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A TRÍPLICE POSIÇÃO DA PESSOA JURÍDICA NA AÇÃO POPULAR E O INTERESSE PÚBLICO NO JUÍZO DO REPRESENTANTE LEGAL OU DIRIGENTE


Autoria:

Wilson Jose Costa Sousa


Advogado, Assessor Jurídico do Município de Juruti, Estado do Pará.

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Resumo:

A ação Popular e instabilidade subjetiva na relação processual no simples "juízo" de interpretação do interesse público na visão do respectivo representante legal ou dirigente. Sendo pertinente verificar a importância de tal fenômeno para o direito.i

Texto enviado ao JurisWay em 21/11/2013.



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Palavras-chave: Ação Popular. Intervenção móvel. Interesse público.

 

1 INTRODUÇÃO.

 

A Ação Popular um dos mais antigos instrumentos de defesa dos bens públicos e de participação popular, foi introduzido “em nosso constitucionalismo pela Carta Política de 1934, nele se mantendo até hoje com um único intervalo, na vigência da Carta de 1937, outorgada pelo Estado Novo”[1](ZAVASKI, 2011, p. 76). A norma constitucional auto-aplicável que foi regulamentada pela Lei nº Lei nº 4.717/65 permanece até os dias atuais, a qual inovou no mundo jurídico introduzindo aspectos processuais singulares, oportunizando aos Entes Públicos demandados movimentarem-se nos diversos polos da lide, desde que escorados no Interesse Público, de acordo com o art. 6º, §3º da Lei supracitada.

 

Os aspectos históricos e processuais da ação popular serão aprofundados, passando-se ao exame do instituto da “intervenção móvel” de acordo com o posicionamento da doutrina e da jurisprudência.

 

2. ORIGEM DA AÇÃO POPULAR.

 

A ação de caráter democrático têm suas origens no Direito Romano, que segundo J. M. Orthen Sidou[2] (1983, apud SOUSA MIRANDA; CHARLEI GOMES, 2012, p.3) com base nesse autor, confunde-se:

 

 

(...) com a história jurídica de todos os povos, haja a vista que este instrumento jurídico processual nasceu com o propósito de tutelar apenas o interesse privado, ou do grupo a que pertencia o indivíduo diretamente ofendido, em razão do mesmo ser um componente dos bens gentílicos, competindo-lhe exigir a reparação da ofensa à comunhão indivisa, eis que a ofensa ao indivíduo representava também uma ofensa aos bens coletivos.

 

 

O indivíduo agia “em defesa de um interesse que conquanto não próprio, ut singuli, é também seu, e frente a cujas ofensas resiste tal como resistiria se particularmente fosse afetado”[3] (Ibid, 1983, apud MIRANDA; GOMES, 2012, p. 03), ou seja, sendo a res publica, pertencia ao povo, e fazendo o cidadão parte daquela comunidade, cabia-lhe também fiscalizar aquilo que lhe pertence.

 

Observa-se então que a Ação visava inibir condutas lesivas ao patrimônio público, empregando caráter eminentemente sancionador, prevendo inclusive penas pecuniárias ao transgressor, o que levou a José Afonso da Silva[4] a dividi-la da seguinte maneira:

 

 

(...) de sepulchro violato, de base pretoriana, contra o violador de sepultura ou outra res sacrae; de effusis et deiectis, contra quem atirasse objetos sobre a via pública; de positis et suspensis, contra quem mantivesse, perigosamente, objetos em sacada ou beira de telhado; de albo corrupto, contra quem adulterasse o álbum [edito do pretor], prevendo-se pena de quinhentos áureos; de aedilitio edicto et redhibitione et quanti minoris, que tomava caráter popular quando instrumentada pelo edito de bestiis, objetivando impedir que animais perigosos fossem levados a lugares freqüentados pelo público; de termino moto, contra os que deslocassem as pedras demarcadoras das propriedades privadas; de tabulis, para impedir que o herdeiro abrisse a sucessão em caso de morte violenta da autora da herança, sem primeiro apurar a responsabilidade dos servos do falecido, a quem se reconhecia o dever de defendê-lo; assertio in libertatem, para se obter a liberdade de um escravo; interdito de homine libero exibendo, semelhante ao nosso hábeas corpus; de collusione detegenda, promovível em caso de conluio entre escravos e seus antigos donos, quando estes declarassem que aqueles haviam nascido livres; accusatio suspecti tutoris, vel curatoribus, para proteção de tutelados e curatelados; havia ainda uma ação popular para proteção dos legados ad pias causas e para restituição de somas perdidas em jogo.

 

 

A ação romana ganhou forças e passou a tutelar mais situações, como pro libertate, pro tutela e lege hostila. Porém, “com a queda do Império Romano, as actiones populares do direito romano não resistiram ao direito bárbaro, permanecendo não aplicáveis durante o período feudal”[5] (NEVES, 2011, p. 204), o ficando conhecido como o mais sombrio para as ações coletivas, vindo a ressurgir na “Lei Comunal de 30 de março de 1836 na Bélgica e a Lei Comunal de 18 de julho de 1837 na França, que teriam servido de base para a ação popular eleitoral italiana de 1859”[6] (id. p. 204)

 

No Brasil de acordo com Michel Temer[7] (2005, p. 201) a “Constituição brasileira de 1824” já a previa “por suborno, peita, peculato e concussão”, a qual poderia ser “intentada dentro de um ano e dia pelo próprio queixoso ou por qualquer do povo, guardada a ordem do processo estabelecido na lei (art. 57)” (CF/1824).

Deixando de ser repetida na Constituição de 1891 e teoricamente banida do sistema jurídico brasileiro após o advento do Código Civil 1916 projetado por Clóvis Beviláqua, o qual segundo Mazzei[8] (2009, p. 377), citando “as próprias palavras do condutor daquela codificação (de índole individualista), teve a intenção de extinguir as ações populares que remanesciam no nosso sistema jurídico, a partir do direito romano”. Vale neste momento transcrever o que dizia o referido art. 76 (BRASIL, 1916):

 

 

Art. 76 – Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral.

Parágrafo Único – O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família.

 

 

Contrariando o pensamento individualista imprimido no Código Civil de 1916, a Constituição de 1934, expressamente previu a ação popular no sistema jurídico brasileiro, vindo a ser suprimida com o advento da Constituição de 1937, retornando em 1946, vindo em 1965 a ser regulamentado pela Lei nº 4.717, mantendo-se nas constituições de 1967, 1969 e finalmente tomando os contornos atuais na de 1988, da seguinte maneira:

 

 

Art. 5º. (...)

LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

 

 

3. A AÇÃO POPULAR E OS DIREITOS COLETIVOS.

 

A ação popular romana segundo Leonel (2002, apud NEVES; DANIEL AMORIM, 2011, p. 203) é “a fonte remota de todas as ações coletivas existentes atualmente”. Nesse mesmo sentido Gregório Assagra de Almeida[9], citando os ensinamentos de Nelson Nery Júnior, destaca:

 

 

(...) que a tutela jurisdicional dos interesses difusos encontra origem no direito romano, mais precisamente nas denominadas actiones popularis, e fundamenta:

“O fenômeno da existência dos direitos metaindividuais (difusos, coletivos e

individuais homogêneos) não é novo, pois já era conhecido dos romanos. Nem a terminologia ‘difusos’ é nova. Com efeito, as actiones populares do direito romano, previstas no Digesto 47, 23, 1, que eram ações essencialmente privadas, destinavam-se à proteção dos interesses da sociedade. Qualquer do povo podia ajuizá-las, mas não agia em nome do direito individual seu, mas como membro da comunidade, como defensor desse mesmo interesse público.

 

 

Assim como a ação popular foi a primeira a tratar de direitos coletivos, a Lei nº 4.717/65 que regulamentou ação popular no Brasil, alterada posteriormente pela Lei nº 6.513/77 “teve o mérito de ser a primeira lei que indiscutivelmente trata de tutela coletiva no ordenamento brasileiro, sendo significativas as inovações propostas por tal lei” (id.. NEVES, 2011, p. 204), inclusive já dizia Barbosa Moreira (1985, apud ZAVASCKI; TEORI ALBINO, 2011, p. 77), que “o instrumento da ação popular faz honra à criatividade do nosso legislador e dispensa o direito brasileiro, no particular, de receber lições estrangeiras”.

 

Mas quais seriam esses direitos difusos, individuais e coletivos?

 

Sinteticamente responde Lúcia Valle Figueiredo dizendo que “são aqueles que transcendem à esfera do indivíduo. Por isso mesmo são chamados de ‘meta-individuais’ ou ‘supra - individuais” (2010, p. 414).

 

De acordo com a doutrina, os Direitos coletivos (sentido lato) seriam gênero, dos quais são espécies: “os direitos difusos, os direitos coletivos strito sensu e os direitos individuais homogênios” [10] MOREIRA (1984, apud JUNIOR. FREDIE DIDIER E HERMES ZANETI, 2009, p. 73), os quais foram sistematizados pela doutrina da seguinte maneira: “os direitos/interesses essencialmente coletivos (difusos e coletivos em sentido estrito) e os direitos acidentalmente coletivos (individuais homogêneos)” (id. Junior. Fredie Didier e Hermes Zaneti, 2009, p. 73).

 

Afirma Lúcia Valle Figueiredo que “na ação popular existe nitidamente a defesa de direito difuso, a res omnium de todos. O Patrimônio Público não é res nullius, mas é res omnius, coisa de todos” (2010, p. 432). Inclusive Teori Albino Zavascki comenta que a transindividualidade dos interesses tutelados na ação popular, não se encontram somente quando da defesa do meio ambiente ou do patrimônio histórico e cultural (direito tipicamente difusos, sem titular determinado) “mas também, quando busca anular atos lesivos ao patrimônio das pessoas de direito público ou de entidades de que o Estado tenha participação” (2011, p. 79).

 

Sem dúvida a Constituição Federal e a Lei nº 4.717/65 ao conceder legitimidade ativa ao cidadão para defender interesses extremamente complexos, contrariando “princípios básicos da processualística” GUIMARÃES (1937, apud Zavascki, Teori Albino, 2011, p. 78), tornou-se um marco importante para o direito, na defesa dos direitos coletivos.

 

4. CONCEITO, REQUISITOS E OBJETO.

 

O remédio constitucional previsto no art. 5º, inciso LXXIII da Constituição Federal, constitui um instrumento deferido a qualquer cidadão no gozo de seus direitos políticos de pleitear em juízo a anulação de atos lesivos ao patrimônio público, abarcando ai, os bens de entidades em que o Estado faça parte, bem como à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Na conceituação de (MEIRELLES, 2004, p. 689),

 

 

É a via constitucional (art. 5º, LXXIII) posta à disposição de qualquer cidadão (eleitor) para obter a anulação de atos ou contratos administrativos – ou a eles equiparados – lesivos ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa e ao meio ambiente natural ou cultural.

 

 

Referido instrumento de defesa dos interesses coletivos tem como requisito geral, aqueles impostos a qualquer ação para um provimento final de mérito, tais como: interesse de agir, possibilidade jurídica e legitimidade. Sendo na visão de[11] (MORAES, 2009, p.185/186) requisitos específicos, dois:

 

 

Requisito subjetivo: somente tem legitimidade para a propositura da ação popular o cidadão;

Requisito objetivo: refere-se à natureza do ato ou da omissão do Poder Público a ser impugnado, que deve ser, obrigatoriamente, lesivo ao patrimônio público, seja por ilegalidade, seja por imoralidade. Conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, a ação popular é destinada “a preservar, em função de seu amplo espectro de atuação jurídico-processual, a intangibilidade do patrimônio público e a integridade da moralidade administrativa (CF, art. 5º, LXXIII)”.

 

 

Por sua vez, a ação tem como objeto anular ato lesivo a um dos bens jurídicos tutelados, quais sejam: a) Patrimônio Público, o qual para José dos Santos Carvalho Filho[12] “tem amplitude suficiente para alojar os demais aspectos mencionados na Carta” (2010, p. 1144); b) à moralidade administrativa, segundo Rodolfo Camargo Mancuso[13] “são impugnáveis as condutas da Administração que ensejam abuso do direito, desvio de poder (...) e desarrazoabinidade da conduta sindicada” (1993, apud, RODRIGUES; GEISA DE ASSIS. 2006, p. 214); c) ao meio ambiente; d) patrimônio histórico e cultural.

 

O que muito se tem discutido na doutrina e na jurisprudência é saber se para ajuizar a ação popular basta a lesividade a um dos bens jurídicos tutelados, ou torna-se necessário também a configuração da ilegalidade do ato.

 

Helly Lopes Meirelles[14] (apud, CARVALHO; KILDARE GONÇALVES, 2007, p. 675) entende que,

 

...há a possibilidade de anular ato apenas ilegal, sem a necessidade da demonstração da efetiva lesividade, para aquelas hipóteses legalmente presumidas. Nos outros casos, necessária a dupla demonstração da ilegalidade e da lesão ao patrimônio publico tutelado pela ação popular.

 

 

Por sua vez, Michel Temer[15] (2005, p. 204) entende que “é impossível a existência de um ato lesivo, mas “legal”. É que a lesividade traz em si a ilegalidade”.

 

Por fim alerta Marcelo Neves (2011, p. 211) que o Superior Tribunal de Justiça adota entendimento doutrinário no sentido de que “nos atos previstos nos art. 2º e 3º da LAP, há lesividade patrimonial efetiva, enquanto, nos atos previstos no art. 4º de mesma lei, há lesividade patrimonial presumida”. Ao final o Doutrinador faz importante observação de que “para o pedido de condenação dos réus a reparação do erário, entretanto, deve-se comprovar, em quaisquer casos, a efetiva existência de danos”.

 

5. COMPETÊNCIA.

 

A Lei que regula a Ação Popular diz em seu art. 5º que dependendo da autoridade que emanou o ato impugnado, será determinada a competência para processar e julgar a ação, a qual via de regra será o juízo de primeiro grau de jurisdição, mesmo que haja competência originária por prerrogativa de função. Nesses termos, “se o patrimônio lesado for da União, competente será a Justiça Federal (vide art. 5º, da lei), e assim por diante” [16] (LENZA, 2009, p. 748).

 

Para Marcelo Novelino[17] (2011, p. 467) ressalta que excepcionalmente existirá a competência originária do Supremo Tribunal Federal, nos seguintes casos:

 

 

I – quando todos os membros da magistratura forem direta ou indiretamente interessados, e naqueles em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados (CF, art. 102, I, n);

II – quando a lide substantivar conflito entre a União e Estado-membro (CF, art. 102, I, f).

 

 

Sendo assim, via de regra o processo e julgamento da ação popular é do juízo de primeiro grau, e excepcionalmente, de acordo com hipótese acima que já foi apreciada pelo STF[18], se admitira a competência originária para o julgamento.

 

6. DA LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA.

 

A Constituição Cidadã de 88 confere aos brasileiros natos e naturalizados, maiores de 16 anos (art. 14, §1º c/c art.15, CF/88), e aos portugueses equiparados caso haja reciprocidade (ar. 12, §1º da CF/88), que estejam no pleno gozo de sua capacidade eleitoral ativa, legitimidade para propor a ação popular, comprovando-se tal condição mediante apresentação de título de eleitor ou documento que a ele corresponda (art. 1º, §3 da Lei nº 4.717/65), exigindo-se dos portugueses equiparados “certificado de equiparação e gozo dos direitos civis e políticos” (NOVELINO, 2011, p. 466). Ressalvando-se que os legitimados não possuem capacidade postulatória, havendo a necessidade de um advogado para suprir tal requisito, salvo se possuírem cumulativamente esta condição.

 

A doutrina majoritária entende que os legitimados atuam como um substituto processual, enquanto a minoritária entende que existe uma “legitimação ordinária ampliada” [19] (MORAES, Alexandre, 2007, p. 282/283). Cabe ressaltar que outros cidadãos poderão habilitar-se como litisconsortes ou assistentes, podendo inclusive assumir o lugar do autor em caso de desistência, assim como o Ministério Público (art. 6º, §5º e art. 9º da Lei nº 4.717/65).

 

Por sua vez, não possuem legitimidade os “estrangeiros, os apátridas, as pessoas jurídicas (vide sumula 365 do STF) e mesmo os brasileiros que estiverem com os seus direitos políticos suspensos ou perdidos (art. 15 da CF/88)”. (LENZA, 2009, p. 747).

No que se refere ao pólo passivo existe um litisconsórcio necessário, “de vez que várias pessoas têm necessariamente que ser citadas” [20] (DI PIETRO; MARIA SYLVIA ZANELLA. 2009, p. 791), que na visão de (KILDARE, 2007, p. 674) são:

 

 

...as pessoas jurídicas públicas, tanto da Administração direta quanto da indireta, inclusive as empresas públicas e as sociedades de economia mista, ou privada, em nome das quais foi praticado o ato a ser anulado, e ainda as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado pessoalmente o ato ou firmado o contrato impugnado, ou que, por omissos, tiverem dado oportunidade à lesão, como também os beneficiários diretos do ato ou contrato.

 

 

Citados, os réus terão o prazo de 20 (vinte) dias para oferecer resposta, que partindo do que determina o Código de Processo Civil, poderão: contestar, oferecer exceções, impugnar o valor da causa, ação declaratória incidental e quedar-se inerte. Contudo, a posição do Ente Público é a que mais chama atenção, a qual é a parte principal deste trabalho.

 

6. A TRÍPLICE POSIÇÃO DA PESSOA JURÍDICA NA AÇÃO POPULAR E O INTERESSE PÚBLICO NO JUÍZO DO REPRESENTANTE LEGAL OU DIRIGENTE.

 

Conforme foi exposto, os legitimados passivos na ação popular como qualquer outro demandado, têm o direito de oferecer resposta à demanda: contestando-a, oferecendo exceções, ajuizando ação declaratória incidental, impugnando o valor da causa, quedar-se inerte, entre outros meios de defesa. Acontece que o legislador no §3º do art. 6º da Lei da Ação Popular, a depender da reação da pessoa jurídica de direito público ou privado, resolveu qualificar sua posição na lide. Nestes termos:

 

 

Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no artigo 1º,(...)

(...)

§ 3º A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente. (grifo nosso)

 

 

Extrai-se da norma que a depender do interesse público útil, no juízo do respectivo representante legal ou dirigente, poderá a pessoa jurídica: a) Oferecer Contestação (art. 7º, IV); b) Abster-se de contestar, e; c) Atuar ao lado do Autor. Sendo que a depender de sua reação acarretará sérias consequências nos pólos da demanda. Passemos à análise:

 

1) Oferecer Contestação (art. 7º, IV) – apesar da “confusão entre gênero e espécie” (NEVES, 2011, p. 250), oferecida a resposta, seja na forma de: contestação, impugnação ao valor da causa, exceção, etc. Mas defendendo o ato impugnado, permanecerá no polo passivo da demanda, e “serão ainda assim beneficiadas com o produto final da condenação, em caso de procedência do pedido, podendo, se for o caso, promover a respectiva execução” (ZAVASCKI, 2011, p. 90);

 

2) Abster-se de contestar – esta atitude ocasionará a declaração de revelia da pessoa jurídica, contudo, de acordo com “a melhor doutrina, apesar de possível, dificilmente haverá a presunção de veracidade em razão das exceções previstas no art. 320, I e II, do CPC”, MANCUSO (2001, apud, NEVES, 2011, p. 252). O que pretende com tal posição é deixar que a “Justiça decida sobre a questão e mesmo, se for de interesse público ou na defesa de seu patrimônio, acatar as razões do autor popular” [21] (ARAÚJO, 2005, p. 1186/1187).

 

3) Atuar ao lado do Autor – assim como na revelia, o reconhecimento do pedido na ação, dificilmente surtiria os efeitos desejados, razão pela qual “o legislador entendeu mais adequado permitir uma mudança no pólo, passando a pessoa jurídica a participar do processo como autora da ação popular, posição que melhor se adequará a sua concordância com a pretensão do autor” (NEVES, 2011, p. 256).

A consequência disso é,

 

 

É uma instabilidade quanto à posição que a pessoa jurídica irá assumir na ação, não se sabendo antes da sua resposta se aceitará a indicação no pólo passivo ou se procederá com o movimento para o pólo ativo, podendo ainda adotar postura de neutralidade ou até mesmo de nova mudança (retratabilidade) no curso da ação...[22] Mazzei (apud, JUNIOR; FREDIE DIDIER; HERMES ZANETI, 2009, p. 251).

 

 

Essa instabilidade ou migração de pólos decorrente da postura da Pessoa Jurídica foi batizada pela doutrina de “intervenção móvel”, Mazzei (apud JUNIOR; FREDIE DIDIER; HERMES ZANETI, 2009, p. 251), a qual vem sendo plenamente aceita pelo Superior Tribunal de Justiça, podendo ocorrer à migração, a qualquer momento do trâmite processual, uma vez que a lei não trouxe “limitação quanto ao momento em que deve ser realizada a migração, ficando evidente a viabilidade de composição do pólo ativo a qualquer tempo” (STJ. REsp 945.238/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/12/2008, DJe 20/04/2009).

 

O Superior Tribunal de Justiça, inclusive já admitiu que a pessoa jurídica atuasse de forma simultânea como autor e réu da mesma ação popular, sustentando que as ações de defesa dos interesses transindividuais, apresentariam regras diversas de legitimação, sendo que ação popular e a ação civil pública comportariam um microssitema de defesa do patrimônio público, que regula de forma especial a legitimatio ad causam, podendo perfeitamente o poder público “assumir a postura [ativa] em relação a um dos pedidos cumulados e manter-se no pólo passivo em relação aos demais” (STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 791.042 - PR (2005/0177439-3).

 

O que legitima essa migração no processo é justamente o interesse público no juízo do representante legal ou dirigente. Com esta redação, o legislador privilegiou o “interesse público secundário”. Explica-se. Hugo Nigro Mazzili em palestra em seminário cujo tema era “Processo Civil e Interesse Público”, proferido ao Ministério Público do Estado de São Paulo (SALLES, 2003), comentou que a noção de interesse público, na visão clássica “consistia basicamente em identificá-lo como interesse do Estado, em confronto com o indivíduo”. Num segundo momento abrangeria “não apenas o interesse do Estado, mas o interesse geral da sociedade”, ou seja, o interesse da sociedade nem sempre irá coincidir com o do administrador.

 

Mazzili (SALLES, 2003) segue citando o publicista italiano Renato Alessi, para o qual o interesse público pode ser visto sobre dois ângulos: o ângulo do administrador ou o ângulo da sociedade como um todo. Sendo que o verdadeiro bem geral da coletividade, o ideal de bem geral para todos, é o que Alessi chama: “interesse público primário”. Já o interesse público visto pelo ângulo do administrador chama: "interesse público secundário, porque é um ângulo já reflexo, já é o interesse público interpretado pelo administrador”. E como é sabido, nem sempre a visão do administrador corresponde com o interesse primário perseguido, motivo leva justamente ao ajuizamento da Ação Popular.

 

Logo, o interesse público a legitimar a tríplice posição da pessoa jurídica na ação popular, possibilitando por consequência a migração nos pólos da demanda é o interesse público primário, e não o secundário como deseja o comando legal.

 

7. CONCLUSÃO

 

A ação popular, historicamente possuiu grande relevância para o mundo jurídico, pois desde sua origem possibilitou a qualquer pessoa, a defesa de interesses coletivos. Seguindo a mesma linha de importância teve a Lei nº 4.717/65, que regulamentou o remédio constitucional, pois ampliou o conceito de patrimônio público, tendo a Constituição de 1988, tomando tal sentido como parâmetro.

 

A ação popular brasileira, não possui somente por esta característica importância para o mundo jurídico, mas por trazer inovações importantes para a defesa dos direitos coletivos, como a tríplice posição da pessoa jurídica de direito público ou privado na ação popular.

Sem dúvida referido instituto é um avanço na tutela dos interesses coletivos. Pois, muito embora o ente público tenha de necessariamente figurar no pólo passivo da demanda, em constatando, que a pretensão intentada é legítima, e que a simples abstenção ou reconhecimento do pedido não surtiria os efeitos desejados. Possibilitou-se que a pessoa jurídica de direito público ou privado, atuarem ao lado do autor da ação na busca da invalidação do ato lesivo e a reparação dos danos a seu patrimônio. Tudo isso com base no Interesse público no juízo do representante legal ou dirigente.

 

Esse interesse público útil não deve pautar-se no “interesse público secundário”, objetivando apenas interesses deturpados por seu interprete, posicionando-se na lide apenas por sentimentos políticos e pessoais, a ponto de apenas de desejar causar embaraços a adversários, visando castigá-los, esquecendo o bem maior que é o patrimônio público como um todo.

 

Na verdade, a pessoa jurídica deve pautar-se no “interesse público primário”, buscando o bem geral, fazendo-se uma analise técnico- jurídica, visando proteger o patrimônio público, a moralidade administrativa, o meio ambiente, o patrimônio histórico e cultural. Anulando-se o ato lesivo e reparando-se o dano causado a coletividade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIA.

 

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DI PIETRO. Maria Silva Zanella. Direito Administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 791.

 

JUNIOR. Fredie Didier e Hermes Zaneti. Curso de direito processual civil – processo coletivo – vol. 4. 4ª. ed. Salvador: JusPODIVM, 2009, p. 73.

 

LENZA. Pedro. Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: 2009, p. 748.

 

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MAZZEI, Rodrigo. Ação popular e o microssistema da tutela coletiva. In: Tutela jurisdicional coletiva. Salvador: JusPODIVM, 2009. p. 377

 

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SILVA, José Afonso da. Ação Popular Constitucional. p. 388-390.Ed. RT, São Paulo, 1968, apud, de ....

[1] Id. Ações Constitucionais. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 204.

 

STF, Tribunal Pleno, ACO 622 QO/RJ , rel. Min. Ilmar Galvão, j. 07/11/2007, DJE 14/02/2008; STF, Tribunal Pleno, Pet 3.674 QO/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j 04/10/2006, DJ 19/12/2006, p. 37.

 

TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 201

 

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 5 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 76)

 

 



[1] ZAVASCKI, Teori Albino. Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 5 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 76)

[2]SIDOU, J. M. Othon. “Habeas corpus”, mandado de segurança, ação popular: as garantias ativas dos direitos coletivos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 384. Apud SOUSA MIRANDA, CHARLEI GOMES de. Ação popular: Legitimidade ativa do cidadão como instrumento de controle externo sobre o ato ilegal e lesivo ao patrimônio público. Disponível em:http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9143&revista_caderno=4

[3] Id. P. 03.

[4] SILVA, José Afonso da. Ação Popular Constitucional. p. 388-390.Ed. RT, São Paulo, 1968, apud, de

[5] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Ações Constitucionais. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 204.

[6] Id. Ações Constitucionais. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 204.

[7] TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 201

[8] MAZZEI, Rodrigo. Ação popular e o microssistema da tutela coletiva. In: Tutela jurisdicional coletiva.

Salvador: JusPODIVM, 2009. p. 377

[9] Almeida, Gregório Assagra de. Direito processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p.

381.

[10] Junior. Fredie Didier e Hermes Zaneti. Curso de direito processual civil – processo coletivo – vol.

4. 4ª. ed. Salvador: JusPODIVM, 2009, p. 73.

[11] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 185/186.

[12] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 1144.

[13] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Popular. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, apud, RODRIGUES, Geisa de Assis. Ações Constitucionais. Salvador: JusPodivm, 2006, p. 214.

[14] MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data, 97-99, apud CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 13 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 675.

[15] TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 20ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 204.

[16] LENZA. Pedro. Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: 2009, p. 748.

[17] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. São Paulo: Método, 2011, p. 467.

[18] STF, Tribunal Pleno, ACO 622 QO/RJ , rel. Min. Ilmar Galvão, j. 07/11/2007, DJE 14/02/2008; STF, Tribunal Pleno, Pet 3.674 QO/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j 04/10/2006, DJ 19/12/2006, p. 37.

[19] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional Administrativo. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 282/283.

[20] DI PIETRO. Maria Silva Zanella. Direito Administrativo. 22 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 791.

[21] ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1186/1187)

[22] MAZZEI, Rodrigo Reis. “A intervenção móvel’ da pessoa jurídica de direito público na ação popular e ação de improbidade administrativa (art. 6º, §3º, da LAP e art. 17, §3º, da LIA), apud, Junior. Fredie Didier e Hermes Zaneti. Curso de direito processual civil – processo coletivo – vol.

4. 4ª. ed. Salvador: JusPODIVM, 2009, p. 73.

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