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Princípios Constitucionais sensíveis: Parcelamento de salários como violação dos direitos da pessoa humana. Intervenção Federal em Minas Gerais. Possibilidade jurídica


Autoria:

Jeferson Botelho


Jeferson Botelho Pereira é ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais. Delegado Geral de Polícia, aposentado. Mestre em Ciência das Religiões; Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Especialização em Combate a Corrupção, Crime Organizado e Antiterrorismo pela Universidade de Salamanca - Espanha. Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG. Autor de livros. Palestrante. Jurista. Advogado Criminalista. Membro da Academia de Letras de Teófilo Otoni-MG.

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Resumo:

Resumo: O presente ensaio tempo por finalidade precípua analisar os princípios constitucionais sensíveis, sua violação e a consequente possibilidade jurídica da intervenção federal no estado de Minas Gerais por grave violação dos direitos humanos.

Texto enviado ao JurisWay em 06/07/2016.



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Princípios Constitucionais sensíveis: Parcelamento de salários como violação dos direitos da pessoa humana.

 

Intervenção Federal em Minas Gerais. Possibilidade jurídica

 

 

 

 “Não está em saber quais, quantos são esses direitos, qual a sua natureza e o seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos; mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados”.

 

  

 

Resumo: O presente ensaio tempo por finalidade precípua analisar os princípios constitucionais sensíveis, sua violação e a consequente possibilidade jurídica da intervenção federal no estado de Minas Gerais por grave violação dos direitos humanos.

 

Palavras-chave: Princípios constitucionais sensíveis, atraso de pagamento de salários,  Segurança Pública, Servidores Públicos, violação dos direitos da pessoa humana, Intervenção Federal. Possibilidade  Jurídica.

 


SUMÁRIO: I - Linhas introdutórias. II - Conceito de Princípios Constitucionais Sensíveis. III  - Direitos da pessoa humana. IV - Parcelamento do salários e violação dos direitos da pessoa humana. V - Incidência na prática de crime a retenção dolosa de salários pelo Governo do Estado. VI - Da Ação interventiva em Minas Gerais por ofensa aos direitos da pessoa humana. VI - 1. Princípios Constitucionais. VI - 2. Competência. VI - 3. Legitimidade. VI -4. Procedimento. Das Conclusões. Referências bibliográficas.

 

 

 

I - Linhas introdutórias.

 

 

O Governo de Minas Gerais vem parcelando os salários de parte dos Servidores públicos, notadamente, aos agentes públicos da área de Segurança Pública, gerando grande insatisfação dos prejudicados, em face da grave violação dos direitos humanos, a ainda, pelo fato de alguns agentes públicos e políticos não terem seus salários parcelados.

 

Tal medida apronta princípios constitucionais, como legalidade, isonomia, proibição da retenção dolosa de salários, espécies dos direitos da pessoa humana, uma das hipóteses caracterizadoras dos princípios constitucionais sensíveis, conforme definido no artigo 34, VII, b), da Constituição Federal de 1988,

 

Todo estudo de qualquer ramo da Ciência Jurídica, passa, necessariamente, pela temática principiológica.

 

Assim, para melhor desenvoltura do tema em apreço, é importante tecer comentários sobre o conceito de princípio.

 

Do latim principĭum, o princípio é o primeiro instante de algo. Trata-se, portanto, do começo ou início.

 

Segundo ensinamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, princípio:

 

 

 

 “é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido humano.

 

É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. Violar um Princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua estrutura mestra”.

 

 

 

Visto o conceito de princípio, agora é saber qual seria o conceito de princípios sensíveis?

 

 

 

II - Conceito de Princípios Constitucionais Sensíveis.

 

 

 

Segundo ensinamentos de Pontes de Miranda, princípios constitucionais sensíveis são aqueles, cujo descumprimento acarreta a intervenção federal.

 

A intervenção federal é um tema tratado no artigo 34 da Constituição da República de 1988.

 

Entrementes, somente o inciso VII, elenca os chamados princípios sensíveis, quais sejam:

 

 

 

a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

 

b) direitos da pessoa humana;

 

c) autonomia municipal;

 

d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

 

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

 

 

 

Assim, descumprir qualquer um desses princípios tem como consequência a intervenção federal por meio de Representação do Procurador-Geral da República diretamente ao Supremo Tribunal Federal.

 

 

 

III  - Direitos da pessoa humana.

 

 

Não obstante, a existência de 05(cinco) princípios constitucionais sensíveis, é relevante frisar que abordaremos neste ensaio os direitos da pessoa humana, artigo 34, VII, b), Constituição da República de 1988.

 

No relatório da ONU-1993 sobre o Desenvolvimento Humano recomenda-se que as pessoas sejam o sujeito de toda a produção tecnológica, econômica e política.

 

Já Aristóteles ensinava que “a política rege todas as artes e ciências porque ela detém a visão global daquilo que convém produzir para o bem de todos os cidadãos".

 

Sem embargos de posições em contrários, pode-se afirmar que os direitos da pessoa humana têm vinculação com os direitos de personalidade, que por sua vez, segundo o Código Civil, a  personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

 

E mais. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

 


IV - Parcelamento do salários e violação dos direitos da pessoa humana

 

 

 

Como é do conhecimento público, o Governo de Minas Gerais, recentemente lançou mão de medidas relativas ao parcelamento de salários de alguns servidores públicos, notadamente, para aqueles servidores que trabalham na Segurança Pública, mas não agiu da mesma forma para o pagamento de secretários, membros do Ministério Público e do Poder Judiciário.

 

De imediato, é importante dizer que a existência de salários faz parte do direto à sobrevivência humana, e em última análise, protege a vida e a dignidade da pessoa do trabalhador.

 

Originariamente, era uma quantia paga aos soldados para a compra de sal, artigo que nem sempre era barato na Europa.

 

Sabe-se que a ordem jurídica trabalhista tem construído uma cadeia sempre articulada de garantias e proteções ao salário do trabalhador.

 

O arcabouço jurídico protege o salário do trabalhador, com adoção de princípios de garantias, como irredutibilidade de salário, intangibilidade salarial, isonomia salarial, proibição da retenção dolosa, impenhorabilidade do salário, restrições à compensação, inviabilidade da cessão do crédito salarial, integralidade do salário, princípio da pontualidade do pagamento, além de outros.

 

A Convenção nº 117 da OIT, estabelece que deverão ser tomadas as medidas necessárias para assegurar que todos os salários ganhos sejam devidamente pagos aos empregados e servidores.

 

A Consolidação das Leis do Trabalho,  Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, no seu § 1º, artigo 459, prevê normas fixando como dia do pagamento, o 5º dia útil do mês subsequente ao do vencimento.

 

 

 

"§ 1º Quando o pagamento houver sido estipulado por mês, deverá ser efetuado, o mais tardar, até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido".

 

 

 

Mas nessa terra de gigantes nem sempre as leis, embora cogentes e imperativas,  são cumpridas.

 

Como se disse, recentemente, o Governo do Estado de Minas Gerais anunciou política de parcelamento dos salários de parte dos seus servidores, em especial, atingindo a toda categoria de servidores que atuam na Segurança Pública.

 

A medida atingiu parte dos servidores que possuem vencimentos intermediários, ficando de fora servidores de outros órgãos que percebem salários astronômicos.

 

É sabido também que no intervalo do escala de pagamento alguns compromissos dos servidores perante o Estado venceram, como o pagamento dos tributos vinculados aos veículos automotores, a saber IPVA, taxa de licenciamento e seguro obrigatório, além dos tributos municipais como o IPTU, e ainda considerando que 40% do IPVA são repassados aos municípios onde os carros são licenciados, consoante artigo 158, III, da Constituição da República de 1988.

 

Pode-se afirmar que o atual governo de Minas Gerais entra eternamente para a história do estado, como sendo o primeiro a parcelar salários de parte de seus servidores, atingindo de cheio a toda categoria policial.

 

E agora como consequência natural, pode-se afirmar, seguramente, que a medida anunciada pelo Governo de parcelamento dos salários de seus servidores, pode acarretar inúmeras consequências jurídicas, a saber:

 

 

 

I - Grave ofensa ao princípio da igualdade formal/material constitucional.

 

II - Ofensa ao princípio sensível atinente aos direitos da pessoa humana.

 

III - Desoneração dos contribuintes de pagamento de acréscimos moratórios aos impostos originários do Estado de Minas Gerais e dos seus 853 municípios;

 

IV - Incidência de ato lesivo ao princípio da legalidade, levando como resultado a prática de ato de improbidade administrativa;

 

V - Incidência na prática de crime a retenção dolosa de salários pelo Governo do Estado.

 

 

 

Passaremos a analisar os itens propostos:

 

 

 

Assim,  tem-se que a odiosa medida de parcelamento de salários da forma imposta, ab initio, agride num primeiro plano, o principio da igualdade constitucional.

 

 

 

I - Grave ofensa ao princípio da igualdade formal/material constitucional.

 

 

 

O princípio da igualdade não nasceu por agora. É um processo lento e evolutivo, de conquistas e retrocessos.

 

Trata-se de regra originária dos tempos remotos, de transição entre o estado natural e o estado de sociedade civil, que foi chamando posteriormente, de sociedade contratual.

 

Acerca da igualdade, a Constituição Federal preceitua no artigo 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

 

Neste contexto, assegura igualdade de aptidões e de possibilidades de gozar de tratamento isonômico.

 

A previsão em apreço acompanha a evolução dos tempos, tendentes a cumprir fielmente o princípio da proibição do retrocesso social.

 

Assim, a  Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em seu artigo 1º prevê que os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum.

 

Já a declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948 também no seu artigo 1º, determina que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

 

São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

 

Igualmente, o Pacto de San José da Costa Rica, de 1969, ratificado pelo Brasil por meio do decreto nº 678/92, no seu artigo  24 assevera:

 

 

 

Todas as pessoas são iguais perante a lei.  Por conseguinte, têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei.

 

 II - Ofensa ao princípio sensível atinente aos direitos da pessoa humana.

 

 

Em matéria de direitos humanos, o Brasil é signatário de Tratados e Convenções Internacionais de proteção desses direitos, sobretudo, quando aderiu a Declaração Universal dos Direitos Humanos e Pacto de San José da Costa Rica, documentos importantes, cujo conteúdo serviu de inspiração para que o Constituinte brasileiro de 1988 utilizasse para a formatação da nossa atual Carta Magna.

 

A  Declaração foi proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de Dezembro de 1948, através da Resolução 217 A da Assembleia Geral como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações. Ela estabelece, pela primeira vez, a proteção universal dos direitos humanos.

 

Desde sua adoção, em 1948, a DUDH foi traduzida em mais de 360 idiomas – o documento mais traduzido do mundo – e inspirou as constituições de muitos Estados e democracias recentes.

 

A DUDH, em dois artigos especiais, dizem respeito ao trabalho e ao salário, a saber:

 

 

 

Artigo 3°

 

Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.  

 

 

Artigo 23°

 

1.Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. 

 

2.Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 

 

3.Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social.

 

 

 

Por meio do Decreto nº 678/92, o Brasil se tornou signatário do Pacto de San José da Costa Rica.

 

Para fins da temática em apreço, colacionamos os seguintes artigos:

 

 

 

Artigo 4º - Direito à vida

 

1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente

 

Artigo 24 - Igualdade perante a lei

 

Todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação alguma, à igual proteção da lei.

 

 

 

A Constituição da República de 1988, nos artigos 1º e 3º, elenca, respectivamente, os princípios fundamentais e os objetivos a serem alcançados:

 

 

 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

 

I - a soberania;

 

II - a cidadania

 

III - a dignidade da pessoa humana;

 

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

 

V - o pluralismo político.

 

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

 

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

 

II - garantir o desenvolvimento nacional;

 

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

 

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

 

 

III - Desoneração dos contribuintes de pagamento de acréscimos moratórios aos impostos originários do Estado de Minas Gerais e dos seus 853 municípios.

 

  

 

O atraso de pagamento e parcelamento aos servidores públicos, pode levar a desoneração de pagamento de acréscimos moratórios aos impostos originários do Estado de Minas Gerais e dos seus 853 municípios.

 

Neste entendimento, o estado não pode atrasar o pagamento dos seus servidores, e depois cobrar juros dos contribuintes por eventuais atrasos no pagamento de impostos devidos, como por exemplo, o pagamento de IPVA, e nem autoriza este mesmo ente federado a exercer seu poder de polícia, por eventuais irregulares nos veículos em circulação, quando se provar que a irregularidade, ocorreu, única e exclusivamente, por culpa do estado, em função da legalidade bilateral.

 

Se o estado tem poder de exigir o pagamento dos seus impostos em dia, também é verdade que o contribuinte não pode ser obrigado a cumprir com suas obrigações, se comprovar que não o fez, por absoluta inexigibilidade de conduta diversa, por motivos de força maior, evidentemente, que não provocou.

 

O regular pagamento de salários somente a alguns servidores, além de contumélia irremissível ao principio da igualmente constitucional, também maltrata o princípio da legalidade.

 

 

 

IV - Incidência de ato lesivo ao princípio da legalidade, levando como resultado a prática de ato de improbidade administrativa;

 

 

O agente público quando viola o princípio da legalidade, além de violenta agressão ao comando normativo do artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, também ofende com pena de morte o artigo 11 da Lei nº 8.429/92, ensejando ato de improbidade administrativa, com as consequências que passamos a discorrer.

 

O principio da legalidade recebe importância constitucional, artigo 5º, inciso II e no artigo 37, como superprincípio da Administração Pública.

 

 

Martha Figueiredo leciona:

 

 

"Assim, sempre que o administrador público praticar ato ou omissão ilegal injustificável, revelando típica realização de má-gestão pública violadora dos deveres de lealdade institucional e eficiência administrativa, estará incorrendo no ilícito previsto no art. 11 da Lei nº 8.429/92, salvo se de tal conduta resultar, também, enriquecimento ilícito ou dano ao erário, caso em que a conduta subsumir-se-á às hipóteses dos arts. 9º e 10 da mesma lei, dado que a violação dos princípios é espécie de improbidade reconhecidamente subsidiária".

 

 

 

O insigne professor Hely Lopes Meirelles ensina com rara sabedoria:

 

 

 

“A legalidade, como principio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”.

 

 

 

O governo alega dificuldade financeira para atrasar o pagamento de parte dos seus servidores, ou para fazê-lo de forma parcelada, mas em contrapartida, ao mesmo tempo, desembolsa R$ 527 mil na aquisição de produtos alimentícios de valores exorbitantes, como carnes nobres, pescados e frios, além de produtos de alta gastronomia para abastecer os palácios do governo nas demandas da cozinha e eventos oficiais, enquanto o policial tem suas contas todas atrasadas.

 

Outrossim, não subsiste dúvida de que nos dias atuais, constitui-se voz dominante no mundo jurídico que salário tem a sua natureza jurídica reconhecida como sendo alimentar.

 

A natureza alimentar do salário é ressaltada por RUSSOMANO (1978, p. 439) para quem o salário e a remuneração possuem traços comuns e ambos são essencialmente alimentares, isto é, constituem meios de subsistência dos trabalhadores.

 

De forma mais incisiva RUSSOMANO (1978, p. 447) afirma: “a natureza alimentar do salário reclama, de parte do legislador, regulamentação cuidadosa”.

 

Não paira nenhuma dúvida de que a natureza do salário é mesmo alimentar. É o salário quem garante a sobrevivência do empregado, até mesmo porque este só trabalha por necessidade de sobreviver.  

 

 

V - Incidência na prática de crime a retenção dolosa de salários pelo Governo do Estado.

 

 De tão importante o salário para a sobrevivência humana, que o legislador elevou à categoria de crime a sua retenção dolosa, conforme artigo 168 do Código Penal Brasileiro.

 

A Constituição Federal reconheceu a gravidade do ato e elevou-o à categoria de crime (art. 7º, X, da CF), cabendo ao legislador infraconstitucional dispor sobre a tipificação e a cominação da pena

 

 

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

 

X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

 

 

 

É certo que o atraso de pagamento e o seu arbitrário parcelamento, aos servidores públicos em Minas Gerais demonstram equivocada política de Segurança Pública, revelando um pífio modelo de gestão pública realizada por uma administração sem metas, sem rumos e sem objetivos, longe daquilo que chamamos de diagnóstico finalístico de perseguição implacável ao bem estar social, fim último a ser perseguido pelo estado de direito.

 

A história é rica em relevar mitos e fracassados, monstros e estadistas. Uns saem de cena e marcam seu nome da história, deixando legados memoráveis. Outros ficam na história especialmente por demonstrarem fraqueza de caráter e ausência de espírito público, de desiderato coletivo.

 

Uns refletem o calor e a luminosidade da injustiça, da maldade, da desfaçatez, outros transformam oásis em zonas de liberdade e fraternidade.

 

Há quem se mira na beleza da madrugada, do brilho lunar, como fonte inspiradora de encantos, para irradiar o surgimento de projetos sociais, mas há quem ignora a sutileza da brisa de primavera, do colorido celestial, mesmo porque em qualquer situação há sempre uma cegueira social, porque gravita num submundo das atrocidades fisiologistas.

 

 

 

VI - Da Ação interventiva em Minas Gerais por ofensa aos direitos da pessoa humana.

 

 

 

Em trabalho científico de grande valor jurídico, os pesquisadores Eduardo Rodrigues dos Santos e Moacir Henrique Júnior, ensinam com propriedade:

 

  

"A Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva consiste numa espécie de controle de constitucionalidade concentrado que visa declarar inconstitucional determinada medida de um Estado ou do Distrito Federal em que há ofensa a algum dos princípios constitucionais sensíveis.    

 

Conforme demonstra Dierley da Cunha Jr. (2012a) A origem da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva reside na Constituição de 1934, por ela designada de representação interventiva, era confiada exclusivamente ao Procurador-Geral da República e de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispunha o art. 12, V, § 2º, da CF/34. A referida ação, naquela época já tinha como objeto conduta dos Estados que fosse ofensiva aos princípios constitucionais sensíveis (seus parâmetros constitucionais), consagrados no art. 7º, I, “a” a “h”, da CF/34. Ademais, há de se registrar que a Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, em que pese tenha sido suprimida pela Constituição Polaca de 1937, foi restabelecida pela Carta Constitucional de 1946 e conservada nas que a sucederam.   

 

Segundo o Bernardo Gonçalves Fernandes (2013), a Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva possui duas finalidades bastante claras, uma jurídica e outra política. Sua finalidade jurídica é a declaração de inconstitucionalidade da conduta do Estado ou do Distrito Federal, pelo Supremo Tribunal Federal. Já sua finalidade política é ensejar a decretação de Intervenção Federal pelo Presidente da República.  

 

O objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, como já salientamos em alguns pontos deste trabalho, consiste na conduta ou prática de algum Estado ou do Distrito Federal que seja ofensiva aos princípios constitucionais sensíveis (aqueles previstos no art. 34, VII, da CF/88). Contudo, na esteira das lições de Bernardo Gonçalves Fernandes (2013) há, ainda, de se esclarecer que tal conduta ou prática pode ser normativa ou de fato (concreta), omissiva ou comissiva. Reforça essa posição, Dirley da Cunha Jr., que afirma ser objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva “toda ação ou omissão, normativa ou não-normativa, administrativa ou concreta, jurídica ou material, que viola os princípios constitucionais sensíveis” (2012a, p. 292).  O parâmetro da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, conforme demonstramos, é objeto de discussão na doutrina e na jurisprudência. Contudo, na linha da doutrina majoritária, afirmamos que seu parâmetro consiste estritamente nos princípios constitucionais sensíveis. 

 

Tais princípios encontram-se positivados no art. 34, VII, da Constituição de 1988 e são exatamente os seguintes: forma republicana; sistema representativo; regime democrático; direitos da pessoa humana; autonomia municipal; prestação de contas da administração pública, direta e indireta; aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.  

 

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Enrique Ricardo Lewandowski, ao comentar o referido dispositivo, inspirando-se nas lições de José Afonso da Silva, afirma que tais princípios são chamados de sensíveis porque “se contrariados, provocam enérgica reação, como, no caso, a intervenção federal” (2013, p. 808), isto é, trata-se de princípios que, se ofendidos, causam uma irritabilidade maior da Constituição porque tutelam suas bases mais elementares, mais fundamentais.2  No que se refere à legitimidade ativa, ou ad causam, da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, pode se dizer que ela é monopólio do Procurador-Geral da República, tendo ele discricionariedade para propor ou não a ação em face de potencial ofensa a qualquer desses princípios. Frise-se: ele possui discricionariedade e não obrigatoriedade de proposição da ação.   No que tange à competência para processar e julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva, como se trata de Intervenção Federal nos Estados ou no Distrito Federal, ela é do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 36, III, da Constituição de 1988.  Em relação ao procedimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva há de se ressaltar que desde 2011, ela é regulamentada pela Lei 12.562. Contudo, foge de nossos objetivos analisar o procedimento da referida ação, destacando-se tão somente duas coisas: primeiro, que a referida lei estabeleceu a possibilidade de medida liminar e, segundo, que o quórum de julgamento é de 8 ministros e o quórum de decisão é de 6 ministros.  Por fim, em relação à decisão e aos efeitos desta, pode-se dizer que sendo a Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva provida, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, após publicado o acórdão, comunicará o Presidente da República para que ele decrete a Intervenção Federal".

 

 

 

VI - 1. Princípios Constitucionais

 

A Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva é destinada a aplicação aos princípios elencados no artigo 34 inciso VII da CF, quando a lei de natureza estadual (ou distrital de natureza estadual) contrariar:

 

a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

 

b) direitos da pessoa humana;

 

c) autonomia municipal;

 

d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta;

 

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

 

 

 

VI - 2. Competência

 

A competência para processar e julgar a Ação Direta Interventiva é do Supremo Tribunal Federal.

 

 

 

VI - 3. Legitimidade

 

Cabe ao Procurador-Geral da República.

 

 VI -4. Procedimento

 

A ação direta interventiva é proposta pelo Procurador-Geral da República, no Supremo Tribunal Federal, quando lei ou ato normativo de natureza estadual (ou distrital de natureza estadual), ou omissão, ou ato governamental contrariem os princípios constitucionais previstos no artigo 34 inciso VII da Constituição Federal, julgada procedente a ação por maioria absoluta, o STF requisitará ao Presidente da República, nos termos do artigo 36 § 3º, por meio de decreto, limitar-se-á a suspender a execução do ato impugnado.

 

Caso essa medida não seja suficiente para o restabelecimento da normalidade, aí, sim, o Presidente da República decretará a intervenção federal, executando-a com a nomeação de interventor e afastando as autoridades responsáveis de seus cargos.

 

  

 

Das Conclusões

 

 

O governo atual em pouco tempo de desmando já escreveu seu nome bem estampado na história de Minas Gerais, deixou sua marca indelével nos anais de uma época autofágica e abjeta.

 

São páginas tristes de se abrirem, grafadas com letras maiúsculas da incompetência e do despreparo, recheios de equívocos crassos e ultrajantes, lesivos aos mais valiosos direitos que incorporam o princípio da dignidade da pessoa humana, como direito a subsistência, absoluto direito ao alimento e sagrado direito ao recebimento de salários por dias trabalhados.

 

Negar salário a quem trabalha, é regressar ao tempo primitivo, imperial, ao nefasto e remoto regime de escravidão que um dia assentou sintomas neste país, e agora expropriam abertamente dos vencimentos de seus servidores, qualificando tais medidas de cruéis, criminosas, nojentas  e de autoextermínio.

 

Enquanto o governo atrasa os salários dos servidores da Segurança Pública, a criminalidade corre solta em Minas Gerais.

 

Somente no período de 30 de junho a 03 de julho de 2016, foram registrados 50 homicídios consumados e 47 tentativas de homicídio, uma explosão da violência, tudo sem controle e sem planejamento, fruto de um incrível amadorismo na gestão pública, com graves perdas sociais.

 

O estado que deixa seus cidadãos ser assinados é o mesmo que introduz a indústria da impunidade, pois não previne e nem apura os crimes registrados na chamada cifra dourada, que são os dados oficiais divulgados, ficando de fora os crimes das cifras negras, amarelas e cinzas.

 

A esperança deve um dia ter superado o medo, mas hoje assistimos a hipocrisia e o escárnio de lobos vorazes, sequestradores da autonomia de vontade dos mais necessitados, terroristas de ocasião, gigantes do terror que rotulam seu território de pátria educadora.       

 

 

Sábias e verdadeiras as palavras da ministra do STF, Cármen Lúcia:

 

 

"Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a Ação Penal 470 e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça. Aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e das iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade, impunidade e corrupção. Não passarão sobre os juízes e as juízas do Brasil. Não passarão sobre novas esperanças do povo brasileiro, porque a decepção não pode estancar a vontade de acertar no espaço público. Não passarão sobre a Constituição do Brasil”

 

 

 

Conclui-se, afirmando que com as medidas unilaterais, arbitrárias e tomadas ao arrepio da lei, malignas e rancorosas, o governo de Minas Gerais transgride frontalmente, as normas legais e constitucionais em vigência, e depois de haver cometido grave ofensa aos princípios constitucionais sensíveis, direitos da pessoa humana, art. 34, VII, b), CF/88, em suas variantes, lesão aos princípios da legalidade, igualdade e moralidade, incorre na pertinência típica de ato de improbidade administrativa e retenção dolosa de salários, a configurar crime de apropriação indébita, tudo conforme normas estatuídas no artigo 11 da Lei nº 8.429/92 c/c artigo 168 do Código Penal Brasileiro.

 

Noutra seara, o governo de Minas Gerais, com a medida de retenção dolosa indireta do pagamento imposta subversiva e arbitrariamente a parte dos servidores públicos, incorre em práticas odiosas como ofensa aos princípios da pontualidade do pagamento, integralidade do pagamento e na inalterabilidade prejudicial.  

 

E por consequência, os servidores públicos lesados que em razão exclusiva da ação ou omissão do estado, atrasarem seus compromissos atinentes ao pagamento dos tributos, caracterizando aquilo que denominamos de interdição intransponível, ficam inumes de multas, juros ou quaisquer acréscimos decorrentes, sob pena de cobrança abusiva e arbitrária por parte do estado.

 

Arremata-se, afirmando que em face da violação dos direitos da pessoa humana, artigo 34, inciso VII, b), da Constituição da República de 1988, pertencente à categoria dos princípios constitucionais sensíveis, sobram motivos para a propositura da Ação Interventiva no estado de Minas Gerais, em homenagem aos direitos de sobrevivência e proteção à vida.

 

 

 

Referências bibliográficas:

 

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. p. 30

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www2.planalto.gov.br>. Acesso em: 16 de fevereiro de 2016

 

BRASIL. Decreto-lei nº 2848, de 07 de dezembro de 1940. Dispõe sobre o Código Penal Brasileiro. Disponível em: <http://www2.planalto.gov.br/>. Acesso em: 16 de fevereiro de  2016.

 

FIGUEIREDO, Martha Carvalho Dias de. Violação ao princípio da legalidade e aos deveres de lealdade institucional e ineficiência funcional.. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2434, 1 mar. 2010. Disponível em: . Acesso em: 16 fev. 2016.

 

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17. Ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

 

RUSSOMANO, Mozart Victor. O Empregado e o Empregador no Direito Brasileiro.São Paulo: LTR, 6ª ed. 1978.

 

SOUZA, Gelson Amaro de. O Salário como Direito Fundamental. Disponível em http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/o-sal%C3%A1rio-como-direito-fundamental-%E2%80%93-revisita%C3%A7%C3%A3o, acesso em 16 de fevereiro de 2016, às 20h04min.

 

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