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Linguagem e Direito no Direito Tributário


Autoria:

Gustavo Rodrigo Picolin


Advogado, graduado pela UNIRP (Centro Universitário de Rio Preto), Pós Graduado em Direito Tributário Pela Unisul - SC

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Texto enviado ao JurisWay em 26/01/2007.

Última edição/atualização em 29/01/2007.



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               Um dos objetivos do presente trabalho é extrair do texto Constitucional o significado da expressãoefeito de confisco”. Mais propriamente, estaremos investigando o conceito desse termo, inserido no art. 150, IV da Constituição brasileira. Disso decorre sabermos qual a espécie de linguagem, usualmente, utilizada pelo legislador.

               O homem não faz a natureza, mas pode modificá-la. Ao trabalhar com fatos naturais, procura ordená-los segundo sua conveniência. Para isso, necessita de instrumentos para alterar ou manter esta estrutura. A existência, ou não, de normas reguladoras, não vai impedir um homem e uma mulher de se unirem, terem filhos e constituírem uma família, pois isto está inerente à sua natureza. Entretanto, o homem com o escopo de manter a ordem e a paz social, disciplina, através de normas, as relações inter-humanas. Disso resulta os modais deônticos obrigatório, proibitivo e permissivo.

               À medida que aumenta o conhecimento do homem em relação a outros fatos, ele aumenta seu discurso lingüístico, no intuito de obrigar, proibir ou permitir condutas. Ao assim fazê-lo, utiliza-se da linguagem prescritiva, pois esta é a linguagem imperativa, que se volta, exclusivamente, para o comportamento do homem.

               Ao enunciar seu pensamento prescritor de condutas, o legislador utiliza signos que, entre si, vêm dar ensejo à relação sintática, cabendo ao intérprete retirar o significado dos mesmos. Contudo a semiótica[1] estuda os signos em dois outros planos, o semântico e o pragmático. Como o legislador, ao prescrever as condutas, quase sempre tem de se referir os objetos, surge aqui uma relação semântica. Um dicionário jurídico, por exemplo, é um livro de semântica, pois mostra o signo e o significado. Por fim, os significados são utilizados para prescrever condutas aos receptores. Desta relação, signos e receptores, surge a pragmática. Na ausência de algum destes três planos, não existe a linguagem.

               O legislador, na maioria dos casos, utiliza-se da linguagem natural (aquela utilizada pelos homens para a comunicação do dia a dia) para introduzir, na sociedade, regras de condutas, que estas devem ser conhecidas pela população como um todo. As normas jurídicas, antes de tudo, devem dar segurança e ordem à comunidade; para tanto, devem estar escritas numa linguagem que os subordinados à lei as entendam, as compreendam e, conseqüentemente, sigam seus comandos e preencham suas finalidades.

               Não podemos nos esquecer que as Casa Legislativas, por estarem compostas por pessoas de diferentes raças, culturas, religiões, profissões e qualificações técnicas, legislam valendo-se de palavras de uso comum e ordinário. Se não fosse assim, o objetivo do Direito em qualquer sociedade civilizada, qual seja, a ordem, não seria alcançado, representando as leis um emaranhado de palavras estranhas e incompreensíveis ao conhecimento de um cidadão comum.

               Disso resulta, que o legislador, a fim de ser entendido, procura, de alguma forma, se relacionar com esses planos de linguagem. Entretanto, por ser sempre leigo em lingüística e, também, dado a heterogeneidade dos receptores, é possível que sua mensagem chegue carregada de “ambigüidade” e “vacuidade”.

               Em relação à ambigüidade das palavras, explica o Mestre argentino Carrió[2]:

Não é certo que todas as palavras são usadas, em todos os contextos, para conotar as mesmas propriedades. Se um de meus filhos me pergunta: ‘Que quer dizer rádio?’, não tenho mais remédio senão contestar com outra pergunta: ‘Em que frase ou oração?’ Porque em algumas significará algo assim comoaparelho elétrico que serve para escutar música e notícias’; em outras, ‘metal descoberto pelo casal Curie’ em outras a metade do diâmetro; em outras, coisas tão pouco precisas como as que indicamos ao falar do raio de ação de certa influência política, o do raio do centro da cidade[3].

               E conclui o professor[4]: “Este simples exemplo nos mostra que o significado das palavras está em função do contexto lingüístico em que aparecem e da situação humana dentro do qual são usadas” [5].

               Noutras vezes, o legislador utiliza palavras vagas, gerando ao receptor a dificuldade em descobrir onde começa e onde termina o campo da aplicação de certotermo”. Para melhor entendimento do tema preferimos avocar a doutrina de Carrió[6], sobre “vacuidade” de palavras:

outros casos, em que a incerteza na aplicação ou interpretação de certos termos, não surge por não sabermos em que sentido estão sendo usados, porque sobre isso, não teremos dúvidas. 

Aqui ocorre o seguinte. Encontro-me frente a um caso ou exemplo concreto, cujas características individuais podem ser examinadas em detalhe, mas, apesar de todos meus empenhos, não sei se trata de um exemplo de uma palavra “X” geral, isto é, de um caso de aplicação dela. Minha dúvida não se origina na falta de informação acerca do objeto da palavra; sei tudo que necessito saber dele. Ela se origina no que não sei bem donde termina o campo de aplicação da palavra “X” e este caso parece encontrar-se nas proximidades desses desfigurados limites cuja ubiquação não posso definir. Mas fundamental ainda: tenho a impressão de que carece de sentido falar aqui de limites preciso.

Tal fenômeno acontece, por exemplo, cada vez que uma palavra tem como critérios relevantes de aplicação a presença de uma característica ou propriedade que os feitos se dá na forma de um contínuo, como a idade, ou a altura, ou o número de cabelos que um homem pode ter, e pretendemos fazer cortes nesses continuados de palavras ou expressões tais comojovem”, “adulto”, “ancião”, homem de idade madura”; oualto”, “baixo”, pessoa de baia estatura”; oucalvo”, “áspero”, etc.

Já sabemos o que quer dizerjovemoucalvo”. Não se trata aqui de um problema de ambigüidade. O problema é este outro: carece de sentido perguntar-se a que precisa idade se deixa de ser jovem, ou quantos cabelos há de ter para não ser calvo, ou quantoque medir para ser alto. Tudo quanto podemos dizer e quecasos centrais ou típicos, frente aos quais nada valeria em aplicar a palavra, e casos claros de exclusão em relação aos quais nada duvidarias em não usá-la. Mas no meio há uma zona mais ou menos estendida de casos possíveis frente aos quais, quando se apresentam, não sabemos que fazer.

               Por mais que se esforcem os legisladores para reduzir, ou até mesmo, retirar dos textos legislativos a imprecisão das palavras que utilizam, sempre restará uma porção de normas jurídicas sujeitas à referida deformidade. Haverá sempre um conjunto de casos duvidosos, uma zona de penumbra, de imprecisão quanto ao significado, alcance e sentido de determinadas expressões lingüísticas.    

               Como não poderia deixar de ser, o legislador, ao elaborar seu discurso, buscando sistematizar um punhado de prescrições aos receptores, também incide em ambigüidade e vacuidade. Sua linguagem objeto, que é um sistema, carece de uma outra para explicitá-la, que será uma metalinguagem ou metasistema, conferido à Ciência do Direito. Em síntese, o Direito comporta dois sistemas ou dois níveis de linguagem, ou seja, a prescritiva, utilizada para formar o Direito positivo, e a descritiva, isto é, a metalinguagem, utilizada pela Ciência do Direito.

De qualquer forma, tanto as linguagens prescritivas do legislador, como a descritiva do cientista do Direito, utilizam a sintaxe em forma proposicional. Ora, como a proposição é uma relação estrutural de signos, é cediço que o legislador constituinte, ao escrever a Constituição Federal, buscou sistematizar tais liames, razão pela qual, para melhor entendimento se sua mensagem, não se pode buscar interpretar, isoladamente, cada um delas. Ao contrário, com o escopo de encontrar coerência e unidade no sistema, o intérprete deve relacionar todas as proposições, analisando, ao final, qual a entidade que pode mantê-la, em seguro liame.

Hodiernamente, é impossível se falar em sistema jurídico sem antes passarmos pelas doutrinas daqueles que se debruçaram no estudo da linguagem, possibilitando a diferenciação entre o sistema do direito positivo do sistema da ciência do Direito Positivo, os quais são representam realidades distintas, ou seja, dois corpos diversos de linguagem.

Na lição de Paulo de Barros Carvalho[7] que encontraremos tal distinção:

Muita diferença existe entre a realidade do direito positivo e da Ciência do Direito. São dois mundos que não se confundem, apresentado peculiaridades tais que nos levam a uma consideração própria e exclusiva. São dois corpos de linguagem, dois discursos lingüísticos, cada qual portador de um tipo de organização lógica e de função semântica e pragmática diversas.

(...) o direito positivo é o complexo de normas jurídicas válidas num dado país. À Ciência do Direito cabe descrever esse enredo normativo, ordenando-o, declarando sua hierarquia, exibindo as formas lógicas que governam o entrelaçamento das válidas unidades do sistema e oferecendo seus conteúdos de significado.

Desta forma, o direito positivo, ao regular a conduta humana dentro de certa sociedade, a faz utilizando-se de uma camada lingüística, que preferimos chamar de “não precisa”, justamente por ter sido, na maioria dos casos, elaboradas por agentes não conhecedores da Ciência do Direito. Em contrapartida, quando o aplicador do direito, versado em Ciência da Jurídica, se depara com um plexo normativo – direito positivo deverá utilizar-se da linguagem técnica, esvaziada de qualquer vacuidade e ambigüidade, para interpretá-las e descrevê-las com precisão.

Podemos concluir que o sistema do direito positivo, o qual é estruturado por diversas normas, tem por finalidade disciplinar a conduta das pessoas dentro de certa sociedade no que se refere às suas relações intersubjetivas. Em contra partida, a Ciência do direito, formado por um outro corpo de linguagem, estuda esse conjunto de normas (o direito positivo), com o escopo de ordená-lo sob um ponto de vista unitário e coerente. Conclui-se assim, que o direito positivo, por regular comportamento humano, está vertido numa linguagem prescritiva, enquanto a Ciência do Direto, por descrever normas jurídicas, apresenta-se numa linguagem descritiva. “Daí o porquê de se afirmar que a linguagem da Ciência do Direito, relativamente à do direito positivo, é uma ‘linguagem de sobre nível’[8], uma meta linguagem. O objeto da Ciência do Direito é o próprio direito positivo”.

A fundamental importância de se registrar a diferença entre estes dois mundos, ou melhor, entre estas duas camadas de linguagem, reside, como veremos à frente, no fato de que o sistema do direito positivo admite a existência de lacunas e contradições entre seus elementos. Tanto é assim que, estabelece critérios com o fim específico de solucionar tais deficiências no momento de aplicar as regras jurídicas. no sistema da Ciência do Direito tais situações são impossíveis, pois toda ciência exige obediência ao princípio lógico de não-contradição. Bastaria a existência de duas normas contraditórias para que todo o sistema ruísse.

Conceito jurídico indeterminado

Na linguagem jurídica, o mesmo fenômeno pode ter matrizes distintas, dando a ele uma acentuação maior ou menor, em casos iguais, não em razão da terminologia, mas também em função do contexto em que a linguagem é empregada na norma jurídica e prevista para situações de fato, que, por sua própria natureza, tornam-se imprevisíveis.

Para Sousa[9]

O legislador do Estado de Direito democrático não pode, não quer e, por vezes, não deve regulamentar através de normas gerais e abstratas a actividade pública até ao mais ínfimo pormenor. Por outro lado, em maior ou menor medida, mais ou menos deliberadamente, o legislador recorre cada vez mais, na técnica legislativa de previsão das situações a regulamentar, os conceitos de interpretação difícil e aplicação ainda mais complexa, tais comoidoneidade”, “aptidão”, “ordem e segurança pública”, “valor histórico”, valor monumental”, “afetação da paisagem”, “necessidade do trânsito”, “moral pública”, etc. 

 

Como se observa da lição do Jurista português, o uso da norma jurídica escrita não fornece um guia preciso, seguro e indubitável para classificar os fatos concretos. A compreensão dos conceitos jurídicos envolve um problema de linguagem. No direito, parece ser mais evidente do que na compreensão dos fenômenos quotidianos, que seus limites são traçados pela linguagem, ou, em outros termos, pela leitura dada pelo intérprete e aplicador da norma jurídica, no momento de sua concretização, acerca dos fatos e processos sociais e dos valores aceitos em determinado tempo e em determinado lugar.  

Conclui-se, portanto, que o Direito, por excelência, é fonte natural de conceitos de conteúdo indeterminado, o que, por conseqüência, trazem o lume a velha e batida problemática da insegurança das coisas do mundo do dever ser, por que acaba por admitir mais de uma interpretação razoável, embora, apenas uma, no caso concreto, possa ser considerada justa. Assim, quando se está diante de um conceito indeterminado, via de regra, a casuística vai amoldar as peculariedades da hipótese debatida em juízo.  

Existem elementos do tipo legal que são inequívocos e não causam dificuldades de interpretação e aplicação, como, por exemplo, indicações de lugar e hora. Mas também existem elementos do tipo e conceitos legais que são universalmente formulados, requerem uma valoração e possibilitam uma larga faixa completa de sentidos.

Quando a norma trás em seu corpo, conceitos que expressam idéias de valor, as dificuldades para sua aplicação aumentam sobremaneira. Especialmente aumentadas as dificuldades, porque a compreensão do conteúdo varia no tempo e no espaço. Por exemplo: lealdade e boa-fé, honestidade, etc.

García de Enterría e Ramón Fernández[10] disserta que:

“a lei não determina com exatidão os limites desses conceitos, porque se trata de conceitos que não admitem uma quantificação ou determinação rigorosa, mas em todo caso é manifesto que está se referindo a um suposto da realidade que, não obstante a indeterminação do conceito, admite ser precisado no momento da aplicação. ... Isto é o essencial do conceito jurídico indeterminado: a indeterminação do enunciado não se traduz em uma indeterminação das aplicações do mesmo, as quais permitem uma unidade de solução justa em cada caso[11]. 

 

Conceito indeterminado é aquelecujo conteúdo e extensão são em larga medida incerto[12]”. “‘Indeterminado’ pode significar: impreciso, fluido, elástico, vago, poroso, flexível, zona de penumbra”[13]. Para Maria Domingues Nigro Conceição o uso das expressões impreciso, fluido, elástico, vago, poroso:

revelam, de modo cristalino, tratar-se de conceitos cuja área de significação não se apresenta definida ou limitada precisamente, no momento de sua aplicação ao caso concreto. Situam-se, portanto, na zona de penumbra, intermediária entre a região de certeza positiva – aquela na qual um conceito se inclui, sem que reste qualquer incerteza – e de certeza negativacasos excludente do uso de conceito[14]. 

Para Zancaner[15]:

os conceitos jurídicos indeterminados são conceitos de experiência ou de valor, utilizados pelo legislador para se referir a determinadas realidades que não admitem um tipo de determinação mais precisa. Ademais, o Direito não pode ser formulado através de uma linguagem estritamente técnica, que visa regular comportamento humano; o que, em palavras pobres, significa que o direito, para poder atingir seu objetivo, tem que se servir de uma linguagem acessível ao homem comum (linguagem natural); tem que ser inteligível, caso contrário não se efetivará. 

E conclui a professora:

Na linguagem natural, algumas palavras padecem de imprecisão; outras, embora não possam ser consideradas atualmente vagas, potencialmente o são.

Assim, um conceito é indeterminado quando deixa de ter limites precisos, isto é, não se refere a uma realidade de modo nítido, podendo ocorrer esta imprecisão em qualquer língua, desde que não sejam conceitos de áreas das Ciências Exatas. Reporta-se ao Direito como um campo propício para sua ocorrência, em virtude da maneira como o signo lingüístico, no contexto jurídico, se relaciona com seu objetorealidades sociais interligadas no tempo e no espaço – acarretando uma maior ou menor influência pessoal sobre suas significações.

Em perfeita síntese, Sousa[16] acentua que, no senso comum, a expressãoconceitos indeterminados, são aqueles que possuem um alto grau de indeterminação”.

Aires Barreto[17] faz importantes considerações sobre Direito e Linguagem, que merecem ser transcritas:

Retomemos o exame da cláusulaefeito de confisco”. Vamos ver que esse conceito integra o grupo dos conceitos indeterminados.

A doutrina classifica os conceitos em determinados e indeterminados; estes últimos congregam os conceitos cuja vaguidade é ampla. 

Alf Ross assinala que todas as palavras, que todos os conceitos são vagos, que o seu ponto de referência é indefinido, pois consistem em um foco central e uma área nebulosa, uma área de incerteza. 

Garcia de Enterría melhor explica esse fenômeno, quando diz: a estrutura de um conceito indeterminado é identificada por um núcleo, ou zona de certeza, configurada por dados prévios e seguros.   Além desse primeiro círculo, outro é identificável, compondo uma zona de incerteza, uma zona intermediária: o halo do conceito, formando uma zona relativamente imprecisa, nebulosa. Finalmente, diz ele, há uma zona de certeza negativa, segura, porque plenamente definida, envolvendo as situações em que o conceito não se aplica. 

Formulemos um exemplo: se, numa sala escura, acendermos uma lanterna, projetando seu facho contra a parede, vamos verificar que o seu foco clareará um determinado círculo; que, ao derredor dele, outros se formarão, estes cada vez menos claros até chegar-se ao máximo de penumbra e, finalmente, uma outra porção dessa sala, que permanecerá escura. 

São plenamente identificáveis, então, duas zonas de certeza: a zona totalmente iluminada, absolutamente clara e uma zona absolutamente escura.  Permeando essas zonas, outra haverá, mas esta terá por timbre a penumbra, a pouca claridade.  É a área de incerteza, de vaguidade, tal como ocorre com os conceitos indeterminados. 

Juan Ramon Capella diz que algumas vaguidades são irredutíveis e que nãocomo superá-las, a não ser pela adoção de critérios arbitrários.  E exemplifica: quando se diz que um automóvel é azul e é bom, a afirmação de que o automóvel é azul não encerra praticamente nenhuma incerteza.  Azul é algo que preenche um standard comum entre as pessoas.  Mas a afirmativa: o automóvel é bom, é um conceito que vem carregado de uma série de imprecisões e de obscuridades. 

Deveras, qual é o paradigma de bom? O desempenho do automóvel? A sua velocidade? A sua durabilidade, o conforto, a reunião de todos esses elementos?  Qual é o conceito de bom desempenho: a velocidade ou o torque do automóvel? O conforto ou o espaço? 

Enfim, qual é o ideal?  A propósito, em que consiste o ideal? 

Na verdade, quando falamos de um bom automóvel, estamos a referir um conceito, com exaltação própria da nossa observação, conceito esse que nunca será igual para as demais pessoas, porque esse conceito está influenciado por uma série de fatores, vários e variáveis, a maioria dos quais de natureza psicológica e não susceptíveis de serem comparados.

Efeito de confisco é conceito indeterminado; jocosamente, poderíamos dizermais que indeterminado, porque, até agora, nem mesmo a área iluminada foi adequadamente explicada pela doutrina.’

No que diz respeito ao objeto de nossa dissertação parece-nos evidente que ao analisarmos o Texto Constitucional devemos estar atentos às considerações acima expostas. A Constituição Federal, tratando-se de texto legal supremo, elaborado por um parlamento formado por representantes de todos os setores da sociedade brasileira, com certeza apresenta os irremediáveis defeitos referidos acerca da linguagem natural, quais sejam, a ambigüidade e a vagueza de seus termos.

Sem sombra de dúvida, a expressão efeito de confisco utilizada pelo Texto Maior está eivada de uma multiplicidade de significados. O que sabemos é que a Constituição Federal veda a utilização de tributo, com efeito, de confisco. Mas, o que é efeito de confisco? São conceitos vagos, com dezenas de outros encontráveis no direito positivo de qualquer, como os perdimentos de bens por cometimento de ato ilícito.   

Demonstramos com um exemplo: se analisarmos um tributo que tenha uma alíquota de 100% (cem por cento) diremos com certeza que se trata de um tributo, com efeito, de confisco. Entretanto, se tivermos um tributo cuja alíquota for de 1% (um por cento) com certeza afirmaremos não tratar de tributo confiscatório. O problema surge, por exemplo, quando aparecem alíquotas de 20%, 25% ou 30% (vinte, vinte e cinco ou trinta por cento) que acaba nos levando a uma zona de indeterminação, onde – dependendo da capacidade contributiva do sujeito passivo – acabaria ou não gerando efeito de confisco.

O emprego de conceitos jurídicos indeterminados, por gerar certa insegurança em sua interpretação, pede o uso da razoabilidade, a fim de verificar se o seu conteúdo está em conformidade aos ditames constitucionais.

Desta forma, para nósefeito de confisco”, assim como dezenas de outras expressões que nos deparamos ao lidarmos com o direito, enquadra-se naquilo que se convencionou denominar conceito vago, conceito indeterminado ou assemelhado. 



[1] A semiótica (teoria dos signos) pode ser dividida e investigada em três partes, cada uma com um objeto determinado, a saber: a sintaxe, a semântica e a pragmática. A sintaxe estuda a relação dos signos entre si. A semântica estuda a relação dos signos com os objetos designados. a pragmática estuda a relação entre os signos e as pessoas que os usam, bem como seus efeitos.

[2]  R. CARRIÓ, Genaro.  Notas sobre derecho y lenguaje. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1990. p. 28-29.

[3] No es cierto que todas las palabras son usadas, en todos los contexto, para connotar las mismas propiedades.  Si uno de mis hijos me pregunta “Qué quiere decir ‘radio’?”, no tengo más remedio que contestarle con otra pregunta: “en que frase e u oración?”. Porque en algunas significará algo así comoaparato eléctrico que sirve para escuchar música y noticia”; en otra, “metal descubierto por los esposos Curie”; en otras “la mitad del diámetro”; en otras, cosas tan poco precisas como las que indicamos al hablar del radio de acción de cierta influencia política, o del radio céntrico de la ciudad.

[4]  R. CARRIÓ, op. cit., p. 29.

[5] Este ejemplo simple nos muestra que el significado de las palabras está en función del contexto lingüístico en que aparecen y de la situación humana dentro de la que son usadas.

Hay otros casos en que la incertidumbre en la aplicación o interpretación de ciertos términos no brota de que no sabemos en qué no sabemos en qué sentido han sido usado, porque sobre eso no tenemos dudas.

Aquí ocurre lo siguiente. Me hallo frente a un caso o ejemplar en detalle, pero a pesar de todos mis empeños no si trata de un ejemplo de la palabra general “X”, esto es, de un caso de aplicación de ella. Mi duda no se origina en falta de información acerca del objeto; todo lo que necesito saber de él. Ella se origina en que no bien dónde termina el campo de aplicación de la palabra “X” y este caso parece hallarse en las proximidades de esos desdibujados linderos, cuya ubicación no puedo precisar. Mas fundamental aún: tengo la impresión de que carace de den tido hablar aquí de límites precisos.

Tal fenómeno acaece, por ejemplo, cada vez que una palabra tiene como criterio relevante de aplicación la presencia de una característica o propiedad que en los hechos se da en la forma de un hombre puede tener, y pretendemos hacer cortes en ese continuo valiéndonos de palabras o expresiones tales como “joven”, “adulto”, “anciano”, “hombre edad madura”; o “alto”; “bajo”; “retacón”; o “calvo”; “hirsuto”; etc.

Ya sabemos lo que quiere decir “joven” o “calvo”. No se trata aquí de un problema de ambigüedad. El problema es este otro: carece de sentido preguntarse a qué precisa edad se deja de ser joven, o cuántos cabellos hay que tener para no ser calvo, o cuánto hay que medir par ser alto. Todo cuanto podemos decir es que hay caso centrales o típicos, frente a los cuales nadie vacilaría en aplicar la palabra, y casos claros de exclusión respecto de los cuales nadie dudaría en no usarla. Pero en el medio hay una zona más o menos extendidas de casos posibles frente a los cuales, cuando se presentan, no sabemos qué hacer.

[6]  R. CARRIÓ, op. cit., p. 28-29.

[7] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo:  Saraiva, 1999. p. 1-2.

[8] CARVALHO, op. cit., p. 3.

[9] SOUSA, António Francisco. Conceitos indeterminados” no direito administrativo. Coimbra: Almedina, 1994. p. 17.

 

[10] ENTERRÍA,  Eduardo Garcia  de; FERNÁNDEZ, Tomaz-Ramón. Curso  de  derecho administrativo. Madri: Civitas, 1984. p. 433.

[11] “la ley no determina con exactitud los límites de esos conceptos porque se trata de conceptos que no admiten una cuantificación o determinación rigurosa, pero en todo caso es manifiesto que se está refiriendo a un supuesto de la realidad que, no obstante la indeterminación del concepto, admite ser precisado en el momento de la aplicación”. “... Esto es lo esencial del concepto jurídico indeterminado: la indeterminación del enunciado no se traduce en una indeterminación de las aplicaciones del mismo, las cuales sólo permiten unaunidade de solución justa’ en cada caso.”

[12] ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. Lisboa:  Calouste Gulbenkian, 2001. p. 208.

[13] HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002. p. 34.

[14] CONCEIÇÃO, Maria Domingos Nigro. Conceitos indeterminados na constituição requisito da relevância e urgência (art. 62 da CF). São Paulo:  Celso  Bastos, 1999. p. 47. 

[15]  ZANCANER, Weida. op. cit., p. 205-210.

[16] SOUSA,  op. cit., p. 24.

[17] BARRETO, Aires Fernandino. Base de  cálculo,  alíquota  e  princípios  constitucionais. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1998. 164 p.

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