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"Discurso sobre a Servidão Voluntária"(Uma percepção do texto de Etienne de La Boétie)


Autoria:

Sérgio Ricardo De Freitas Cruz


Bacharel em Direito pelo UniCeub(Centro Universitário de Brasília)(2014), monografia publicada, mestre em Direito e Políticas Públicas no UniCeub(2017).Doutorando em Direito. Especialista em "Criminologia" e Filosofia do Direito, curso de MEDIAÇÃO na CAMED- CÂMARA DE MEDIAÇÃO do UNICEUB com estágio no Fórum Desembargador José Júlio Leal Fagundes-TJDFT, Estagiário Docente em Filosofia do Direito e Teoria dos Direitos Fundamentais.Cursos vários em especial: "História das Constituições brasileiras" ministrado extensivamente pelo Dr Carlos Bastide Horbach , "Seminário avançado sobre o novo CPC ", ministrado por S. Exa. Ministro Luiz Fux entre setembro e dezembro de 2014 (UniCeub).Participante do Seminário avançado: "Sistemas Jurídicos na visão dos jusfilósofos: Herbert Hart, Hans Kelsen, Carl Schmitt, Tércio Sampaio Ferraz Jr. e Alf Ross" ministrado pelo professor Drº. João Carlos Medeiros de Aragão. O doutorando é membro do IBCCrim e IBDFAM. CV: http://lattes.cnpq.br/2851178104693524

Resumo:

"O homem nasce livre, e em toda parte é posto a ferros. Quem se julga o senhor dos outros não deixa de ser tão escravo quanto eles.".

Texto enviado ao JurisWay em 22/12/2015.



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“Discurso sobre a Servidão Voluntária”

(Uma percepção do texto de Etienne de La Boétie)

 

 

Em nota de apresentação à obra de La Boétie em citação de Manuel J. Gomes, encontramos:

“Se em 1600 era tarefa difícil escrever um prefácio a La Boétie, hoje não é mais fácil. Hoje como nos tempos de La Boétie e Montaigne, a alienação é doce (como refrigerante) e a liberdade amarga, porque está demasiado próxima da solidão. E da loucura”. [1]

 

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) em sua obra capital[2] denunciava nas primeiras linhas que o homem que nasce livre, encontrava-se preso por todas as partes:  "O homem nasce livre, e em toda parte é posto a ferros. Quem se julga o senhor dos outros não deixa de ser tão escravo quanto eles.”.

A liberdade é a essencialidade do Direito para o homem. Mesmo o contratualista Rousseau (in thesis) , percebe que as cadeias e os grilhões das ideologias e dos sistemas políticos assumiam condições jamais vistas no cenário mundial. La Boétie (1530-1575) em sua curta vida escreveu um clássico contra a dominação do homem pelo homem. Já no título percebemos certa contradição  irônica: “Servidão voluntária”.

La Boétie afirma:

“ Digno de espanto, se bem que vulgaríssimo, e tão doloroso quanto impressionante, é ver milhões de homens a servir, miseravelmente curvados ao peso do jugo, esmagados não por uma força muito grande, mas aparentemente dominados e encantados apenas pelo nome de um só homem cujo poder não deveria assustá-los, visto que é um só, e cujas qualidades não deveriam prezar porque trata desumana e cruelmente. Tal é a fraqueza humana: temos frequentemente de nos curvar perante a força, somos obrigados a contemporizar, não podemos ser sempre os mais fortes”.  [3]

 

O texto escrito no século XVI é atual quanto à dominação invisível que os detentores do poder legitimado, utilizam sobre a grande maioria dos desprovidos do poder e que permanecem sob um sistema complexo que envolve um processo ideológico,midiático e coercitivo. O Direito, invenção do homem, como afirma Michel Foucault em inúmeras obras, todavia, em “A Verdade e as normas jurídicas”   torna tal reflexão mais densa, corrobora com a idéia primordial de La Boétie.

O que faz com que massas de pessoas se deixem conduzir por pouquíssimos que delineiam caminhos, assumem decisões, prendem, calam, encarceram, impedem, matam e chamam isso democracia ? José Saramago diz ser a democracia uma mentira inventada para justificar desmandos. Vejamos : Roberto Azevedo[4], diplomata brasileiro, recentemente foi eleito para a presidência da OMC ( Organização Mundial do Comércio). Na lógica do saudoso Saramago, isso não é democracia, o povo não participou da decisão, como de fato, não participa das decisões dos orgãos internacionais.

Figuras como Mahatma Gandhi, Rosa Parker, Martin Luther King, Nelson Mandela, Desmond Tutu, Malcon X, influenciados diretamente ou não por La Boétie e mesmo Henry David Thoreau (1817-1862) e seu ensaio Desobediência Civil  (1849) , contribuiram para formalizar o grito de La Boétie que denuncia a “Servidão voluntária”.

O filósofo esloveno Slavoj Zizek (1949-) , em um livro polêmco “Bem-vindo ao deserto do Real !”, nos conduz à seiva do pensamento de La Boétie por uma via secundária. Ele nos diz:

“ Por que se deveria privilegiar a catástrofe do WTC em relação, digamos, ao genocídio dos hutus pelos tutsis em Ruanda, em 1994 ? Ou o bombardeio em massa e envenenamento por gás dos curdos no norte do Iraque no início da década de 1990? Ou a matança generalizada perpetrada pelas forças indonésias contra a população do Timor Leste ? Ou...é longa a lista de países onde o sofrimento era, e é, incomparavelmente maior que o sofrimento em Nova Iorque, mas a população não teve a sorte de ser elevada pela mídia à categoria de vítimas sublimes do Mal Absoluto. Mas esta é a questão: se insistirmos em usar o termo, são todos “Males Absolutos”. Devemos então estender a proibição de explicação e afirmar que nenhum desses males não pode nem deve ser “dialetizado”? Não somos também obrigados a avançar um pouco mais : o que dizer dos horriveis crimes individuais , desde os sádicos assassinatos em massa de Jeffrey Dalmer[5] até de Andrea Yates[6], que afogou os cinco filhos a sangue-frio? Não existe algo real, impossível, inexplicável, em todos esses atos ? Não é verdade, como Schelling explicou há mais de duzentos anos, que em cada um deles temos de enfrentar o abismo último do livre-arbítrio, o fato imponderável de que “fiz porque quis fazer” que resiste a qualquer explicação em termos de causas psicológicas, sociólogicas ou ideológicas”.[7]

  

O pensamento do “Deserto do Real”  é a construção que edificamos por séculos ao permitir a tirania, seja ela maquiada de democracia ou não. O século XX foi o laboratório das idéias bizarras colocadas em prática sob os ideais de liberdade como em Hiroshima e Nagasaki, o Muro de Berlim, os Gulaks, o massacre de Srebrenica em julho de 1995 na Sérvia, os embates em Soweto na África do Sul , o massacre de Eldorado dos Carajás no Pará em 1996, tudo sob a legitimação do silêncio dos que não denunciam e dos que não questionam.

Servidão ? Jamais. Voluntária ? Inconcebível.  O pequeno livro de Etienne de La Boétie, poucas folhas, como o de Stéphane Hessel, “Indignai-vos” , são robustos em conteúdo e verdadeiras falas de liberdade.

 

Autor: Sérgio Ricardo de Freitas Cruz (Mestrando em Direito e Políticas Públicas-UniCeub).

 



[1]          LA BOÉTIE, Etienne de. Discurso sobre a servidão voluntária. LGE Editora, Brasília 2009.

[2]          ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

 

[3]            Idem. Op. Cit. p. 9

[4]       Roberto Carvalho de Azevêdo é um diplomata brasileiro, atual Diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. É considerado o diplomata brasileiro que mais entende de negociações comerciais, bem preparado e com bom trânsito dentro da OMC.

[5]      Jeffrey Lionel Dahmer (1960-1994) foi um serial killer americano. Dahmer assassinou 17 homens e garotos entre 1978 e 1991, sendo a maioria dos assassinatos ocorridos entre os anos de 1989 e 1991. Seus crimes eram particularmente hediondos, envolvendo estupro, necrofilia e canibalismo. (N.A do artigo)

[6]         Andrea Yates (nascida Andrea Pia Kennedy em 1964) é uma moradora de Houston  Texas, que matou seus cinco filhos pequenos, afogando-os na banheira de sua casa em 20 de junho de 2001. Ela vinha sofrendo há anos de depressão pós-parto e psicose severas. Sua condenação foi por crime capital, em 2002, cuja sentença de prisão perpétua com liberdade condicional depois de 40 anos foi revista mais tarde no julgmaneto de apelação. Em 26 de julho de 2006, um júri texano considerou Yates inocente por razões de insanidade. Ela foi encaminhada pelo tribunal a um hospital para doentes mentais de segurança máxima, onde recebeu tratamento médico e conheceu sua colega de quarto, Dena Schlosser, outra mulher que matou a filha. Em janeiro de 2007, Andrea foi transferida para um hospital para doentes mentais de segurança mínima em Kerrville Texas. (N.A do artigo)

 

[7]           Zizek, Slavoj.Bem-vindo ao deserto do Real! (Estado de sítio). Boitempo- Editorial, 2002, p159.  

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