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O ESTRANGEIRO TRIPULANTE MARÍTIMO NA NAVEGAÇÃO DE CURSO INTERNACIONAL PELO BRASIL


Autoria:

Ivan Barbosa De Araujo


Funcionário público federal, Bacharel em direito pela Faculdade brasileira de ciências jurídicas do Rio de Janeiro, pos graduado em direito público e privado pelo ISMP do Rio de Janeiro.

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Resumo:

O Brasil como Estado soberano possui mecanismos legais para o controle e fiscalização da identidade e estada do estrangeiro que adentra seu território a fim de atuar no transporte marítimo de um modo geral. Este estrangeiro deverá obter junto da ...

Texto enviado ao JurisWay em 07/01/2016.



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O ESTRANGEIRO TRIPULANTE MARÍTIMO NA NAVEGAÇÃO DE CURSO INTERNACIONAL PELO BRASIL

Resumo: O Brasil como Estado soberano possui mecanismos legais para o controle e fiscalização da identidade[1] e estada do estrangeiro que adentra seu território a fim de atuar no transporte marítimo de um modo geral. Este estrangeiro deverá obter junto da autoridade responsável por fiscalizar sua entrada um “status” de acordo com sua identidade (documento de viagem) apresentado. Este artigo terá o objetivo de abordar as diversas Normas aplicáveis à estada e ao documento de identidade do estrangeiro tripulante[2] marítimo na chamada navegação de curso internacional ou longo curso pelo território brasileiro. Buscando obter a real finalidade destas para o tratamento dado na chegada desses estrangeiros ao território brasileiro.

 

Sumário: 1. Soberania brasileira e elaboração de Normas. 2. Navegação de curso internacional ou longo curso. 3. Disposição das Normas. 4. Normas nacionais – Lei 6.815/80 e Decreto 86.715/81. 5. Normas internacionais – Convenções da OIT. 6. Normas administrativas do Conselho Nacional de Imigração. 7. Interpretação e finalidade das normas. 8. Conclusão.

 

 

1. Soberania brasileira e elaboração de Normas

A soberania do Brasil explicitada em sua própria Carta de direitos constitucionais promulgada em 05 de outubro de 1988. Dispõe em seu artigo 1º, inciso I, o seguinte:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

 

O Brasil como precursor de sua própria soberania é o responsável em elaborar e publicar toda Norma legal que reja a situação do estrangeiro em seu território. A elaboração da Norma referente ao direito estrangeiro abrange principalmente a questão migratória de competência privativa da União. Tal matéria vem regida na Constituição da República de 1988 como segue:

Art. 21. Compete à União:

I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

XV - emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros; (grifado)

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

 

A Constituição da República Federativa brasileira trás uma exceção á está competência privativa da União de legislar sobre questões do direito estrangeiro. O parágrafo único do artigo 22 delega aos Estados membros a possibilidade de legislar sobre esta matéria. Desde que esta somente abarque questões específicas delegadas por Lei Complementar a ser publicada pela própria União federativa. Na atualidade não há pelos Estados da federação legislação sobre a matéria.

Pela legislação da União se teve a simplória expedição da Lei 6.815/80 e seu Decreto regulamentar 86.715/81.

Existe também no Brasil como em vários outros países, há incidência de outras espécies normativas. Dentre as quais, (Tratado, Acordo, entre outros) que internacionalmente envolvem diversas matérias. A Carta Magna brasileira como guardiã fiel prevê todo rito para o estudo e publicação desta complexa regulamentação interna. Necessitando da vênia de poderes distintos da União republicana para esta ter validade. Esta espécie normativa para ser internalizada no ordenamento jurídico pátrio necessitará primeiramente da celebração pelo poder executivo na Presidência da República, que decidirá pelo envio para aprovação na casa legislativa. Enviado para envio o Congresso Nacional receberá e resolverá definitivamente sobre sua ratificação. Resolvendo por ratificá-lo, o fará através de Decreto Legislativo e o reenviará para o executivo que dará a última palavra quanto à promulgação, vigência e validade. O ato promulgado se dará através de Decreto da Presidência da República.

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; (grifado)

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional; (grifado)

Ainda pelo tema proposto neste artigo, será também analisado algumas Normas do Conselho Nacional de Imigração – (Cnig), do Ministério do Trabalho e Emprego, que abarcam as questões de estada e identidade do estrangeiro tripulante marítimo na navegação de curso internacional. Sendo Estas Normas se dão através de Resoluções Normativas. Verdadeiros diplomas secundários que dispõem a matéria de maneira limitada. 

 

2. Da navegação de curso internacional ou longo curso.

A navegação de curso internacional é a que tem a maior incidência de entrada e saída no território dos países pelo mundo todo.  Sendo a figura do estrangeiro tripulante e marítimo que venha no Brasil para a navegação de um modo geral, matéria que possui uma variada incidência normativa. Pois este tripulante receberá em primeiro momento seu ciclo de estada de acordo com a finalidade da navegação pelo território brasileiro.

Anteriormente a fase de exploração do petróleo no pré-sal brasileiro, as idas e vindas dessa classe de estrangeiro se dava em sua grande maioria pela navegação de curso internacional ou longo curso. Ressalte-se que esta navegação também realiza na maioria das vezes quando em curso internacional, escalas de curso nacional que em tese configura uma espécie de cabotagem nacional passageira. Isso se dá por ser necessário realizar as cargas e descargas no território brasileiro antes de seguir novamente destino ao curso internacional iniciado. 

A Lei 9.432/97 em seu artigo 2º inc. IX e XI, atendendo disposição constitucional do artigo 22 inc. X trouxe respectivamente a definição jurídica para a navegação de curso internacional ou longo curso, e também para a chamada navegação de curso nacional ou cabotagem, assim dispondo:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições:

IX - navegação de cabotagem: a realizada entre portos ou pontos do território brasileiro, utilizando a via marítima ou esta e as vias navegáveis interiores; (grifado)

XI - navegação de longo curso: a realizada entre portos brasileiros e estrangeiros; (grifado)

 

Nos dias atuais o afretamento de embarcações para atender a demanda do pré-sal teve grande crescimento. Essa fase de exploração do petróleo brasileiro tem uma grande incidência de navegação de curso nacional ou da chamada cabotagem por afretamento. Ficando por relação de número de embarcação estrangeira no território nacional, bem parelha com as de curso internacional ou longo curso.

Temos então, que para o estrangeiro tripulante e marítimo a Norma aplicável à sua identidade e estada pelo Brasil deverá ser dada em primeiro momento, de acordo com a finalidade da navegação a ser realizada pela embarcação no território brasileiro.

O propósito deste artigo quanto ao tratamento a ser dado na estada e identidade do estrangeiro marítimo e tripulante, se dará somente em relação à navegação de curso internacional ou longo curso. Pois a chamada navegação de cabotagem ou navegação nacional, bem como outras distintas que também contam com definição na legislação acima, a exemplo da navegação interior e navegação de apoio marítimo, não serão aqui abordadas.  

 

3. Disposição das Normas.

Para o tema em comento desta classe de estrangeiro da navegação marítima de curso internacional no território marítimo brasileiro, as questões de fiscalização dessas diversas Normas que incidem no estudo e análise de sua aplicação, se tem controle de apenas um órgão brasileiro. Este é auferido pela imigração brasileira, que tem pelo art. 144 par. 1º, inc. III da CRFB/1988, no Departamento de Polícia Federal o órgão de atribuição constitucional.

A Norma de diplomação primária nacional que se aplica ao tema para o estrangeiro de um modo geral é a Lei 6.815/80 e seu regulamento (Decreto 86.715/81). Entretanto, tanto na Lei como no Decreto não há conjugação clara em relação à figura do tripulante e marítimo estrangeiro. Pelo art. 105 da Lei há um único termo expresso referente à “tripulante” e é relacionando a palavra navio. E pelo Decreto, o art. 49 parece correlacionar dispondo ao tripulante estrangeiro o benefício de uma descida a terra e do desembarque no Brasil.

O Conselho Nacional de imigração – (Cnig), dispõe sua normatização de acordo com a finalidade que a embarcação estrangeira terá no território brasileiro. Destacam-se para este fim as Resoluções Normativas de números 71, 72 e 81.

A Resolução Normativa 71 do Cnig, disciplina a concessão de visto a marítimo estrangeiro empregado a bordo de embarcação de turismo estrangeira que opere em águas jurisdicionais brasileiras. Esta norma deixa clara a prevalência do uso da identidade de marítimo ou documento equivalente, mesmo para embarcação que venha operar no Brasil pela chamada navegação de cabotagem por afretamento. Isto é expresso por seus artigos 1º, 2º e 3º, claramente no 2º.

 Art. 2º Não será exigido visto de entrada no País ao marítimo estrangeiro empregado a bordo de embarcação de turismo estrangeira que seja portador da Carteira de Identidade Internacional de Marítimo ou documento equivalente.

Parágrafo único. Equipara-se ao marítimo, a que se refere o caput deste artigo, qualquer pessoa portadora da Carteira de Identidade Internacional de Marítimo que exerça atividade profissional a bordo de embarcação de turismo estrangeira.

Esta Norma vem corroborar o respeito às normas trabalhistas na contratação de mão de obra brasileira estabelecendo seu quantitativo mínimo no art. 6º e 7º. Ressalte-se o artigo 7º desta Norma, parágrafo 3º que expressa:

Art. 7º Transcorridos cento e oitenta dias da vigência desta Resolução Normativa, a partir do 31º (trigésimo primeiro) dia de operação em águas jurisdicionais brasileiras, a embarcação de turismo estrangeira deverá contar com um mínimo de 25% (vinte e cinco por cento) de brasileiros em vários níveis técnicos e em diversas atividades a serem definidas pelo armador ou pela empresa representante do mesmo. 

§ 3º O disposto no caput deste artigo não se aplica às embarcações de turismo estrangeiras que realizem viagens entre portos internacionais e portos nacionais por até 45 (quarenta e cinco) dias e que transportem majoritariamente turistas estrangeiros cujo embarque ou desembarque ocorra em portos estrangeiros. (Parágrafo acrescentado pela RN 105, de 17/09/2013) (grifado)

O parágrafo 3º que se refere ao quantitativo de marítimo brasileiro deve por lógica ser aplicado também ao seu artigo 6º.

Pela Resolução Normativa 72 se tem disciplinado a chamada de profissionais estrangeiros para trabalho a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira nas águas jurisdicionais brasileiras.  Para o tema proposto, essa Resolução prevê no seu art. 2º, para o estrangeiro tripulante da chamada navegação de longo curso o uso da identidade de marítimo sem limitar prazo de estada. Ressalvado no artigo o prazo limite de 30 dias para aquele estrangeiro marítimo que venha para a chamada navegação de cabotagem.

Art. 2º. Não será exigido visto, bastando a apresentação de carteira internacional de identidade de marítimo ou documento equivalente, conforme o previsto em Convenção da Organização Internacional do Trabalho em vigor no Brasil, nos seguintes casos: (grifado)

I - ao estrangeiro tripulante de embarcação que ingresse no País sob viagem de longo curso, assim definida aquela realizada entre portos estrangeiros e portos brasileiros; (grifado)

II – pelo prazo máximo de trinta dias, ao estrangeiro tripulante de embarcação autorizada pelo órgão competente para afretamento em navegação de cabotagem, assim definida aquela realizada entre portos ou pontos do território brasileiro. (grifado)

Note que esta Resolução Normativa em relação ao estrangeiro tripulante e marítimo faz menção a Convenção da OIT, e como a 71, não limita estada para o tripulante da chamada navegação de longo curso.

Na Resolução Normativa 84 é disciplinada a concessão de autorização de trabalho para obtenção de visto temporário a tripulante de embarcação de pesca estrangeira arrendada por empresa brasileira. Esta Resolução Normativa não terá incidência sobre o estudo do tema aqui abordado, tendo em vista dispor estritamente sobre o uso de visto de trabalho na embarcação de pesca em águas brasileiras. Ou seja, na navegação de cabotagem.

Por Norma internacional a disposição de estada e identidade do estrangeiro marítimo e tripulante, atualmente está disposta para o Brasil pela Convenção 185 da OIT – (C.185). Nesta se tem o reconhecimento de princípios já consagrados na Convenção sobre o Documento de Identidade da Gente do Mar de 1958 da Convenção 108 da OIT – (C.108), dispondo sobre a facilitação para entrada da gente do mar no território dos países membros, quando esta tenha por finalidade o gozo de uma autorização para desembarque, trânsito, e reembarque em outra embarcação ou repatriação do marítimo.  Por esta Convenção 185, a figura do estrangeiro marítimo tripulante proveniente de viagem de curso internacional, portando identidade de marítimo válida prevista na mesma, se tem grande citação, e tratamento específico previsto nesta norma. Dentre os quais destacamos os elencados no artigo 6º relativos à permissão para desembarque, Trânsito e reembarque.

Há de se destacar que a nova Convenção 185 da OIT, assim como a sua antecessora a C.108, não estipula o prazo de estada para essa classe de estrangeiro marítimo e tripulante permanecer em território alienígena. Sendo razoável que a autoridade de imigração no uso de sua atribuição faça entrevista com o representante da embarcação no local de chegada para que seja estipulado o prazo necessário. Lembrando que em geral, esse tripulante marítimo é possuidor de contrato de trabalho por tempo junto ao armador contratante.

 

4. Normas nacionais – Lei 6.815/80 e Decreto 86.715/81.

A Lei que trata da matéria relativa à identidade e estada do estrangeiro no território brasileiro é a Lei 6.815/80. Esta Lei também é muito conhecida como Estatuto do Estrangeiro no Brasil. Entretanto, em que pese o estrangeiro marítimo e tripulante ser uma classe assídua de estrangeiro no território brasileiro, tal lei não reservou qualquer menção em nenhum de seus 141 artigos para a questão da estada e identidade deste marítimo. Tendo na espécie uma verdadeira anomia jurídica em relação a este controle de estada. Entretanto, foi estranhamente mencionado no Decreto 86.715/81, que é o regulamento da Lei 6.815/80, singelo artigo trazendo menção a identidade e estada do estrangeiro tripulante. Isto é alegado pelo fato de ser este regulamento uma Norma que deveria servir como o próprio nome diz, para regular um assunto já incorporado ao texto da Lei regulada. O que não ocorre. De qualquer forma, é de se destacar está menção ao estrangeiro marítimo e tripulante neste regulamento. Mais precisamente no seu artigo 49. Assim expresso:

Art. 49 - Nenhum tripulante estrangeiro, de embarcação marítima de curso internacional, poderá desembarcar no território nacional, ou descer à terra, durante a permanência da embarcação no porto, sem a apresentação da carteira de identidade de marítimo prevista em Convenção da Organização Internacional do Trabalho. (grifado)

Parágrafo único - A carteira de identidade, de que trata este artigo, poderá ser substituída por documento de viagem que atribua ao titular a condição de marítimo. (grifado)

A conotação no dizer do artigo 49 c/c. seu parágrafo único estabelece expressamente poder desembarcar no território nacional o estrangeiro marítimo e tripulante com um documento de viagem que ali expresse essa condição. Entretanto esta conjugação exigida neste regulamento em matéria de tripulante, diga-se da classe marítimo, é mitigada pela própria Lei que este regula (Lei 6.815/80). Estendendo estes benefícios ao estrangeiro desta classe. Pois o artigo 105 desta Norma assim reza:

Art. 105. Ao estrangeiro que tenha entrado no Brasil na condição de turista ou em trânsito é proibido o engajamento como tripulante em porto brasileiro, salvo em navio de bandeira de seu país, por viagem não redonda, a requerimento do transportador ou do seu agente, mediante autorização do Ministério da Justiça. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81) (grifado)

Para entender esta mitigação da exigência do Decreto, pense que é similar pelo mundo inteiro, que o estrangeiro turista porte em sua maioria quando adentra em outro território alienígena, um passaporte que o identifica como tal. Neste ínterim, por um pensamento teleológico, o Estatuto do estrangeiro no Brasil pelo artigo 105 acima, deseja que o estrangeiro turista portando apenas um passaporte tenha o direito de embarcar como tripulante em navio de bandeira de seu país.  Fato contínuo, estando esse navio na navegação de curso internacional, conhecida por vigem Longo Curso, o no passado turista e agora tripulante, poderá desembarcar em território brasileiro por quantas escalas a embarcação passar. Desde que o mesmo nessa viagem não retorne ao ponto de seu embarque.  

Como exemplo: Imagine um italiano que venha ao Brasil em viajem de turismo e receba a ordem de um empregador para tripular um navio de bandeira italiana no território brasileiro. Isto será plenamente possível ao mesmo, bastando para tanto o uso de um passaporte válido e que a embarcação seja de viagem não redonda como estabelece o artigo 105 da Lei.  A contrário “sensu” temos a definição de “viagem redonda”:

Considera-se “Viagem Redonda”, exclusivamente para efeito de despacho, a viagem contada desde que a embarcação zarpe do porto inicial até regressar a ele, ou seja, a viagem realizada por uma embarcação que recebe o seu Passe de Saída em um determinado Porto de Origem e tendo como Porto de Destino o próprio Porto de Origem, sem que venha a demandar ao longo da viagem qualquer outro Porto. [3]

Por outras palavras, a viagem não redonda se mantém enquanto a embarcação navegue e não retorne ao ponto de partida anterior.

Então, à de se ressaltar que esta embarcação poderá passar por outros portos brasileiros, e até seguir se for o caso rumo ao exterior. Consequentemente nesta navegação terá o italiano, no exemplo portando apenas um passaporte o direito de descer a terra nos portos de escala que se sucederem. Percebe-se aqui neste exemplo, claramente uma antinomia jurídica entre estas duas Normas. A Lei (Estatuto do estrangeiro) e seu próprio regulamento (Decreto). Pois a Lei mitiga o Decreto de certa forma, dispondo que um turista com apenas um passaporte possa se tornar tripulante de embarcação de curso internacional e realizar embarque, desembarque e descida a terra. Mesmo não possuindo a carteira de identidade de marítimo da Convenção da OIT, neste regulamentado.

Indo um pouco mais longe, poderá o turista estrangeiro embarcar nesta mesma situação, possuindo apenas um documento de identidade (registro civil) de sua nacionalidade. Bastando que seu país tenha assinado o acordo sobre documento de viagem para o Mercosul. 

Mas por força de Lei constitucionalmente primária, de cunho originário brasileiro, a situação da estada e identidade do estrangeiro tripulante marítimo no território nacional brasileiro conta com estas Normas.

 

5. Normas internacionais – Convenções da OIT.

O Brasil pode assinar Norma internacional sobre matéria diversa e internalizá-la no ordenamento normativo. A figura do estrangeiro marítimo e tripulante em relação a sua identidade e estada, nesta espécie de Norma se encontra expressa nas Convenções da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é membro desde 28 de junho de 1916.[4]

As Convenções da OIT que tratam do assunto abordado neste artigo são da espécie Convenções de princípios, de caráter mais genérico. Não da espécie “self-executing” ou de auto – execução ou aplicação imediata. Aquelas normas por regra geral após o depósito de ratificação na RIT – Repartição Internacional do Trabalho terão prazo de 12 meses para que os Estados membros providenciem a edição de medidas em seus territórios com vistas a dar cumprimento aos princípios nelas estabelecidos.

As Convenções de princípios surgiram na década de 60, após a 2ª Guerra Mundial, no intuito de se aprofundar a relação entre os Estados da OIT. Possibilitando a elaboração de normas internas que tivessem compatibilidade com sua sociedade. A OIT assim tentou estabelecer a universalidade dos direitos trabalhistas, adaptando-os aos entes da organização. [5]

Dentre essas espécies de Convenções assinadas pelo Brasil sobre a matéria temos:

 A Convenção 108 que aprovada na 41ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho (Genebra— 1958), entrou em vigor no plano internacional em 19.2.1961. Foi ratificada no Brasil em 5 de novembro de 1963 com vigência nacional em 5 de novembro de 1964, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 6, de 14.7.1966 e promulgada pelo Decreto n. 58.825 de 14.7.1966. [6]

E a Convenção 185 tratando da figura do tripulante marítimo e revisando os assuntos relacionados à elaboração de documentos de identidade de tripulante marítimo e estipulando controle de dados. Fora Convocada em Genebra pelo Conselho de Administração do Escritório Internacional do Trabalho e reunida na mencionada cidade em 3 de junho de 2003.  No Brasil a Convenção 185 teve sua aprovação pelo Decreto Legislativo n. 892, de 21.11.2009 do Congresso Nacional com vigência nacional na mesma data. Sua ratificação foi em 21 de janeiro de 2010. [7]

A Convenção 108 foi aplicada no Brasil por décadas e teve agora no ano de 2010 mais precisamente na data de 21 de julho, sua denúncia por parte do Estado Brasileiro. Esta denúncia se deu pelo fato do Brasil estar se adequando as novas exigências da Convenção 185 em matéria de itens de segurança no documento de identidade de marítimo.

Um breve comentário ao instituto da denúncia no direito brasileiro. A este falta regra e normatização. Não conta com nenhuma expressividade de Norma. Nem mesmo na própria Carta Magna brasileira. Já foi palco de celeuma jurídico interno entre legislativo e executivo.  A maioria da doutrina brasileira entende que a denúncia única e exclusiva do executivo sem a deliberação do legislativo quando esta Norma internacional não contenha em seu texto essa previsão de ser denunciada, não poderá se efetivada internamente. Deve assim haver a previsão expressa da denúncia na Norma internacional, estipulando este mecanismo a que esta deva submeter-se. Quando a Norma internacional for omissa a respeito deste instituto da denúncia, trará dúvidas sobre sua efetivação interna.

A Convenção de Viena em seu artigo 56 §1º trás trechos de como deve ser a denúncia efetivada:

“Artigo 56. Denúncia ou retirada de um tratado que não contém disposições sobre extinção, denuncia ou retirada.

1 Um tratado que não contem disposição sobre sua terminação e não prevê a denuncia ou retirada do mesmo não pode ser objeto de denuncia ou retirada a não ser que:

a) Fique estabelecido que as partes tiveram a intenção de admitir a possibilidade de denuncia ou retirada; ou

b) O direito de denúncia ou retirada possa ser inferido da natureza do tratado.”[8]

 

A denúncia da Convenção 108 da OIT realizada pelo executivo federal no ano de 2010 pareceu estar dentro dos padrões estabelecidos pela convenção de Viena. Pelo simples fato de nela própria haver essa previsão. [9]

Ora, pelo congresso nacional brasileiro já havia aprovação e publicação do Decreto Legislativo 892 que resolvera sobre a aplicação da Convenção 185. Dessa forma este sinalizou pela aceitação da denúncia da Convenção 108. Entretanto, faltava a promulgação pela própria presidência da república do Decreto de revogação para retirar a vigência do Decreto anterior que internalizou esta Convenção 108. 

Assim, agora com a publicação do Decreto 8.605/2015, deu-se revogação expressa do Decreto anterior daquela Norma internacional. E a Convenção 185 passou a ser revisora da anterior e aplicada à estada e identidade do marítimo e tripulante estrangeiro no Brasil. O novo Decreto 8.605/2015, de 18 de dezembro de 2015, revogou expressamente do ordenamento brasileiro o Decreto 58.825/66 da Convenção 108 da OIT no Brasil.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição,

DECRETA

Art. 1º  Fica promulgada a Convenção nº 185 (revisada) da Organização Internacional do Trabalho - OIT, anexa a este Decreto. 

Art. 2º  São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional atos que possam resultar em revisão da Convenção e ajustes complementares que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, nos termos do inciso I do caput do art. 49 da Constituição

Art. 3º  Fica revogado o Decreto nº 58.825, de 14 de junho de 1966, que promulgou a Convenção nº 108 da Organização Internacional do Trabalho, de 13 de maio de 1958. (grifo nosso)

Art. 4º  Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília, 18 de dezembro de 2015; 194º da Independência e 127º da República. [10]

 

Alguns pontos devem ser destacados nesta atual Convenção, em que diferenciam e assemelham a Convenção 108 da C.185. No primeiro momento abaixo elas se equivalem respectivamente:

C.108:

Art. 6 — 1. Todo Membro autorizará a entrada, em um território para o qual a presente convenção estiver em vigor, de qualquer marítimo portador de uma carteira de identidade de marítimos válida, sempre que essa entrada seja solicitada por motivo de licença em terra, de duração temporária, durante a escala do navio. (grifo nosso)

C.185:

Artigo 6º - 4. Todo Membro para o qual a presente Convenção esteja em vigor autorizará, da forma mais breve possível, e salvo que existam motivos claros para duvidar da autenticidade do documento de identidade do marítimo, a entrada em seu território aos marítimos titulares de um documento de identidade da gente do mar válido, quando tal entrada seja requerida a fim de permitir o gozo de uma autorização temporária para desembarcar pelo tempo de duração da escala da embarcação. (grifado)

 

Nestes artigos, as duas Convenções não estabelece prazo de estada para a estada do tripulante marítimo estrangeiro. Ressaltando que este deve ser observado pela duração da escala da embarcação. Resta claro que a intenção desta C.185 assim como era a C.108, é permitir ao tripulante e marítimo da navegação internacional, uma estada suficiente até a saída do mesmo daquele território membro.

A diferença principal desta Convenção de nº 185 da OIT é estabelecida nas novas regras para a expedição de Documento de Identidade da Gente do Mar (Marítimo), quanto à forma e característica desse documento. Regras para expedição do documento de identidade de marítimo, a C. 108 também tinha. Percebe-se que estas são de importância a tentar padronizar e dar maior segurança e efetividade ao controle desse marítimo.  Assim o estrangeiro marítimo e tripulante que porte uma identidade de marítimo de um país que seja signatário desta Convenção, terá a princípio, assegurado o direito de estada contido na mesma de uma maneira mais segura e efetiva pelos próprios países que a ratificaram.

Quanto à expedição e concessão da identidade de marítimo pela C. 185 o critério também ficou mais rigoroso do que o estabelecido na C. 108. Pois o documento de identidade de marítimo da C. 185 só poderá ser fornecido para o nacional e/ou residente do país que a tenha ratificado e se comprometera expedir tal documento de identidade naqueles moldes. Veja abaixo:

Artigo 2

Expedição dos Documentos de Identidade da Gente do Mar

1. Todo Membro para o qual esteja em vigor a presente Convenção deverá expedir a todos seus nacionais que exerçam a profissão de marítimo, e apresente o requerimento correspondente, um documento de identidade da gente do mar conforme o disposto no artigo 3 da presénte Convenção. (grifado)

2. ....

3. Todo Membro poderá também expedir o documento de identidade da gente do mar, mencionado no parágrafo 1º, à gente do mar à qual tenha outorgado a condição de residente permanente em seu território. Os residentes permanentes viajarão sempre conforme o disposto no parágrafo 7º do artigo 6º. (grifado)

 

Compare o teor da C.108 em seu artigo 2º item 2, menos rigorosa quanto aos critérios para a expedição dessas identidades. Este regramento dava Conceito à chamada carteira de identidade de marítimo por conveniência do Estado membro.

Art. 2 — 1. Qualquer Membro para o qual a presente Convenção estiver em vigor expedirá, para todos os seus nacionais que exerçam a profissão de marítimo, e a pedido seu, uma ‘carteira de identidade de marítimo’ na conformidade do disposto no art. 4. Se, todavia, não for possível a expedição desse documento a certas categorias de marítimos, o referido Membro poderá expedir, em seu lugar, um passaporte que especifique que o seu titular é marítimo, o qual para os fins da presente Convenção produzirá os mesmos efeitos da carteira de identidade de marítimos. (grifado)

2. Qualquer Membro para o qual a presente Convenção estiver em vigor poderá expedir uma carteira de identidade de marítimos a qualquer outro marítimo empregado a bordo de um navio matriculado em seu território ou registrado em agência de colocação de seu território, se o interessado a requerer. (grifado)

Outro aspecto que chama atenção é que o número de países que ratificaram a Convenção 185, ainda é bem inferior aos que já haviam ratificado a C.108 da OIT. [11] 

Levando a crer, haver relação com o custo de implantação na elaboração, controle e expedição desta nova identidade para o Estado membro.

 

6. Normas administrativas do Conselho Nacional de Imigração.

Devido ao aumento na exploração das áreas de reserva de petróleo o fluxo de entrada e saída de estrangeiro no território brasileiro teve um ganho expressivo. Principalmente do estrangeiro que trabalha na era da navegação marítima de um modo geral. Ou seja, o considerado marítimo.

As Normas nacionais e internacionais que regulam de alguma forma o estrangeiro marítimo e tripulante em território brasileiro foram gradativamente recebendo algumas regulações administrativas. Essas regulações foram elaboradas pelo Conselho Nacional de Imigração, que é um órgão coletivo deliberativo do Ministério do Trabalho e Emprego.  

Este órgão deliberativo teve sua criação pelo artigo 128 da Lei 6.815/80 e artigo 142 do Decreto 86.715/81 quando regulamenta a situação jurídica do estrangeiro no Brasil.

No início esse organismo deliberativo teve uma composição mais restrita de sete ministérios previstos no artigo 143 daquele Decreto, e atribuições no artigo 144. Atualmente recebeu também pelo artigo 1º do Decreto 840/93, similar competência. Sua composição foi muito mais extensa. Não sendo composta unicamente por órgãos públicos.  Sendo que participam as diversas categorias interessadas nas regulações deste Conselho. Estando essa composição dividida em: - Governo, Trabalhadores, Empregadores, Comunidade Científica - Tecnológica, e de Observadores. Perfazendo um total de 34 membros ao todo. [12]

A regulação dedicada ao estrangeiro marítimo e tripulante pelo Conselho Nacional de Imigração – Cnig possui maior relevância na chamada Resolução Normativa deste Conselho.  Esta Norma expedida pelo Cnig atende aos preceitos regulamentares do Decreto 86.715/80, no seu artigo 144, inciso III e seu parágrafo único c/c artigo 1º inciso VI, e 4º do Decreto 840/93, “in verbis”.

Decreto 86715/81:

Art . 144 - O Conselho Nacional de Imigração terá as seguintes atribuições: (grifado)

III - estabelecer normas de seleção de imigrantes, visando proporcionar mão-de-obra especilizada aos vários setores da economia nacional e à captação de recursos para setores específicos;

Parágrafo único - As deliberações do Conselho Nacional de Imigração serão fixadas por meio de Resoluções.

Decreto 840/93:

Art. 1° Ao Conselho Nacional de Imigração, órgão de deliberação coletiva, integrante do Ministério do Trabalho, nos termos da Lei n° 8.490, de 19 de novembro de 1992, compete: (grifado)

VI - estabelecer normas de seleção de imigrantes, visando proporcionar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional e captar recursos para setores específicos;

 Art. 4° O Conselho Nacional de Imigração deliberará por meio de resoluções.

 

 

Dentre as Resoluções Normativas do Cnig que se destacam na atualidade para a regulamentação da estada e identidade de estrangeiro marítimo e tripulante no Brasil temos as de números 71 e 72.

A Resolução Normativa nº 71 que foi alterada pelas Resoluções Normativas nº 105/2013 e nº 107/2013, disciplina a concessão de visto a marítimo e tripulante estrangeiro empregado a bordo de embarcação de turismo estrangeira que opere em águas jurisdicionais brasileiras.

A Resolução Normativa nº 72 disciplina a chamada de profissionais estrangeiros para trabalho a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira em águas jurisdicionais brasileiras.

Existe outra Resolução Normativa do Cnig de nº 81 que se refere à estada e identidade de estrangeiro tripulante no Brasil. Esta Resolução Normativa nº 81 foi alterada pela RN nº 90, de 10 de novembro de 2010, e disciplina a concessão de autorização de trabalho para obtenção de visto temporário a tripulante de embarcação de pesca estrangeira arrendada por empresa brasileira.

 

 

7. Interpretação e finalidade das normas.

A descoberta da finalidade de uma Norma deve passa antes pelo estudo da mesma. Esse estudo não deve se restringe somente aos estreitos termos nela expressos. Para a doutrina de um modo geral existem algumas espécies de critérios para se interpretar e buscar de o verdadeiro alcance da Norma jurídica dentro do arcabouço normativo a que pertença.

Teremos em Limonge França, de sua obra, Hermenêutica Júridica de 1988, a base dessa busca. Este mestre menciona três espécies de critérios a ser observado nesta missão. [13] 

Agente da interpretação, natureza e extensão.

Cite-se um breve trecho de Carlos Maximiliano, que trás outra definição da hermenêutica da seguinte forma:

 “Consiste em enquadrar um caso concreto na norma jurídica adequada”. [14]

 

A doutrina de um modo geral estabelece três critérios mais usados, entres estes está, o usado pelo Agente de Interpretação em pública autêntica, pública judicial e privada doutrinária. O que busca a Natureza da Norma pela divisão em gramatical, lógica, histórica e sistemática. E por sua extensão em declarativa, extensiva e restritiva.

Em matéria de interpretação deve se ater aos escopos que realmente incidem na questão. Sendo assim, o critério de interpretação necessário ao fim colimado do tema, que é chegar à realidade da estada e identidade de todo o estrangeiro marítimo e tripulante na viagem de curso internacional, será o mais plausível possível.

Buscando pela interpretação autêntica do agente, se diz daquela que é a oriunda do órgão que favoreceu a lei. Sendo que, por mais resumido que possa parecer não se encontrou nada com base desses entes para o tema.

Na pública judicial, temos várias decisões que trazem de alguma forma ou de outra, ligação com a matéria. Contudo, não se encontra termos claros que sejam determinantes para a questão central do tema abordado. Todavia eis algumas decisões correlacionadas a respeito:

   
   
   
   

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRABALHISTA. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIPULANTES ESTRANGEIROS. CARTEIRA DE MARÍTIMOS EXPEDIDA POR PAÍS NÃO SIGNATÁRIO DA CONVENÇÃO Nº 108 DA OIT. DOCUMENTO DE VIAGEM VÁLIDO. VISTO TEMPORÁRIO. DESNECESSIDADE. ART. 11, 1314 E 15 DA LEI Nº 6.815/80. RESOLUÇÃO Nº 72 DO CONSELHO NACIONAL DE IMIGRAÇÃO.

1. Sentença que denegou a segurança que objetivava que autoridade coatora se abstivesse de exigir o pagamento das penalidades impostas em decorrência da lavratura de auto de infração, bem como de inscrever os débitos em dívida ativa.

2. A Impetrante pretendia o cancelamento definitivo dos autos de infração lavrados sob o fundamento de que os marítimos embarcados na plataforma marítima estavam de posse de carteiras de marítimo inválidas, porque emitidas pelas autoridades das Ilhas Marshall, país não signatário das Convenções nº 108 e 185 da OIT - Organização Internacional do Trabalho. Além disso, os fiscais entenderam que houve exercício de atividade laborativa irregular no território nacional, que teria contrariado o art. 125, incisos VI e VII, c/c os arts.11 e 13 da Lei nº 6.815/80 e o art. 2º da Resolução Normativa 72 do Conselho Nacional de Imigração.

3. Apesar de as Ilhas Marshall não serem signatárias da Convenção nº 108 da OIT, as carteiras de identidade dos marítimos devem ser consideradas documentos de viagem válidos, já que emitidos pelas autoridades do país da bandeira da embarcação, tendo o condão de atribuir aos seus titulares a condição de marítimo, de acordo com o parágrafo único do art. 49 do Decreto nº86.715/81. Destarte, não se pode entender que na plataforma havia estrangeiros em situação irregular ou impedidos de exercer atividade remunerada, conforme estabelece o art. 125VII, da Lei nº 6.815/80, simplesmente porque as carteiras de marítimo foram expedidas por país não signatário da convenção mencionada.

4. Assim, é de se concluir que a única restrição cabível aos tripulantes portadores de carteira de marítimo emitida por país não signatário da convenção aludida seria a proibição de descida da embarcação. Portanto, nenhuma penalização seria possível, desde que os marítimos não desembarcassem da plataforma.  (grifado)

5. TRF2, APELRE 201351010005620, Desembargador Federal LUIZ PAULO DA SILVA ARAUJO FILHO, Sétima Turma Especializada, E-DJF2R: 17/03/2014; TRF5, APELREEX 00008407720114058300, Relator Desembargador Federal FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, DJE: 07/12/2012; TRF1, AMS 200001000069534, Relator Desembargador Federal REYNALDO FONSECA, Sétima Turma, e-DJF: 13/11/2009; TRF1, AMS 199901001137764, Relatora Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA, Terceira Turma Suplementar, DJ DATA: 02/12/2004. 6. Apelação provida. Sentença reformada.

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. AGENTES MARÍTIMOS. TRIPULANTES ESTRANGEIROS. LEI Nº 6.815/96. SÚMULA Nº 192. VISTO CONSULAR TEMPORÁRIO. NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM POR EMBARCAÇÃO ESTRANGEIRA. DESNECESSIDADE DE VISTO. CARTEIRA DE IDENTIDADE DE MARÍTIMO. CONVENÇÃO Nº 108 DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. 1 Não há necessidade do visto temporário dos tripulantes estrangeiros que estão exercendo suas atividades a bordo do navio estrangeiro, visto que por se tratar de serviços desempenhados por estes, temporariamente, durante as escalas da embarcação e, exclusivamente, em seu interior, no qual este é considerado juridicamente, para fins trabalhistas, como prolongamento do território de origem, é suficiente, apenas, a carteira de identidade de marítimo válida durante os desembarques, conforme preceitua a Convenção nº 108 da OIT, em seus arts. 4º e 6º, bem como o art. 49 do Decreto nº 86.715/81. 2. Remessa oficial e apelação não providas.

(TRF-1 - AMS: 6953 BA 2000.01.00.006953-4, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL REYNALDO FONSECA, Data de Julgamento: 09/11/2009,  SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: 13/11/2009 e-DJF1 p.214)

 

Nas jurisprudências se encontram reflexões da descida à terra do tripulante possuidor da identidade de marítimo da Convenção da OIT. Mas está jurisprudência, assim como tantas outras encontradas, não entram no questionamento do tema central deste artigo. Abordam questões ligadas ao tripulante estrangeiro, sem abarcar o tema central para a aplicação das normas que precedem a identidade e condição destes estrangeiros marítimos.

 

Em relação à interpretação privada doutrinária também não é encontrado aprofundamento para este tema. De modo que passaremos ao critério de interpretação pela natureza das normas.

 

Seguindo com a hermenêutica jurídica, buscaremos a fase de interpretação pela natureza gramatical ou literal das Normas. Sendo que o primeiro ponto que chama a atenção é que essas Normas possuem pontos ambíguos, imprecisos. O que eleva a dificuldade de se abster sua real finalidade pela simples interpretação gramatical.

Como exemplo se pode citar o artigo 10 da C.185 que expressa o termo “revisada” da anterior C.108, entretanto este artigo não deixa claro que limites de revisão.

Artigo 10

Pela presente Convenção é revisada a Convenção sobre os documentos de identidade da gente do mar, 1958. (grifado)

Outro ponto que não se tem clareza em sua definição está na expressão documento de viagemdo parágrafo único do artigo 49 do Decreto 86.715/81:

Parágrafo único - A carteira de identidade, de que trata este artigo, poderá ser substituída por documento de viagem que atribua ao titular a condição de marítimo.

Parece que a norma acima sem precisão, quis se referir ao artigo 2º, 2ª parte da C.108, que expressa:

Art. 2 — 1. Qualquer Membro para o qual a presente Convenção estiver em vigor expedirá, para todos os seus nacionais que exerçam a profissão de marítimo, e a pedido seu, uma ‘carteira de identidade de marítimo’ na conformidade do disposto no art. 4. Se, todavia, não for possível a expedição desse documento a certas categorias de marítimos, o referido Membro poderá expedir, em seu lugar, um passaporte que especifique que o seu titular é marítimo, o qual para os fins da presente Convenção produzirá os mesmos efeitos da carteira de identidade de marítimos.

 

Entretanto há pontos claros nas normas, como o abaixo elencado pela C.185 que define marítimo:

Artigo 1

Âmbito de Aplicação

1. Para os efeitos da presente Convenção, o termo marítimo e a locução gente do mar designam toda e qualquer pessoa empregada, contratada ou que trabalhe em qualquer função a bordo de uma embarcação, que não seja de guerra e que esteja dedicada habitualmente à navegação marítima. (grifado)

Passemos para a Interpretação Lógica da finalidade da norma jurídica. Esta subdividida por critério subjetivo e objetivo.

No primeiro é analisado o processo legislativo de criação que considera qual é a intenção do legislador para a Norma.

No segundo busca-se o fim colimado na mesma. Esta interpretação é também conhecida na doutrina por interpretação Teleológica. Vamos tentar extrair a lógica de cada Norma em relação ao tema.

Na Lei 6.815/80 e seu Decreto 86.715/81 se tem por subjetividade que foram criadas durante o período da ditadura militar no Brasil e visava dar ao do estrangeiro no Brasil uma norma que estabelecesse sua situação jurídica.  Pelo critério objetivo para o tema proposto, as mesmas resumem sua intenção em facilitar a vida do estrangeiro na condição de tripulante e marítimo. Tanto que a Lei claramente ressalta em seu já citado artigo 105, ser possível ao simples turista passar para a condição de tripulante e marítimo.  Enquanto o Decreto 86.715/81 por parágrafo único prevê expressamente o uso de documento de viagem que atribua ao titular a condição de marítimo, ampliando o alcance do artigo para o termo marítimo.

Nas Resoluções Normativas do Cnig a subjetividade está na sua disposição voltada para disciplinar à vinda dos tripulantes e marítimos estrangeiros na vinda de embarcação para navegação no território brasileiro. Entretanto, pelo critério objetivado, o tratamento a ser dado à figura central do estrangeiro tripulante e marítimo na navegação de curso internacional demonstra conteúdo resumido.  Podendo ser observados na RN 71 e na RN 72 conceitos para a estada e identidade desses estrangeiros. Abaixo:

RN 71

 Art. 2º Não será exigido visto de entrada no País ao marítimo estrangeiro empregado a bordo de embarcação de turismo estrangeira que seja portador da Carteira de Identidade Internacional de Marítimo ou documento equivalente. (grifado)

RN 72

Art. 2º. Não será exigido visto, bastando a apresentação de carteira internacional de identidade de marítimo ou documento equivalente, conforme o previsto em Convenção da Organização Internacional do Trabalho em vigor no Brasil, nos seguintes casos: (grifado)

Resta claro que o conceito de “documento equivalente”, previsto nestas Resoluções, é o mesmo previsto em objetividade pelo art. 49 do Decreto 86.715/81.

 

Pela interpretação teleológica, as Convenções da OIT trazem maior conteúdo literal de critérios ao tema.

No critério de subjetividade as duas Convenções se assemelham, na intenção de identificar e padronizar o documento proposto em seus textos. Como pode se ver nos textos abaixo:

Convenção 108

Depois de haver decidido adotar diversas proposições relativas ao reconhecimento recíproco ou internacional de uma carteira de identidade nacional para os marítimos, questão que constitui o sétimo ponto da ordem do dia da sessão, (grifado)

Convenção 185

Tendo decidido adotar um conjunto de propostas referentes a um sistema mais seguro de identificação da gente do mar, questão que constitui o item sete da ordem do dia da reunião; (grifado)

A diferenciação entre esses critérios lógicos subjetivos das mesmas se tem por ter a C.185 um maior número de motivação para a criação e a expedição desta nova identidade. Como exemplo deve ser citado os abaixo:

Consciente da ameaça continuada à proteção dos passageiros e da tripulação, à segurança das embarcações, e ao interesse dos Estados e das pessoas; (grifado)

Consciente, também, do mandato fundamental da Organização, que consiste em promover condições de trabalho decentes; (grifado)

Consciente de que agente do mar trabalha e vive em embarcações dedicadas ao comércio internacional, e de que o acesso às instalações em terra e a autorização para desembarcar são elementos decisivos para o bem-estar da gente do mar e, em conseqüência, para o alcance de uma navegação mais segura e de maior limpeza dos oceanos; (grifado)

Consciente, também, de que a possibilidade de desembarcar é essencial para a entrada e saída de uma embarcação ao término do período de service acordado; (grifado)

O critério objetivo que se encontra nestas duas normas da OIT pode ser extraído pela simples leitura de seus textos. A Convenção 108 e a sua sucessora no Brasil expressam ao menos um mesmo fim, que é o de assegurar ao tripulante e marítimo estrangeiro nas viagens de curso internacional o tratamento digno da pessoa humana.

Não existe diferença na lógica objetiva destas duas normas, sendo diferentes somente os mecanismos propostos para adoção e garantias daqueles direitos nelas expressos. Haja vista que a C. 185 devido a grande preocupação internacional com a violência, principalmente por atentados terroristas, estabeleceu mecanismos mais detalhados para esta efetivação. Dentre os quais se tem a diferença do mecanismo para a expedição da identidade ao estrangeiro tripulante e marítimo. Pela C.108, permitido a todo estrangeiro em virtude do pavilhão do transportador. Pela C.185, só permitido à nacional e a residente do Estado emissor. Expressão que está clara em seu artigo 2º, inc. 1 e 3:

1. Todo Membro para o qual esteja em vigor a presente Convenção deverá expedir a todos seus nacionais que exerçam a profissão de marítimo, e apresente o requerimento correspondente, um documento de identidade da gente do mar conforme o disposto no artigo 3 da presénte Convenção. (grifado)

3. Todo Membro poderá também expedir o documento de identidade da gente do mar, mencionado no parágrafo 1º, à gente do mar à qual tenha outorgado a condição de residente permanente em seu território. Os residentes permanentes viajarão sempre conforme o disposto no parágrafo 7º do artigo 6º. (grifado)

 

A diferença objetiva dessa nova Convenção 185, se por quase todo o texto da mesma, e não implica em vedar os direitos dos estrangeiros tripulantes marítimos na navegação mundial. Ao contrario, visa somente dar aqueles munidos por este novo documento, um tratamento mais seguro e eficiente na sua estada de passagem pelos territórios dos Estados membros.  Haja vista a previsão de controle de dados e de material para a confecção desta nova identidade. Como está nos artigos da Norma e também em seus anexos abaixo citados:

Artigo 3

Conteúdo e Forma

Artigo 4

Base de Dados Eletrônica Nacional

Artigo 5º

Controle de Qualidade e Avaliações

ANEXO

Anexo I

Modelo para o documento de identidade da gente do mar

Explicação dos dados

Anexo II

...

Base de dados eletrônica

Anexo III

 

 

Adiante, pela aplicação dos métodos para interpretação, teremos na interpretação histórica, a pesquisa do processo evolutivo do tema, pela sua história e precedentes. Ajudando a entender o atual momento das Normas. Alguns aspectos devem ser observados nesta interpretação, como a exposição de motivos, entre outros nessas Normas. A interpretação histórica é também chamada de interpretação histórica sociológica.

Por história e precedentes que ajude a chegar ao esclarecimento almejado para o tema, que é o tratamento dado ao estrangeiro marítimo e tripulante na navegação de curso internacional, o que se tem a destacar e o conteúdo humanitário da história dos atos internacionais.

Temos na Declaração Universal dos Direitos Humanos um marco de respeito e civilidade humana. Destaca-se do mesmo, como precedente histórico nessa questão, apenas um trecho no seu artigo XIII que dispõe:

Artigo XXVIII

Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados. (grifado)

Neste singelo artigo acima fica claro que a Declaração que data de 1948 já demonstrava a preocupação com as necessidades do ser humano no meio internacional.

Em 1946 foi elaborada a Constituição da OIT. Sendo que seu preâmbulo tem algumas considerações de incidência para a interpretação histórica de suas Convenções.

CONSTITUIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

Preâmbulo

"Considerando que a paz para ser universal e duradoura deve assentar sobre a justiça social; (grifado)

Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas de trabalho, à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário que assegure condições de existência convenientes, à proteção dos trabalhadores contra as moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, às pensões de velhice e de invalidez, à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, à afirmação do princípio "para igual trabalho, mesmo salário", à afirmação do princípio de liberdade sindical, à organização do ensino profissional e técnico, e outras medidas análogas; (grifado)

Considerando que a não adoção por qualquer nação de um regime de trabalho realmente humano cria obstáculos aos esforços das outras nações desejosas de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios territórios. (grifado)

AS ALTAS PARTES CONTRATANTES, movidas por sentimentos de justiça e humanidade e pelo desejo de assegurar uma paz mundial duradoura, visando os fins enunciados neste preâmbulo, aprovam a presente Constituição da Organização Internacional do Trabalho:

Fica claro pela conjugação destas duas Normas acima que os direitos humanos estão historicamente desde o início como ponto principal presente na condição de trabalho de qualquer profissão. Seja no âmbito nacional de um território, seja também no âmbito internacional do qual o mesmo faça parte e tenha assumido este compromisso.

Na própria CRFB/88 são encontrados artigos priorizando os direitos humanos, vejamos alguns expressos destes direitos humanos:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

II - prevalência dos direitos humanos; (grifado)

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

§ 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).  (grifado)

 

Por derradeiro, temos para este tema que o critério de interpretação que melhor demonstra a real situação para o uso de identidade e estada dessa classe de estrangeiro no Brasil, é o dá interpretação pela natureza sistemática.

Pela Interpretação Sistemática deve o exegeta buscar nas Normas conteúdo em concordância com outras Normas do sistema jurídico de que faz parte. Partindo da interpretação gramatical dos vários dispositivos legais até se chegar a uma conclusão interpretativa do tema buscado.

Partindo deste aspecto, o sistema positivado em vigor no território brasileiro será entrelaçado para se chegar a real intenção das Normas em relação ao tema.

Como primeiro ponto para essa sistematização, partiremos das que possuem conteúdo literal de maior extensão sobre o tema. As Convenções da OIT.

Na ratificação de uma Convenção se tem por lógica que o Estado membro que a tenha ratificado se obriga a colocar em execução toda a programática nela prevista.

No Direito Internacional, o termo convenção é usado para referir-se a uma lei internacional que rege princípios a serem seguidos pelos países signatários (no Brasil, uma convenção internacional deverá ser ratificada formalmente pelo Presidente da República para ter eficácia, depois de ser aprovada pelo Congresso Nacional) tais como as convenções da ONU ou da OIT. [15]

 

Citando inicialmente dois pontos da Convenção 185 que abaixo serão elencados, podemos chegar ao ponto central na interpretação para esta Norma. Pois é claramente demonstrado que esta, assim como a Norma anterior (C.108), estipula um determinado modelo de identidade de marítimo a ser elaborado pelo Estado membro que a tenha ratificado. Incitando-os a que cumpram os trâmites de elaboração destas identidades e atendam a aceitação das mesmas.

O segundo ponto está no artigo 6º, parágrafos 1 e 4, que se refere ao tratamento para o marítimo que porte esta identidade elaborada nos termos desta Norma.

Artigo 6º

Facilitação da autorização para desembarcar, do Trânsito e do reembarque da gente do mar

1. A gente do mar será reconhecida como tal, para efeitos desta Convenção, quando seja titular de um documento de identidade da gente do mar válido e expedido de acordo com as disposições da presente Convenção por um Membro para o qual este instrumento esteja em vigor, salvo se existirem razões claras para duvidar da autenticidade do documento de identidade da gente do mar. (grifado)

4. Todo Membro para o qual a presente Convenção esteja em vigor autorizará, da forma mais breve possível, e salvo que existam motivos claros para duvidar da autenticidade do documento de identidade do marítimo, a entrada em seu território aos marítimos titulares de um documento de identidade da gente do mar válido, quando tal entrada seja requerida a fim de permitir o gozo de uma autorização temporária para desembarcar pelo tempo de duração da escala da embarcação. (grifado)

 

Temos em continuação deste segundo ponto, no mesmo artigo 6º, no parágrafo 7, especificamente a letra “b” outra observância aos países que a ratificaram. Ressalte-se que não é uma exceção de seu regramento. Mas a sua real intenção. Facilitar a vida de toda gente do mar com tratamento humanitário no reconhecimento de suas identidades. O parágrafo 7 do mesmo artigo 6º, letra “b” demonstra uma suplementação por um passaporte na identificação da gente do mar, não impedindo o seu direito de ir e vir do marítimo. Abaixo:

7. Cada Membro para o qual a presente Convenção esteja em vigor autorizará igualmente, o mais breve possível, a entrada em seu território dos marítimos titulares de um documento de identidade da gente do mar válido, suplementado por um passaporte, quando a entrada tenha por objetivo: (grifado)

a) o embarque em sua embarcação ou o reembarque em outra embarcação;

b) o trânsito para embarcar em sua embarcação em outro país ou para sua repatriação, ou qualquer outro fim aprovado pelas autoridades do Membro interessado. (grifado)

 

Ressalte-se que este item “b”, se refere a “qualquer outro fim aprovado” por esse Estado Membro. Referindo-se primeiramente a embarque e ao trânsito do marítimo por determinado território. Mas percebam que o termo “qualquer outro fim aprovado”, permite ao Estado membro flexibilizar a Norma. Confirmando seu caráter de princípios gerais. E não limitadora dos direitos por ela seguidos e estabelecidos. Necessitando que cada Estado Membro faça a sua adaptação de acordo com sua normatização interna.

Mas não pode passar despercebido que também está previsto clara e expressamente nos dizeres iniciais da própria C. 185 da OIT o reconhecimento dos princípios já consagrados na convenção C. 108 da OIT. Que são os mesmos da atual. Diferenciando apenas pelo requinte e detalhe de elaboração dos documentos de identidade.

Reconhecendo os princípios consagrados na Convenção sobre os Documentos de Identidade da Gente do Mar, 1958, relativos à facilitação da entrada da gente do mar no território dos Membros, quando a entrada tenha como finalidade o gozo de uma autorização para desembarcar, o trânsito, o reembarque em outra embarcação ou a repatriação; (grifado)

 

Fica assim entendido, que a finalidade desta Convenção não é tolher o direito de ir e vir do marítimo que possua uma identidade fora do padrão estipulado na elaboração e controle previsto nesta Norma. Deve ainda se ressaltar que no texto das considerações iniciais da Convenção 185 da OIT, existe citação expressa aos itens 3.44 e 3.45 da FAL – 65 que asseguram estes direitos previstos nesta Norma a todos os marítimos. Como abaixo dispõe. [16] 

Tomando nota do disposto na Convenção da Organização Marítima Internacional sobre a Facilitação do Trânsito Marítimo Internacional, 1965, com emendas, e, particulamiente, as Normas 3.44 e 3.45;

G. MEDIDAS ESPECIAIS DE FACILITAÇÃO PARA ESTRANGEIROS PERTENCENTES À TRIPULAÇÃO DE NAVIOS EMPREGADOS EM VIAGENS INTERNACIONAIS - LICENÇA PARA BAIXAR A TERRA

3.44 Norma. As autoridades públicas deverão permitir aos membros estrangeiros da tripulação baixar a terra enquanto o navio no qual chegaram estiver no porto, desde que as formalidades de chegada do navio tenham sido cumpridas e as autoridades públicas não tenham motivo para recusar permissão para ir a terra por razoes de saúde pública, segurança pública ou ordem pública. (grifado)

3.45 Norma. Aos membros da tripulação não deverá ser exigido possuir um visto com o propósito de licença para baixar a terra. (grifado)

 

O Decreto 80.062 de 07 de novembro de 1977 deu vigência no Brasil à Convenção para a Facilitação do Tráfego Marítimo Internacional de 1965 - (FAL - 65). Acrescente que esta norma continua com vigência na atualidade.

 

Por um terceiro ponto e tomando nota nos dizeres das Resoluções Normativas 71 e 72 do Cnig, tem-se por certo estas apenas abordam superficialmente o tema. Entretanto não se percebe qualquer restrição na citação dos termos “carteira de marítimo” e “documento equivalente”. O que leva a crer que elas estejam em sintonia com as demais Normas internacionais e nacionais.

E por último ponto deste sistema interpretativo proposto, a Lei 6.815/80 e seu regulamento o Decreto 86.715/81, trazem literalmente dispositivos que confirmam o sentimento neste tema.

Na Lei 6.815/80, o artigo 105 que mitiga a exclusividade do uso da identidade de marítimo previsto no art. 49 do Decreto estende ainda mais as facilidades a serem observadas para essa classe de estrangeiro. Perceba que esta flexibilidade de identificação está inserida no título “X”, dos direitos e deveres do estrangeiro. O que corrobora a tese de ser um direito destes estrangeiros.

Pelo Decreto 86.715/81 o parágrafo único do artigo 49 que inseridos no título “I” capitulo “II” tratando da entrada do estrangeiro no Brasil, prevê a possibilidade do estrangeiro usar outro documento diverso da carteira de identidade de marítimo prevista na Convenção da OIT que atribuía ao mesmo uma condição de marítimo. Lembrando que o artigo 49 é conteúdo de Diploma primário, e dispõe no território brasileiro o direito desta classe de estrangeiro de desembarcar e descer a terra.

Por certo existem outras normas ratificadas pelo Brasil que estão interligadas. E que preveem outros modos de tratamento humanitário a ser dado ao estrangeiro marítimo e tripulante quando no território brasileiro. Dentre estas, citem-se o Decreto 2.669 de 15 de julho de 1998 que Promulgou a Convenção nº 163 da OIT que dispõe sobre o Bem-Estar dos Trabalhadores Marítimos no Mar e no Porto, e foi assinada em Genebra em 8 de outubro de 1987. Tendo estabelecido em seu art. 3º, item 1, o seguinte:

   

 Artigo 3

1.          Todo Membro se compromete a cuidar para que sejam providenciados meios e serviços de Bem-Estar nos portos apropriados do país para todos os marinheiros, sem distinção de nacionalidade, raça, cor, sexo, religião, opinião pública ou origem social, e independentemente do Estado em que estiver registrado o navio a bordo do qual estejam empregados. (grifado)

 

Chama atenção nesta Norma, que o termo “marinheiros” parece ser referente ao marinheiro civil, equivalente a tripulante marítimo. Em seu conteúdo é previsto ser providenciado, o bem estar independente de nacionalidade e independe do Estado em que estiver registrado o navio do marítimo. Não se pode haver dúvida que a palavra, “Estado”, neste artigo, refere-se a Estado soberano. Não devendo ser restringida a Estado federado. Pois quando a norma quis restringir usou termos precisos, tais como: “Portos do País” acima, e “seu território” abaixo:

Artigo 4

Todo Membro compromete-se a cuidar de que os meios e serviços de Bem-Estar instalados em todo navio dedicado à navegação marítima, de propriedade pública ou privada, registrado em seu território, sejam acessíveis a todos os trabalhadores marítimos que se encontrarem a bordo. (grifado)

8. Conclusão.

Após o exame dos textos e conjecturas de todas estas Normas, internacional e nacional, se percebe que o cerne da questão é muito entrelaçado entre as mesmas. Entretanto é a função do interprete buscar no conteúdo das mesmas a real finalidade de seus termos. Fica neste artigo a impressão sob a ótica da interpretação, que o estrangeiro tripulante e marítimo de um modo geral, deve ter o tratamento digno e humano previsto nas Convenções da OIT e também da OMI. As quais abarcam questões humanitárias específicas. Como o previsto por esta última na FAL 65, que estabelece relação a facilitar os meios de chegada, controle e fiscalização, para a liberdade de ir e vir destes estrangeiros. Como principalmente, o previsto por aquela Convenção 185 que dispõe das liberdades de descida a terra, trânsito, embarque e desembarque para esta classe de trabalhador marítimo. Devendo se conhecido por uma interpretação mais aprofundada, a real intenção desta última Norma, em querer estabelecer maior critério de segurança para a identificação dessa classe de trabalhadores estrangeiros, rechaçando ser este critério como único meio dos mesmos gozarem os direitos ali expressos. Haja vista, que já se tem mais que demonstrado, através das outras Normas aqui narradas, que à figura do estrangeiro na condição de marítimo, para o gozo e bem estar propostos pela história dos direitos humanos de um modo geral, basta à prova desta sua condição por qualquer documento que assim o intitule. 

Entretanto, não resta claro a aplicação desse entendimento no Brasil para facilitar a todos os estrangeiros tripulantes e marítimos dos países ainda fora do compromisso da Convenção 185. Talvez por faltar maior discussão sobre a matéria dos órgãos envolvidos na questão. Em que pese essas normas serem diversificadas e elaboradas em épocas distintas, existe entre as mesmas total cumplicidade para o tratamento a ser dado ao tema. O assunto é delicado, e as Normas de aplicação interna e externa não deixam duvidas que a todos estes estrangeiros marítimos e tripulantes deve ser dado tratamento humanitário previsto nas mesmas.

 

 

Referências:

SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. São Paulo: RTr, 2000.

França, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica / 2° edição, revista e ampliada – São Paulo: Saraiva, 1988. 

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. São Paulo: Revista Forense, 1999 (1924).

LEI 6.815/80 - (Estatuto do estrangeiro no Brasil).

DECRETO 86.715 - (Regulamento do estatuto do Estrangeiro no Brasil).

DECRETO 840/93.

DECRETO 58.825/66 – (Convenção 108 – Organização Mundial do Trabalho).

DECRETO LEGISLATIVO 892/2009.

DECRETO 8.605/2015 – (Convenção 185 - Organização Mundial do Trabalho).

DECRETO 2.669/98 - (Convenção 163 - Organização Mundial do Trabalho).

RESOLUÇÃO NORMATIVA 71 – (Conselho Nacional de Imigração).

RESOLUÇÃO NORMATIVA 72 – (Conselho Nacional de Imigração).

RESOLUÇÃO NORMATIVA 81 – (Conselho Nacional de Imigração).

DECRETO 80.062/77 – (Facilitação do Tráfego Marítimo Internacional – FAL. 65)

 

 

 

Informações sobre o autor:

- Ivan Barbosa de Araujo

Bacharel em Ciências Jurídicas pela Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas.

Pós Graduado em Direito Público e Privado pelo Instituto Superior do Ministério Público do Rio de Janeiro.

 

 



[1] Considere identidade igual a documento de viagem válido para o Brasil.

[2] Considere o termo tripulante neste artigo sempre da categoria marítimo.

[3] (NORMAM-08/DPC) - NORMAS DA AUTORIDADE MARÍTIMA PARA TRÁFEGO E PERMANÊNCIA DE EMBARCAÇÕES EM ÁGUAS JURISDICIONAIS BRASILEIRAS

 

[4] Num nível similar de formalidade, costuma ser empregado o termo Convenção para designar atos multilaterais, oriundos de conferências internacionais e que versem assunto de interesse geral, como por exemplo, as convenções de Viena sobre relações diplomáticas, relações consulares e direito dos tratados; as convenções sobre aviação civil, sobre segurança no mar, sobre questões trabalhistas. É um tipo de instrumento internacional destinado em geral a estabelecer normas para o comportamento dos Estados em uma gama cada vez mais ampla de setores. No entanto, existem algumas, poucas é verdade, Convenções bilaterais, como a Convenção destinada a evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal celebrada com a Argentina (1980) e a Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita celebrada com a Bélgica (1955). http://dai-mre.serpro.gov.br/clientes/dai/dai/apresentacao/tipos-de-atos-internacionais

[5] SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. São Paulo: RTr, 2000.

[6] Dados do livro “Convenções da OIT” de Arnaldo Süssekind, 2ª edição, 1998. 338p. Ed. LTR

[7] Publicado no site: OIT - Organização Internacional do Trabalho - Escritório no Brasil (http://www.oitbrasil.org.br)

[8] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d7030.htm

[9] C. 108 da OIT:  Art. 13 — 1. No caso de a Conferência adotar nova convenção de revisão total ou parcial da presente convenção, e a menos que a nova convenção disponha diferentemente:

a) a ratificação, por um Membro, da nova convenção de revisão acarretará, de pleno direito, não obstante o art. 17 acima, denúncia imediata da presente convenção quando a nova convenção de revisão tiver entrado em vigor;

[11] Trinta e um países raticaram a OIT 185, enquanto 64 ratificaram a 108.

[12] http://acesso.mte.gov.br/data/files/8A7C816A4EE0C92C014EFDC03B6D22A8/LISTA-DE-MEMBROS-CNIg-2015-SITE.pdf

[13] França, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica / 2° edição, revista e ampliada – São Paulo: Saraiva, 1988. 

 

[14] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. São Paulo: Revista Forense, 1999 (1924).

[15] https://pt.wikipedia.org/wiki/Conven%C3%A7%C3%A3o_(norma)

[16] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1970-1979/D80672.htm

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