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Constitucionalidade da prisão do depositário infiel


Autoria:

Paulo Henrique De Araujo


Advogado militante nas áreas Cívil, Criminal, Trabalhista e Previdenciária.

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Resumo:

`A CONSTITUIÇÃO É O QUE OS JUIZES DIZEM QUE É ´, e´com esta frase de um famoso juiz americano que se chega a salutar conclusão que nosso judiciário é responsável por digerir os fatos sociais e retirar deste processo àquilo que for mais pertinente...

Texto enviado ao JurisWay em 13/12/2009.

Última edição/atualização em 14/12/2009.



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A Constituição de 1988 e seus efeitos na órbita infraconstitucional

 

 

Não se pode entender o direito das obrigações bem como a prisão civil por divida na atualidade sem antes nos remetermos ao fenômeno do constitucionalismo e de seu produto primordial, a constituição.

Como sabemos o constitucionalismo surge no mundo social com o escopo principal de combater a ingerência total promovida pelo sistema absolutista que reinava na Europa dos séculos passados, devido a este tipo de sistema onde o Rei era a personificação de estado e de todos os seus poderes, o monarca, concomitantemente, legislava, executava e exercia a atividade jurisdicional pelo seu bel prazer. Não é muito difícil perceber o prejuízo a que estavam submetidos aqueles sob seu julgo. Os cidadãos não gozavam de direitos e garantias contra possíveis arbitrariedades, exceto uma parcela da nobreza e do clero que possuíam certas prerrogativas, surgidas, para a nobreza, com a carta de 1215 do Rei João sem terra.

O clima começa a esquentar na Europa e na América do Norte, França lidera o movimento idealizado sob os princípios da liberdade, igualdade e fraternidade, os revoltosos compartilhavam do sentimento que tais princípios devem prevalecer entre os homens, os EUA compartilham do mesmo sentimento ao proclamarem sua independência em relação a sua colônia, a poderosa coroa inglesa.

A Revolução Francesa foi um marco muito importante para o fenômeno que deu origem ao conceito de Constituição como o conhecemos hoje, o escopo do movimento era impor limites aos detentores do poder, visando criar óbices a abusos e arbitrariedades, proporcionando mais respeito aos cidadãos, ou seja, ao povo.

Os Revoltosos estabeleceram em uma carta, direitos e garantias ao gênero humano em uma tentativa de não haver mais abusos exacerbados como os praticados no passado. Estabeleceram limites aos governantes e a seus subordinados, surgindo um acordo forçado, um pacto entre o povo e seus lideres, pacto este que estabeleceram direitos e obrigações a ambos os lados, bem como estabeleceu limites de atuação a ambas as partes.

Surge a Constituição Moderna.

A carta Magna nada mais é do que a opção de estilo de vida de uma determinada nação, ela expressa a norte ideológico, moral político e econômico de determinada coletividade.

Nos dizeres do Mestre Celso Ribeiro de Bastos:

 

“Constituição é o confronto de forças políticas, econômicas, ideológicas etc. que conforma a realidade social de determinado estado, configurando a sua particular maneira de ser.” (Curso de Direito Constitucional, São Paulo, pág. 43).

Vejamos a analise da citação do eminente mestre, quando diz; “Maneira de Ser” aduz nada mais que a forma de um estado se manifestar em suas relações, lembrando que o povo é elemento constituinte do estado juntamente com território, finalidade e soberania, este ‘jeito de ser’ é a forma como disciplina seu dinamismo social, as relações entre os particulares, entre o próprio estado e os particulares, entre os poderes que integram o estado e entre estados.

Importantíssimo se faz entender essa diretriz ora exposta para posteriormente compreender melhor qual o sentido devemos interpretar o direito civil bem como o ramo das obrigações sob o prisma dos ditames constitucionais.

 Então, já que constituição nada mais é do que o “jeito de ser” do estado, qual seria então o nosso jeito de ser?Como é modernamente?

Modernamente nosso jeito de ser, isto é, nossa constituição, obedece às regras ditadas pelo chamado poder constituinte originário, que em nome do povo e baseado em seus anseios e desejos, elaboraram as normas que integram a atual constituição.

A teoria da constituição, ramo dogmático jurídico que tem por objeto o estudo das normas constitucionais, afirma que o poder supracitado tem como características a incondicionabilidade e a ilimitabilidade mais percebemos que o regime optado pela nação, em nosso caso o democrático de direito, influencia, e muito, o sentido axiológico e normativo das normas que integram a lei maior em seu processo de formação.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, chamada carinhosamente de constituição cidadã por Ulisses Guimarães, estabeleceu um rol de direitos e garantias fundamentais de forma extensa e exemplificativa (numerus apertus) e em razão disso abre margem a acolhida de novos direitos e garantias originadas de acordos internacionais que o pais ratificou e que possa vir a ratificar, é o que aduz a norma contida no artigo 5º, em seu parágrafo 2º, graças a este jeito de ser específico adotado por nosso constituinte que será possível a mudança interpretativa do inciso LXVII do mesmo artigo, dispositivo este que trata da prisão civil por dívida e que terá a parte que rege a hermenêutica sobre o encarceramento do depositário infiel analisado ulteriormente.

Mas como a Constituição pode influenciar o código civil e tudo que dele decorre, sendo o mesmo uma codificação normativa infraconstitucional?

Pois bem, nosso ordenamento jurídico adota o principio da supremacia das normas constitucionais, princípios este que coaduna com a teoria de Hans Kelsen a respeito do posicionamento de normas constitucionais dentro de determinado ordenamento, de acordo com referido princípio as normas que integram a carta maior são locadas no topo da pirâmide normativa, irradiando validade a todas as demais espécies normativas que se encontram abaixo, via de conseqüência, todas as demais normas, ditas infraconstitucionais devem obediência aos princípios e mandamentos que decorrem da Constituição.

É por esse princípio que o código civil de 2002 adota as chamadas clausulas gerais, normas abertas que permitem ao interprete aplicar os princípios constitucionais, há assim, uma hermenêutica mais aberta, diferente do que ocorria com o código civil de 1916, bem mais hermético.

Vejamos na prática.

Vamos analisar a norma contida no artigo 113 do CC/2002:

 

 “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa fé e os usos do lugar de sua celebração.”

 

O citado artigo traz em seu bojo uma norma de caráter geral, que permite ao interprete (magistrado) visualizar no termo: “Boa fé” um principio (no caso a Boa Fé objetiva) que decorre do objetivo constitucional de construir uma sociedade livre, justa e solidária (CRFB/1998 Art. 3º, I), para que uma sociedade seja justa e solidária seus membros devem agir de Boa Fé em suas relações, através deste instrumento  ( a clausula geral) o magistrado terá condições de aplicar o direito ao caso concreto observando sempre as diretrizes constitucionais, então temos que o “ jeito de ser” do estado, fruto da deliberação daqueles que representam o povo, se manifesta em todo ordenamento jurídico, o código civil bem como o ramo das obrigações, são partes de um todo, um todo constitucional, chamado bloco de constitucionalidade para alguns, tal conceito enseja que não é somente o que esta inserido formalmente no texto constitucional é que tem validade de mesma natureza, há princípios e valores não materializados nas normas constitucionais que pairam em todo ordenamento jurídico proporcionando um verdadeiro clima constitucional.

Vejamos parte da fundamentação do decano do STF ministro Celso De Melo na ADC-MC 12/DF:

“O parâmetro constitucional (bloco de constitucionalidade) é mais vasto do que as normas e princípios constantes das leis constitucionais escritas, devendo alargar-se, pelo menos, aos princípios reclamados pelo ‘espírito’ ou pelos valores que informam a ordem constitucional global’

É por isso que devemos não nos dedicar ao direito civil mais sim ao direito civil constitucional, não ao direito penal mais ao direito penal constitucional e daí por diante, tudo que se origina do espírito constitucional se prolifera por todo ordenamento jurídico, o ‘jeito de ser’ escolhido por nosso constituinte originário para guiar e disciplinar as relações em nossa sociedade não se resume em 250 artigos, mas sim ao norte ideológico do regime democrático de direito fundado no principio da dignidade da pessoa humana e tudo que dele decorre.

 

 

Somos resultado daquilo que fazemos repetidas vezes... (Aristóteles)

  

 

Direito Civil Constitucional

 

Com o advento da constituição de 1988 o direito civil pátrio passou por uma reformulação a ponto de se enquadrar na nova conjuntura normativa e ideológica instaurada pela nova carta. O antigo código de 1916, hermético, patrimonialista e individualista perder espaço para um novo código civil voltado para conceitos mais próximos dos princípios constitucionais que visam à garantia e respeito do individuo como pessoa humana, esta pessoa, destinatária de garantias mínimas a serem respeitadas.

A constituição trouxe uma importante inovação para o ordenamento jurídico Brasileiro, qual seja? A abertura interpretativa, isso mesmo, saímos do positivismo hermético, característico do código napoleônico para uma era de mais abertura, marcada por uma hermenêutica mais dinâmica com objetivos mais inteligentes, estamos agora mais avançados na dogmática jurídica.

Vejamos a opinião do eminente professor Nelson Rosenvald.

 

“Vivenciamos o pós-positivismo. Celebramos a supremacia axiológica da Constituição Federal e o fim do legalismo estrito.” ( Direito das obrigações, 2ª edição, lúmen júris, pág. 1)

 

As contendas particulares não mais se digladiam na seara do hermetismo, se valem agora de instrumentos mais hábeis a proporcionar um resultado jurídico mais justo, tendo como conseqüência um resultado social mais aceitável aumentando a legitimidade de nosso judiciário ao dirimir conflitos no campo do direito privado.

A propriedade privada, verdadeiro escudo do patrimonialismo de 1916, não mais exerce seu absolutismo, é fiscalizada pela função social, elencada pela constituição de 1988 como uma garantia de harmonia social em busca do objetivo de construir uma sociedade mais justa e solidária (CRFB/88, Art. 3º, I) aquele que se vale da propriedade privada apenas para acumulo quantitativo de bens, se encontra na contramão do estado democrático de direito, bem conciso, mais é isso.

De acordo com essa nova percepção, não cabe mais ao direito dar supremacia apenas ao credor, ao dono, ao pai, ao empregador; a nova estrutura constitucional imposta pela carta de 1988 mudou as regras do jogo, agora os princípios da eticidade, socialidade e operabilidade são observadas no sentido de proporcionar vantagens e conforto as ambas às partes de uma relação judicial e também as pessoas que se encontram fora de seu âmbito de atuação.

É a chamada função social do contrato ou do negocio jurídico.

Para entender bem o que foi dito até aqui, vamos nos ater agora ao principio basilar de todo o estado democrático de direito, principio esse que erradia seus efeitos com muita magnitude por toda seara civil, é o principio da dignidade da pessoa humana, agasalhado por nossa constituição como fundamento em seu artigo 1, III.

É sabido por todo civilista que o que caracteriza mais nitidamente a seara privada é a autonomia das partes em relação ao estado, os particulares possuem a prerrogativa da liberdade contratual, não absoluta é claro, mais essencial. O que seria o ser humano sem sua liberdade, ela é inerente a sua própria dignidade, sem ela (a liberdade) não se é feliz, e se você não é feliz, não é digna, não esta na condição de ser humano, este merece ao menos a chance de tentar ser.

 

“Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta... não há ninguém que a explique e ninguém que não a entenda.” (Cecília Meirelles). 

 

    A liberdade hoje disciplinada pelo código civil Pátrio trilhou uma jornada sangrenta até nossos dias, agora já esta sedimentada ao patrimônio do individuo através do principio da dignidade humana, a liberdade proporciona ao indivíduo uma autonomia de vida incrível e nunca antes experimentada tão universalmente como é hodiernamente, ilustrando o comentário supra, vejamos a opinião filosófica de Voltare

 

“Posso até não concordar com suas palavras, mas prometo morrer pela liberdade de você as dizê-las.”

 

Até agora vimos como é importante o conceito de liberdade para o individuo e como este mesmo conceito é peça chave no quebra cabeça chamado direito civil. Sabemos também que a liberdade decore do principio constitucional da dignidade da pessoa humana, alias um dos que deste decorre.

O citado princípio funciona como um chuveiro que quando acionado libera seus filetes de água, a dignidade da pessoa humana, jorra seus filetes em todos os ramos de direito que integram nosso ordenamento. Vejamos um exemplo tirado do código civil\ 2002:

Artigo 16:

 

“Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e sobrenome.”

 

            O individuo que não tem a chance de receber um nome, que é sua identificação social, tem sua dignidade lesada e merece ser protegido contra tal ato.

            Não podemos nos furtar de dizer que o novo código civil, interpretado a luz da constituição, da maior ênfase ao coletivo, ao social em detrimento ao individualismo reinante no código de 1916, desta nova abordagem reina a boa fé objetiva, a responsabilidade civil objetiva, ambas preocupas em disciplinar as condutas de particulares e públicos com o objetivo de não lesar seus colaterais.

            Vejamos o que diz a jurisprudência nesse sentido:

            Sumula do STF n° 562:

 

            “Na indenização de danos materiais decorrentes de atos ilícitos cabe a atualização do seu valor.”

 

            O ato ilícito é fonte de obrigações, causar dano a outrem ou a seu patrimônio é causa que enseja indenização, salvo quando presente alguma excludente de ilicitude.

            O diploma civil preceitua que aquele que nasce com vida detém personalidade civil, apesar de absolutamente incapaz de exercer diretamente os seus direitos é detentor de direitos fundamentais, o que quero dizer com tais colocações, é que princípios como a boa fé objetiva e função social possuem como destinatários todos aqueles que se encontram como possuidores de direitos fundamentais, o direito civil constitucional amplia sua visão saindo do seu antigo paradigma estritamente positivista.

            Olhemos o que diz o caput do artigo 5°:

 

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”

 

            A partir dele nossa lei maior reconhece no individuo estrangeiro, seja residindo ou temporariamente no país, um possuidor de direitos fundamentais, logo, no que couber, nosso código civil deve respeitá-lo e protegê-lo quanto a eventuais abusos e lesões.

            A partir dessa visão aqui abordada, percebemos a mudança no paradigma civilista, a autonomia privada não mantém a sua supremacia absoluta, diante do ganho de força normativa e axiológica da constituição, ela se vê direcionada no sentido do bem comum, perdeu sua característica egoísta e individualista, não mais encerra seus efeitos no circulo hermético estipulado inter partes, eis que agora temos no palco privado os deveres anexos, a cooperação, a informação e proteção devem ser observados, tudo em nome da solidariedade, base de uma coletividade mais harmônica e igualitária.

            No estudo constitucional das obrigações, vamos exemplificar os conceitos aqui demonstrados e poderemos perceber o quanto é importante esse sincronismo entre constitucional e infraconstitucional para a condução da sociedade rumo aos objetivos traçados pelos seus integrantes.

            Mas como é realizada a fiscalização quanto à observância destas questões constitucionais, como são disciplinados e aplicados em todo o mundo jurisdicional os princípios constitucionais?

            Muito importante é compreender o teor desta resposta para posteriormente clarear as duvidas a respeito da prisão civil por divida, especificamente a do depositário infiel e na alienação fiduciária em garantia, temas estes que serão o objetivo de nossa análise em estudo posterior.

            Em nosso país, com uma formação centrífuga de federação, modelo este onde o estado central erradia autonomia aos novos estados membros, há uma constituição que regula toda a federação e é ela que doa validade a todo o mundo normativo federado, como já visto anteriormente, e o controle dessa validade é atribuído a uma corte constitucional, no Brasil o STF é considerado o guardião da CRFB.

            O STF dispõe de um sistema denominado de controle de constitucionalidade de leis e atos normativos, sendo o meio através do qual a corte aprecia e analisa a compatibilidade de uma lei ou ato normativo perante as normas constitucionais, ele pode ser concentrado quando se analisa uma lei em tese utilizando seus instrumentos da ADI e ADECON ou difuso quando se detecta a inconstitucionalidade de uma lei por meio da análise (por qualquer juiz ou tribunal) de um caso concreto, neste caso a sentença terá eficácia inter partes e ex tunc.

            Importante lembrar que qualquer dos poderes pode realizar o controle de constitucionalidade, acontece é claro, de maneira especifica e bem delineada, exemplo é o veto a projeto de lei pelo presidente da república, sendo este veto jurídico não capaz de ferir o principio da separação dos poderes albergado no artigo 2° da CRFB.

            Agora sabemos que se uma lei no âmbito civil, por exemplo, for aprovada e inserida no ordenamento jurídico e posteriormente for detectada sua inconstitucionalidade ao ferir princípios contidos na constituição, terá como resultado sua impugnação via ação direta de inconstitucionalidade ou por meio incidenter tantum, também conhecido como via de defesa, evitando assim lesões a direitos.

            São instrumentos como estes que possibilitam a aplicação do direito respeitando-se a diretriz constitucional, o direito civil é observado desta forma, na análise do artigo 5° LXVII que trata da prisão do depositário infiel constataremos a prática e eficácia deste sistema.

            Enfim, o espírito da constituição paira sobre todo o ordenamento jurídico, impondo o sentido de aplicação do direito ao caso concreto, às vezes isso foge ao rigoroso formalismo jurídico-positivo e abrange matérias não previstas na constituição, é o chamado bloco de constitucionalidade, por tal teoria se aduz que a constituição não é somente o que está escrito, mas sim valores e princípios que norteiam o caminho ideológico e normativo do direito (c.f adecon n 12 relator ministro Carlos Britto).

             Então é isso, daqui para frente será mais fácil compreender como se desenrola o direito civil, o campo das obrigações e o específico tema da prisão civil por divida sobre a luz do sistema constitucional.

 

  

Os preceitos constitucionais e o ramo das obrigações

 

            O direito obrigacional é conhecido desde os tempos romanos onde os mesmos já se preocupavam em regular as relações jurídicas entre os particulares, prova que esta modalidade jurídica é uma das mais antigas que existem, a atividade de contrair determinado compromisso e cumpri-lo de acordo com o combinado merecia tanta atenção desses antigos povos que o seu descumprimento poderia levar o inadimplente a pena de morte. A maior característica das obrigações era seu caráter pessoal, o vínculo que unia o credor ao devedor era estritamente pessoal e levou-se muito tempo para que Napoleão desse início a transformação do vínculo pessoal em patrimonial.

A respeito do tema e de acordo com Nelson Rosenvald:

 

            “E um grande salto no tempo, o código Napoleônico de 1804 – marco para todas as codificações do século XIX  e inicio do século XX – estabelecia que no patrimônio do devedor os credores encontrariam as garantias para o caso de inadimplemento ( art. 2.093).”

 

            Característica marcante ao longo dos séculos é a sua universalidade, é impossível pensar em qualquer ordenamento jurídico no mundo que não tenha em seu bojo o ramo obrigacional, claro que não de maneira uniforme, guardando cada um suas peculiaridades.

            Chegamos ao ponto, comungamos da idéia que cada ordenamento adota uma constituição moldada as necessidades e objetivos de cada sociedade que as elaborou, por isso temos classificações diferentes para seu conceito, temos, por exemplo, a constituição sintética nos E.U.A e analítica no Brasil, temos também a consuetudinária na Inglaterra e a formal em nosso país, pelo que foi mostrado pelo presente trabalho anteriormente, temos a inteligência de saber que o mundo infraconstitucional é influenciado normativamente pela carta maior, daí concluímos que o  ordenamento jurídico ( para aqueles que adotam o constitucionalismo), é capitaneado por uma determinada carta constitucional e que esta caracteriza o ramo das obrigações de maneira a torná-lo constitucional, ou seja, em conformidade com as regras, princípios e valores constitucionais vigentes.

            Destarte, as peculiaridades de cada linha obrigacional sofrem, com certeza, influências da carta política adotada.

            Antes do advento da constituição de 1988, o código civil de 1916 era o centro de todo o sistema normativo (pois a constituição não tinha o valor normativo e axiológico que tem hoje) gozava de uma autonomia bastante ampla em relação à constituição ou constituições reinantes a época, mas tal afirmação não pode ser encarada como absoluta, ele respeitava suas limitações, até porque, já existia controle de constitucionalidade.

            Como sabemos, com o fim do retrocesso militar instaurado pelo golpe de 1964, nasce um novo regime inaugurado com a lei maior de 5 de Outubro de 1988 e que vem demonstrando um ganho de normatividade considerável a cada dia, assertiva essa que vem confirmada pela modificação de nossa jurisprudência, neste sentido vejamos sua materialização:

 

            “ RESPONSABILIDADE CIVIL – Furto de veiculo estacionado no interior do campus da USP – Não configuração, na espécie, de contrato de deposito, com tradição real ou simbólica, ou mesmo a assunção tácita, pela autarquia, da obrigação de guarda e vigilância – Fato de se tratar de área “fechada”, cujo acesso é fiscalizado por guardas postados em guaritas de entrada e saída, através de cartão de controle, que não induz tal dever de vigilância – Funcionários que não são contratados para zelar pelos bens dos particulares que se utilizam do campus universitário, mas simplesmente para zelar pela integridade do patrimônio que, em ultima análise, é de todos – Improcedência bem decretada em primeiro grau – Recurso do autor não provido.

(Apelação Cível n 76.374-5 – 9 Câmara do Direito Publico – Relator: Paulo Dimas Mascaretti – 23.08.00 – V.U.)

            Percebemos que o julgado transcrito supra mostra carência de aplicação dos chamados deveres anexos, no caso o dever de proteção esta faltante, só lembrando que referido julgado teve sua fundamentação jurídica embasada em normas contidas no antigo código de 1916, vejamos agora caso semelhante, mas já sob égide do código de 2002:

 

RESPONSABILIDADE CIVIL. ESTACIONAMENTO COMERCIAL VINCULADO A BANCO. OFERECIMENTO DE

VAGA PARA CLIENTES E USUÁRIOS. CO-RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO

BANCÁRIA E DA ADMINISTRADORA DO ESTACIONAMENTO. ROUBO. INDENIZAÇÃO

DEVIDA.

I. Tanto a instituição bancária locadora da área como a empresa

administradora do estacionamento são responsáveis pela segurança das

pessoas e veículos que dele fazem uso.

II. A exploração comercial de estacionamento, que tem por escopo

oferecer espaço e segurança aos usuários, afasta a alegação de força

Maior em caso de roubo havido dentro de suas instalações.

III. Precedentes do STJ.

IV. Recurso especial não conhecido.

(Resp 503208/SP 4° TURMA, STJ/2008 relator min. Aldir Passarinho)

 

            Como foi mostrada a jurisprudência vem sofrendo mutação no sentido de aumentar a aplicabilidade de princípios que solidificam a supremacia da Constituição Federal dentro da relação obrigacional, nota-se acima que a co-responsabilidade se faz presente e com muita força, diferente do que ocorria no passado quando o individualismo reinava soberano. Na jurisprudência aqui apresentada os princípios da solidariedade (art. 3°, lll da CRFB) e os valores que dele decorrem se fazem presentes através do dever anexo de proteção e ultrapassam o antigo legalismo predominante no estilo de jurisprudência anterior, agora podemos notar que o sentido de relação obrigacional muda de paradigma, abandonando sua característica isolacionista e começa a se preocupar com seus efeitos fora da orbita das partes, a função social é garante da harmonia e do equilíbrio dentro do meio onde se realiza o negocio jurídico obrigacional, começamos a perceber que o estado democrático de direito, os objetivos constitucionais elencados pelo constituinte originário e todos os seus corolários começam a surtir efeitos dentro das relações privadas e quando não observadas o poder jurisdicional se encarrega de sanar a falha e mostrando assim o verdadeiro caminho a ser trilhado.

            Como se pode perceber, a nova ordem constitucional disciplinou o novo código civil no sentido de valorizar o “ser” em detrimento do “ter” de 1916 e na seara obrigacional isso não foi diferente.

            Devemos ressaltar que os valores inseridos pelo novo corpo constitucional, não são valores genéricos ou que norteiam apenas superficialmente a relação obrigacional, muito pelo contrario em cada modalidade de obrigações nota-se a presença e a influência dos princípios da carta de 1988, vejamos a obrigação na modalidade alternativa, tal modalidade é caracterizada pela alternatividade de objetos, a concentração é o momento onde, em regra, o devedor escolhe o objeto a ser transferido do credor, adimplindo a divida, o artigo 252 do código civil de 2002 é bastante claro:

 

            “A escolha cabe ao devedor, se nada se estipulou entre as partes.”

 

            Nota-se a mudança de paradigma onde o credor perde um pouco sua superposição em relação ao devedor, dando assim mais oportunidade aquele que vê sua liberdade restringida de retomá-la novamente, atentemos a opinião de Renan Lotufo:

           

“ Como é a esfera de liberdade do devedor que sofre a carga da obrigação, em geral cabe a este a escolha” ( Código Civil comentado, Vol II, pag 56).

 

            Outra espécie de modalidade obrigacional que outorga ao devedor, certas vantagens para adimplir sua divida e a facultativa, esta modalidade da ao devedor o direito potestativo de substituir o objeto da prestação por outro no momento do pagamento, objeto este de caráter subsidiário, nota-se mais uma vez o sentido de fazer da relação obrigacional um meio de satisfazer a ambos os lados de maneira mais igualitária possível, maneira esta que sacrifique o menos possível o devedor sem prejuízo daquilo que é devido ao credor, este é o espírito constitucional vigorando no seio obrigacional.

            Temos ainda as modalidades cumulativas, fracionárias, divisíveis e indivisíveis (objeto) e obrigações solidárias, em todas elas, se analisarmos os artigos que as discriminam, a dogmática que as analisam, a doutrina que as interpreta e a jurisprudência que solidifica e cristaliza essa hermenêutica, perceberemos sempre que todos tocam para o mesmo sentido: o de valorizar mais o ser humano como sujeito detentor de direitos fundamentais e de ver a relação obrigacional como um instrumento para o alcance da satisfação e felicidade das partes integrantes de uma determinada relação jurídica, mais se valem dela para alcançar seus objetivos, o contrário é impensável pela nossa constituição atual que cristaliza o princípio da dignidade humana como um de seus fundamentos, a relação obrigacional, a luz da hermenêutica constitucional é instrumento, ferramenta social, já a pessoa é nos dizeres do grande Kant:     

 

“Um fim em si mesmo!”

 

  

 

“ A prisão civil por divida e o pacto de São José da Costa Rica “

 

 

            Vimos que todas as garantias de que dispõe o credor par o adimplemento da obrigação se localiza no patrimônio, seja do devedor, de quem sub rogou-se em seu lugar ou de seu fiador, veremos agora a exceção constitucional elencada no artigo  5° , LXVII cuja literalidade segue :

 

            “Não haverá prisão civil por divida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.”

 

            É sabido por todos que o referido preceito esta protegido pelo escudo das clausulas pétreas, conceito este que se encontra agasalho constitucional no artigo 60 em se parágrafo 4° IV da CRFB\ 1998.

            É também da inteligência de um bom jurista que norma jurídica se concretiza e se exterioriza através de interpretação, de hermenêutica e não da simples leitura superficial e gramatical exposta à primeira vista, até porque impossível é, que a norma jurídica seja estável no sentido da imutabilidade, petrificação e da sedimentação total, se o fosse andaria em total antagonismo com a dinâmica social, o direito é dialético e dinâmico por excelência, se faltar um destes elementos essenciais, seria como receber a tarefa de produzir vinho sem as uvas.

            Partindo do sentimento acima demonstrado, passaremos a analisar a posição jurídica hodierna sobre a prisão civil por dívida e os acontecimentos que ensejaram a sua atual interpretação e aplicação por nossos tribunais superiores.

            Pela inteligência do artigo 5°, inciso LXVII percebemos que o mesmo alberga duas modalidades de obrigações civis que podem acarretar ao seu sujeito passivo uma sanção de natureza penal caso o mesmo não cumpra com a prestação a ele imposta, são elas:

a)    Obrigação de alimentos

b)    Obrigação de depósito

            Vamos atentar nesse trabalho a doar atenção à questão do depósito, pois é ele que vem ensejando mutação constitucional quanto a sua interpretação, a questão de alimentos é pacífica na jurisprudência e se sofrerá modificação de monta só o tempo dirá, sendo assim, objetivo de ulterior trabalho.

            A prisão em caso de descumprimento da obrigação de depósito é maneira de coagir o depositário a honrar com o compromisso firmado, não sendo pena em strito sensu, é meio compulsório de execução, é imprescindível que o inadimplemento ocorra de maneira voluntária e inescusável, caso contrário se fomentado por fortuito ou força maior ensejaria descaracterização, segue nesse sentido a jurisprudência superior:

 

            Habeas Corpus. Depositário infiel. Motivo de força maior. Prisão civil. Constrangimento ilegal. Comprovado que a data da penhora no bem já era objeto da garantia de contrato de financiamento, é de reconhecer-se motivo de força maior para a recusa em entregá-lo, mostrando-se ilícita a prisão civil decretada.” (STF, AC.unân. 2 T., HC 83.056\SP, rel, Min. Mauricio Corrêa, j. 27.5.2003, DJU 27.6.2003, p.54).

 

            Com a chegada da Constituição de 1988 que trouxe em seu corpo um conjunto de direitos e garantias fundamentais que permitem uma interpretação extensiva em prol dos destinatários, o que permite também  o acolhimento de novos direitos e de novas interpretações via acordo e tratados de direitos humanos a nível internacional ( artigo 5°    parágrafo 2°   e 3°  da CRFB\ 88.

            Características jurídicas, estas que permitirão que uma de suas próprias normas, dita pétrea anteriormente, seja modificada (lembrando que norma jurídica nasce com a interpretação).

            Vamos ver agora como o pacto de São José da Costa Rica contribuiu para uma nova interpretação do artigo 5°, LXVII para alguns apenas mutação constitucional e para outros uma revogação parcial da norma contida no artigo.

            É importante ressaltar que apesar de assinado pelo Brasil em 1969, somente em 6\10\1992, através do decreto do poder executivo n° 678,, a referida convenção internacional foi incorporada, formalmente do direito positivo Brasileiro , sendo assim, o mesmo passa a incorporar o ordenamento pátrio após o advento da Constituição de 1988.

            O referido pacto preceitua que:

            Artigo 7° parágrafo 7°:

 

            “Ninguém deve ser detido por dividas. Este princípio não limita os mandatos de autoridade judiciária competente expedido em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”.

 

            A letra do parágrafo é clara e não prevê a forma de prisão para depositário infiel, a questão é qual o posicionamento do pacto de São José da Costa Rica dentro do ordenamento jurídico Brasileiro, seria ele capaz de revogar ou mudar a interpretação de uma norma constitucional? Vários são os posicionamentos dentro da doutrina e que passaremos a ver a partir de agora.

            Os tratados internacionais ratificados pelo Brasil podem assumir natureza jurídica diferenciada conforme seu procedimento de ingresso na ordem jurídica nacional.

            Por força da emenda constitucional n° 45 de 2004, no que tange aos tratados sobre direitos humanos o congresso terá duas opções:

a)    Poderá incorporá-los com status ordinário como reza o artigo 49, I da CRFB\88, ou ainda,

b)    Com status constitucional como preceitua o artigo 5° parágrafo 3° da CRFB\88.

É importante destacar que para os casos da alternativa B o processo de incorporação segue o mesmo procedimento para aprovação de emendas a constituição, ou seja:

         Duplo turno de votação em cada casa.

         Quorum de maioria qualificada de 3\5.

            O grande doutrinador Alexandre de Morais assevera que tais acordos entram em nosso ordenamento com status de norma infraconstitucional, exceto a hipótese do parágrafo 3° do artigo 5°, vejamos:

 

            “As normas previstas nos atos, tratados, convenções ou pactos internacionais devidamente aprovados pelo Poder Legislativo e promulgadas pelo Presidente da República, inclusive quando prevêem normas sobre direitos fundamentais, ingressam no ordenamento jurídico como atos normativos infraconstitucionais, salvo na hipótese do parágrafo 3°, do art. 5°...”, Direito constitucional. 17. Ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 617”.

 

            Já de outra banda, a professora Flávia Piovesan aduz quaisquer tratados de direitos humanos, entram no direito pátrio com o status de normas constitucionais:

 

            “Ao efetuar a incorporação, a carta atribui ao direitos internacionais uma natureza especial e diferenciada, qual seja a natureza de norma constitucional. Os direitos enunciados nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é parte integram, portanto, o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados. Essa conclusão advém ainda de interpretação sistemática e tecnológica do Texto, especialmente em face da força expansiva dos valores da dignidade humana e dos direitos fundamentais, como parâmetros axiológicos a orientar a compreensão do fenômeno constitucional”, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 7 . Ed. São Paulo : Saraiva, 2006,p. 52.

 

            Justifica a conceituada professora que os direitos humanos veiculados a tratados assinados pelo Brasil assumem condição de normas constitucionais por expressa previsão da carta de 1988 (artigo 5° parágrafo 2° e 3°). Em consonância com o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais.

 

            “Assim, ao afirmar que os direitos e garantias expressos na constituição não afastam outros decorrentes dos pactos assinados pelo Brasil, assim como do regime democrático, a Constituição federal de 1988 incorpora os direitos humanos advindos dos tratados internacionais ao ordenamento nacional na qualidade de direitos constitucionalmente consagrados”

 

           

            Antes de continuar a expor os pensamentos e posicionamentos dos doutrinadores, peço vênia para colocar em tela o pensamento de um universitário sobre a questão em pauta.

            A norma jurídica extraída do artigo 5°, LXVII não tem natureza jurídica mandamental, é permissivo, ou seja, efetuada a prisão no caso do depositário infiel ou do devedor de alimentos, a constituição outorga ao legislador a tarefa de regulamentar a matéria em instrumento infraconstitucional o que foi realizado através da entrada em vigor em nosso ordenamento jurídico das leis n° 8866 de 11 de Abril de 1984 e vale lembrar também que se trata de decreto lei (911\969) a regular a alienação fiduciária, este último foi recepcionado pela lei maior de 1988 com status de lei ordinária partindo de tais informações temo então:

  1. Os instrumentos que regulam as relações concernentes ao depositário infiel e a alienação fiduciária se posicionam dentro de nosso ordenamento jurídico com status de lei ordinária.
  2. Os instrumentos legais acima citados datam respectivamente:

 

    1. Lei 8866 11\04\1994
    2. Decreto lei n 911 de 01\10\1969

 

  1.  Para aqueles que defendem que o pacto de São José da Costa Rica, assinado pelo Brasil em 1969, mas somente inserido no ordenamento jurídico Brasileiro no ano de 1992, está em paridade com as leis ordinárias temos então o problema da alienação fiduciária resolvido, pois de acordo com a lei de introdução ao código civil (decreto lei n 4657).

 

            Artigo 2° parágrafo1°:

 

“A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

 

            Para aqueles que aceitam a prisão do devedor fiduciário como se fosse depositário, o raciocínio jurídico acima corre em seu desfavor caracterizando assim constrangimento ilegal, devendo ser rechaçado via remédio constitucional do habeas corpus (artigo 5°, LXVIII  da CRFB\88).

  1. O raciocínio não presta ao depositário infiel, sendo o artigo 2° parágrafo 1° da LICC arredado pela data da vigência da Lei 8866\1994 (data esta posterior a entrada do pacto de São José da Costa Rica em nosso ordenamento)

 

            Então para o caso do depositário infiel temos que encontrar outra solução que aproveite o artigo 7°, parágrafo 7° do referido pacto no sentido de combater o uso da coação penal, mas qual seja?

            Para resolver essa questão o atual presidente do Supremo Tribunal Federal Ministro Gilmar Ferreira Mendes assevera e defende no plenário da egrégia corte que os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos subscritos pelo Brasil possuem status normativo supra legal, ou seja, se locam entre a constituição (que está acima) e a legislação infraconstitucional (que está abaixo) , tal locação torna inaplicável a legislação ordinária, sendo esta a sede originária da regulamentação normativa tanto do depositário infiel quanto do devedor fiduciante, vejamos :

 

            “Entendo que, desde a ratificação, elo Brasil, sem qualquer reserva, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos ( art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica ( art. 7, 7 ), ambos no anos de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos olhe reserva lugar especifico no ordenamento jurídico estando abaixo da Constituição, porem acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil, dessa forma, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação”.( retirado do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes no HC 90172 – 7 de São Paulo)

 

            Vimos aqui que o caráter supra legal do pacto defendido pelo Ministro Gilmar Mendes resolve tanto o conflito de datas vigenciais elencada no tópico 4 anterior quanto as controvérsias doutrinárias a respeito da locação do pacto São José da Costa Rica uniformizando assim a aplicação do direito em casos dessa natureza.

            No caso ainda da alienação fiduciária há ainda a questão da interpretação do artigo 5° LXVII, alguns ministro do STF defendem que o decreto lei 911 de 1969 fere o princípio da proporcionalidade e da própria reserva legal ao equiparar o devedor fiduciante ao depositário infiel, analisemos a ementa do RE 349703 do estado do Rio Grande do Sul que segue:

 

PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL EM FACE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INTERPRETAÇÃO DA PARTE FINAL DO INCISO LXVII DO ART. 5O DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. POSIÇÃO HIERÁRQUICO-NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código Civil de 1916 e com o Decreto-Lei n° 911/69, assim como em relação ao art. 652 do Novo Código Civil (Lei n° 10.406/2002). ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. DECRETO-LEI N° 911/69. EQUIPAÇÃO DO DEVEDOR-FIDUCIANTE AO DEPOSITÁRIO. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR-FIDUCIANTE EM FACE DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. A prisão civil do devedor-fiduciante no âmbito do contrato de alienação fiduciária em garantia viola o princípio da proporcionalidade, visto que: a) o ordenamento jurídico prevê outros meios processuais-executórios postos à disposição do credor-fiduciário para a garantia do crédito, de forma que a prisão civil, como medida extrema de coerção do devedor inadimplente, não passa no exame da proporcionalidade como proibição de excesso, em sua tríplice configuração: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito; e b) o Decreto-Lei n° 911/69, ao instituir uma ficção jurídica, equiparando o devedor-fiduciante ao depositário, para todos os efeitos previstos nas leis civis e penais, criou uma figura atípica de depósito, transbordando os limites do conteúdo semântico da expressão "depositário infiel" insculpida no art. 5º, inciso LXVII, da Constituição e, dessa forma, desfigurando o instituto do depósito em sua conformação constitucional, o que perfaz a violação ao princípio da reserva legal proporcional. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

 

Não mais para expor lembremos que o direito é sempre dinâmico ,qualidade esta inerente a própria condição humana de buscadora de soluções para todos os seus conflitos e necessidades.

 

 

 

“O homem quando não encontra as condições ideais para seu sucesso... ele para, pensa e  as cria...Winston Churchill “

 

           

 

BIBLIOGRAFIA

 

  • FILHO,Nestor Sampaio Penteado.Manual de Direitos Humanos – Série Concursos Públicos. São Paulo: Ed. Método, 2006.

 

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  • CRETELLA JÚNIOR, José.Elementos do Direito Constitucional.3.São Paulo: Ed. RT,2000.

 

  • MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional.11.São Paulo: Ed.Atlas, 2002.

 

  • PIOVESAN,Flávia.Gestão Direitos Humanos e o direito constitucional internacional.7. São Paulo. Ed. Saraiva,2006.

 

  • LENZA, Alessandra Martinewski.– Gestão Por Competência – Uma perspectiva para a consolidação da gestão estratégica de Recursos Humanos. 1 Edição.Ed. QUALITYMARK, 2007

 

  • DUTRA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. São Paulo: Ed. Método,2006 .

 

  • NETO, Manoel Jorge e Silva – Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Ed. Lamen Juris, 2008.

 

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  • NETTO, José Oliveira – Dicionário Jurídico.São Paulo: Ed.Edijur, 2008.

 

  • JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade Nery – Código Civil Comentado.São Paulo: Ed.RT – Revista dos Tribunais, 2007.

 

  • FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson – Direito das Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Lamen Juris, 2007.

 

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