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A DESAPOSENTAÇÃO E OS PRINCÍPIOS DA SOLIDARIEDADE E RAZOABILIDADE


Autoria:

Ana Cecilia Pimenta Silva


Ana Cecília Pimenta Silva, Universidade Estadual de Montes Claros, Curso de Direito

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Resumo:

Análise do instituto da desaposentação com base nos princípios norteadores do Direito Previdenciário.

Texto enviado ao JurisWay em 09/05/2016.

Última edição/atualização em 13/05/2016.



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DESAPOSENTAÇÃO E OS PRINCÍPIOS DA SOLIDARIEDADE E RAZOABILIDADE 

 

 

RESUMO  

 

O presente trabalho tem por principal objetivo a análise do conceito de desaposentação e sua possibilidade frente ao ordenamento jurídico. Fez-se uma breve explanação sobre o sistema de previdência social, abarcando a assistência, saúde e previdência e acerca do instituto da desaposentação sob enfoque dos princípios da seguridade social, notadamente o princípio da solidariedade.

 

Por meio de análise jurisprudencial enfatizou-se a posição dos Tribunais Superiores sobre o tema, bem como foi realizada análise entre os diversos posicionamentos, notadamente pelo confronto entre o princípio da retributividade e o princípio da solidariedade social.

 

Palavras-chave: Seguridade Social- Princípios da Seguridade- Desaposentação- Princípio da Solidariedade.

 

INTRODUÇÃO  

 

O estudo pretende fazer análise e conceituação da desaposentação, envolvendo-o com a possibilidade de renúncia á aposentadoria e os princípios que regem a seguridade social, bem como analisando a viabilidade da desaposentação para fins de majoração de benefícios.

 

A relevância da pesquisa se dá pelo atual debate acerca do tema, bem como pela Lei nº 13.183/2015, cujo projeto previa o instituto, tendo, no entanto, sido vetados os dispositivos que o regulavam, bem como pelas controvérsias de teses a respeito da possibilidade ou não da desaposentação, sob o ponto de vista social e do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema de previdência em contraponto ao princípio da retributividade.

 

Destacada a relevância do tema, a pesquisa se deu com base no método indutivo de investigação, por meio da análise normativa, jurisprudencial e bibliográfica.

  

 

1. A SEGURIDADE NO BRASIL 

 

O artigo 194 da Constituição Federal prevê o sistema de seguridade pátrio ao estabelecer que:

  

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos a da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

  

Desta feita, a seguridade social nada mais é que um conjunto de iniciativas geridas pela sociedade como um todo com o poder público, uma garantia social do cidadão em ver prestado pelo Estado alguns de seus direitos fundamentais, notadamente o direito à saúde e á assistência social, os quais lhe são assegurados independentemente de qualquer contraprestação sua, de forma gratuita, além da previdência social.

 

Assim, pode-se afirmar que o termo previdência social em sentido amplo abrange três espécies programas sociais a saber, a previdência em sentido estrito, saúde e assistência social. Nesse sentido, assevera Fábio Zambitte Ibrahim:  

 

A seguridade social pode ser conceituada como a rede protetiva formada pelos Estados e particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações para o sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida digna. ( IBRAHIM, ano. p.3.) 

 

Nesse contexto, infere-se que a previdência social é mantida em parte por meio dos seus segurados que realizam contribuições necessárias á manutenção do sistema, possibilitando a prestação de direitos fundamentais ás pessoas menos favorecidas, bem como a subsistência de quem contribui de forma regular, por meio dos benefícios previdenciários previstos em lei.

 

 

1.1 Saúde

 

A saúde é direito de todos e dever do Estado, nos termos da Carta Magna, que em seu artigo 196 prevê:

  

Art.196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante politicas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

 

 

A saúde, como direito fundamental que é, é gratuita e deve ser assegurada a todos, independentemente de qualquer contribuição prestada à seguridade social. Ademais, de acordo com a universalidade, ninguém pode ser excluído da rede de atendimento pelo Sistema Único de Saúde.

 

 

1.2 Previdência

 

O artigo 1º da Lei nº 8213/9119 dispõe que:

 

 

Art.1º. A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.

 

 

Conforme se infere da letra da lei, a previdência social possui caráter essencialmente contributivo, sendo mantida por contribuições de seus segurados, bem como de toda a sociedade, que funcionam como fonte de custeio para os benefícios que mantém a subsistência dos contribuintes segurados, bem como de seus dependentes habilitados.

 

O artigo 201 da Constituição Federal estabelece a contributividade própria da previdência, conforme se vê:

 

Artigo 201,CF :A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei.

 

Trata, portanto, de direito a benefícios que consistem, normalmente, em uma prestação pecuniária, concedida aos segurados que atenderam a certos requisitos previstos em lei, que se enquadrem nas situações de contingência também estabelecidas legalmente, que impossibilitem o segurado de prover seu próprio sustento.

 

Nesse contexto, atua a Previdência Social, precipuamente, garantindo a subsistência aos seus segurados. Trata de sistema de filiação obrigatória aos que queiram dele se beneficiar, ao contrário do que ocorre com a saúde e assistência social. 

 

 

1.3 Assistência Social 

 

Quanto à assistência social, pode-se afirmar que será prestada de forma gratuita aos que dela necessitarem, independentemente de qualquer contribuição á Previdência.

 

De acordo com o artigo 203 da Constituição Federal, a assistência social tem por objetivo a proteção da família, maternidade, infância, adolescência e velhice, a promoção da integração ao mercado de trabalho, a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

 

Nesse sentido, assim como a saúde, a assistência social consiste em direito fundamental do cidadão, que lhe deve ser assegurado de forma ampla sem restrições, tendo como fonte de custeio as contribuições realizadas pelos segurados, bem como outras fontes geradoras espalhadas pela sociedade. Tudo a fim de garantir o mínimo de dignidade aos que necessitam.

 

 

2. PRINCÍPIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL 

 

O sistema previdenciário, enquanto garantia social que é, é norteada por uma vasta base principiológica que dá sustentáculo ao sistema e orienta a aplicação de suas normas. Podem ser citados o princípio da universalidade, irredutibilidade dos benefícios, equilíbrio financeiro e atuarial, solidariedade, dentre outros.

 

Todavia, é foco do presente escrito, a análise do princípio da solidariedade, razão pela qual será priorizado em face dos demais princípios.

 

  

2.1 Princípio da Solidariedade Social 

 

A solidariedade pode ser definida como a determinação de que é dever social de todos à contribuição para a manutenção da seguridade social, independentemente de auferir qualquer benefício em contrapartida.

 

A contribuição pode se dar tanto de forma direta, com o pagamento de contribuições previdenciárias junto à autarquia do Instituto Nacional da Seguridade Social, como de forma indireta, pela aquisição de determinados produtos ou serviços, sobre os quais incidirão percentual a ser destinado á Previdência.

 

Desta feita, em virtude do princípio da solidariedade, a sociedade assume um dever de manutenção da previdência, podendo apresentar uma atuação mais direta, realizando espontaneamente as contribuições, bem como assumindo uma posição mais passiva, auxiliando de forma indireta nas aquisições de itens e serviços essenciais de seu cotidiano, havendo, inclusive, incidência em atividades empresariais.

 

Nota-se, portanto, a chamada diversidade da base de custeio e financiamento, outro princípio imprescindível para a manutenção do equilíbrio do sistema.

 

Insta ressaltar que o princípio da solidariedade social se opõe diametralmente á retributividade, que prevê que à cada contribuição deve haver o correspectivo benefício.

 

De forma contrária se mostra o princípio da solidariedade, cuja principal peculiaridade é a previsão do dever social do financiamento sem que haja qualquer imposição de atuação da Previdência no sentido de conceder benefícios a quem com ela contribua, com objetivo, sobretudo, de garantir a dignidade da pessoa humana aos cidadãos em situações de risco.

 

Com efeito, nota-se de forma mais evidente a aplicação do princípio em tela quando da apreciação da saúde e assistência social que, como se sabe, se caracterizam como espécies de benefícios “gratuitos”, prestados de forma unilateral pela Previdência Social, aos membros da sociedade que deles necessitam, sem que haja necessidade de contraprestação pecuniária.

 

 

2.2 Princípio da Razoabilidade 

 

Ainda nesse contexto, impende destacar também o princípio da razoabilidade, definido como critério de aplicação da lei de forma a impedir restrições a direitos fundamentais, atuando também em caso de conflito aparente entre direitos com mesma estatura constitucional, de forma a fazer prevalecer aquele cujo sacrifício pareça menos razoável ao caso concreto.

 

Assim, a razoabilidade ou proporcionalidade se relaciona diretamente ao princípio da solidariedade, ao determinar sua prevalência sobre a retributividade. Nesse sentido, é notório que, entre o direito de um contribuinte receber retribuição pecuniária por contribuições feitas e a dignidade de uma pessoa portadora de deficiência sem condições financeiras aptas a garantir o mínimo existencial de um ser humano, a segunda opção deve preponderar.

 

Além disso, como princípio informador da própria aplicação da lei, pode determinar seu afastamento no caso concreto com fim de garantir a observância de direito de suprema importância.

 

 

3. DA DESAPOSENTAÇÃO 

 

Inicialmente, antes de adentrar no tema desaposentação, convém realizar uma breve análise histórica sobre o instituto e suas alterações ao longo do tempo.

 

A desaposentação é caracterizada como a hipótese em que aposentados que continuam com suas atividades laborativas após a concessão de aposentadoria devem continuar a contribuir com a Previdência, sem direito à devolução dos valores recolhidos.

 

Até 1994, os valores pagos após a aposentadoria denominavam-se pecúlio e correspondiam á soma das contribuições recolhidas a partir da data da concessão da aposentadoria ao segurado, que lhe era entregue em uma só parcela. Vigorava o princípio da retributividade.

 

Todavia, em 15 de abril de 1994, sobreveio a Lei nº 8870, que extinguiu o pecúlio e com ela o dever do aposentado que continuasse laborando em contribuir com a Previdência Social. No ano seguinte, foi editada a Lei que, por sua vez, tornou obrigatória a contribuição para os aposentados nessa situação.

 

O instituto da desaposentação nunca foi previsto de forma expressa na legislação, consistindo, em verdade, em uma construção doutrinária que conquistou adeptos em sede de jurisprudência. Assim sendo, nunca houve em lei previsão de que aposentados que continuem realizando contribuições à previdência teriam direito a reajuste de seus respectivos benefícios.

 

Conforme explanado, existia uma espécie de benefício denominada pecúlio que consistia na devolução integral e de uma só vez dos valores pagos junto à Previdência pelo segurado aposentado.

 

Quanto à desaposentação, afirma Ibrahim:

 

A desaposentação é a possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter um benefício mais vantajoso, no Regime Geral da Previdência Social ou em Regime Próprio de Previdência Social, mediante a utilização de seu tempo de contribuição. (IBRAHIM, 2011, p. 35).

  

Ainda sobre o tema, Martins (2008, p. 347) observa que a “Constituição não veda a desaposentação. As Leis nº 8.212 e 8.213 também não o fazem. O que não é proibido, é permitido. A norma não pode ser interpretada contra o segurado, com o intuito de obrigá-lo a permanecer aposentado”.

 

Coelho (1999, p. 1130-1134) define o instituto como“a contagem do tempo de serviço vinculado à antiga aposentadoria para fins de averbação em outra atividade profissional ou mesmopara dar suporte a uma nova e mais benéfica jubilação”.

 

Desta feita, conclui-se que o instituto da desaposentação, em tese, consiste em direito de um segurado renunciara uma aposentadoria objetivando se aposentar novamente, mas com valor mais vantajoso, no qual seriam incluídas as contribuições realizadas a partir da primeira aposentadoria no período de base de cálculo para a nova.

 

Tendo em vista o caráter patrimonial do benefício da aposentadoria, surgiram as primeiras teses defensivas da possibilidade de renúncia a esse direito por parte do segurado, já que, notadamente, trata-se de direito inteiramente disponível.

 

Assim, poderia, em tese, o aposentado renunciar ao seu direito de aposentação e permanecer contribuindo junto á Previdência, com objetivo de adquirir direito a novo benefício, seja no mesmo regime previdenciário com aproveitamento do novo tempo de contribuição, seja com enquadramento em outro regime que, de alguma forma, lhe seja mais favorável.

 

Nesse contexto, em que pese não haver previsão normativa, há nos Tribunais Superiores manifestações favoráveis ao reconhecimento do direito, notadamente no Superior Tribunal de Justiça, conforme infere do seguinte julgado: 

 

 

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. CONCESSÃO DE NOVO BENEFÍCIO.DESAPOSENTAÇÃO. POSSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL.LEI Nº8.213/1991, ART.18,§ 2º.1. Consoante jurisprudência firmada pelas duas Turmas que compõem a Primeira Seção deste Tribunal, ressalvado o ponto de vista contrário do próprio relator, é possível a renúncia à aposentadoria por tempo de contribuição anteriormente concedida e a obtenção de uma nova aposentadoria, no mesmo regime ou em regime diverso, com a majoração da renda mensal inicial, considerando o tempo de serviço trabalhado após a aposentação e as novas contribuições vertidas para o sistema previdenciário.2. Fundamenta-se a figura da desaposentação em duas premissas: a possibilidade do aposentado de renunciar à aposentadoria, por se tratar de direito patrimonial, portanto, disponível, e a natureza sinalagmática da relação contributiva, vertida ao sistema previdenciário no período em que o aposentado continuou em atividade após a aposentação,sendo descabida a devolução pelo segurado de qualquer parcela obtida em decorrência da aposentadoria já concedida administrativamente, por consistir em direito regularmente admitido. Precedentes do STJ. 3. Tratando-se, no caso, de mandado de segurança, são devidas apenas as parcelas vencidas após o ajuizamento da ação, que devem ser compensadas com aquelas percebidas pela parte autora com a aposentadoria anterior, acrescidas de correção monetária e de juros de mora, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução/CJF 134, de 21.12.2010. 4. Remessa oficial parcialmente provida. (TRF 1ª Região. REO 2008.34.00.024286-6/DF, Rel. Desembargador Federal Néviton Guedes, Primeira Turma, e-DJF1 p.26 de 31/05/2012).

 

 

Nesse contexto, cumpre destacar que, atualmente, há regulação pela Lei 8.212/91, cujas disposições preterem o princípio da retributividade ao estabelecer uma suposta desaposentação, traduzida como continuidade do dever de contribuição após a aposentadoria para quem se mantém trabalhando, sem que, contudo, os aposentados contribuintes possam receber qualquer contraprestação em troca. Vale a transcrição:

 

 

Artigo 12, Lei 8212/1991: O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social.

 

  

Assim, a lei estabelece que o aposentado que volta a exercer trabalho e continua contribuindo com a Previdência não receberá nenhuma espécie de benefício previdenciário em troca, o que, conforme dito, fere o princípio da retributividade previsto no parágrafo 5º, artigo 195 da Constituição Federal que estabelece que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado ou majorado sem a correspondente fonte de custeio, o que, por via de consequência, leva a conclusão de que não haverá aumento de fonte de custeio sem o correspondente benefício.

 

Todavia, na atualidade vigora o princípio da solidariedade como maior premissa do Sistema Previdenciário Brasileiro, o que legitima, inclusive a existência de certos benefícios e prestações sem qualquer contribuição por parte do beneficiário, notadamente a saúde e assistência social. De acordo com tal previsão, a via inversa também é admitida, já que pode haver contribuição sem recebimento de qualquer benefício.

 

Com base em tal princípio impera a determinação de que ao aposentado que permaneça ativo no trabalho e perante a Previdência, não é assegurado qualquer direito a eventual benefício. Dessa forma, sua contribuição serve para o custeio e manutenção do sistema, notadamente com fim de assegurar saúde e assistência aos carentes, corolando a solidariedade social que sustenta o complexo sistema.

 

Nessa perspectiva, não obstante a existência de controvérsias quanto ao tema, tem-se que a solidariedade tem prevalecendo, notadamente sob argumento de que a seguridade social deve ser custeada por toda a sociedade com fins de garantir a universalidade do sistema

 

Nesse sentido, sob a ótica social, é crível exigir-se de quem esteja em condições contributivas perfeitas, que contribua para o sucesso do sistema de seguridade, mesmo sem perspectiva de receber algo em contrapartida, atuando de forma solidária a fim de possibilitar aos mais debilitados da sociedade o acesso aos seus direitos fundamentais, como saúde, alimentação e uma vida condizente com sua condição de pessoa humana.

 

Assim, no choque entre os princípios, deve-se ponderar o que deve prevalecer, se a retributividade ou a solidariedade que se mostra imprescindível para a sobrevivência saudável da Previdência na promoção de uma proteção social mais universal.

 

Sobre as controvérsias, cumpre destacar o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal:

  

Servidor público: contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos – 4 Informativo nº 787 (25 a 29 de maio de 2015.) O Plenário retomou julgamento de recurso extraordinário em que discutido se haveria incidência de contribuição previdenciária sobre terço de férias e adicionais por serviços extraordinários e por insalubridade. Em voto-vista, o Ministro Luiz Fux acompanhou o Ministro Roberto Barroso (relator), para prover parcialmente o recurso. Destacou a convergência, no âmbito constitucional, entre o Regime Geral de Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio de Previdência Social – RPPS. Anotou que, antes das alterações constitucionais em debate, a jurisprudência do STF seria no sentido de que a contribuição previdenciária de servidor público não poderia incidir sobre parcelas não computadas para o cálculo dos benefícios de aposentadoria, tendo em conta que: a) a natureza indenizatória dessas parcelas não se amoldaria ao conceito de remuneração; e b) essas parcelas não seriam incorporáveis aos proventos dos servidores, o que levaria à desconsideração da dimensão contributiva do RPPS. Uma vez existirem controvérsias quanto à natureza das parcelas, remanesceria o segundo argumento. No ponto, o RPPS teria migrado, da redação originária do texto constitucional, de natureza solidária e distributiva, para um regime de natureza também contributiva (EC 3/1993). Posteriormente, com a entrada em vigor da EC 20/1998, o aspecto contributivo fora reforçado, colocando em aparente conflito os princípios da contributividade e da solidariedade. A EC 41/2003, por sua vez, reforçara o caráter solidário do sistema, mas não derrogara o seu caráter contributivo. Afirmou que a aplicação do princípio da solidariedade afastaria relação sinalagmática e simétrica entre contribuição e benefício. Contudo, o princípio contributivo impediria a cobrança de contribuição previdenciária sem que se conferisse ao segurado qualquer contraprestação, efetiva ou potencial, em termos de serviços ou benefícios. Servidor público: contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos – 5 Por sua vez, o Ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência, para desprover o recurso. Aduziu que o rol exemplificativo do art. 4º das Leis 9.783/1999 e 10.884/2004 deveria ser interpretado no sentido da possibilidade de se incluírem na base de cálculo das contribuições previdenciárias, independentemente da repercussão direta e imediata do valor do benefício, parcelas remuneratórias recebidas pelos servidores a título de ganhos habituais, excluindo-se, portanto, os ganhos não habituais e aqueles que, mesmo recebidos com habitualidade, tivessem caráter indenizatório. A questão atinente à natureza da verba, inclusive seu caráter indenizatório ou não, para fins de incidência da contribuição previdenciária, seria matéria a implicar juízo de legalidade e de fatos e provas, inviável em sede de recurso extraordinário. Afirmou que deveria haver proporcionalidade entre as contribuições exigidas e o benefício concedido. Desse modo, o servidor deveria ser protegido de alterações abruptas do regime, mas não teria direito subjetivo a uma estrita vinculação do valor do benefício com as contribuições vertidas ao sistema da seguridade social. Ademais, a base econômica da contribuição previdenciária do servidor público não constaria do art. 40, § 3º, da CF, mas de seu art. 195, II, o qual dispõe sobre o financiamento da seguridade social para toda a sociedade. Assim, a base de cálculo das contribuições seria a folha de salários, o total dos rendimentos, a qualquer título. Entretanto, o art. 201, § 11, da CF estabelece que todos os ganhos habituais do trabalhador deveriam compor a base de cálculo das contribuições, a delimitar, para fins de incidência, o que seria considerado “total dos rendimentos”. Dessa perspectiva, no custeio da seguridade social, os princípios da solidariedade e da universalidade, conquanto não criassem poderes restritivos, já regulados por outras normas, teriam a função de delimitar os contornos do exercício dos poderes previstos nas regras constitucionais de competência. Em seguida, pediu vista dos autos a Ministra Cármen Lúcia. Ref.: RE 593068/SC, rel. Min. Roberto Barroso, 27.5.2015. (RE-593068).

  

Por fim, cumpre salientar que a questão ainda se mostra um pouco longe de solução, já que o projeto de lei de nº 13.183/2015, que pretendia criar efetivamente o instituto da desaposentação, teve seus dispositivos que regulamentavam o tema vetados pela Presidente da República, de forma que subsistem as discussões ante a falta de regulamentação.

 

Todavia, em que pesem os argumentos favoráveis ao instituto, tem-se que este ferirá de forma direta o princípio da solidariedade, colocando em risco a própria manutenção e o equilíbrio financeiro do sistema previdenciário no Brasil.

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

 

 

A desaposentação ainda é tema controvertido, sobretudo no que tange às suas consequências. O Superior Tribunal de Justiça tem dado sustentação ao tema, apontando para sua possibilidade frente ao ordenamento jurídico, contudo, ainda não há uma manifestação do Supremo Tribunal Federal.

 

No momento, prevalece a posição da possibilidade de renúncia ao direito de aposentação por parte do segurado, que pode continuar contribuindo junto á Previdência, todavia sem receber qualquer contraprestação por sua atitude. Conforme se nota, impera o princípio da solidariedade informando o sistema, podendo se dizer que foi preterida a retributividade, a fim de se assegurar o equilíbrio e fim social do sistema.

 

Notadamente, a desaposentação se mostra favorável ao segurado, que vê no instituto a possibilidade de renunciar à sua aposentadoria com propósito de obter benefício mais vantajoso, seja no regime geral de previdência social ou em regime próprio de previdência, com a utilização de seu tempo de contribuição.

 

Contudo, do ponto de vista social, a desaposentação acabaria por afetar os direitos constitucionalmente garantidos ás pessoas menos favorecidas, notadamente os portadores de deficiência, idosos, inválidos, dentre outros, tendo em vista que sua aplicação pelo Estado depende diretamente da manutenção da solidariedade social que mantém a seguridade social.

 

Nesse sentido, há que se observar a questão suscitada a fim de assegurar, em último plano, a própria dignidade da pessoa humana, princípio matriz da Constituição Federal de 1988.

 

Nota-se que, apesar do acolhimento na doutrina e jurisprudência, a questão esbarra na ausência de previsão legal, o que, além de ensejar controvérsias, obsta a concessão do direito na via administrativa, já que a Previdência deve seguir a lei estritamente.

 

Assim sendo, quem deseje ver assegurado o seu direito à desaposentação não possui outro meio a não ser recorrer ao Poder Judiciário, enquanto o legislador não atua.

 

Todavia, conforme já mencionado, é de rigor o alerta quanto aos riscos da regulamentação da desaposentação, sobretudo no que tange ao princípio da solidariedade que determina o dever social de contribuição de todos, com diversidade nas fontes de custeio, independentemente de concessão de benefícios aos contribuintes e se mostra como imprescindível à manutenção do próprio equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, sem o qual é temerosa a ruína da seguridade social.

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

  

AGUIRRE, João Ricardo Brandão, TÁVORA, Nestor; Vade Mecum Legislação.3.ed. –Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODA, 2015. 

 

COELHO, Hamilton Antonio. Desaposentação: Um Novo Instituto? Revista de Previdência Social, São Paulo: LTR, vol.228, p.1130-1134, nov 1999.  

 

FILIPPO, Filipe de. Os princípios e objetivos da Seguridade Social, à luz da Constituição Federal. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 43, jul.2007. Disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?nlink=revista_artigos_leitura&artigoid=2012>.

  

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação: o caminho para uma melhor aposentadoria. 5º ed. Niterói-RJ. Impetus, 2011. 

 

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2008 

 

MEDINA, Damares.O Supremo Tribunal Federal e a contribuição previdenciária dos servidores inativos.Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1920, 3out.2008. Disponível em: Acesso em 04/01/2016, ás 23:45 hs.

 

http://www.jusbrasil.com.br/topicos/1195356/renuncia-a-aposentadoria > Acesso em 05/01/2016, às 18:00. 

 

DESAPOSENTAÇÃO: antecedentes, teses favoráveis e contrárias, jurisprudência atual.Revista Jus Navigandi, Teresina,ano 18,n. 3601,11maio2013. Disponível em:. Acesso em:6 jan. 2016, às 21:58. 

 

http://www.blogservidorlegal.com.br/solidariedade-e-pro-ou-contra-a-retributividade-da-previdencia/ > Acesso em 04/01/2016, às 22:37hs. 

 

http://alestrazzi.jusbrasil.com.br/artigos/256150606/a-dilma-acabou-com-a-desaposentacao > Acesso em 05/01/2016, às 14:00hs

 

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