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BARRIGA DE ALUGUEL: Uma análise à luz do novo ordenamento jurídico brasileiro


Autoria:

Eluã Marques De Oliveira


Advogado. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo.

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Resumo:

O empréstimo temporário do útero, mais conhecido como barriga de aluguel é uma prática de gestação por terceiros que tem se tornado cada vez mais comum ultimamente. O presente artigo analisa sua (im) procedência no ordenamento jurídico brasileiro.

Texto enviado ao JurisWay em 17/08/2015.



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Barriga de Aluguel: Uma análise à luz de um novo ordenamento jurídico brasileiro[1]

 

Eluã Marques de Oliveira

Graduação Direito Universidade Federal do Espírito Santo

 

SUMÁRIO: 1.0 Introdução. 2.0 Considerações sobre a filiação. 2.1. Fecundação Assistida. 3.0 A barriga de aluguel à luz da Constituição Federal de 1988. 4.0 A Jurisprudência com relação à barriga de aluguel. 5.0 Conclusão. 6.0 Referências Bibliográficas

  

Resumo: O empréstimo temporário do útero, mais conhecido como barriga de aluguel é uma prática de gestação por terceiros que tem se tornado cada vez mais comum ultimamente, embora nosso ordenamento jurídico não possua normas regulamentando a matéria, é evidente que ante as novas alterações conceituais e de abrangência de família, essa realidade/omissão normativa precisa ser alterada cabendo à doutrina debater e discutir o tema trazendo inovações concernentes à questão, afastando os preconceitos e paradigmas até então estabelecidos.

  

Palavras chaves: barriga de aluguel; filiação biológica; reprodução assistida.

  

Abstract:The temporary loan of the uterus, known as surrogacy is a practice of gestation by third parties that have become increasingly common these days, but our legal system has no rules regulating the matter, it is clear that before the new conceptual change and family coverage, this reality / rules must be modified fitting omitting the doctrine debate and discuss the topic bringing innovations concerning the issue, removing prejudices and paradigms previously established.

  

Key words: surrogacy; biological parentage; assisted reproduction.

 

1.0       INTRODUÇÃO

           

A prática gestacional conhecida por barriga de aluguel, Surrogate Mother em inglês, Mère Porteuse em francês, também denominado pelos doutrinadores de “gestação em substituição”, “doação temporária do útero” e outros, é, na concepção de muitos, uma prática vedada por nosso ordenamento jurídico, isso porque a Constituição Federal de 1988 em seu art. 199, §4° dispõe que “a lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização”[2]; já para outros não há qualquer vedação constitucional ou legal quanto ao empréstimo temporário do útero, contudo é vedada qualquer comercialização, e contraprestação financeira, de modo que o empréstimo do útero deve ser gratuito, tanto é assim que o Conselho Federal de Medicina através da Resolução 2.013/2013 dispõe das situações e procedimentos em que os médicos poderão proceder a realização da gestação por substituição, sendo que além das situações ali previstas é possível mediante aprovação do Conselho Regional de Medicina ao qual o médico esteja submetido.

 

Segundo Maria Helena Diniz (2012), diversas são as complicações que surgem quanto às possibilidades de gestação, seja com relação à verdadeira maternidade/paternidade, seja de natureza patrimonial, inclusive situações prejudiciais à própria criança, de modo que são necessárias normas que regulamentam os casos em que os bebês não são, geneticamente, filhos do casal que quis seu nascimento.[3]

Desse modo, como tem se tornado cada vez mais frequente a utilização do procedimento de “empréstimo temporário do útero”, isso devido a facilidade com que a mídia apresenta o tema aos telespectadores[4], criando assim cada vez mais expectativas em um público “consumidor” que já existe, e abrindo mercado ao público “fornecedor” desse serviço.

 

Além disso, com os recentes alargamentos dado, no mundo jurídico, ao conceito de família, tendo passado considerar como famílias as uniões homoafetivas, é evidente que é mais que necessário uma análise mais cuidadosa do assunto, de modo a não criminalizar a conduta de um casal homoafetivo de homens, por exemplo, que desejarem terem filhos biológicos.

           

Assim, o presente trabalho vai analisar de maneira geral algumas considerações relevantes sobre o instituto do empréstimo temporário do útero. É fato que esse tema pressupõe uma carga de moralidade e religiosidade muito grande, afinal, trata-se da vida de uma criança, todavia, vamos tentar estudá-lo de maneira mais objetivo possível.

 

2.0              CONSIDERAÇÕES SOBRE A FILIAÇÃO

 

O instituto da filiação, segundo alguns autores é tão antigo quanto o instituto da posse/propriedade, isso porque conforme diz Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012):

 

“a mais relevante relação de parentesco existente na ciência jurídica é a que se estabelece entre pai/mãe e filho”. (...) a filiação é forma segura de se falar na realização plena e valorização da pessoa humana. “Mostrar o mundo para o filho é filho é redescobri-lo nos seus perdidos detalhes: depois de crescer, a gente só se recorda que a lagarta se metamorfoseia em borboleta, e tantas coisas mais, ao falar disso com ele. Ter filhos, vivenciando intensamente a relação, é rejuvenescer. (E por que não dizer?) é atingir a plena realização da própria personalidade humana”.

 

De igual modo, Fábio Ulhoa Coelho (2012), afirma que:

 

“ter filhos é uma experiência única e, embora acompanhada de imensas dificuldades, essencialmente gratificante. Quem passa por ela no momento certo da vida, enriquece-a muito. Como antes de transmitir conceitos e valores é preciso clarificá-los, preparar alguém para viver em sociedade importa reestruturar-se internamente. Acompanhar de perto o crescimento de novo ser da espécie, contribuindo de modo decisivo para sua formação, desperta o sentimento de responsabilidade pela preservação e renovação e renovação de uma herança cultural milenar.”

 

Portanto, ter filhos, conforme os autores acima preceituam traduz-se num sentimento de emoção e bem estar.

 

A filiação é um estado, status familiae, e segundo Sílvio Salvo Venosa (2012), todas as ações que visem seu reconhecimento, modificação ou negação são, portanto, ações de estado; sendo que o termo filiação exprime a relação entre filhos e seus pais, aqueles que o geraram ou o adotaram.

 

A Constituição Federal de 1988 vedou qualquer qualificação/classificação entre filhos, que até então era classificada no Código Civil de 1916 como filhos legítimos, ilegítimos e adotivos. O Código Civil de 2002 traz em capítulos diversos os filhos havidos na relação de casamento e os filhos havidos fora da relação de casamento. No capítulo intitulado “Da filiação”, que compreende do art. 1.596 ao art. 1.606, refere-se aos filhos nascidos na constância do casamento; já no capítulo “Do reconhecimento dos filhos” que compreende do art. 1.607 ao 1.617 refere-se aos filhos nascidos fora do casamento. Essa estrutura deve-se ao fato da visão romana de família, aquela visão sacra de família, e o legislador quis tentar manter aquela estrutura de família através das disposições no Código.

 

2.1              REPRODUÇÃO ASSISTIDA

 

Para os fins do presente trabalho é importante analisar os atuais parâmetros da reprodução assistida, também denominada de fecundação artificial, inseminação artificial e outros; isso porque conforme veremos adiante, apenas é possível o desenvolvimento da “barriga de aluguel” por meio da reprodução assistida.

 

Trata-se um conjunto de técnicas, utilizadas por médicos especializados, que tem como principal objetivo tentar viabilizar a gestação em mulheres com dificuldades de engravidar. Muitas vezes essas dificuldades, até mesmo a infertilidade do casal ou um de seus membros, podem trazer sérios prejuízos ao relacionamento conjugal. 

 

As diferentes variantes técnicas do conjunto da RA podem ser reunidas em dois grupos:


As mais antigas e mais simples - nas quais a fecundação se dá dentro do corpo da mulher - são chamadas de Inseminação Artificial. Caso os gametas utilizados na reprodução assistida sejam do próprio casal, chamamos de inseminação homóloga; caso um ou ambos os gametas sejam obtidos a partir de doadores anônimos, chamamos de inseminação hetetórologa[5].

 

Portanto, em se tratando da gestação por substituição, a fertilização deverá ser realizada mediante gametas dos pais que procuram a barriga de aluguel ou de terceiros anônimos, e não poderá ser da própria mãe de aluguel, pois se assim for, a mãe de aluguel estará “vendendo” seu óvulo, o que é vedado pela Constituição Federal, sem mencionar no fato de que ela será a mãe biológica da criança, com direito à visitação conforme veremos adiante em caso semelhante.

 

3.0              A “BARRIGA DE ALUGUEL” À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

 

A Constituição Federal de 1988 dispõe em seu art. 5° inc. II que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da Lei”.

 

Esse dispositivo constitucional consagra o princípio da legalidade, previsto no art. 4°[6] da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, cujo surgimento se deu com o Estado de Direito, visando opor-se ao Estado de polícia, antidemocrático e autoritário.

 

Embora não seja absoluto, mas pelo princípio da legalidade apenas o Poder Legislativo pode criar comandos inovadores na ordem jurídica do país.

 

Nesses termos, ao contrário do que muitos querem fazer acreditar[7], não existe no ordenamento jurídico brasileiro uma única Lei que proíba a gestação conhecida por “barriga de aluguel”.   

 

O que existe é vedação expressa pela própria Constituição Federal, conforme já citado na Introdução do presente trabalho, à comercialização de órgãos e tecidos humanos, de modo que o óvulo da mulher não pode ser objeto de avença, o que faz com que a barriga de aluguel apenas seja possível por meio de inseminação artificial.

 

A Resolução do Conselho Federal de Medicina n° 2.013/2013 não pode ser considerada Lei para fins de vedação à prática da “barriga de aluguel”, até porque a resolução, conforme disposto na exposição de motivos[8], é direcionada aos médicos no exercício de sua profissão.

De igual modo, não há que se tipificar a conduta de colocar o útero à disposição de terceiros e nem o ato de procurar ou adquirir esses serviços, enquadrando-se tais condutas na Lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997, isso porque tal Lei apenas criminaliza a conduta de comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano[9]. E, no direito penal não há que se falar em interpretação extensiva maléfica.

 

Desse modo, não há Lei que proíba a prática de barriga de aluguel no ordenamento jurídico brasileiro[10], de modo que a mesma pode ser realizada. Sendo que a única ressalva é que o feto não tenha o material genético da mãe doadora do útero, isso porque esta estaria vendendo material genético, o que é vedado pela Magna Carta e punido pela Lei 9.434/1997 com pena de reclusão de três a oito anos e multa. Entretanto, conforme veremos em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça adiante, em uma hipótese como esta a criança não pode ser punida pelas atitudes dos pais, de modo que a decisão judicial deverá ter como base o princípio do melhor interesse da criança.

 

O que ainda causa uma certa resistência à aceitação do instituto do empréstimo temporário do útero é todo o preconceito arraigado na sociedade, sendo que até pouco tempo tal preconceito estava estampado no Código Civil de 1916, sendo que o Código Civil de 2002 veio extinguindo diversos institutos como da filiação legitima, os havidos na constância do casamento e os filhos ilegítimos, havidos fora do matrimônio[11].

 

Portanto, não pode-se deixar que esse preconceito que enraíza nosso direito, prevaleça em nossas mentes, impossibilitando que outras pessoas tenham o acesso pleno aos seus direitos garantidos na Constituição Federal, dentre eles, a liberdade; o direito de constituírem famílias mediante filhos sanguíneos, se assim o desejarem.

 

Conforme bem diz o professor Lucas Abreu Barroso (In A realização do Direito Civil: entre normas jurídicas e práticas sociais, p. 255/283):

“O sistema jurídico não é pronto e acabado. Quantas injustiças ocorreriam, se o fosse. Enquadrar as incontáveis possibilidades econômico-sociais em normas preestabelecidas é querer recortar o indivíduo do tamanho do direito, sendo preferível flexibilizar o direito de acordo com a atuação humana no contexto da comunidade política. Esse é o sentido do direito hoje”.

 

Portanto, não se pode submeter àqueles que desejam ter seus filhos, à luz da liberdade emanada pela Constituição, aos resquícios do código patriarcal e fechado de 1916, nem mesmo ao direito romano; mas deve-se analisar a presente realidade à luz da Constituição Federal de 1988 e à luz do Código Civil de 2002 que veio preceituando uma série de direitos às pessoas e mais, não apenas adaptando as pessoas às normas jurídicas, mas as normas jurídicas devem ser adaptadas às pessoas, visando a concretização plena da sociedade.

 

4.0              A JURISPRUDÊNCIA COM RELAÇÃO À “BARRIGA DE ALUGUEL”.

 

A jurisprudência tem se mostrado bastante aberta a acolhedora em se tratando de temas relacionados à barriga de aluguel.

 

Vejamos trecho de um v. acórdão do C. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, onde a primeira turma manteve a r. sentença que concedeu 180 dias de licença maternidade à autora que tinha se submetido à fertilização in vitro e gestação em “barriga de aluguel” sob o fundamento de que tratava-se de filiação biológica, o que é diferente da situação de filiação por adoção, in verbis:

 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 534999 PE (0004161-23.2011.4.05.8300)

APTE : RENATA DE MESQUITA VALADARES

ADV/PROC : ISABELA GUEDES FERREIRA LIMA E OUTROS

APTE : UFPE - UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

REPTE : PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO

APDO : OS MESMOS

ORIGEM : 12ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO - PE

RELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma

 

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA MATERNIDADE. PRAZO DE 180 DIAS. FERTILIZAÇÃO “IN VITRO” EM “BARRIGA DE ALUGUEL”. DANOS MORAIS. INXISTÊNCIA.

1. Hipótese em que a autora tendo realizado fertilização “in vitro”e gestação em “barriga de aluguel”, em virtude das dificuldades em engravidar, pretende seja reconhecido o seu direto à licença maternidade pelo período de 180 (cento e oitenta dias) dias e não de 150 (cento e cinquenta) dias como deferido pela UFPE, bem como indenização por

danos morais.

2. Devem ser computados aos prazos previstos nos artigos 207 e 210, da Constituição Federal, os prazos estabelecidos nos Decretos nºs. 6.690/2008 e 6.691/2008, resultando o benefício de 180 (cento e oitenta) dias para a mãe gestante e 150 (cento e cinquenta) dias para a mãe adotante.

3. A autora é, efetivamente, mãe biológica, não importa se a fertilização foi “in vitro”ou com “barriga de aluguel”. Os filhos são sanguíneos e não adotivos. A autora faz jus à licença maternidade pelo período de 180 (cento e oitenta) dias, o que se justifica, sobretudo, por serem 03 (três) os filhos.

4. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, conforme posicionamento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o mero dissabor não gera o direito à indenização por danos morais.

5. “O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige” (REsp 898.005/RN, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 19/06/2007, DJ 06/08/2007 p. 528).

6. Apelação a que se nega provimento.

 

VOTO

 

O JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI (Relator): Hipótese em que a autora tendo realizado fertilização “in vitro”e gestação em “barriga de aluguel”, em virtude das dificuldades em engravidar, pretende seja reconhecido o seu direto à licença maternidade pelo período de 180 (cento e oitenta dias) dias e não de 150 (cento e cinquenta) dias como deferido pela UFPE, bem como indenização por danos morais.

Penso que a r. sentença não merece reparos

Vejamos.

A Lei nº. 8.112/90 assegura a licença maternidade, diferenciando o prazo da licença concedida à mãe gestante do prazo concedido à mãe adotante, nos seguintes termos:

Art. 207. Será concedida licença à servidora gestante por 120 (cento e vinte) dias consecutivos, sem prejuízo da remuneração. (Vide Decreto nº 6.690, de 2008)

Art. 210. À servidora que adotar ou obtiver guarda judicial de criança até 1 (um) ano de idade, serão concedidos 90 (noventa) dias de licença remunerada. (Vide Decreto nº 6.691, de 2008)

Parágrafo único. No caso de adoção ou guarda judicial de criança com

mais de 1 (um) ano de idade, o prazo de que trata este artigo será de 30

(trinta) dias.

Devem ser computados aos prazos acima previstos, os dos Decretos nºs. 6.690/2008 e 6.691/2008, resultando o benefício de 180 (cento e oitenta) dias para a mãe gestante e 150 (cento e cinquenta) dias para a mãe adotante.

Considerando que não há previsão legal para a hipótese dos autos (fertilização “in vitro”com gestação em “barriga de aluguel”), a solução deve ser analisada com base no art. 4º, da Lei de introdução ao Código Civil, como bem entendeu a MM. Juíza a quo, nos seguintes termos:

Diante dessa omissão legislativa é que surge o presente litígio, cuja solução é alcançada por meio do que dispõe o art. 4º da Lei de introdução ao Código Civil, in verbis:

Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Diante disso, a questão é saber se, por analogia, o caso apresentado aos autos, desprovido que é de expressa previsão legal, merece o tratamento dispensado à mãe gestante ou aquele dispensado à mãe adotante.

No entender deste Juízo, deve-se dispensar à autora o mesmo tratamento legal conferido à mãe gestante.

No tipo de concepção apresentado, fertilização in vitru para o desenvolvimento do feto no útero de outra mulher, a mãe biológica, embora não sofra com os procedimentos da gestação e do parto, é submetida a diversos outros procedimentos a fim de propiciar referida fertilização, além de acompanhar diuturnamente seu filho sendo gestado em útero alheio, o que significa, necessariamente, conseqüências

psicológicas típicas de uma mãe gestante.

Já em relação à mãe adotante, a mesma não é submetida, ao menos em tese, a qualquer procedimento de intervenção médica, não chegando, inclusive, na maioria das vezes, a acompanhar a gestação ou a presenciar o parto.

Conforme já realçado acima, o benefício em questão é promovido para suprir uma necessidade imediata da criança, cujo bom desenvolvimento físico e mental depende da atenção que lhe é dada, principalmente pela mãe, nos primeiros meses de vida. A mãe também necessita de tempo para se dedicar aos filhos, mormente quando se trata de trigêmeos, como no caso em análise.

Uma que uma mãe em tal situação aproxima-se mais da condição da mãe gestante do que da condição de mãe adotante, porquanto a distinção entre essas duas é justamente o laço genético havido com a criança, sendo a mãe que opta por conceber um filho através de aludido método mãe biológica tal qual uma mãe gestante.

Pelo exposto, verificados os motivos acima, é de se entender que o tratamento legal em que se enquadra a autora deve ser o mesmo da mãe gestante, sendo-lhe, pois, devido o benefício da licença maternidade a ser gozado no período de 180 (cento e oitenta) dias.

 

Destarte, a autora é, efetivamente, mãe biológica, não importa se a fertilização foi “in vitro”ou com “barriga de aluguel”. Os filhos são sanguíneos e não adotivos. A autora faz jus à licença maternidade pelo período de 180 (cento e oitenta) dias, o que se justifica, sobretudo, por serem 03 (três) os filhos.

(...). Fonte: DVD Magister. Jun/Jul 2013.

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Cumpre observar que o MM. Relator confirmou a r. sentença que reconheceu à mãe que tomou o útero emprestado como mãe com plenos direitos, uma vez que teve que acompanhar toda a gestação do filho no útero alheio.

           

Em situação diferente, mas também referente à “barriga de aluguel”, em uma ação movida pelo Ministério Público do Paraná visando à desconstituição do pátrio poder familiar e que criança fosse colocada para o sistema de adoção por ter o pai alugado a barriga da mãe biológica;  o Superior Tribunal de Justiça entendeu não ser cabível o pedido formulado, uma vez que a criança não poderia ser penalizada pelas condutas irregulares dos pais.

           

A criança havia sido registrada como filha do pai de aluguel e da mãe biológica que é uma prostituta; e a criança vivia desde recém-nascida com o pai e sua esposa, uma vez que esta não tinha condições de engravidar. Devido a negociação da gravidez, a Justiça do Paraná havia determinado a busca e apreensão da criança para que a mesma fosse submetida à adoção regular.

           

Todavia, em sede de Recurso Especial o Ministro Luis Felipe Salomão afirmou que toda a situação havia sido analisada tão somente com base na conduta do pai registral e da mãe biológica, sendo que não havia sido observado o melhor interesse da criança, de modo que sob este prisma, o melhor era que a criança permanecesse com os pais, com direito à visitação pela mãe biológica[12] já que com base no princípio do melhor interesse da criança, era melhor que esta permanecesse com o pai que a registrou ao invés de ser colocada no sistema de adoção.

           

Vê-se como a r. decisão do Exc. Senhor Ministro alterou completamente os parâmetros até então adotados pelos julgadores no processo, com análise única e exclusivamente no princípio do melhor interesse da criança consagrado no art. 227, caput[13] da Constituição Federal e arts. 1.583 e 1.584 do Código Civil, segundo Flávio Tartuce (In Manual de direito das famílias e das Sucessões, 2008, p.35/51).

           

Por esse princípio, melhor interesse da criança, ou Best interest of child, reconhecido pela Convenção Internacional de Haia, visa-se sempre a proteção integral à criança.

 

5.0              CONCLUSÃO

 

Ante tudo o que foi exposto, conclui-se que não cabe mais a alegação de ilegalidade na realização da gestação mediante pagamento: “empréstimo temporário do útero”, isso porque conforme já afirmado, a família é firmada na afetividade, sendo ainda que com base no princípio da dignidade da pessoa humana, se a mãe deseja que outra mulher gere um filho biológico seu, isso deve ser possível pelo ordenamento jurídico. Qualquer intervenção contrária ao interesse do núcleo familiar vai de encontro ao princípio da não intervenção, insculpido no art. 1.553 do Código Civil[14].

 

Sobretudo, em nossa sociedade, todas as relações envolvem transações econômicas, custos, de modo que a gestação para outrem é mais um fato que envolve custos e despesas, sem mencionar no dano estético que poderá acarretar à gestante. Logo, é devido a contraprestação financeira por aqueles que buscam a “barriga de aluguel”.

 

De igual modo, com a elevação das uniões estáveis homoafetivas ao patamar de família, crescerá, na medida em que aumentam os casais homoafetivos, a busca por empréstimo temporário de útero, uma vez que esses casais desejam ter filhos, sejam adotivos ou biológicos, sendo que para que estes últimos se concretizem é necessária uma genitora, de modo que o procedimento em muitas situações se dará mediante pagamento.

           

Portanto, o direito não pode ser omisso quanto à crescente demanda social por regulação no que tange ao empréstimo temporário do útero, devendo, desse modo, traçar procedimentos e formas de contratos, estipulando valores e condições de realização do pacto.

 

Assim, longe de esgotar o tema, o presente trabalho visou apresentar uma vertente diferenciada com relação ao empréstimo temporário do útero, ensejando o debate e preparando o ordenamento jurídico para as demandas que estão crescentes dia após dia.


6.0       REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

CARNEIRO DE OLIVEIRA, Letícia Gabrielly. Influência da mídia brasileira em processos de “barriga de aluguel”. Disponível em:

<http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/8314/Influencia-da-midia-brasileira-em-processos-de-barriga-de-aluguel>. Acesso em 03/03/2014.

 

SANTOS QUEIROZ, Yuri Augusto dos; SEQUEIRA MENDES, Marisa Schimitt. Barriga de Aluguel: Legalizar? Disponível em

 <http://www.ibdfam.org.br/artigos/915/Barriga+De+Aluguel%3A+legalizar%3F>. Acesso em 06/03/2014.

 

POLLITTI, Katha. When is a mother not a mother? (Cover story). Nation [Serial online]. December 31, 1990; 251(23):825-846. Available from: Academic Search Elite, Ipswich, MA. Accessed March 08, 2014. (Disponível no períodico CAPES, .

 

BARROSO, Lucas Abreu. A realização do Direito Civil: entre normas jurídicas e práticas sociais. Curitiba. Juruá, 2011.

 

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 6° ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2011.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, família e sucessões. 5° ed. rev. atual. São Paulo. Saraiva. 2012.

 

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8ª ed. rev. e atual. São Paulo. RT, 2011.

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 5. Direito de Família. 27ª Ed. São Paulo. Saraiva, 2012.

 

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Direito das famílias. 4ª ed. Bahia: JusPodivm, 2012.

 

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. 5, direito de família. 21ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 2013.

 

TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. 3 ed. rev, e atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013.

 

TARTUCE, Flávio. Manual de direito das famílias e das sucessões. Coordenadores: TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado, RIBEIRO, Gustavo Pereira Leite. Belo Horizonte, Del Rey: Mandamentos, 2008.

 

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. Vol. 6. 12ª ed. São Paulo, Atlas, 2012.

 

 

                       

 



[1] O presente trabalho, indo na contramão do que entende a doutrina pátria, visou dar uma visão permissiva a realização da barriga de aluguel, deixando de lado todo o preconceito em que esse instituto se funda, fomentando o debate no meio acadêmico e preparando a sociedade para a crescente demanda pela prática da “barriga de aluguel”.

[2] Maria Berenice Dias, (In Manual de Direito das Famílias, 8ª ed., p. 371/372), diz que: “Gestação por conta de outrem, maternidade por substituição, ou sub-rogação, são expressões que nada mais significa do que a conhecida barriga de aluguel. Porém, apesar do nome, é vedada constitucionalmente a comercialização de qualquer órgão, tecido ou substância (CF 199 §4°). Assim, também é proibido gestar o filho alheio, mediante pagamento. A gestação por substituição seria um negócio jurídico de comportamento, compreendendo para a “mãe de aluguel”obrigações de fazer e não fazer, culminando com a obrigação de dar, consistente na entrega do filho. Como uma criança não pode ser objeto de contrato, a avença seria nula, por ilicitude de seu objeto (CC, art. 104 II). Também se poderia ver configurado ilícito penal, que pune dar parto alheio como próprio e registrar como seu filho de outrem (CP 242).” E continua a autora: “Há quem sustente, em sede doutrinária, que tal vedação alcança inclusive a cessão gratuita do útero para gestação por conta de outrem. No entanto, Resolução do Conselho Regional de Medicina admite a cessão temporária do útero sem fins lucrativos, desde que a cedente seja parente até o segundo grau (ou seja, mãe, avó, neta ou irmã) da mãe genética. Apesar da omissão da norma regulamentadora, mister admitir que também parentes por afinidade (sogra ou cunhada) podem ceder o útero. A possibilidade de uso do útero alheio elimina a presunção mater semper certa est, que é determinada pela gravidez e pelo parto. Em conseqüência também cai por terra a presunção pater est, ou seja, que o pai é o marido da mãe. Assim, quem dá a luz não é a mãe biológica e, como o filho não tem sua carga biológica, poderia ser considerada, na classificação geral (CC 1.593), como mãe civil. À vista da hipótese de cada vez menos rara da maternidade por substituição, o que se pode afirmar que é a gestatriz é sempre certa.”

 

[3] Maria Helena Diniz (In Curso de Direito Civil Brasileiro, 27ª ed. p. 488/504) diz que como o embrião decorrente de fertilização do óvulo da mulher pelo sêmen de seu marido, pode ser, como nos Estados Unidos, Inglaterra e África do Sul, transferido com uma cânula para o útero de outra mulher (mãe de aluguel), que, mediante pagamento, aluga seu útero para gerar criança alheia, surgem inúmeros conflitos de ordem moral e jurídica, como, p. ex, quem seria a mãe: a que cedeu o útero ou a que cedeu o óvulo”. Nesse mesmo sentido, em 31 de dezembro de 1990, foi publicado um artigo de Katha Pollitt no jornal Norte Americado, The Nation, intitulado WHEN IS A MOTHER NOT A MOTHER? Referente a um típico caso de barriga de aluguel, onde a mãe de aluguel não quis entregar a criança após seu nascimento, contudo o juiz entendeu que os genes fazem a mãe bem como fazem o pai, de modo que a mãe de aluguel é uma espécie de mãe adotiva, um meio ambiente: “On October 23 in Orange County, California. Superior Court Judge Richard Parslow decided that the rightful mother of Baby Boy Johnson was not Anna Johnson, the black "gestational surrogate" who, for $10,000, carried him and birthed him, but Crispina Calvert, the wombiess Asian-bom woman who provided the egg from which, after in vitro fertilization with her (white) husband's sperm and implantation in Ms. Johnson, the baby grew. Declining, he said, to play Solomon and put the baby in the "crazy-making" position of having "two mothers"- or to follow California law, which defmes the mother as the woman who gives birth to the child - Judge Parslow ruled that genes make the mom, as they do the dad. Anna Johnson was merely a kind of foster mother, a "home," an "environment."

[4] Há um artigo sobre a influência a mídia em processos de barriga de aluguel, com esse mesmo título: A influência da mídia brasileira em processos de “barriga de aluguel”, de Letícia Gabrielly Carneiro de Oliveira que diz muito bem sobre como a mídia, através das telenovelas, prolifera o uso e a prática da doação temporário do útero, isso, segundo a autora porque “nos dias atuais, há uma tendência mundial em mulheres terem filhos mais velhas (na faixa dos 35/49 anos de idade), decidindo se tornarem mães depois de um casamento bem consolidado e uma carreira bem sucedida. Porém, algumas questões são impeditivas para que a mulher que tenha o desejo consiga ter seus próprios bebês, por possuírem problemas de fertilidade. O que faz com que recorram à adoção ou ao que trataremos neste estudo de “doação temporária do útero ou gestação de substituição”, mais conhecido como “barriga de aluguel”. É por isso que cresce cada vez mais esse mercado, pois também muitas são as mulheres que vêem nessa atitude uma opção para obterem renda, tanto é assim que diversos são os anúncios da internet de mulheres oferecendo seus úteros para geração de filhos.

[5] Maria Helena Diniz, (Idem), afirma que os filhos cujo nascimento se dê por inseminação artificial heteróloga, desde que haja prévia autorização do marido, nos termos da Res. 1.957/2010 do CFM, dão ensejo à natureza socioafetiva da filiação. Entretanto, a autora entende que se a mulher ser submeter a procedimento de inseminação artificial heteróloga, sem o consentimento do marido, poderá ter-se uma causa de reparação por danos morais ou separação judicial, pois segundo ela seria hipótese de paternidade forçada, (CC, art 1.597, V), o que atinge a integridade moral e a honra do marido. Todavia, entende que se o marido consentir com a inseminação artificial heteróloga, e posteriormente quiser negar a paternidade, isso seria torpe, imoral e injusto e antijurídico, com base no art. 1.597, V do CC.

[6] Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.

[7] Nesse sentido, vejamos o que preceitua os autores Yury Augusto dos Santos Queiroz e Marisa Schimitt Siqueira Mendes, em seu artigo Barriga de Aluguel: Legalizar? “2 A BARRIGA DE ALUGUEL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Devido a crescente procura e ao avanço das técnicas de reprodução humana assistida –RA, aumentou também a urgência de normas legais que a regulem no Ordenamento Jurídico brasileiro. Atualmente esses procedimentos são geridos somente pela resolução CFM Nº 2.013/2013. Publicada no D.O.U. de 09 de maio de 2013, Seção I, p. 119.

Obrigatoriamente aplicada nos casos de reprodução humana medicamente assistida, tal resolução prevê que nos casos de gestação com útero de substituição ou “barriga de aluguel”, só será permitida onde exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética, bem como limitam a idade da candidata à gestação em 50 anos e obriga a produção do termo de consentimento informado[9] em todos os casos.

As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família da doadora genética ou de seu parceiro, num parentesco até o quarto grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina[10], com precedentes apenas no Estado de São Paulo e Minas Gerais. Há de ressaltar que a doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.

A resolução também já permite a utilização da técnica de reprodução assistida para pessoa solteiras e para casais homoafetivos, por força das decisões do Superior Tribunal Federal na ADI 4.277 e na ADPF 132, que reconheceu e qualificou como entidade familiar a união estável homoafetiva.

Tal resolução não possui força de Lei, sendo apenas um parâmetro a ser seguido, o que permite a prática ilegal da barriga de aluguel nas suas mais variadas formas. No âmbito do direito penal, encaixa-se a barriga de aluguel na Lei n° 9.434/97 que estabelece em seu art. 15 que comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano é crime punido com a pena de reclusão de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias, e, ainda incorre na mesma pena quem promove, intermedia, facilita ou aufere qualquer vantagem na transação.

Sobre a legislação que regula a R.A., é valido destacar que existe o projeto de Lei n° 90, de 1999, de autoria do Senador Lucio Alcântra, que dispõe sobre a procriação medicamente assistida, regulando tanto clínicas, qualificação do profissional médico, do consentimento prévio e todos os demais atos necessários para que aconteça a reprodução humana assistida.

O projeto citado além de regulamentar a prática da R.A., trás a tipificação de atos relacionados com essa prática, por exemplo, em seu artigo 26, determina que é proibido participar da prática de útero ou barriga de aluguel, na condição de beneficiário, intermediário ou executor da técnica, concedendo a pena de reclusão de um a três anos, e multa.

O art. 37 do mesmo projeto determina que realizar a procriação medicamente assistida em pessoas que não sejam casadas ou não vivam em união estável, é crime e deve ser punido com pena de detenção de seis meses a dois anos, ou multa. Incorrendo na mesma, homem ou mulher que solicitar o emprego da técnica para dela usufruir individualmente ou com outrem que não o seu cônjuge ou companheiro.

As disposições acima citadas foram feitas em 2001, quando o então projeto sofreu algumas modificações. Mesmo assim, devido a crescente evolução cientifica e a mutação social, tal projeto de Lei, arquivado na câmara dos deputados desde 2007, necessitará de muitas modificações até sua eventual aprovação.

Dessa forma ainda continuará o Brasil, sabe-se lá até quando, sem regulamentação legal para as mais diferentes formas de reprodução humana assistida. Todavia, mesmo em países que já regulamentaram a reprodução assistida e a “barriga de aluguel”, ainda persiste infindáveis discussões sobre o assunto.”

 

[8]EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA RESOLUÇÃO CFM nº 2.013/13

No Brasil, até a presente data não há legislação específica a respeito da reprodução assistida. Transitam no Congresso Nacional, há anos, diversos projetos a respeito do assunto, mas nenhum deles chegou a termo.

Considerando as dificuldades relativas ao assunto, o Conselho Federal de Medicina produziu uma resolução – Resolução CFM nº 1.957/10 – orientadora dos médicos quanto às condutas a serem adotadas diante dos problemas decorrentes da prática da reprodução assistida, normatizando as condutas éticas a serem obedecidas no exercício das técnicas de reprodução assistida.

A Resolução CFM nº 1.957/10 mostrou-se satisfatória e eficaz, balizando o controle dos processos de fertilização assistida. No entanto, as mudanças sociais e a constante e rápida evolução científica nessa área tornaram necessária a sua revisão.

Uma insistente e reiterada solicitação das clínicas de fertilidade de todo o país foi a abordagem sobre o descarte de embriões congelados, alguns até com mais de 20 (vinte) anos, em abandono e entulhando os serviços. A comissão revisora observou que a Lei de Biossegurança (Lei no 11.105/05), em seu artigo 5º, inciso II, já autorizava o descarte de embriões congelados há 3 (três) anos, contados a partir da data do congelamento, para uso em pesquisas sobre células- tronco. A proposta é ampliar o prazo para 5 (cinco) anos, e não só para pesquisas sobre células-tronco.

Outros fatores motivadores foram a falta de limite de idade para o uso das técnicas e o excessivo número de mulheres com baixa probabilidade de gravidez devido à idade, que necessitam a recepção de óvulos doados.

Esses aspectos geraram dúvidas crescentes oriundas dos Conselhos Regionais de Medicina, provocando a necessidade de atualizações.

O somatório dos fatores acima citados foi estudado pela comissão, em conjunto com representantes da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, da Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia e da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana e Sociedade Brasileira de Genética Médica, sob a coordenação do conselheiro federal José Hiran da Silva Gallo.

Esta é a visão da comissão formada, que trazemos à consideração do plenário do Conselho Federal de Medicina.

[9] Lei 9.434/97. (...). Art. 15. Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano:

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita ou aufere qualquer vantagem com a transação.

 

[10] O autor Fábio Ulhoa Coelho, em seu livro Curso de Direito Civil deixa claro sua posição de que a doação temporária do útero pode ocorrer também quando uma mulher não quer sofrer danos estéticos decorrentes da gravidez. Vejamos o que diz o r. doutrinador: “(...). 1.1.2 Doação Temporária do Útero. De acordo com o item VII da Res. n. 1.957/2010-CFM, a doação temporária temporária de útero (barriga de aluguel) só pode ocorrer se a mãe não tiver condições, por razões médicas, de abrigar a gestação do embrião. Somente se a contratante dos serviços de reprodução assistida tiver problema médico que impeça ou contraindique a gestação, poderá ser o embrião implantado no útero de outra mulher. Mesmo que não tenha sido ela a fornecedora do óvulo, tendo saúde para a gravidez, o implante será obrigatoriamente feito no útero da usuária, isto é, da mulher contratante dos serviços médicos.

                A doadora do útero, quando permitida a doação, deve ter, em princípio, parentesco até o segundo grau com a mulher contratante dos serviços de reprodução assistida. Quer dizer, ela deve ser sua mãe, avó, irmã, sogra (ou mãe do companheiro) ou cunhada (ou irmã do companheiro). Não havendo esse vínculo de parentesco, o médico deve antes pedir a autorização do Conselho Regional de Medicina a que estiver vinculado.

                Outra determinação da regulamentação profissional de reprodução assistida relacionada à DTU é a proibição de a doadora ter, com seu ato, qualquer lucro. Podem e devem os contratantes do serviço de fertilização artificial ressarcir as despesas que a gravidez trará para a doadora, assim como indenizá-la por algum prejuízo que o estado de grávida lhe acarrete, como a dificuldade de encontrar emprego. Mas a regulamentação não permite qualquer remuneração pelo serviço prestado.

(...)

                Essas limitações de ordem ética, não vinculam senão os médicos. Apenas eles estão sujeitos ao poder normativo do Conselho Federal de Medicina e expostos à sanções no caso de desobediência. Pela ordem constitucional vigente ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Desse modo, não se pode dizer propriamente que os casais estão proibidos de contratar a DTU (Doação Temporária de útero) de modo diverso do previsto na norma deontológica do CFM. (...)

                No meu modo de entender a questão, não é injurídico o contrato de  prestação de serviços de gestação, inclusive quando prestado de forma remunerada por mulher sem vínculo de parentesco. Qualquer trabalho, manual ou intelectual, importa ao trabalhador dar algo de si, de seu corpo, de suas energias para o contratante. Não há nenhuma diferença sob esse ponto de vista, entre o advogado que vara a madrugada redigindo a minuta do contrato para atender ao prazo combinado com o cliente e a mulher que se propõe a gerar em seu ventre o filho da contratante. Evidentemente, a questão é bastantepolêmica, e predomina na doutrina o entendimento contrário à validade desse contrato (Leite, 1995: 401/409).

                Tenho para mim também que a mulher saudável, com plenas condições orgânicas para gerar uma criança, tem também o direito de contratar a DTU. Ela pode ter interesse em contratar a gestação de seu filho biológico por outra mulher, porque não lhe agrada ou convém ficar grávida. É irrelevante o motivo pelo qual deseja ser mãe sem parir: a gravidez pode atrapalhar sua carreira profissional ou alterar-lhe o corpo de maneira não querida (cf. Araújo, 1999: 29/31). Na disciplina legal da matéria, esse interesse deveria ser amplamente protegido. Trata-se de manifestação do direito da personalidade referente ao próprio corpo, por ela titulado, que a lei não pode ignorar. Para a sociedade, por outro lado, é igualmente útil que não só a maternidade como a gravidez sejam atos conscientes das mulheres, respeitando-se as decisões que adotam. Sob a perspectiva do filho, a gravidez indesejada da mãe pode lhe acarretar problemas psicológicos, que a DTU contribuiria para evitar.”

[11] Nesse sentido, Caio Mário (In Instituições de Direito de Civil. Vol. 5. Direito de Família. p. 372/432), diz que uma distinção muito vívida se estabelecia entre filiação legítima e filiação natural, sendo que a primeira dava origem a uma relação jurídica que é correlata à situação de fato, instituindo-se o vínculo  jurídico que liga o filho ao pai e à mãe. Este vínculo defluia do casamento e só se destruía mediante uma atuação jurisdicional contrária. Já na filiação extramatrimonial não ocorria a mesma coincidência entre o fato do nascimento e a relação jurídica. Especialmente no que concerne à paternidade, pois nosso direito buscava subsídio no direito romano, sempre presumiu com base no casamento: pater is est quem nuptiae demonstrant; mas como a Lei não dispunha de dados exatos para identificar o genitor, contentava-se com a fórmula: pater semper incertus.

Portanto, têm-se que nossa sociedade, com base no brocardo latino, ubi jus ubi societas, sempre foi fundada em preconceito e discriminação, tanto que no direito romano, o filho nascido de uma mulher que não tinha sido associado ao culto doméstico pela cerimônia do casamento não tinha o direito de participar dos sacrifícios  e solenidades ante o altar dos deuses lares, e por ele a família não se perpetuava.

[12] O número do processo não pode ser divulgado por motivos de tramitar em segredo de justiça, todavia a matéria sobre essa questão pode ser lida na página do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: . Acesso em 17/01/2014.

 

[13] CF. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

[14] Segundo Flávio Tartude (idem), pelo art. 1.513 do Código Civil onde prevê que “é defeso a qualquer pessoa de direito público ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família”, fica consagrado o princípio da liberdade ou da não intervenção. Para o autor, este princípio mantém relação direta com o princípio da autonomia privada, que nos termos de Daniel Sarmento é o poder que a pessoa tem de auto-regulamentar os próprios interesses. Todavia, embora o Estado ou mesmo um ente privado não possa intervir coativamente nas relações da família; o Estado poderá incentivar o controle de natalidade e o planejamento familiar por meio de políticas públicas, o que encontra previsão na Magna Carta em seu art. 227, §§ 7° e 8°.

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