente não mais existe. A lei nova, como se vê, é benéfica ao agente e retroage, favorecendo-o. Diante dessa Lei e aplicada imediatamente, há que se fazer um reparo na sentença, no sentido acima disposto (13ª Câmara Criminal – Apelação n°. 990.08.110610-8 – Relator Desembargador Cardoso Perpétuo – Acórdão de 03 de dezembro de 2009, publicado em 18 de dezembro de 2009).
De igual entendimento o Tribunal de Justiça de Santa Catarina: Assim, a Lei nº. 12.015/2009, ao conferir nova redação ao artigo 213 do Código Penal, instituiu a tipicidade mista alternativa, cuja aplicação repele a possibilidade de concurso de crimes entre o estupro e o atentadoviolento ao pudor em suas redações pretéritas, de ordem a inviabilizar a dupla punição, razão pela qual, como reflexo, deve ser decretada, ex officio, a extinção da punibilidade do agente condenado pelo delito de atentadoviolento ao pudor, haja vista a peculiar hipótese de abolitio criminis (CP, art. 107, III; e, CPP, art. 61) (2ª Câmara Criminal – Apelação nº. 2009.014002-6 – Relatora Desembargadora Denise Helena Schild de Oliveira – Acórdão de 17 de novembro de 2009, publicado em 12 de janeiro de 2010).  
Ainda que a solução adotada nos julgados mencionados possa causar perplexidade no leigo, é preciso reconhecer que é a única solução possível, à luz do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, consagrado na Constituição Federal de 1988.
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