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O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E A CRÍTICA JORNALÍSTICA


Autoria:

Wanessa Moreira


Advogada; Pós Graduada em Docência universitária; Especialista em Direito Público; Experiência acadêmica consignada em estágio lotada no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás durante 2 anos; Experiência profissional em todas as atividades inerentes ao exercício da Advocacia.

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Resumo:

A presente discussão consubstancia-se na abordagem de teses acerca do Princípio da Presunção de Inocência, instituto previsto no artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal, bem como sua incorporação ao ordenamento jurídico e sua aplicabilidade.

Texto enviado ao JurisWay em 21/10/2014.



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O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E A CRÍTICA JORNALÍSTICA[1]

Wanessa Moreira Cândida[2]

Alano Franco Bastos[3]

 

Resumo: A discussão que abrangerá o presente artigo científico consubstancia-se na abordagem de teses acerca do Princípio da Presunção de Inocência, instituto previsto no artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal, bem como sua incorporação ao ordenamento jurídico pátrioe ainda a sua aplicabilidade em casos concretos. Na sequência, asseverar-se-á a importância da efetivação do aduzido princípio sob o prisma dos Princípios Constitucionais que regem os direitos e deveres do cidadão e dos órgãos julgadores, a fim de se evitar a aplicação errônea das sanções punitivas pertinentes acada situação. Após, passar-se-á a análise do exercício da imprensa e da mídia, no que tange à publicação de notícias acerca de fatos delituosos, haja vista o recurso, por tais meios de comunicação, a divulgação sensacionalista dos acusados, com o ferimento do Princípio da Presunção de Inocência constitucionalmente garantido a todos os indivíduos. Oportunamente, serão obtemperadas nuances relativas aos reflexos midiáticos sobre os magistrados e os jurados, e, ainda, a possibilidade de sobreposição entre dois direitos, quais sejam: presunção de inocência ou liberdade de imprensa.

 

Palavras Chaves: Constituição Federal, Presunção Inocência, Mídia, Processo Penal, Divulgação, Sensacionalismo.

 

 

THE PRINCIPLE OF PRESUMPTION OF INNOCENCE AND CRITICAL JOURNALISTIC

 

Abstract: The discussion will cover this Article scientific approach is embodied in the thesis about the Principle of Presumption of Innocence, institute referred to in Article 5, section LVII of the Federal Constitution, as well as their incorporation into the national legal system and yet its applicability in specific cases. Further, it will assert the importance of the realization of the principle put forward the perspective of Constitutional Principles that govern the rights and duties of citizens and judicial Organs, in order to avoid misapplication of punitive sanctions relevant to each situation. After passes the analysis of the exercise of press and media, regarding the publication of news about criminal acts, given the use by such media, sensational disclosure of the accused, with the injury Principle presumption of Innocence constitutionally guaranteed to all individuals.  In due course, will be analyzed nuances concerning media reflections on judges and juries, and also the possibility of overlap between two rights , namely: the presumption of innocence and freedom of the press.

 

Keywords: Constitution, Presumed Innocence, Media, Criminal Procedure, Disclosure Sensationalism.

 

1. Introdução

A variedade dos meios de comunicação presente no cotidiano brasileiro, bem como a facilidade de acesso a eles, permite a população adquirir diversas informações acerca de tudo que acontece no mundo.

No entanto, a problemática que será apresentada no presente artigo está inserida na qualidade das informações adquiridas através de referidos meios de comunicação, isto porque, nas hipóteses em que a imprensa possui uma qualidade sensacionalista, a notícia asseverada pode tornar-se perigosa, haja vista que, o fato de repassar uma informação sem maiores compromissos com a verdade cuja única finalidade é garantir audiência, tal como ocorre frequentemente, em manifestodesrespeito ao princípio da presunção de inocência, garantido constitucionalmente, o que consequentemente colabora para a execração pública do suposto autor do fato delituoso, haja vista que as opiniões do público muitas vezes são manipuladas.

Nesse contexto, em complemento as observações obtidas no presente trabalho, realizou-se, outrossim, uma pesquisa com um mui digno e atuante magistrado sobre a eficácia do Principio da Presunção de Inocência no Brasil, bem como acerca da possibilidade de que os jurados que compõem o Conselho de Sentença do Tribunal do júri serem manipulados pela mídia ao exararem suas decisões.

 

2. Conceito

 

Conforme se denota do teor do artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal, ninguém será considerado culpado até que haja uma sentença penal condenatória transitada em julgado.

Após análise interpretativa de referida norma jurídica, conclui-se que o Princípio da Presunção de Inocência está positivado no respectivo artigo.

O aludido princípio se refere a um direito que atribui ao acusado de determinado fato delituoso a garantia de que não será considerado culpado, sem que haja o devido processo legal e uma sentença penal condenatória que lhe aplique uma sanção pelo ato pratico.

O respeito ao Princípio da Presunção de Inocência possui o condão de evitar a aplicação açodada das sanções punitivas previstas no ordenamento jurídico, garantindo ao acusado um julgamento justo proferido por sentenças não oriundas de um juízo de valor pré-existente.

Alexandre de Moraes (2007) leciona que, o princípio da presunção de inocência é um dos preceitos basilares do Estado de Direito, e como garantia processual penal, visa à tutela da liberdade pessoal, salientando a necessidade de o Estado comprovar a culpabilidade do indivíduo, que é de forma constitucional presumido inocente, sob pena de retrocedermos ao estado de total supressão dos direitos e garantias individuais.

Destarte, a norma constitucional em tese, não declara que o acusado seja inocente de modo absoluto, portanto, o que tal preceito institui é que o não pode ser imediatamente responsabilizado pela prática do delito que lhe é imputado sem antes responder ao due process of law, onde lhe será assegurado o contraditório e o recurso a todos os meios de defesa legalmente permitidos.

Portanto, o Princípio Constitucional da Presunção de Inocência é considerado extremamente importante, pois, sob sua égide, o acusado de cometer determinada infração é protegido para que não sofra uma sanção punitiva de forma antecipada. Isto é, ele não corre o risco de ser apenado pela prática de um delito sem que haja o devido processo legal.

 

3. Contexto Histórico do Princípio da Presunção de Inocência

 

Em sua obra, Edilson Mougento Bonfim (2009) leciona a respeito dos precedentes históricos do princípio da presunção de inocência, informando que “tal dispositivo se positivou pela primeira vez no artigo 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão na data de 26 de agosto de 1.789. Inspirado na razão iluminista de intelectuais como Voltaire e Rousseau. Posteriormente foi reafirmado no artigo 26 da Declaração Americana de Direitos e Deveres, em 22 de maio de 1948. E no artigo 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Assembléia das Nações Unidas, em 10 de dezembro do ano de 1948.”

Nessa esteira de raciocínio, Leonir Batisti (2009) esclarece que, “a Constituição de 1.988, seguindo certa tendência, foi redigida de modo a regrar todos os assuntos de forma minuciosa, com exceção daqueles que não obtiveram algum consenso, os quais foram remetidos para a legislação ordinária”.

 Tematicamente, a Constituição Federal colocou em precedência os princípios fundamentais da República e os direitos e deveres individuais e coletivos. E pela primeira vez apareceu nas constituições à presunção de inocência. Embora ainda não se mencione a expressão tradicional "presunção de inocência". Haja vista ter sido adotada a linguagem inversa: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" (BATISTI, 2009).

Portanto, no que tange a evolução dos direitos e garantias que o Princípio da Presunção de Inocência oferece, Edihermes Marques Coelho leciona que:

“As funções do Direito Penal, assim, podem ser sintetizadas como, por um lado, o controle social, através de mecanismos simbólicos de prevenção. Por outro lado, paralela e paradoxalmente, a garantia do indivíduo frente ao Estado e suas pretensões de intervir sobre a liberdade individual. É no contraponto entre essas duas faces da esfera penal que se pode destacar que o Direito Penal contemporâneo caminha para ser uma esfera jurídica centrada no enaltecimento do ser humano como referência e razão principal das relações sociais”. (COELHO, 2011)

 

Dessa forma, pode-se afirmar que o Direito evolui em conformidade com as demandas da sociedade, entrementes, cumpre ressaltar que sempre deverão ser levados em consideração os direitos inerentes à personalidade do indivíduo, autor e possuidor da proteção oriunda do ordenamento jurídico.

 

4. A repercussão infraconstitucional do Princípio da Presunção de Inocência e sua integração no Ordenamento Jurídico Brasileiro

 

A Legislação Brasileira carece de norma precisamente positivada que estabeleça uma proposição ou um conceito acerca do que é o Princípio da Presunção de Inocência, daí o recurso à hermenêutica, pela qual se pode afirmar que a integração de tal preceito ao ordenamento jurídico brasileiro encontra-se prevista no Artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal da República Brasileira, sendo certo que o mesmo pode ser apontado como um desdobramento do princípio do devido processo legal.

Ressalte-se que referida norma constitucional é categórica em dispor que: “ninguém será considerado culpado até o transito em julgado da sentença penal condenatória.”.

Destarte, considerando a hierarquia da aludida Lei Fundamental, é cediço que o ordenamento jurídico infraconstitucional,tempor obrigação editar normas que possibilitem o equilíbrio entre o interesse punitivo estatal e o direito de liberdade, concedendo-lhe efetividade.

Com efeito, o sistema normativo constitucional exerce grande influência sobre os demais ramos da legislação que compõe o Direito brasileiro.

Insta mencionar que os reflexos e implicações do estado de inocência estão explícitos também no Pacto de São José da Costa Rica, ao salientar em seu artigo 8°, inciso I, que, “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.”

Nesse ponto, frise-se que, conforme se denota do teor do § 2° do artigo 5° da Constituição Federal, o mencionado preceito legal, conquanto se trate de dispositivo internacional, possui valor legal no ordenamento jurídico brasileiro, sendo taxativa a norma constitucional ao declarar que, “Os direitos e garantias expressas nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Desta forma, o princípio da presunção de inocência é assegurado no Ordenamento Jurídico Brasileiro, por duas normas: o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, segundo o qual "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" e o art. 8, I, do Pacto de São José da Costa Rica, retro citado.

Nesse diapasão, Mirabete leciona que "existe apenas uma tendência à presunção de inocência, ou, mais precisamente, um estado de inocência, um estado jurídico no qual o acusado é inocente até que seja declarado culpado por uma sentença transitada em julgado. Por isso, a nossa Constituição Federal não ‘presume’ a inocência, mas declara que ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (art. 5º, LVII), ou seja, que o acusado é inocente durante o desenvolvimento do processo e seu estado só se modifica por uma sentença final que o declare culpado. (Mirabete, 2001)”.

 

5. A Publicidade dos Atos Processuais

 

Os atos processuais proferidos pelo Estado possuem a obrigatoriedade de serem públicos. Trata-se de um direito caracterizado pela finalidade de oportunizar o controle da opinião pública no que tange aos serviços judiciais, especialmente sobre o poder de que foi investido o Juiz.

Destarte, a publicidade conferida aos atos judiciais possui o condão de assegurar aos cidadãos a eficaz aplicação da justiça, haja vista que esta medida torna transparentes as decisões dos magistrados durante a persecução do processo.

Nessa esteira de raciocínio o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, com redação determinada pela Emenda Constitucional  nº 45, de 08 de dezembro de 2004 aduz que:

“[...] todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.

Ressalte-se ainda que, consoante disposição elencada no artigo 5°, inciso LX da Constituição Federal, “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou interesse social o exigirem.”

Portanto, o principio da publicidade confere oportunidade para que além das partes, toda a sociedade tenha acesso e adquira ciência das decisões promulgadas pelo judiciário.

 

5.1 O Princípio da Publicidade frente ao Direito à Intimidade

 

O princípio da publicidade, conforme leciona Luiz Rodrigues Wambier, existe para vedar o obstáculo ao conhecimento. Todos têm o direito de acesso aos atos do processo, exatamente como meio de se dar transparência à atividade jurisdicional (WAMBIER, 2011).

Todavia é necessário enfatizar que, a dignidade da pessoa humana, considerada como principio fundamental, está prevista no artigo 1°, inciso III da Constituição Federal, e somente estará devidamente assegurada quando for possível ao ser humano uma realidade que permita a plena efetividade de todos os direitos fundamentais.

Isto porque oreferido princípio consagra uma proteção contra tudo que possa levar o ser humano ao menosprezo.

É necessário, portanto, promover uma solução da dicotomia entre publicidade e intimidade. Dessarte, nenhum dos princípios asseverados deverá ser interpretado de maneira irrestrita e absoluta. Pretende-se, dessa forma, efetivar uma relativização do principio da publicidade em face do direito a intimidade.

Essa é a orientação do Supremo Tribunal Federal:

“Os direitos e garantias individuais não têm caráter absoluto. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas estão sujeitas – e considerado o substrato ético que as informa – permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.” (MS 23.452/RJ, Relator Ministro Celso de Mello, j. em 16 set. 1999).

 

Logo, a intenção não é de se invalidar o principio da publicidade. Os atos processuais devem ser públicos, porém, tal como permitido pela própria Constituição Federal, há de se existir a possibilidade de restrição à publicidade em determinadas situações, sejam elas, quando a defesa da intimidade ou o interesse social exigirem (CF/88, artigo 5°, LX).

 

6. A Liberdade Jornalística

 

Em seu artigo 5°, incisos IV e XIV, respectivamente, a Constituição Federal da República Brasileira assegura as liberdades de manifestação de pensamento e informação, sendo certo que, existe uma relação de interdependência entre elas.

Assim sendo, a Constituição empenhou-se em proteger tais liberdades, consagrando-as como um direito fundamental, isto é, um direito garantido a todos os indivíduos com a finalidade de impedir a criação de empecilhos ao livre trânsito das informações, por parte do poder público.

Nesse diapasão, o artigo 220 da Constituição Federal de 1988 prevê que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veiculo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Verifica-se que no texto constitucional acima mencionado há o emprego pelo legislador da expressão “sob qualquer forma”, determinando, dessa maneira, conforme dispõe o § 1° do mesmo, que a liberdade à informação, inclusive à informação jornalística nos meios de comunicação social, deve ser plena, não podendo nenhuma lei conter dispositivos que possam gerar embaraços a ela, sendo vedada qualquer espécie de censura prévia, segundo dispõe o § 2° do mesmo artigo.

Assim, a Constituição Federal gera repulsa a qualquer tipo de censura prévia à imprensa, significando dizer que nenhum texto ou programa destinado à exibição ao público necessita, previamente, ser submetido a controle ou intervenção (MORAIS, 2005).

Importante ressaltar que, a desnecessidade de prévia submissão a algum tipo de controle das informações repassadas pela imprensa, não deve ser interpretada como maneira de proporcionar a imprensa uma liberdade absoluta. É necessária a existência de algumas restrições no exercício da liberdade jornalística afim de que esta, não entre em conflito com outros direitos fundamentais igualmente garantidos constitucionalmente.

A função da imprensa é proporcionar a constituição da opinião do público, utilizando-se para tanto, o pensamento crítico, daquele juízo de valor ou opinião, o qual recai sobre a notícia, e oportunizar reflexões construtivas para que os receptores da mesma possam fazer suas renúncias e escolhas diante do que lhes é exigido pela sociedade.

Frise-se que as notícias veiculadas devem dispor de um caráter de verdade e serem relevantes ao interesse público social, pois, do contrário não há que se falar em liberdade de informação jornalística.

Assim, caso a imprensa pretenda divulgar fatos ou notícias que não apresentem nenhuma finalidade pública ou possuam caráter jornalístico e que disponham do potencial para acarretarem danos à dignidade humana, tais matérias podem ser previamente proibidas, além de possível responsabilidade posterior em virtude do abuso no exercício do direito à informação (MORAIS, 2005).

 

7. Descaracterização do Princípio da Presunção de Inocência pela Mídia

 

A mídia, tal como sugere seu próprio nome, desempenha o papel de mediadora entre os sujeitos e as notícias, o que significa que ela é o instrumento que transmite a realidade levada às pessoas, através dos mais variados meios de comunicação.

A presença dos meios de comunicação no cotidiano brasileiro é algo normal na maioria das residências do país, o que permite à população acessar as mais variadas informações acerca de tudo que acontece no mundo. No entanto, o problema encontrado, em referida situação, reside na qualidade das informações adquiridas através de referidos meios de comunicação, isto porque, nas hipóteses em que a imprensa possui uma qualidade sensacionalista, a notícia asseverada pode tornar-se perigosa, haja vista que, muitas vezes as informações midiáticas são repassadas de forma ilimitada, com a única finalidade de garantir audiência.

Logo, a rapidez e versatilidade com que referidas notícias são transmitidas, consequentemente, possui o condão de desrespeitar o princípio da presunção de inocência, bem como inúmeros princípios fundamentais. Isto porque, é notório o interesse que possuem os operadores de jornalismo em divulgar notícias relacionadas a crimes utilizando-se de um imenso sensacionalismo como forma de auferir proveito próprio, o que muitas vezes provoca a manipulação da opinião pública e consequentemente colabora com a execração do suposto autor do fato delituoso, situação essa que desrespeita completamente as vertentes do princípio da presunção de inocência.

Quando a imprensa outorga a possibilidade da realização de determinado delito a uma pessoa, paira até então, um sentimento de dúvida, no que tange ao cometimento ou não da infração. Todavia, nas hipóteses em que ela promove um pré-julgamento, o indivíduo passa a ser visto como culpado pela sociedade, situação esta, que se opõe ao principio norteador do processo penal e à garantia constitucional que assegura ao acusado ser considerado inocente até a sentença penal condenatória não mais passível de qualquer recurso.

Destarte, necessário se faz salientar que o limite da liberdade que possui a imprensa, deve terminar no exato momento em que começa a violar os direitos fundamentais garantidos a todos os cidadãos.

 

8. Liberdade de Imprensa X Presunção de Inocência

 

Ante o teor do que foi exposto, nota-se que o direito a liberdade de imprensa muitas vezes se choca com o direito a presunção de inocência. Dessa forma, necessário se faz obter uma solução apta a resolver o impasse existente entre esses dois direitos ou garantias fundamentais.

De outro norte, insta asseverar acerca da existência de semelhança entre referidos direitos, haja vista que, ambos se perfilham como direitos fundamentais ligados a liberdade pública, ou seja, determinam uma conduta negativa do Estado e extensiva aos particulares. Ambos são princípios norteadores do Estado Democrático de Direito, o que autoriza a presunção de que não é possível existir democracia sem liberdade de imprensa ou presunção de inocência.

De acordo com Carla Gomes de Melo, nas situações em que ocorre o choque entre a liberdade de imprensa e a presunção de inocência se está “diante de uma colisão de direitos fundamentais”. Ainda segundo a referida autora, para resolução de tal conflito é necessário analisar os detalhes de cada caso concreto, pois, como os direitos em conflito não podem ser hierarquizados, o caso concreto dirá qual deles deve recuar.

Dessa forma, nas hipóteses em que aduzidos direitos fundamentais se colidirem haverá a necessidade de utilização do princípio da proporcionalidade, que, segundo Jairo Gilberto Schäfer e Nairane Decarli, permite que o magistrado; diante da colisão de direitos fundamentais, decida de modo que se maximize a proteção constitucional, impedindo o excesso na atividade restritiva aos direitos fundamentais. O objetivo não é anular um ou outro princípio constitucional, mas encontrar a solução que mantenha os respectivos núcleos essenciais (SCHÄFER, DECARLI,2007).

Portanto, na hipótese de colisão entre liberdade de imprensa e presunção de inocência, direitos fundamentais, não sendo possível a conciliação entre eles, conclui-se que a liberdade de imprensa deve ceder de maneira adequadamente equilibrada, frente ao principio da presunção de inocência, haja vista que não é admissível que a liberdade de imprensa prepondere em detrimento de direitos e garantias fundamentais do indivíduo.

 

9. Reflexos midiáticos sobre os magistrados e jurados

 

Inicialmente, cumpre salientar que a mídia exerce influência na opinião do público, isto porque, a maioria dos indivíduos utiliza-se dos meios de comunicação para manterem-se informados acerca do que acontece no Brasil e no mundo.

Porém, as noticias propagadas nos mencionados meios de comunicação, por vezes, estão despidas de verdades, podendo então ser definidas como parcialmente corretas, uma vez que demonstram somente a maneira como o jornalista analisa e retrata determinada situação ou fato, demonstrando, muitas vezes, uma única versão do ocorrido, ocultando assim esclarecimentos e informações precisas, e veiculando somente a maneira de interpretar de determinado meio de comunicação.

Por outro lado, considerando a liberdade que possui a imprensa, a exploração de alguns assuntos de maneira exacerbada e sensacionalista acaba por estabelecer uma suposta verdade acerca do caso ocorrido, que nem sempre condiz com a verdade propriamente dita dos fatos.

Segundo Carla Gomes de Mello, “o veículo midiático sensacionalista faz da emoção o principal foco da matéria, esquecendo-se do conteúdo da notícia a ser repassada, se é que ela existe”.

Assim sendo, as pessoas acabam por formarem suas opiniões baseando-se somente naquilo que foi explanado pela mídia. E isto ocorre principalmente em razão da falta de tempo que possui a maioria dos indivíduos da sociedade para pesquisarem mais a fundo sobre as notícias veiculadas, bem como a necessidade de se manterem informados, restando como opção a eleição de um jornal ou site da internet, muitas vezes ligados a mesma empresa de comunicação, para interar-se acerca dos acontecimentos mundiais.

Dessa forma, a absorção das notícias acaba por ser exatamente nos termos em que a imprensa deseja que seja, isto é, com conteúdos valorativos estabelecidos por ela própria.

Nesses casos, o público é manipulado pelas informações prestadas pela mídia, pois em que pese haverem diversos veículos de transmissões, todos eles procuram formas de propagarem as notícias da mesma maneira, com intuito de estabelecer uma verdade dos fatos, quando na verdade fica estabelecida é a verdade da mídia.

No âmbito do direito penal, a influência da mídia é exacerbada é sensacionalista, conforme afirma Carla Gomes de Mello, haja vista que segundo a autora, o crime, desde os tempos mais remotos, onde predominavam execuções públicas que se constituíam em verdadeiros espetáculos de horror, fascinava a população e era notícia. A mídia, sabedora desse fascínio e atração do público pelos acontecimentos violentos, desde então, explora o assunto.

Nesse diapasão, segundo entendimento de Luiz Flávio Gomes, não existe “produto” midiático mais rentável que a dramatização da dor humana gerada por uma perda perversa e devidamente explorada, de forma a catalisar a aflição das pessoas e suas iras. Isso ganha uma rápida solidariedade popular, todos passando a fazer um discurso único: mais leis, mais prisões, mais castigos para os sádicos que destroem a vida de inocentes indefesos.

No que se refere à repercussão sensacionalista proferida pela mídia em relação a crimes, insta trazer a baila o exemplo do “Caso Nardoni”. No caso em comento, o pai e a madrasta de Isabela Nardoni foram acusados e denunciados pelo Ministério Público em razão da suposta prática de homicídio doloso contra a criança. Ressalte-se que antes mesmo da propositura da ação penal pública incondicionada a imprensa veiculou, durante muito tempo, todos os dias, diversas notícias acerca do caso. Houve participação midiática durante todas as fases procedimentais pertinentes ao processo penal, e as simulações do crime foram apresentadas em diversas emissoras de televisão, situação esta que resultou na condenação pública do casal, ainda que considerados somente suspeitos. O casal foi considerado culpado pelos jurados que compuseram aquele Tribunal do Júri, tendo sido a referida decisão amplamente divulgada no cenário mundial, com o intuito de transmitir ao público a sensação de que a justiça teria sido feita.

Pois bem. No que se refere à influência da imprensa no mencionado caso, cumpre salientar a posição de Carla Gomes de Mello, a qual nos remete a tomar como exemplo, a edição n. 2057, da Revista Veja, de 23 de abril de 2008. Na capa, estampados estão os rostos do pai e da madrasta suspeitos de terem assassinado a menina Isabela. Logo abaixo da imagem, o título impactante, cujo final nos chama atenção, uma vez que escritos em tamanho maior e em cores diferentes da utilizada no início do texto: “Para a polícia, não há mais dúvida sobre a morte de Isabela: FORAM ELES”.

Desta feita, é cediço que a imprensa, utilizando-se de seu jornalismo investigado, ao divulgar os nomes dos envolvidos nas situações delituosas, interfere na vida dos acusados e até mesmo de suas famílias, promovendo-os ao julgamento social, ainda que ausente a evidenciação de provas de autoria de referidos crimes.

Assim sendo, uma vez que a opinião pública se torna contaminada, os juízos de valores transmitidos pela imprensa se tornam aptos a tolher a defesa dos acusados, o que fere integralmente o princípio da presunção de inocência.

Nesses casos, é nítida a ocorrência da condenação popular dos suspeitos, não levando se em consideração nem mesmo a situação em que ocorreu o crime, ou se ele foi praticado exatamente da forma em que é exposto.

Para Carla Gomes de Mello, não importa a sociedade ser manipulada pela mídia, se contra o suspeito houve tortura, o que o levou a confessar o ato criminoso, se, da mesma maneira, houve força excessiva, se ele está preso inocentemente e sem necessidade, se os direitos dele estão sendo violados, se ele tem a chance de não ser considerado culpado e se ele faz jus a um julgamento justo.

O problema da manipulação efetivada pela mídia sob a população é tão grave que, ela também pode exercer influência sobre a decisão dos jurados, haja vista que estes podem ter recebido previamente, por parte da mídia informações errôneas acerca da pratica do crime, situação esta, que pode influenciá-los no julgamento.

Insta mencionar ainda, a possibilidade de as notícias transmitidas pela mídia exercerem influência até mesmo nas decisões proferidas pelo Juiz de Direito competente para julgar o caso, pois já se verificou em diversos casos concretos, a decretação de prisão preventiva dos acusados fundamentada no clamor da sociedade por justiça.

Nesta esteira de raciocínio Carla Gomes de Mello, aduz que a força que os meios de comunicação produzem e projetam ao noticiarem um crime é passível de influenciar até mesmo o juiz, antes do momento adequado de decidir. Muitas vezes, pelo temor de gerar nos cidadãos a sensação de insegurança jurídica, juízes decidem da maneira como espera a mídia e toda a sociedade por ela influenciada.

 

10. O caso da Escola Base

 

Ocorrido no mês de março do ano de 1994, o chamado caso da Escola Base é considerado por diversos juristas e doutrinadores como um dos maiores erros cometidos pela imprensa brasileira no que tange à imputação de crimes às pessoas sem possuir um acervo probatório apto a comprovar a autoria do delito.

A Escola de Educação Infantil Base foi fechada no mencionado ano ante o fato de que seus proprietários, sócios e uma professora foram acusados de terem praticado abuso sexual contra alguns alunos.

No caso em comento, o início da confusão foi marcado na ocasião em que as mães, após perceberem um comportamento diferente nos seus filhos, os quais eram alunos na referida instituição, acreditaram que as crianças haviam sofrido abuso sexual, razão porque prestaram queixa contra três casais que trabalhava no colégio.

Ressalte-se que, o que levou as genitoras a acreditarem que seus filhos estavam sofrendo abusos sexuais foi o fato de uma das crianças ter falado algumas coisas à sua mãe que possuíram o condão de deixá-la espantada. Na ocasião, questionada a criança acerca de onde havia aprendido tais coisas, ela não soube responder à mãe. Em razão disso, a genitora começou a fazer suposições e decidiu conversar com mães de outras crianças, as quais, diante das respostas proferidas por seus filhos em conversas de mesmo teor, concluíram que as crianças realmente estavam sofrendo abuso sexual.

Os supostos autores do crime foram denunciados pelas mães das referidas crianças, e, em seus depoimentos, elas afirmaram que os donos da escola promoviam orgias sexuais com as crianças na casa dos pais de um dos alunos.

Asseveraram ainda que, o motorista do transporte que levava os alunos até a escola, bem como uma a sócia dos donos também estavam envolvidos no caso.

O delegado de polícia condutor do feito encaminhou as crianças ao Instituto Médico Legal e, na sequência requereu um mandado de busca e apreensão a ser cumprido na residência na qual, segundo as mães, aconteciam os abusos, na intenção de  encontrar vídeos, fotos, ou qualquer coisa que pudesse incriminá-los.

O referido mandado foi deferido e devidamente cumprido, todavia, não foi encontrado, na residência do casal, nenhum vestígio que hes pudesse imputar a autoria do crime. Por conseguinte, em razão da ausência de acervo probatório suficiente, o delegado retornou a delegacia, o que consubstanciou na indignação das mães, oportunidade em que decidiram acionar a Rede Globo de Televisão.

Assim, o caso foi amplamente divulgado em diversos jornais e comentado em todo o país.  A imprensa divulgou as informações que lhe foram passadas, sem se atentar ao cuidado de ouvir os responsáveis pela escola, e pelo fato de diversos veículos midiáticos estarem mostrando a figura das crianças e seus pais como vítimas, a opinião pública já tinha os acusados como terríveis vilões do ocorrido.

Dessa forma, o caso dos seis pedófilos que abusavam sexualmente de criancinhas em pleno horário de aula já tinha um veredicto popular.

Conseguintemente, os repórteres, ansiosos por notícias acerca do caso que gerava tanta repercussão, estimulavam o delegado condutor do caso a depor informações parciais e não comprovadas. Naqueles dias, raros foram os jornais que não apresentaram a Escola Base como manchete.

O Jornal Nacional sugeriu até mesmo a hipótese de consumo de drogas e contaminação pelo vírus HIV, enquanto a Folha da Tarde noticiava: “Perua carregava crianças para orgia”; o tablóide Notícias Populares, por sua vez, estampou a capa com o título: “Kombi era motel na escolinha do sexo”.

No momento em que surgiram os primeiros indícios de provas acerca da inocência dos acusados, o então delegado do caso foi substituído. Após, mencionado fato, a polícia recebeu uma denuncia anônima que a conduziu a residência de Richard Harrod Pedicini, que foi preso pela suspeita de tráfico das fotos de crianças, entre elas as da Escola Base. Entrementes, isso não foi devidamente comprovado.

Por conseguinte, os infantes foram conduzidos até a residência de Richard, a fim de que houvesse a possibilidade de reconhecimento do local, ocasião em que, uma das crianças, ao ver uma abelhinha de pelúcia jogada no chão, quis brincar com a mesma, o que foi suficiente para alegarem que a garota havia identificado a residência.

Diante disso, a imprensa logo lançou as afirmativas: “Alunos da Escola Base reconhecem a casa do americano”, e “Criança liga americano a abuso de escola” foram manchetes do Estadão e da Folha, respectivamente.

No dia 13 de abril, dois dias após a prisão de Richard e após tanta repercussão, foi esclarecido de que ele não tinha ligação com o caso Escola Base. Ele e os supostos culpados nem mesmo se conheciam.

Após a prisão preventiva de um dos casais acusados, os procuradores do mesmo tiveram acesso ao laudo do IML, ocasião em que perceberam que o seu resultado era completamente inconclusivo, haja vista que o documento alegava a existência de cicatrizes em uma das crianças que tanto poderiam ter sido ocasionadas por um abuso sexual como também por uma diarréia forte. Na sequência, a própria mãe da criança afirmou que seu filho sofria de uma constipação intestinal.

Nesse contexto, a situação dos acusados começou a passar por um processo de reversão, haja vista que foram aparecendo provas da inocência de todos os indiciados, tais como depoimentos de funcionários do colégio e dos pais de outros alunos.

Em razão do exposto, os suspeitos da prática de abuso sexual contra os menores da Escola Base foram inocentados no dia 22 de Junho de 1994, oportunidade em que, discretamente a imprensa começou a fazer suas retratações. Contudo, é necessário frisar que isso não foi suficiente para consertar os danos morais sofridos pelos acusados.

A emissora Rede Globo de televisão foi condenada a pagar um milhão e trezentos e cinqüenta mil reais a titulo de reparação dos danos morais sofridos pelos donos e pelo motorista da Escola Base de São Paulo, em um montante R$ 450 mil para cada um deles.

Os jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e a revista IstoÉ também já foram condenados.

Contudo, em  todos os casos já julgados, ainda não houve decisões do Superior Tribunal de Justiça. A decisão que prolatou condenação contra a Globo foi tomada por unanimidade pela 7ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP.

O TJ entendeu que a atuação da imprensa deve se pautar pelo cuidado na divulgação ou veiculação de fatos ofensivos à dignidade e aos direitos de cidadania.

 

11. Pesquisa de Campo

 

Inicialmente, cumpre salientar que a pesquisa foi realizada perante o Magistrado Glauco Antonio de Araújo, Juiz de Direito titular da Comarca de Mossâmedes-GO.

 

11.1 Método

 

Para realização da pesquisa foi utilizado um questionário contendo perguntas pessoais direcionadas ao magistrado com o objetivo de verificar, sob o ponto de vista daquele julgador, a eficácia ou não do principio da presunção de inocência nos procedimentos penais de sua comarca e das comarcas que já atuou bem como a possível influência que a mídia poderia exercer sobre os jurados membros do Conselho de Sentença.

 

11.2 Resultado

 

Questionado o magistrado acerca da existência ou não do necessário equilíbrio entre o interesse punitivo estatal e o direito a liberdade, exarou sua opinião no sentido de que, no geral, existe sim mencionado equilíbrio. Ressaltou que muitas vezes um possível desequilíbrio é ocasionado pela deficiência técnica dos advogados, cabendo o magistrado interferir quando ficar evidenciado prejuízo ao réu.

Quanto ao Princípio da Presunção de Inocência, o entrevistado afirmou que observa uma preocupação entre a maioria dos magistrados em somente decretar prisões cautelares quando haja real necessidade, embora muitos pequem por insuficiência de fundamentação concreta nas suas decisões.

No que tange ao seu posicionamento acerca do fato de o Conselho de Sentença ter contato com o caso a ser julgado apenas no plenário e suas decisões decorrerem apenas do que foi exposto pelos representantes das partes, afirmou que em que pese as criticas doutrinarias, não haveria condições de os jurados acompanharem ambas as fases do procedimento do Júri. Em sua opinião, as provas e os debates em plenário fornecem aos jurados subsídios suficientes para uma decisão por íntima convicção. Salientou ainda que, o argumento e a persuasão, seja da acusação, seja da defesa, sem o respaldo nas provas colhidas nos autos não enseja, de per si, uma condenação ou uma absolvição.

Por fim, questionado acerca da possibilidade de influencia da mídia nas decisões dos jurados naqueles crimes de grande repercussão, o magistrado afirmou acreditar na referida possibilidade. Salientou que, normalmente a mídia se deixa levar pela versão e provas apresentadas pela polícia, contribuindo negativamente para a formação prévia da convicção de um indivíduo que venha eventualmente compor o Júri. Porém, advertiu que não crê na existência de uma desconsideração das provas colhidas em plenário, mas sim uma leitura delas de modo mais tendencioso, em função das informações absorvidas pela mídia.

 

11.3 Conclusão

 

Conforme constatado no presente artigo, o principio da presunção de inocência, em que pese possuir força de norma constitucional, muitas vezes não é respeitado pela mídia, e a problemática dessa situação reside no fato de que muitas vezes, os meios de comunicação, através de suas reportagens, exercem uma tênue influencia sobre o procedimento penal de julgamento de acusados de fatos delituosos. 

A mídia ao exercer seu papel de veicular noticia para o mundo, exerce influencia na população mediante as informações e detalhes que divulga, o que conseguintemente possibilita a formação da opinião das pessoas que comporão o corpo de jurados responsável a julgar o caso publicado, haja vista que o Conselho de Sentença é formado por indivíduos inseridos na população.

Destarte, além da imparcialidade, também é colocado em risco o necessário respeito ao principio da presunção de inocência, haja vista que ninguém poderá ser considerado culpado até que haja uma sentença penal condenatória transitada em julgado.

Dessa forma, quando a notícia acerca de determinado fato criminoso é veiculada na imprensa, há um enorme desrespeito à dignidade da pessoa do suspeito, uma vez que sua identidade é revelada, sua privacidade é invadida e sua condenação é imediatamente decretada pela própria população.

A Escola Base é um exemplo dessa combinação desastrosa, in casu, má apuração policial e falta de ética jornalística. Assim, na corrida pelo furo de reportagem, vários jornalistas divulgaram informações equivocadas que destruíram, para sempre, a vida dos acusados.

Sendo assim, o presente trabalho concluiu que é perceptível o considerável poder de influencia dos profissionais da comunicação sobre a opinião da sociedade, e em razão disso, algumas vezes, o direito a  liberdade de imprensa deve ceder frente aos direitos fundamentais que ela fere, com a finalidade de que o corpo de jurados que venha a julgar o fato delituoso não seja incutido por uma opinião prévia, bem como para que as decisões de condenação proferidas pelos jurados não sejam oriundas de um juízo de valores produzido pela mídia.

 

 

Referências Bibliográficas

 

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WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil, 5. ed., São Paulo, RT, 2011.

 

 

 

ANEXO I

 

 

PESQUISA DE CAMPO PARA COMPLEMENTAÇÃO DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO


TEMA: O Princípio da Presunção de Inocência e a Crítica Jornalística

Nome e profissão do Entrevistado: Glauco Antonio de Araújo – Juiz de Direito

Acadêmica: Wanessa Moreira Candida

Mestre Orientador: Allano de Franco Bastos

 

QUESTIONÁRIO

 

1. No que tange a efetividade e eficácia do princípio da (Presunção de Inocência), Vossa Excelência, considerando a sua experiência efetivada nas Comarcas do Estado de Goiás, percebeu, nos procedimentos penais em que teve acesso, (e que já se encontravam na fase de cumprimento de sentença), a existência do necessário equilíbrio entre o interesse punitivo estatal e o direito a liberdade?

R – No geral, sim. O Sistema Processual Penal Brasileiro é concebido para que haja “paridade de armas” entre a acusação e a defesa. Muitas vezes o desequilíbrio é ocasionado pela deficiência técnica dos advogados, cabendo o magistrado interferir quando ficar evidenciado prejuízo ao réu. Quanto ao Princípio da Presunção de Inocência, tenho observado a preocupação da maioria dos magistrados em somente decretar prisões cautelares quando haja real necessidade, embora muitos pequem por insuficiência de fundamentação concreta nas suas decisões.

 

2.      No contexto mundial atual, a aparência dos indivíduos, na opinião de Vossa Excelência é um fato importante? Por quê?

R – Judicialmente, não. Acredito que a conduta social e os antecedentes de um indivíduo possa estigmatizá-lo, inclusive perante o Poder Judiciário, mas não sua aparência física. Afinal, julgamos os atos e não a aparência.

 

3.      Como Vossa Excelência se posiciona ante o possível choque dos institutos da prisão preventiva e o principio da presunção de inocência?

R – Na realidade não vejo como um choque, pois o Princípio da Presunção de Inocência pode e deve ser afastado nas ocasiões em que a prisão de um indivíduo for imprescindível, especialmente quando ficar demonstrado que a sua permanência em liberdade comprometerá a garantia da ordem pública ou econômica, a instrução criminal ou frustrará a aplicação da Lei Penal. A própria Constituição Federal excepciona o Princípio da Presunção de Inocência quando admite, fora dos casos de flagrante, as prisões provisórias “por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária” (art. 5º, LXI).

 

4.      Qual é a opinião de Vossa Excelência acerca da crítica que a doutrinária faz ao fato de o Conselho de Sentença ter contato com o caso a ser julgado apenas no plenário e suas decisões decorrerem apenas do que foi exposto pelos representantes das partes, propiciando que o melhor representado, aquele com maior poder de argumentação e de persuasão, terá mais chance de obter um julgamento favorável?

R – Na realidade, não haveria condições de os jurados acompanharem ambas as fases do procedimento do Júri. A meu sentir, as provas e os debates em plenário fornecem aos jurados subsídios suficientes para uma decisão por íntima convicção. O argumento e a persuasão, seja da acusação, seja da defesa, sem o respaldo nas provas colhidas nos autos não enseja, de per si, uma condenação ou uma absolvição.

 

5.         Considerando o douto conhecimento que Vossa Excelência tem sobre o tema: Tribunal do Júri, questiona-se: é possível que, em casos famosos, os jurados se deixem manipular pelas informações que receberam, antes, da mídia, desconsiderando, inclusive, as repassadas em plenário?

R – Acredito que sim. Normalmente a mídia se deixa levar pela versão e provas apresentadas pela polícia, contribuindo negativamente para a formação prévia da convicção de um indivíduo que venha eventualmente compor o Júri. Não creio que haja uma desconsideração das provas colhidas em plenário, mas sim uma leitura delas de modo mais tendencioso, em função das informações absorvidas pela mídia.

 



[1]Artigo Científico apresentado à Faculdade Montes Belos como requisito da obtenção do título de Graduação, Bacharel em Direito.

[2] Discente do Curso de Direito da FMB

[3] (Professor de Direito Constituciona e orientador do discente)

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