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Controle de Constitucionalidade e o Vício de Decoro Parlamentar


Autoria:

Bruno Simão Lobato


Advogado- OAB/PA 14994.

Resumo:

Este artigo tem como objetivo analisar o controle de constitucionalidade no Brasil, demonstrando que a falta de decoro dos políticos no processo de criação da norma configura-se uma espécie de inconstitucionalidade.

Texto enviado ao JurisWay em 11/06/2009.



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CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E O VÍCIO DE DECORO PARLAMENTAR
 
 
  1. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
 
Em todas as sociedades conhecidas, por mais antigas que sejam, aonde exista um grupo social, mesmo que pequeno, seja numa pequena aldeia, seja numa sociedade mais avançada, mesmo que ainda precária, encontra-se o fenômeno jurídico, que resguardava os direitos que estas sociedades consideravam como primordiais. Sempre existiu uma norma de consulta regendo a atuação do homem nas suas relações com o outro.
Os ordenamentos jurídicos conhecidos, desde a Antigüidade até os tempos atuais, consagraram e consagram determinadas normas que deveriam prevalecer sobre as demais. Essas normas, ditas superiores, por mais que em tempos remotos não aplicassem os conceitos atuais de Constitucionalismo, resguardavam direitos que o povo tinha como primordiais ou basilares de uma sociedade organizada, dando indícios de como seriam as constituições atuais.
Para resguardar a supremacia destas normas superiores foi criado o sistema do Controle de Constitucionalidade das normas, inicialmente vislumbrado em Atenas no séc. V a.C., com o denominado graphé paranomon, mas que foi desenvolvido nos moldes atuais a partir de 1800, com o judicial review, nos Estados Unidos, com o célebre caso Marbury VS Madison.
No ano de 1800, nos Estados Unidos da América, ocorrera um fato que marcaria para sempre a história do constitucionalismo no mundo. Neste ano, ocorreria a sucessão Presidencial no mencionado país. O até então Presidente John Adams foi derrotado por Thomas Jefferson e, em sua última manobra política, imaginou um plano, juntamente com seus aliados federalistas, para continuar tendo influência no Judiciário americano. Este fato seria, mais a frente, objeto do primeiro caso de controle de constitucionalidade difuso e fora denominado de judicial review (BARROSO, 2008, p. 5).
Eles aprovaram leis no Congresso que, em suma, traziam as seguintes medidas: criaram 16 novos cargos de juiz federal; reduziram o número de ministros da Suprema Corte, para que o novo Presidente não pudesse nomear outros ministros; e, por fim, permitiram a nomeação de 42 juízes de paz. Este último fato ocorreu na véspera na posse do novo Presidente Thomas Jefferson.
O secretário de Estado de John Adams, na época, era John Marshall, que ficou incumbido de entregar os atos de investidura aos novos juízes de paz. Ocorre que, tendo apenas um dia para realizar esses atos, não conseguiu efetuar a entrega dos atos de investidura a todos os novos juízes de paz.
No dia posterior, o Presidente eleito dos EUA tomou posse de seu cargo, e nomeou James Madison como seu Secretário, orientando-o a não investir ao cargo de juiz de paz os nomeados pelo antigo Presidente. Dentre os 42 nomeados, estava William Marbury, que havia sido indicado para exercer tal função em Washington e, almejando ser empossado para o cargo o qual havia sido nomeado, interpôs ante a Suprema Corte Norte-Americana uma ação judicial conhecida como writ of mandamus.
O Presidente da Suprema Corte norte-americana John Marshall – Chief Justice como é chamado, passou a analisar o caso e, no decorrer de seu voto, fez constatações que seriam um marco na história e serviriam de base para o controle de constitucionalidade.
Na explanação de seu voto, foram destacados três grandes fundamentos, que servem de base até hoje para o controle de constitucionalidade: a supremacia constitucional, a nulidade da lei que contrarie a Constituição e a afirmação de que o poder judiciário é o interprete da Constituição.
O sistema normativo é bastante amplo, composto por normas e princípios que regem as relações sociais do povo. Ocorre que, para haver um sistema harmônico, deve haver um meio pelo qual se possa corrigir eventuais falhas nesse sistema. É o que se passa com o Controle de Constitucionalidade, que verifica a adequação entre qualquer ato normativo e a Constituição. Uma eventual contrariedade entre a norma infraconstitucional e a norma constitucional gera a nulidade da primeira.
O controle de constitucionalidade visa diretamente analisar a compatibilidade das normas infraconstitucionais em relação à Constituição[1], entretanto, indiretamente, ele resguarda muito mais do que isto. O Controle de Constitucionalidade resguarda os ideais do povo que estão presentes na Constituição, sua própria legitimação.
Através de uma análise das previsões constitucionais, podemos então dizer que o Controle de Constitucionalidade é uma série de mecanismos criados para impedir que um ato normativo contrário à Constituição permaneça no ordenamento jurídico, cumprindo um papel fundamental no Estado Democrático de Direito, qual seja, a defesa da supremacia material da Constituição. Busca-se pautar as condutas do Poder Público para privilegiar, exclusivamente, o Estado e a comunidade.
 
 
2. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E O VÍCIO DE DECORO PARLAMENTAR
 
O decoro parlamentar, que é a conjunção de valores, como o da moralidade, o da honestidade, o da legalidade, o da impessoalidade, o da supremacia do interesse público, o da boa-fé e outros tantos é, sem dúvida, um fator extremamente importante, se não for o mais importante, para o desempenho da função legislativa de um Estado.
O povo investe um cidadão de um poder para representá-lo e buscar melhoras para a sociedade. O problema é que muitas vezes isso é esquecido por esses políticos a partir do momento que conseguem estar no poder. O povo se torna prejudicado e a sociedade ideal fica cada vez mais distante da realidade
O Poder Legislativo tem a competência típica de legislar, ou seja, os políticos têm a responsabilidade e a incumbência de traduzir, através de normas, o sentimento social, uma demanda que traga uma mudança social positiva, os anseios do povo que lhe colocou no poder, que o escolheu para ser representado no Poder Legislativo. O político deve ser a voz do povo no Congresso Nacional.
Ocorre que, além de ser o responsável pela atividade legisferante, deve o político exercer-la com decoro. Entende-se por decoro parlamentar o conjunto de princípios e normas de conduta que devem orientar o político durante o exercício de seu mandato. O decoro parlamentar deve estar presente em cada atitude do político no desempenhar de seu mister, sob pena de atos serem ilegítimos e, em algumas situações, inconstitucionais.
O decoro parlamentar está diretamente ligado com a honradez e dignidade moral de todos os componentes do Poder Legislativo. O político deve ser, ou pelo menos deveria, um exemplo para a sociedade, deve ser um cidadão incansável na busca do bem da sociedade. Mas, atualmente, o que se tem é uma sensação contrária a isto.
Por sua vez, um ato ou norma que se mostre contrário a Constituição, deve ser considerado ilegítimo e inconstitucional, na medida em que fere dois preceitos: primeiramente, não se adéqua aos valores essenciais de um povo seja este positivado ou não e, ao mesmo tempo, não se harmoniza com a Lei Maior de um Estado, a que confere validade a todas as outras.
A falta de decoro se configura num ato totalmente contrário aos ditames constitucionais, um vício de comportamento tão grave que resulta ao político a perda do mandato.
A figura do político deveria ser exemplar, suas atitudes em seu mister deveriam estar impregnadas de todos os valores que aquele povo que o elegeu tem como imprescindíveis, devem se pautar nas normas e princípios constitucionais. Eles deveriam servir de exemplo para a sociedade. A situação no Brasil, entretanto, é bem diferente. Processos de improbidade administrativa são bem visíveis, CPI’s e escândalos, como o do “mensalão”, mancham o Poder Legislativo. A descrença do povo em relação ao homem político é constante. 
Não se pode admitir que um ato político que esteja viciado pela falta de decoro parlamentar influencie em toda a sociedade, regule seus atos, modifique suas relações jurídicas. O que se espera do político nada mais é do que trabalho honesto que vise melhoria do povo.
O Legislativo tem como função principal a de legislar e fiscalizar, competências inerentes à vida de todos os indivíduos de uma sociedade, mas este Poder também precisa ser fiscalizado. Devem existir mecanismos para que as atividades deste Poder também sejam fiscalizas. Eventuais desvios de objetivo do Legislativo devem ser “freados” se ultrapassarem o limites aceitos, para que sua função seja desempenhada de modo correto e, em conseqüência disto, para que eventuais normas jurídicas, que sejam elaboradas em troca de vantagens de qualquer tipo, não subsistam no mundo jurídico.
Monstesquieu já imaginava que todo poder ilimitado, que não seja “freado” (checks and balances), fiscalizado, quando ocorrerem desvios, tem contornos de abuso e tende a se afastar do seu ideal, vejamos:
 
[...] todo homem que tem poder é levado a abusar dele. Vai até onde encontrar limites. Quem diria! A própria virtude precisa de limites. Para que não possam abusar do poder, pela disposição das coisas, o poder freie o poder. (MONTESQUIEU, 1987, p. 136).
 
É aí que entra o papel do Judiciário, que deve “frear” os abusos e desvios realizados pelo Legislativo na edição de normas, declarando- as inconstitucionais se não se enquadrarem com os ditames constitucionais.
 É necessário, também, que se punam os políticos que atentem contra o decoro parlamentar tanto na esfera criminal, como na civil, administrativa, mas, sobretudo, o próprio povo deve fazer essa punição, não elegendo os candidatos que cometam esses atos.
Após a elaboração das leis pelas assembléias competentes, ela se despersonaliza, se desvincula do ente político que a criou, resultando a norma, não como algo que alguém disse ou quis, e sim como manifestação de uma vontade coletiva, como se o povo estivesse se manifestando. Será que uma norma que tenha sido criada com o vício de decoro parlamentar pode ser assim considerada? Com absoluta certeza, não! É justamente esse o grande vício que atenta contra a Supremacia Constitucional e o Estado Democrático de Direito. Essas normas que desrespeitam tais preceitos constitucionais devem ser declaradas inconstitucionais e, por conseguinte, nulas.
O Poder Legislativo é o depositário da soberania. É ele que, em tese, representa a vontade do povo e que deve promover a felicidade da sociedade. A cada momento que o Legislativo não cumpre esse papel, quando passa a galgar interesses próprios ou de uma minoria, acaba se afastando do povo que lhe investiu no Poder.
Em um Estado Democrático de Direito, no qual se busca uma supremacia material dos princípios e normas constitucionais, não é admissível que políticos passem por cima destas normas e princípios constitucionais. Ocorrendo isto, é o mesmo que passar por cima de valores dos indivíduos. O processo de criação da norma deve ter como fundamento a melhoria da situação do povo, caso contrário, entendemos estar configurado o vício de decoro parlamentar.
 
 
 
  1. CONCLUSÃO
 
Para um efetivo Estado Democrático de Direito, previsto expressamente pela Constituição Federal de 1988, faz-se mister atender a todas as normas e princípios constitucionais, sob pena destes serem vistos apenas como “letra morta”, mera supremacia formal, uma teórica realidade que pouco, ou quase nada, beneficia o povo.
O Poder Judiciário, através do Supremo Tribunal Federal, deve analisar os casos que envolvam a falta de decoro e deve declarar nula a norma que esteja eivada com a ausência de decoro parlamentar. É certo que muito melhor seria se fosse criado um Tribunal Constitucional, imaginado por Kelsen, com função exclusiva de analisar os atos que contrariem a Constituição, seria um guardião dos princípios e das normas constitucionais. Este Tribunal agiria como uma espécie de Poder moderador atuaria como uma espécie de legislador negativo, eliminando do ordenamento jurídico as leis que se mostrem contrárias a Constituição, corrigindo eventuais abusos de quaisquer dos três Poderes desempenhados pelo Estado.
Enquanto não houver previsão legal específica acerca da inconstitucionalidade pelo vício de decoro parlamentar, deve o Supremo Tribunal Federal (na ausência do Tribunal Constitucional imaginado por Kelsen) se manifestar sobre o assunto, estendendo os efeitos de inconstitucionalidades ao processo legislativo onde for comprovada a ausência de decoro por parte dos políticos.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS
 
 
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[1] Essa compatibilidade, em que a CF confere validade as demais normas, é fruto de uma supremacia constitucional, demonstrada por Kelsen através de sua pirâmide jurídica.
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