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NOÇÕES GERAIS DE SEGURIDADE SOCIAL


Autoria:

Angélica Gonçalves Pereira


Acadêmica do 10º período de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros.

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Texto enviado ao JurisWay em 25/11/2016.



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NOÇÕES GERAIS DE SEGURIDADE SOCIAL 


1  A Seguridade Social 

 

Segundo Ibrahim (2015), a raiz da proteção social encontra-se na família. Na antiguidade, a concepção de família tinha mais força que atualmente, haja vista que vivia em conjunto com várias outras famílias. Nessa época, as obrigações de uns para com os outros eram bem delineadas, a exemplo dos jovens que eram incumbidos de cuidar dos idosos e incapacitados. 

Todavia, nem todo indivíduo tinha essa proteção no seu âmbito familiar, e muitas vezes, quando tinha, era precária. A partir disso, surgiu a necessidade da participação de terceiros para suprir essa ausência de proteção. Inicialmente, o auxílio externo partiu-se da igreja, sendo que, apenas no século XVII na Inglaterra, inicia-se a normatização para atendimento de pessoas que por diversas situações não poderiam se manter, por meio da lei dos pobres “Poor Law”. (IBRAHIM, 2015)

 No que se refere ao aspecto previdenciário, a Alemanha é pioneira. Em 1883, Otto Von Bismarck editou a primeira lei que tratou do seguro-doença. Mas a primeira previsão constitucional sobre o tema foi trazida pelo México, em 1917, seguida da Constituição Alemã de Weimar, em 1919. (KERTZMAN, 2015) 

No Brasil, a primeira Constituição a prever um ato securitário foi a de 1824, que em seu artigo 179, inciso XXXI, garantia os socorros públicos. Em seguida, a Constituição de 1891 dispôs sobre a aposentadoria por invalidez para os servidores públicos – não é considerada como um marco mundial, pois a previsão do benefício se restringia aos servidores públicos. Daí em diante, o ordenamento jurídico brasileiro previu outras espécies de proteção social, como a Lei Eloy Chaves, em 1923, que criou as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP’s) e a Legião Brasileira da Assistência Social (LBA), criada pelo Decreto 4.890/42. Mas somente com a Constituição de 1988 utilizou-se a expressão Seguridade Social abrangendo a Saúde, a Assistência Social e a Previdência Social. (KERTZMAN, 2015)

A seguridade social está prevista na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) no Título VIII, Da Ordem Social. 

caput do artigo 194 da CRFB/88 dispõe que “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. (BRASIL, 1988)

De acordo com Ibrahim (2014), o objetivo do constituinte originário ao criar a seguridade social foi o de elaborar um sistema de proteção hábil a satisfazer os interesses sociais. Assim, a seguridade social pode ser conceituada como:

 

[...] a rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos no sentido de estabelecer ações para o sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida digna. (IBRAHIM, 2014, p. 5)

 

Fala-se em rede protetiva devido ao elo que há entre os componentes da seguridade social. O Estado investe-se em saúde no intuito de que menos pessoas adoeçam ou curem-se mais rápido, por conseguinte, precisarão menos dos benefícios por incapacidade laborativa. Ademais, investindo-se em previdência social, mais pessoas estarão incluídas no sistema, e menos dependerão da assistência social. (KERTZMAN, 2015)

A saúde está prevista nos artigos 196 a 200 da CRFB/88 e é concebida como direito de todos e dever do Estado, que por meio de políticas públicas, deve garantir à redução de doenças, bem como outros agravos. Devido a sua importância, está sujeita à regulamentação, fiscalização e controle do poder público. (SILVA, 2014)

O artigo 199 da CRFB/88 dispõe que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada. Entretanto, esta deverá cooperar de maneira suplementar ao Sistema Único de Saúde (SUS), conforme as suas diretrizes, por meio de contrato público ou convênio, sendo vedada a destinação de recursos públicos para subsidiar instituições privadas com fins lucrativos. (TSUTIYA, 2013)

O SUS é subsidiado com recursos do orçamento da seguridade social e dos entes federativos e incorpora uma rede regionalizada e hierarquizada. Devido ao aspecto de regionalização do SUS, o artigo 23, inciso II da CRFB/88 instituiu o caráter solidário da responsabilização para com a saúde, entre os entes da federação. (BRANCO; MENDES, 2014)

Ibrahim (2014) lembra que o direito de obter atendimento de saúde na rede pública é de todos, independentemente de contribuição. Ainda que seja comprovado que a pessoa tenha meios de arcar com seu próprio tratamento médico, terá acesso a rede pública de saúde, diferentemente da Previdência Social, que para usufruí-la, exige-se contribuição obrigatória. 

A previdência social está prevista nos artigos 201 e 202 da CRFB/88, bem como nas Leis 8.212/91 e 8.213/91.

O artigo 201 da CRFB/88 preleciona que “a previdência social será organizada por meio de regime geral, de caráter contributivo e filiação”. (BRASIL, 1988)

 Entende-se por regime previdenciário aquele que abrange vários indivíduos ligados entre si, por meio de uma relação jurídica previdenciária, em razão do trabalho ou vínculo profissional que estão sujeitos, assegurando-os benefícios de proteção a eventualidades, a exemplo de auxílios, aposentadorias e pensões. (CASTRO; LAZZARI, 2015)

O principal regime de previdência social da ordem interna é o Regime Geral de Previdência Social – RGPS que abrange todos os trabalhadores privados: trabalhadores urbanos, rurais, avulsos, temporários, autônomos, empregados domésticos, empresários, etc. Além do RGPS, há outros regimes como a previdência complementar, regime de previdência de agentes públicos e dos militares das forças armadas. (CASTRO; LAZZARI, 2015)

O RGPS é gerenciado pelo Instituto Nacional de Seguro Social – INSS, autarquia federal vinculada ao Ministério da Previdência Social. A autarquia tem a função conceder e manter os benefícios e serviços previdenciários, dirigir os recursos do Fundo Geral de Previdência Social e orçar o montante das contribuições que incidem sobre as remunerações e demais rendimentos. (CASTRO; LAZZARI, 2015)

São exemplos de eventualidades protegidas pela previdência: as doenças, os acidentes, a maternidade, a morte, a reclusão, eventos previsíveis como a idade avançada, dentre outros.  

A filiação à previdência social é imposta por lei que vincula o trabalhador ao sistema. Só poderão filiar-se as pessoas físicas que exerçam atividade remunerada. Excepcionalmente, aqueles que não exercem atividade remunerada poderão ser filiados à previdência, é o caso dos segurados facultativos. (MARTINEZ, 2013)

Sobre a filiação obrigatória e facultativa esclarece Martinez (2013, p. 158):

 

 

A filiação obrigatória reflete a impositividade do sistema, seu sustentáculo maior. A filiação facultativa demonstra sua liberdade, instituída para viabilizar individualmente a proteção do cidadão em circunstância atípica. Exigidas a submissão do indivíduo à instituição, ao comando legal, e a incidência de norma pública, da filiação defluem inúmeras obrigações e direitos, conseqüências, efeitos materiais e jurídicos. 


Considerando que o sistema previdenciário é contributivo, o recolhimento da contribuição por parte do filiado é requisito imprescindível para manter a sua qualidade de segurado. Leitão e Meirinho (2015) elucidam que há uma ausência de denominação legal própria para esse instituto, sendo que a doutrina o denomina de período de graça.

 

 

O período de graça é assim reconhecido por se tratar de um período adicional de cobertura previdenciária que, na maioria das vezes, sai, literalmente, de graça. Só há um caso de pagamento da contribuição durante o período de graça: ocorre quando a segurada está em gozo de salário maternidade. (LEITÃO; MEIRINHO, 2015, p. 209)

 

Mesmo depois de cessada as contribuições, o segurado mantém a qualidade de segurado. Só ocorrerá a perda desta depois de transcorrido o período de graça. (LEITÃO; MEIRINHO 2015)

Com o objetivo de proteger aquele que por algum motivo deixou de contribuir, ou nunca contribuiu, e encontra-se em situação de miserabilidade, o Estado criou o instituto da Assistência Social, último elemento da tríade Seguridade Social, que tem como principal requisito a necessidade do assistido. (IBRAHIM, 2015)

A assistência social está prevista nos artigos 203 e 204 da CRFB/88 e, assim como a Saúde, independe de contribuição direta do beneficiário. Todavia, só será prestada àqueles que não possuem condições de prover o próprio sustento, ou tê-lo provido pela família. Logo, o indivíduo que possui condição financeira de manter-se, ou de ser mantido pela família, não poderá ser beneficiário do auxílio pecuniário disponibilizado pelo sistema. (IBRAHIM, 2014)

A assistência social é regida pela Lei 8.742/1993 que de acordo com seu artigo 2º, tem por objetivos:

 

 

I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos, especialmente:

a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes;

c) a promoção da integração ao mercado de trabalho;

d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; 

e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família; 

II - a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a capacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de vitimizações e danos; 

III - a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais. (BRASIL, 1993)

 

 

Ibrahim (2014) esclarece que o objetivo principal da assistência social é preencher as lacunas deixadas pela previdência social, pois muitas pessoas não possuem remuneração e, consequentemente, não contribuem para com o sistema, o que as impossibilitam de gozar de algum benefício previdenciário, cabendo ao Estado proporcionar segmento assistencial a quem precisa. 

Diante disso, verifica-se que a seguridade social tem por finalidade assegurar, por meio de um sistema de proteção social, a todos aqueles que forem submetidos a circunstâncias de vulnerabilidade, o direito à saúde, à assistência social e à previdência social. Para tanto, é regida por princípios constitucionais que serão tratados no tópico a seguir. 

 

 

2  Princípios que norteiam a seguridade social


Antes de adentrar nos princípios que norteiam a seguridade social, é importante salientar sobre a definição de princípio. Segundo Lenza (2012), trata-se de uma espécie de norma mais flexível, que, ao contrário da regra, não se determina a conduta correta, cabendo ao intérprete analisar o peso do princípio quando se contrapuser a outra norma. 

Mello (2004, p. 451) o conceitua como:

 

[...] um mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente para definir a lógica e racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica de lhe dá sentido harmônico.

 

De acordo com Tsutiya (2013), princípios são os alicerces de uma ciência, eles formam a base do corpo legal que estruturam o ordenamento jurídico. 

Diante disso, pode-se extrair que a principal função do princípio é embasar as diretrizes de interpretação a fim de que seja evidenciada a real vontade do legislador.

A seguridade social é regida pelos princípios gerais do direito a exemplo dos princípios da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, da igualdade, da legalidade e do direito adquirido; e como ramo autônomo, possui também princípios específicos explícitos, previstos no parágrafo único do artigo 194 da CRFB/88. 

A dignidade da pessoa humana está prevista no art. 1º, inciso III, da CRFB/88 como fundamento do Estado Democrático de Direito.

Conforme leciona Moraes (2005), a dignidade da pessoa humana é um valor moral e espiritual atinente ao indivíduo, que se apresenta de forma singular pela consciência e responsabilidade da própria vida, no intuito de obter o respeito por parte de outras pessoas. 

Segundo o autor, é dever do regime jurídico assegurar a dignidade da pessoa humana, sendo que, apenas excepcionalmente dever-se-á limitar o exercício dos direitos fundamentais. (MORAES, 2005)

Ao mesmo tempo em que o princípio da dignidade da pessoa humana representa limite à atuação do Estado, exige-se deste uma atuação positiva, por meio de condutas que possam garantir o mínimo existencial para cada ser humano. (DIAS, 2015)

O princípio da solidariedade possui previsão constitucional no art. 3º, inciso I, da CRFB/88 e dispõe que “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: construir uma sociedade livre, justa e solidária”. (BRASIL, 1988)

De acordo com Martinez (2013, p.117), a solidariedade é essencial à previdência social, haja vista ser a “cooperação da maioria em favor da minoria”, pois, enquanto todos contribuem, muitos são beneficiados com a participação da coletividade. “O valor não utilizado por uns é canalizado para outros”.

O autor lembra ainda que a solidariedade passa despercebida em face dos protegidos, que não possuem nenhuma consciência da participação de milhares de pessoas, em razão do distanciamento que há entre si. (MARTINEZ, 2013)

O princípio da igualdade está previsto no caput do artigo 5º da CRFB/88 que preleciona que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]”. (BRASIL, 1988)

Segundo Moraes (2014), o princípio da igualdade previsto na constituição atua em dois planos distintos. O primeiro ante aos que obtêm o poder de legislar, de modo que os impeçam de elaborar normas abusivas com tratamento diferenciado a pessoas que se encontram em situações idênticas. A segunda diante da autoridade pública ou intérprete que devem aplicar as leis e atos normativos sem distinção em virtude de religião, classe social, sexo, raça, convicções filosóficas ou políticas.

A igualdade a que se refere o artigo é a igualdade substancial, a qual consiste em tratar desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade. (TSUTIYA, 2013)

Esse é também o entendimento de Moraes (2014, p.35) ao afirmar que:

 

A desigualdade na lei se produz quando a norma distingue de forma não razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas. Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos. 

 

Com base nessa premissa, o constituinte originário, no artigo 201, §7º, II da CRFB/88, previu a aposentadoria por idade dos rurícolas diferenciada, com o decréscimo de cinco anos com relação aos segurados urbanos. Bem como o previsto no art. 201, §1º da CRFB/88, aos que exercem atividades prejudiciais à saúde e integridade física, cujo tempo de contribuição varia entre quinze, vinte e vinte e cinco anos, conforme o risco da atividade exercida pelo segurado. (BRASIL, 1988)

O princípio da legalidade, fundamento do Estado Democrático de Direito, está previsto na Constituição no artigo 5ª, inciso II, e dispõe que: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se não em virtude de lei”. (BRASIL, 1988)

A transcrição do artigo 5º, inciso II, já era previsto nas Constituição anteriores, mais precisamente, desde a Constituição de 1824. A partir desta Constituição, com exceção da Constituição de 1937, todas as seguintes (1891, 1934, 1946, 1967 / 69) passaram a prever essa norma que traduz o princípio da legalidade. (BRANCO; MENDES, 2014)

Pode-se extrair do referido dispositivo que, apenas mediante lei será possível criar direitos, deveres e proibições. O objetivo precípuo do princípio da legalidade é proteger as pessoas contra os excessos cometidos pelo Estado ou mesmo por outros particulares. (LENZA, 2012)

Do princípio da legalidade decorre a garantia constitucional da estabilidade das relações jurídicas configurado pela formação tríplice, direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada.                                                                                    

O instituto do direito adquirido está previsto no artigo 5º, inciso XXXVI, da CRFB/88 e dispõe que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. (BRASIL, 1988)

caput do artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), Decreto Lei nº 4.657/42, prevê que “a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”. O parágrafo segundo do mesmo artigo traz o conceito de direito adquirido: “consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele possa exercer como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem”. (BRASIL, 1942)

Portando, o direito existe, por natureza, para regular o futuro, haja vista que não é razoável uma norma posterior definir consequências novas a fatos ocorridos no passado. (BRANCO; MENDES, 2014)

Uma vez trabalho alguns dos princípios gerais aplicáveis à Seguridade Social, cabe, então, discorrer sobre os princípios específicos explícitos no artigo 194, parágrafo único, da CRFB/88. 

Segundo Ibrahim (2015, p.64) embora esteja disposto na CRFB/88 como objetivos, “são verdadeiros princípios descrevendo as normas elementares da seguridade, as quais direcionam toda a atividade legislativa e interpretativa da seguridade social”.

Com base no fundamento do princípio da universalidade da cobertura e do atendimento, a seguridade social visa abarcar o máximo de proteção social da coletividade.

Todavia, embora o termo “universalidade” signifique totalidade, no caso da Previdência Social, apenas os que contribuem possuem direito aos benefícios. (TSUTIYA, 2013)

 

A universalidade de cobertura refere-se aos sujeitos protegidos. Os atingidos por contingências sociais que retirem ou diminuam a capacidade de trabalho, de ganho, devem ser protegidos. Já a universalidade do atendimento refere-se ao objeto, vale dizer, às contingências a serem cobertas, isto é, aos acontecimentos que trazem como conseqüência o estado de necessidade social, que requer proteção por meio de renda substitutiva ou complementar da remuneração e de atos e bens que recuperem a saúde. (TSUTIYA, 2013, p. 74/75)

                                 

 

Diante disso, uma vez que exista a contingência ou o risco, todos terão direito as prestações ou serviços disponibilizados pela seguridade social, conforme as particularidades de cada benefício. (ALVES, 2014)

Sobre o princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, Leitão e Meirinho (2015, p.56) esclarecem que:

 

 

Uniformidade significa igual rol de prestações, ou seja, os benefícios e serviços garantidos aos trabalhos urbanos devem também ser garantidos aos rurícolas. Já a equivalência impõe a aplicação da mesma sistemática de cálculo dos benefícios previdenciários devidos aos trabalhadores urbanos e rurais.

 

Logo, pode-se inferir que não poderá haver distinção das prestações e valores pecuniários correspondentes em respeito ao princípio da isonomia.

Já o princípio da seletividade é voltado para o legislador, haja vista ser ele o responsável por selecionar os riscos e eventos sociais a serem protegidos pela previdência. O objetivo deste princípio é não generalizar o direito à seguridade social a todos os indivíduos. (ALVES, 2014)

Sobre o tema, Alves (2014) apresenta o exemplo do benefício de auxílio-reclusão, só surgirá o benefício se o segurado tiver dependente(s), visto que a lei traz a existência de dependentes como critério para que seja possível a aquisição desse benefício.

Em contrapartida, o princípio da distributividade está relacionado à criação de preceitos para a obtenção do objeto de proteção, visando que o maior número de pessoas possível possa ter acesso ao direito à seguridade social. (LEITÃO; MEIRINHO, 2015)

O princípio da irredutibilidade do valor do benefício tem como objetivo estabilizar a renda para manter o poder de compra e está materializado no artigo 201, §§ 2º e 3º da CRFB/88 e no artigo 58 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT:

 

 

Art. 201 [...]

§ 2º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.

§ 3º Todos os salários de contribuição considerados para o cálculo de benefício serão devidamente atualizados, na forma da lei. (BRASIL, 1988)

 

Art. 58. Os benefícios de prestação continuada, mantidos pela previdência social na data da promulgação da Constituição, terão seus valores revistos, a fim de que seja restabelecido o poder aquisitivo, expresso em número de salários mínimos, que tinham na data de sua concessão, obedecendo-se a esse critério de atualização até a implantação do plano de custeio e benefícios referidos no artigo seguinte.

Parágrafo único. As prestações mensais dos benefícios atualizadas de acordo com este artigo serão devidas e pagas a partir do sétimo mês a contar da promulgação da Constituição. (BRASIL, 1988)

 

 

Alves (2014) elucida que, ao contrário do que dispõe nos referidos dispositivos constitucionais, o reajuste periódico dos benefícios não está relacionado ao salário mínimo, mas sim ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor – IAPC. Por isso, o salário do aposentado, anualmente, apresenta perda significativa do seu poder de compra, visto que, em contrapartida, a cesta básica é vinculada ao índice de aumento do salário mínimo.

O princípio da equidade na forma de participação e custeio está relacionado ao princípio da isonomia, bem como à capacidade contributiva. “Alíquotas desiguais para contribuintes em situação desigual. (TSUTIYA, 2013, p. 75)

O princípio mencionado encontra-se previsto nos artigos 145, §1º, e 150, II, da CRFB/88:

 

 

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

[...]

§1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (BRASIL, 1988)

[...]

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos. (BRASIL, 1988)

       

 

De acordo com Kertzman (2015) a equidade é a justiça no caso concreto. Devendo-se cobrar mais contribuições de quem possui maior capacidade de pagamento, de modo que possa beneficiar aqueles que não possuem as mesmas condições.

O princípio da diversidade da base de financiamento visa estabelecer maior estabilidade à seguridade social e está previsto no artigo 195, incisos I a IV, da CRFB/88:

 


Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: 

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; 

b) a receita ou o faturamento;

c) o lucro; 

II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; 

III - sobre a receita de concursos de prognósticos.

IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. (BRASIL, 1988)

 

Alves (2014) esclarece que o legislador possui autonomia para criar novas fontes de financiamento, caso as hipóteses previstas no artigo citado não sejam suficientes. Contudo, não poderão ser cumulativas nem ter a mesma base de cálculo e fato gerador das já previstas na Constituição. 

O princípio do caráter democrático e descentralizado da administração está relacionado à ampla participação da comunidade para com o custeio da seguridade social. Diz-se em gestão quadripartite a participação constitucionalmente expressa dos trabalhadores, empregadores, aposentados e governo. (LEITÃO; MEIRINHO, 2015)

Ibrahim (2015) aduz que o objetivo do referido princípio é promover uma participação mais ampla da sociedade, a materialização do regime democrático. Afirma ainda ser comum a participação das empresas, haja vista que estas também são responsáveis pelo custeio securitário.  

Diante do que foi exposto acerca dos princípios norteadores da seguridade social, pode-se concluir que todos estão interligados ao princípio da solidariedade, tendo em vista que todos em sua essência possuem o mesmo fim, qual seja, construir uma sociedade livre, justa e solidária. 

 

 

3  A Seguridade Social enquanto Direito Fundamental

Os direitos fundamentais do homem, segundo Silva (2014), referem-se a fundamentos que sintetizam a percepção do mundo e orientam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, que se concretizam em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todos os indivíduos. 

De acordo com a definição de Bonavides (2012, p. 579), os direitos fundamentais “são aqueles que receberam da Constituição um grau mais elevado de garantia ou de segurança; ou são imutáveis ou pelo menos de mudança dificultada, a saber, direitos unicamente alteráveis mediante lei de emenda à Constituição”.  

Parte da doutrina moderna, a exemplo de Moraes (2014) e Branco e Mendes (2014), classifica os direitos fundamentais em três gerações[1] tomando como base a ordem cronológica em que os direitos foram conquistados.

Os direitos de primeira geração surgiram ao final do século XVIII, frutos das revoluções americana e francesa em que a burguesia reivindicava liberdades individuais ante o governo absolutista. (BRANCO; MENDES, 2014) 

Caracterizam-se pela liberdade e estão relacionados aos direitos civis e políticos. “São por igual direitos que valorizam primeiro o homem-singular, o homem das liberdades abstratas, o homem da sociedade mecanicista, que compõe a chamada sociedade civil, da linguagem jurídica mais usual”. (BONAVIDES, 2012, p. 582)

Os direitos sociais de segunda geração, segundo Moraes (2014, p. 29) “são os direitos sociais, econômicos e culturais”. Estão atrelados ao princípio da igualdade e relacionados a reivindicações de justiça social. (BRANCO; MENDES, 2014)  

 

 

O descaso para com os problemas sociais, que veio a caracterizar o État Gendarme, associado às pressões decorrentes da industrialização em marcha, o impacto do crescimento demográfico e o agravamento das disparidades no interior da sociedade, tudo isso gerou novas reivindicações, impondo ao Estado um papel ativo na realização da justiça social. (BRANCO; MENDES, 2014, p.137)

 

 

Os direitos de segunda geração, dos quais inclui a seguridade social, fez surgir a consciência do quão é importante proteger o indivíduo, não na sua individualidade, mas como um ser social que necessita de tratamento isonômico. Para tanto, clamava-se pela intervenção do Estado, haja vista ser este o detentor do poder para materializar a vontade do povo.

Já os direitos fundamentais de terceira geração caracterizam-se pela preocupação para com a coletividade, visando à fraternidade. Dentre eles estão o direito à paz, à comunicação, ao desenvolvimento, ao meio-ambiente, à conservação do patrimônio histórico 

e cultural da humanidade, entre outros. (BRANCO; MENDES, 2014)

 

Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termo de existencialidade concreta. (BONAVIDES, 2012, p.587-588)

 

Os direitos fundamentais destacam-se quando se opõe à relação tradicional que há entre o Estado e o indivíduo, de modo a admitir que a pessoa, em primeiro lugar, possua direitos, e, posteriormente, deveres em face do Estado. (BRANCO; MENDES, 2014)

Moraes (2014, p. 203) alude que:

 

 

Direitos sociais são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal.

 

 

As Constituições anteriores a de 1988 tinham predisposição à valoração do individualismo e liberalismo, haja vista que tratavam os direitos individuais como contrapostos aos direitos sociais. Contudo, a Constituição atual assenta a compreensão de que os direitos individuais e sociais estão em harmonia. (SILVA, 2014)

 

 

A Constituição, agora, fundamenta o entendimento de que as categorias de direitos humanos fundamentais, nela previstos, integram-se num todo harmônico, mediante influências recíprocas, até porque os direitos individuais, consubstanciado no seu art. 5º, estão contaminados de dimensão social, de tal sorte que a previsão dos direitos sociais, entre eles, e os direitos de nacionalidade e políticos, lhes quebra o formalismo e o sentido abstrato. (SILVA, 2014, p. 186-187)

 

              

A CRFB/88 atribuiu o entendimento pelo qual há, de fato, a conformidade entre todas as categorias dos direitos fundamentais do homem, sob a influência dos direitos sociais, não podendo mais ser tratados como categorias acessórias, haja vista que a integração harmônica dos direitos fundamentais “supõe uma autêntica garantia para a democracia”. (SILVA, 2014, p. 187)

Para Bonavides (2012) os direitos fundamentais não restringem a três gerações. A globalização e o neoliberalismo político propiciaram o surgimento dos direitos fundamentais de quarta geração, consubstanciados no direito à democracia, à informação e ao pluralismo. 

Por conseguinte, com o progresso trazido pelos direitos fundamentais a partir da terceira geração, fala-se sobre a concepção da paz no campo da normatização jurídica. Diante disso, o direito à paz foi elevado à condição de direito fundamental de quinta geração, que segundo Bonavides (2012), é o direito supremo da Humanidade.

 

Com a breve análise acerca das gerações dos direitos fundamentais, foi possível verificar a localização da seguridade social enquanto direito fundamental da pessoa humana. Restou demonstrado que seguridade social é uma das espécies dos direitos sociais, logo, direito de segunda geração, que visa à igualdade de oportunidades, materializada no dever do Estado de proporcionar Saúde a todos; proteção aos eventuais riscos sociais, por intermédio da Previdência Social; e prestação de Assistência Social aos hipossuficientes que vivem em situação de vulnerabilidade. 

 

REFERÊNCIAS


ALVES, Hélio Gustavo. Auxílio Reclusão. Direito dos Presos e seus familiares. São Paulo: Ltr, 2014. 

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. MENDES, Gilmar Ferreira; Curso de Direito Constitucional. 9 ed. São Paulo: Saraiva: 2014.

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário – 17 ed – Rio de Janeiro: Forense, 2015.

 

DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. 10. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 19. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014.

KERTZMAN, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. – 12ª ed. – Bahia: JusPodvm, 2015.

 

LEITÃO, André Studart; MEIRINHO, Augusto Grieco Sant’Anna. Manual de direito previdenciário – 3ª ed – São Paulo: Saraiva, 2015.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito Previdenciário. 5ª ed. São Paulo: LTr, 2013.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 34ª ed. São Paulo: Atlas, 2014.

 

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

 

SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2014.

TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de Direito da Seguridade Social. - 4ª ed. - São Paulo: Saraiva, 2013.

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