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O BLACK BLOC, APENAS UMA ESTRATÉGIA NAS MANIFESTAÇÕES SOCIAIS?


Autoria:

Marcos Antonio Duarte Silva


Doutorando em Ciências Criminais,Mestre em Filosofia do Direito e do Estado(PUC/SP), Mestrando em Teologia, Especialista em Direito Penal e Processo Penal(Mackenzie), Especialista em Filosofia Contemporânea; Especialista em Psicanálise, formação em Psicanálise Clínica, Psicanálise Integrativa e Psicaálise Análise e Supervisão Licenciado em Filosofia, formado em Direito,Jornalista, Psicanalista Clínico,Professor de Pós Graduação.

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Resumo:

Os Black Blocs, qual sua legitimidade? Existe um limite estabelecido pela lei até onde se possa ir numa manifestação? A democracia permite qualquer coisa?

Texto enviado ao JurisWay em 21/11/2013.



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O BLACK BLOC, APENAS UMA ESTRATÉGIA NAS MANIFESTAÇÕES SOCIAIS?*

 

*Marcos Antônio Duarte Silva, Professor na Faculdade Anchieta/Anhanguera e Centro universitário Módulo. Teólogo, Especialista em Direito Penal e Processo Penal; Mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC/SP, Pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Análise Informação e Sistemas (Gedais, PUC/SP), Pesquisador pela CNPq.

 

Qual sua legitimidade? Existe um limite estabelecido pela lei até onde se possa ir numa manifestação? A democracia permite qualquer coisa?

 

 

RESUMO: Na esteira das manifestações sociais de junho de 2013, surgiu no cenário nacional o Black Bloc, que se auto-intitula de estratégia de ataque, utilizando em muitas das vezes de uma forma sincronizada e desenfreada tem enfrentado e desafiado as autoridades resistindo as mais diversas formas de confronto.

PALAVRAS CHAVES: Black Bloc, Manifestações, Estratégia, Direito.

 

ABSTRACT: In the wake of the social protests of June 2013, has emerged on the national scene the Black Bloc, who calls himself the attack strategy, often using in a synchronized manner and unbridled has faced and challenged the authorities to resist the most various forms of confrontation.

KEYWORDS: Black Bloc, Demonstrations, Strategy, Law.

 

Introdução

 

No cenário nacional, surge uma “estratégia” que se intitula Black Bloc, (Bloco Negro), dentro das várias manifestações ocorridas no Brasil este ano. Sua caracterização é de jovens de classe média baixa, com os rostos sempre cobertos (com a clara intenção de dificultar a identificação) e vestidos de preto, usam de suas estratégias de ataque aos símbolos do capitalismo. Com uma postura de ataque muito bem montada, aonde chegam dominam o cenário e ocupam desde cedo o teatro de operações. Com a clara vocação anarquista utilizam-se desta forma de protesto para questionar o sistema vigente.

Classificados inicialmente como “marginais”, por imagens flagradas pela TV, apresentando o grupo como “saqueadores”, mas por meio de outras imagens contrastadas, estas primeiras informações foram sendo dirimidas e foi-se aos poucos compreendendo se tratar de uma estratégia elaborada, seguindo os padrões dos Black Blocs, no mundo.

Diante do quadro que se apresentou de manifestações e clamor popular, surgiram perguntas principalmente por se voltar a falar da Lei de Segurança Nacional (Lei n° 7.170, de 14/12/1983), o que causou estranheza, por se tratar de uma Lei que relembra o final da ditadura militar no Brasil.

Concomitantemente ao quadro apresentado repleto de manifestações e clamor popular, emergiram diversas perguntas principalmente por se voltar a falar de Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170, de 14/12/1983), o que causou estranheza, por se tratar de uma Lei que relembra o final da ditadura militar no Brasil.

Algumas indagações têm surgido no horizonte pátrio, ante estas estratégias dos Black Blocs, esta forma de manifestação estratégica é legitima? Existe um limite estabelecido na lei dos possíveis limites de uma manifestação popular e seu alcance? A democracia permite qualquer coisa, ou este sistema tem sua forma auto protetiva? Os Black Blocs representa uma ameaça a democracia?

A proposta do presente artigo está longe de julgar, ou apenas criticar estas chamadas “estratégias”, ou de forma direta os Black Blocs, mas sim trazer a discussão, sem parcialidade o que há no aspecto sociológico destes movimentos sociais, em especial estas estratégias e o que a lei maior, a Constituição Federal oferece de subsidio para atravessar esta período de incertezas.

1.A possível origem dos Black Bloc

Com o findo de entender sua nascente e origem, cumpre apontar a dados tirados de fontes que são possíveis, ou seja, ainda não se tem uma fonte de confiança veraz, mas o que sinaliza de forma mais razoável e possível e o que se há a mão é que este grupo tem sua origem nos EUA, no ano de 1991, coincidindo com a Guerra do Golfo. Assim encontra-se disposto:

Onde surgiu a idéia do Black Bloc?

Black Blocs na América do Norte surgiram na época da guerra do golfo(1991). Foram inspirados pelo movimento autonomista alemão da década de 80. Esse movimento era conhecido pelas batalhas urbanas travadas com a polícia, mas também por mostrar uma alternativa radical aos outros movimentos de protesto. (https://www.facebook.com/notes/)

 

Segundo esta descrição, esta estratégia segue a linha surgida na Alemanha nos anos de 1980, como forma de protesto radical. Percebe-se que o contexto que serviu de pano de fundo foi a Guerra do Golfo, que teve um apelo popular, ainda mais por se saber que quem realmente vai para guerra promovida pelos americanos é sempre a classe mais pobre socialmente falando, o que de certa forma por si só, carrega uma indignação, aos discursos acalorados dos pseudos patriotas que nem em sonho permite que seus entes queridos em idade para servir pisem num campo de guerra. Esta afirmativa é sustentada pelo filósofo Michael Sandel, em seu livro Justiça: o que é Fazer a Coisa Certa, onde no qual faz uma análise apurada da chamada ética social, e como ela tem sido debelada por estas condutas descritas e muitas outras, remontando a história americana da guerra civil até aos últimas guerras lideradas pelos Estados Unidos  

“Nos primeiros meses da Guerra Civil americana, passeatas festivas e o sentimento de patriotismo levaram dezenas e milhares de cidadãos dos estados do norte dos Estados Unidos a se alistar como voluntários no exército da união. Com a derrota da União na Bull Run, porém, seguida pelo fracasso da tentativa do general George B. McClellan de ocupar Richmond, os cidadãos do norte passaram a temer que o conflito não terminasse logo. Foi preciso convocar mais soldados e, El julho de 1862, Abraham Lincolm assinou a primeira lei de alistamento compulsório da União”. (SANDEL: 2013, p. 100).

 

Com isto surgiu à obrigatoriedade de se alistar e servir ao exército, o que provocou o oposto das “passeatas festivas de sentimento patriotismo”. Aqueles que apoiavam se viram do dia pra noite tendo que enviar seus filhos jovens, para um campo de batalha sangrento e, pior ainda sabendo que eles poderiam voltar num caixão. Diante desse quadro aterrador, foi se pensado numa saída chamada honrosa, mas não para todos.

“A obrigatoriedade do serviço militar atingia a tradição individualista americana em sua base, e a União abriu ampla concessão: quem fosse convocado e não quisesse servir poderia contratar outra pessoa para assumir seu lugar. Os convocados publicaram anúncios nos jornais em busca de substitutos, oferecendo até 1.500 dólares, valor considerável na época. A lei da Confederação também permitia o pagamento a substitutos, o que deu origem a expressão ‘guerra dos ricos, luta dos pobres’, uma queixa que repercutiu no norte. Em março de 1863, o Congresso aprovou uma nova lei relativa ao alistamento, na tentativa de solucionar o problema. Embora não abolisse o direito de contratar um substituto, a lei permitia que qualquer convocado pagasse ao governo uma taxa de 300 dólares em vez de servir”. (SANDEL, 2013, p. 100)

 

 Em síntese, como é fácil fazer um discurso, mais estar muito distante de realizar o que se propõe. Este quadro será que mudou para os dias atuais? Percebe-se que não, aliás, nestas últimas guerras encabeçadas pelos Estados Unidos, ainda a classe mais baixa da população continua sendo atraída para as frentes de batalhas, com convites desde de pagamentos de suas dívidas até bolsa de estudos em universidade, para poder atrair soldados que esteja dispostos a darem “sua vida pelo país”, eles são chamados carinhosamente de “exército de voluntários.

“A situação econômica e escolar dos atuais voluntários do exército comprova a lógica dessa objeção, pelo menos até certo ponto. Jovens de regiões de baixa e média renda (renda familiar média de 30.850 até 57.836 dólares) representam a maioria nas fileiras ativas do exército. Os 10% mais pobres da população (muitos dos quais podem não preencher os requisitos de educação e capacidade) e os 20% mais abastados (de regiões cuja renda média é de 66.329 dólares ou mais) são os que têm menor representação. Nos últimos anos, mais de 25% dos recrutas não têm diploma de ensino médio. E, enquanto 46% da população civil possui algum tipo de educação universitária, apenas 6,5% dos componentes das fileiras militares entre 18 e 24 anos frequentaram uma universidade.” (SANDEL, 2013, p.106).

 

Assim sendo mesmo não assumindo uma postura favorável a estratégia Black Bloc, diante deste quadro fica claro o motivo da revolta e postura assumido por estes jovens de classe média baixa, afinal são eles que abandonados à margem do Estado, vem à oportunidade de ter alguma chance se colocar sua vida em risco indo para a guerra. O protesto fomentado por estes jovens é de se sentirem esquecidos pelo poder estatal, a ponto de só terem oportunidade no extremo do que um país pode oferecer para seus jovens Nesta esteira, é currial ainda, mesmo que utilizando a fonte indicada apontar mais alguns detalhes importantes para construção da ideia. Algumas ações reivindicadas de autoria do Black Bloc.

“Uma breve lista de notáveis Black Blocs:

1992- Washington D.C., Black Bloc no protesto anti-guerra do golfo. Janelas do Banco Mundial destruídas.

1992- San Francisco, Black Bloc protesta contra os 500 anos de exploração e genocídio promovidos pelo primeiro mundo.

1999- Philadelphia, 24 de abril, 1500-2000 anarquistas marcham no Black Bloc durante o Millions For Mumia.

      1999- Seattle, 30 de novembro, Black Bloc se engendra na destruição do distrito financeiro central.

2000- 16 e 17 de abril, o Bloco Revolucionário Anti-Capitalista (RACB) participa dos protestos anti-FMI/BM, em Washington D.C. Entre 700 e 1000 anarquistas participaram no A16.

2000- Primeiro de maio, Black Blocs em Nova York, Chicago e Portland.” (https://www.facebook.com/notes/)

Com esta pequena resenha, porém com a possibilidade de visualizar as demonstrações e estratégias pode se seguir esta análise histórica.

2.Os Black Blocs no Brasil

Buscando uma setorização e firmar a participação desta estratégia, é de suma importância localiza-los dentro do momento que tomam força e acabam por trazer preocupações as autoridades públicas no Brasil.

Num trabalho digno de nota, deparou-se com o pesquisador da FGV especialista em estudos organizacionais, recente e de bom alcance tratando sobre o fortalecimento dessa estratégia no Brasil está sendo realizado pelo pesquisador Rafael Alcadipani. São dele as seguintes afirmações:

“Alcadipani afirmou que os brasileiros se inspiraram no movimento Black Bloc dos Estados Unidos, que tem um caráter antiglobalização e ataca com violência o que considera símbolos do capitalismo. O movimento está presente não só nos Estados Unidos, mas em diversos países como Egito, Turquia, Grécia, entre outros. Sua principal característica é não ter líderes definidos ou interlocutores para falar com o governo. O pesquisador afirmou que, no Brasil, esse modelo foi adaptado e a agenda crítica da globalização deu lugar à reivindicação de melhorias para o Brasil. Segundo ele, o nível de organização que a polícia quer atribuir aos black blocs - supostamente capazes de criar até táticas de enfrentamento com a PM - não ocorreria. O pesquisador disse acreditar que o Black Bloc é uma tática, e não um grupo organizado”. (http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/policias-do-rj-e-sp-ignoram-discurso-do-black-bloc-e-buscam-lideres).

Para o historiador Mário Maestri,este fenônemo chamado Black Bloc, tem que ser tratado de forma diferente. Não basta invocar a Lei de Segurança Nacional, algemar, ou simplesmente coibir como está se fazendo, há de se buscar alternativa. Em uma entrevista tratando sobre o tema assim se expressou:

O Black Bloc é a organização de jovens por afinidade, em torno de núcleos organizados, facilitada pela mídia social. São, sobretudo, produto da derrapagem de sentimentos antissistema e de tendências protagonistas de jovens radicalizados ou simplesmente atraídos pela destruição e pela violência, em um mundo que não lhes oferece sequer como possibilidade longínqua a perspectiva e o prazer da construção e autoconstrução. A esses grupos se juntam indiscutivelmente provocadores e jovens marginalizados atraídos pela prática da violência. (http://port.pravda.ru/cplp/brasil/15-10-2013/35425-black_bloc)

 

Evidente estáque na visão de Maestri, estes jovens que se juntam para promover estas estratégias, são aqueles que são deixados à margem da sociedade e que como se afirma, não são ouvidos. Justificados ou não é uma forma de enxergar um pouco o outro lado da história. Claro fica que há em seus atos, uma espécie de revolta muito arraigada, manifesta em suas estratégias violentas de depredações e destruições. O historiador continua:

“Do reconhecimento das origens sociais desses comportamentos, não podemos e não devemos promover sua elevação ao status de ação política progressiva. É indiscutível a utilização de tais atos contra o movimento social, do qual o Black Bloc disputa o protagonismo, desviando e enfraquecendo o seu sentido político e social. São indiscutíveis a infiltração e a manipulação policial e política desses grupos, mesmo devendo seu surgimento às razões assinaladas. O movimento social deve defendê-los, se necessário, mas criticando esse tipo de atuação e, sobretudo, delimitando as fronteiras políticas e geográficas com os mesmos”. http://port.pravda.ru/cplp/brasil/15-10-2013/35425-black_bloc

 

Há um fato inconteste com o surgimento destas estratégias nas manifestações de junho de 2013, eles acabaram por causar certo repúdio e cisma da população em geral. É notório que na maior parte da história no Brasil a população que participa de manifestações, segue a forma pacífica de lidar com esta instituição democrática, não se vê nos últimos grandes acontecimentos desta natureza, o uso da força, de destruição nem violência como se tem visto nestes últimos meses deste ano de 2013. Não se está lançando nenhuma crítica, mas esta forma de estratégia destoa, e, por conseguinte, retraí por demais a opinião pública que normalmente é facilmente manipulada.

E ainda como se não bastasse, houve um caso de difícil aceitação na sexta feira dia 25/10/2013, com imagens geradas por vários meios de comunicação um Coronel da PM, foi cercado por pessoas que aparentemente eram Black Bloc, que durante alguns minutos o espancaram, uma coisa precisa ser dita, o policial em questão estava desarmado e não consta que estava praticando qualquer ato violento, apenas cumprindo sua missão de liderar suas tropas, para garantir uma manifestação pacífica.

“O coronel da Polícia Militar de São Paulo Reynaldo Simões Rossi, comandante da região central da capital, foi espancado na noite de ontem por um grupo de cerca de dez manifestantes mascarados, adeptos à tática "black bloc". O policial, integrante da cúpula da PM, teve a clavícula quebrada e sofreu cortes no rosto e na cabeça. Ele foi levado para o Hospital das Clínicas, onde permanecia em observação até a conclusão desta edição. Até o início da madrugada, a polícia tentava identificar os agressores.[...] Em meio ao tumulto, um grupo de mascarados cercou o comandante e passou a agredi-lo com socos e pontapés. Ele foi derrubado, mas conseguiu se levantar. Neste momento, um dos mascarados golpeou o policial na cabeça usando uma placa de ferro”. (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/corrida/135821-frase-do-dia.shtml).

É inegável que a violência gratuita contra uma pessoa humana, desarmado, sem condições de resistir ou se quer enfrentar seus espancadores foge e muito de qualquer desculpa que se possa oferecer. É de suma importância que se diga que esta atitude aparentemente difere da prática contumaz desta estratégia chamada Black Bloc. Não se encontra fácil relato de ser esta prática de espancamento e violência contra qualquer pessoa, um meio usual.

3. O que vem a ser um Estado Democrático de Direito?

A lei que é norteadora e mantenedora da figura do Estado estabelece sua função e atribuição quanto aos cidadãos que vivem dentro de suas fronteiras. É notório que nas últimas décadas este papel tem se perdido em meio uma série de manobras de manutenção do poder. Essa prática que se tornou rotineira tem afastado o governo de seu papel primal que é oferecer condições a cada pessoa sob seus cuidados de ter uma vida digna, com oportunidades relativamente iguais para todos. Longe deste papel, as reações da população passam a ser quase que o único caminho para debelar tal situação de estagnação estatal.

No artigo 1° da Constituição Federal, traz em sue bojo a seguinte redação:

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de Direito e tem como fundamentos:

É desnecessário dizer que este artigo merece atenção em duas vertentes muito importantes: O Estado Democrático de Direito. Daí surge imediatamente à pergunta: o que é Estado Democrático de Direito?

O constitucionalista José Afonso da Silva assim caracteriza e dá vida a imagem do Estado Democrático de Direito;

 “O Estado Democrático se funda no princípio da soberania popular que ‘impõe a participação efetiva e operante do povo na coisa pública, participação que não se exaure, como veremos, na simples formação das instituições representativas, que constituem o Estado Democrático se funda no princípio da soberania popular um estágio da evolução do Estado Democrático, mas não o seu completo desenvolvimento.” (SILVA, 2007, p.66).

Nas palavras aqui exaradas pode se visualizar um pouco do que o legislador queria enfrentar em matéria de funcionabilidade do Estado. A soberania popular ser a válvula propulsora da vontade do povo e nunca, o contrário. Sabiamente o autor chama a atenção que está será a forma do Estado evoluir e se desenvolver por completo. Urge ainda nesta mesma linha citar, para a construção e explicitação deste conceito mais um doutrinador que baliza esta ideia.

“A idéia fundamental da democracia é a determinação normativa de um tipo de convívio de um povo pelo mesmo povo. Já que não se pode ter o auto-governo na prática quase inexequível, pretende-se ter ao menos a auto-codificação das prescrições vigentes com base na livre competição entre opiniões e interesses, com alternativas manuseáveis e possibilidades eficazes de sancionamento político”. (MÜLLER, 1998, p.57). 

 Nas palavras de Müller, é fundamental para se manter a democracia a determinação de norma, que possibilite a convivência entre todos os cidadãos que vivam no Estado. Cumpre dizer, que estas normas não podem ter o condão apenas proibitivo, mas a forma também de garantir direitos e favorecer a competição entre opiniões e interesses, ou seja, ser um reagente na sociedade que discipline, sem afrontar direitos, mais concedendo oportunidades a todos de forma uniforme.

Adentrando mais nesta particularidade, não se pode esquecer o que Canotilho preceitua sobre o tema.

“O esquema racional da estadualidade encontra expressão jurídico–política adequada num sistema político normativamente conformado por uma constituição e democraticamente legitimado. Por outras palavras: o Estado concebe-se hoje como Estado Constitucional Democrático, porque ele é conformado por uma Lei fundamental escrita (= constituição juridicamente constituída das estruturas básicas da justiça) e pressupõe um modelo de legitimação tendencialmente reconduzível à legitimação democrática”. (CANOTILHO, 1995, p.43).

 

Nas palavras deste constitucionalista, há de se pressupor “um modelo de legitimação”, este modelo se abriga numa Lei Fundamental de suma importância para garantir a manutenção do Estado Democrático de Direito.

Salta aos olhos que todos estes autores entendem que para se alcançar a democracia e o direito no Estado, ele deve possuir o viés de exaltar a lei e regular a forma como se pode o governo atuar como facilitador da vida humana. Em outras palavras, só existe Estado Democrático de Direito se estas diretrizes estiverem sendo mantidas e operando no seio da sociedade, caso contrário o que se terá é um simulacro.

 

3.1. O que vem a ser dignidade da pessoa humana?

 

Apreendendo o sentido do Estado Democrático de Direito, cumpre buscar uma luz sobre o ponto central de um governo que é a dignidade da pessoa humana. Ora se tem um Estado que busca ser democrático e de direito esta busca tem um fim único que é garantir a toda população sua dignidade para viver, pensar, existir e coexistir. Nada menos do que isso se espera de um governo que se preste a cumprir seu papel de mandatário dentro da sociedade. Num Estado que preze esta condição democrática os princípios fundamentais deve guiar com lisura toda a conduta dos patronos do povo, ou seja, não há de se falar em democracia e direito se não se fizer presente os princípios fundamentais.

“Tal como são um elemento constitutivo do Estado de Direito, os direitos fundamentais são um elemento básico para a realização do princípio democrático. Mais concretamente: os direitos fundamentais têm uma função democrática dado que o exercício democrático do poder: 1 - significa a contribuição de todos os cidadãos para o seu exercício (princípio direito de igualdade e da participação política); 2 – implica participação livre assente em importantes garantias para a liberdade desse exercício (o direito de associação, de formação de partidos, de liberdade de expressão, são, por ex., direitos constitutivos do próprio princípio democrático; 3 – envolve a abertura do processo político no sentido da criação de direitos sociais, econômicos e culturais, constitutivo de uma democracia econômica, social e cultural. Realce-se esta dinâmica dialética entre os direitos fundamentais e o princípio democrático. Ao pressupor a participação igual dos cidadãos, o princípio democrático entrelaça-se com os direitos subjetivos de participação e associação, que se tornam, assim, fundamentos funcionais da democracia”. ( CANOTILHO, 1995, p. 430).

Canotilho usa uma expressão digna de nota “os direitos fundamentais têm uma função democrática”, ora se assim é não se pode abrir mão destes, sem comprometer toda a estrutura democrática de um país que deseja ter esta vocação. Não basta ter apenas a norma escrita, promulgada e publicada ela tem invariavelmente ser efetiva, real e principalmente e mais importante, tem que ser aplicada em toda usa extensão e alcance. Nesta compreensão o que se pode dizer sobre o papel da dignidade da pessoa humana?

Quando se fala em dignidade da pessoa humana se busca um entendimento mais amplo do que está de forma saturado sendo exposto diariamente.

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano, que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste  sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (SARLET, 2006.)

Desta forma temos como princípio norteador a questão do respeito que se deve ter pelo ser humano, de forma especial pela figura do Estado, em providenciar meios e condições para que todos os seres humanos que vivam nos seus domínios possam viver como se pode inferir, de forma digna. Um país que se preze deve ter em sua mais alta nota e importância este papel de suma vitalidade e ordem entre seus patrícios, para manter a aceitação do chamado contrato social, entre Estado e cidadãos.

Na Constituição Federal este tema é tratado como princípio e está contido no artigo 1°, se estendendo ao artigo 5 °, onde residem os Direitos e Garantias Fundamentais num elenco amplo, onde o legislador procurou instalar em seus incisos as condições mínimas necessárias de convivência social e, indo além, demonstrando como deve o Estado tratar e se portar frente a cada pessoa humana.

É desnecessário dizer que o Estado brasileiro está longe de cumprir este ideal constitucional e, pior, não há como vislumbrar ante os fatos sociais que se presencia se quer uma expectativa de mudança. Outrossim, se observa uma leniência quase doentia e inquisitória por parte do poder estatal frente as necessidades de se fazer presente na vida das pessoas que mais necessitam de sua proteção. Embora esta constatação carregue em si mesmo uma dose forte de dissabor, ela produz uma espécie de tupor coletivo, onde se há a nítida impressão de estarem estas pessoas sob o comando de este poder esdrúxulo, anestesiadas e sem reações.

Neste cenário muito propício; a história nos mostra sempre esta situação se repetindo, não é incomum nascer movimentos e reações as mais revolucionárias possíveis. Este é o caso presente dos Black Blocs.

3.2 Os Black Blocs e a lei, qual o limite?

Diante deste quadro encontramos esta estratégia Black Blocs, que tem assumido aqui e ali, se tratar de uma reação anarquista, ou seja, literalmente sem poder, é este o significado que esta ideologia, se assim se pode tratar carrega.

Ora é possível, viver num Estado, sem a composição de leis, normas, regras, e instituições? Que espécie de lugar seria este?

É fato, que há tempos se pode buscar entender porque o Estado se tem mantido tão ausente e distante das questões sociais, ao invés da criação apenas de pseudo programas sociais que assumem mais uma postura de propaganda eleitoral do que consegue atingir a população em sua necessidade primal.

Princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar, que o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as garantias de atuação livre de regras da jurisdição constitucional; (Silva, 2007).

Desta forma, parte da indagação da possibilidade de haver um Estado sem uma norma régia caí por chão, uma vez ser mister para manutenção do Estado Democrático de Direito se ter os pesos e contra pesos, indispensáveis para uma sincronização da sociedade. Ademais, quando se fala de segurança como uma instituição social, se tem que manter em mente a necessidade de o mínimo de ajuste a necessidade geral, não da parte. Mesmo um sistema que possa ser ruim é melhor do que nenhum sistema.

Quanto a direito de manifestação a lei assim preceitua:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

Não há impedimento como se pode extrair do texto legal, para manifestações e afins. Apenas a lei estabelece limites que por mais que hoje não soe como razoável, se torna sumamente importante respeitar para se manter a ordem e respeito. Assim, o direito permite em locais abertos, reuniões e manifestações, sem, contudo, empunhar armas e que possua um caráter pacífico. E não se pode ter outra finalidade se não esta por mesmo que se tenha a exata noção do que seja democracia, ela impõe e deve impor limites mínimos necessários para convivência social.

Deste feito o limite das manifestações se assim se pode inferir é respeitar em grande medida o direito de todos, não atrelando, e nem buscando apenas um grupo impor a todos os demais algo além do aceitável. O artigo 5, do mesmo diploma legal, descortina o direito individual, mais também aborda a questão do direito coletivo, e se é aceitável e razoável que se tenha a liberdade para se opor e se reunir, é da mesma forma importante aceitar que esta coletividade deve ser mantida para o bem de todos.

O prof. Márcio Alves Fonseca, em sua obra Michel Foucault e Constituição do Sujeito, assim aclara este tema aqui debatido.

Foucault pensa que muito mais produtivo do que analisar a racionalização da sociedade num todo seria abordar o processo de racionalização dentro de domínios específico das sociedades e das culturas, que, por sua vez, remeter-se-iam cada um a uma experiência fundamental, como por exemplo, a loucura, a doença, o crime, a sexualidade. Em seu procedimento, a análise das racionalidades específicas ocorridas nesses domínios substituiria a consideração de um processo global de  racionalização ou, pelo menos, a antecederia. [...] Não se trata de analisar o poder do ponto de vista de sua racionalidade interna, mas de pensar nas relações de poder a partir do confronto das estratégias de poder/resistência. (FONSECA, 2003).

O texto evoca como o poder procura atuar dentro das relações existentes dentro do Estado, e urge racionalizar as estratégias empreendidas para manutenção do chamado controle sociais. Assim continua o pensamento nesta mesma linha.

O Estudo detalhado das relações de poder que Foucault empreende de maneira especial em alguns de seus trabalhos nada mais é do que um tratamento pode-se dizer que indireto, dos processos que incidem sobre o individuo: dos modos de objetivação que o produzem para seja dócil-e-útil e da subjetivação que o produz para que se tome sujeito a uma identidade determinada. É na busca de uma concepção mais ampla de poder que Foucault poderá chegar à ideia de um tipo de relações de forças que transformam os homens em sujeitos.

Extrai se deste texto a forma que as relações de poder empreende tentando aprofundar seu controle e produzindo homens transformados em sujeitos, ou em outras palavras, a sujeição cega. A amplitude de onde se pode chegar com esta instrumentalidade não tem limites e, o poder central conseguindo esta façanha, pode fazer e realizar qualquer coisa sem interferência, sem preocupações. É certo que pensar desta forma é devastador, mais o que se presencia nos dias atuais está muito perto desta realidade. Cumpre aprofundar este prisma.

Pode-se mesmo dizer que a concepção que Foucault desenvolva de relações de poder se apoia no estudo de mecanismos produtores de ideias, palavras e ações. É interessante notar a diferença que existe entre essa concepção e aquela que considera o poder associado a uma entidade ou aparelho localizáveis: dentro dessa segunda, a análise dos procedimentos do poder acontece em torno dos seus mecanismos de repressão e dominação. [...]A ideia de poder em questão seria tipo proibir, inibir, restringir, fazer calar, fazer ouvir. Já a ideia de relações de força que Foucault desenvolve é do tipo incitar, suscitar, incentivar, fazer calar. Em vez de tomar os objetos sobre os quais incidem e moldá-los, caracterizando assim uma relação de dominação, os mecanismos das relações de poder visam construir tais objetos.

Salta aos olhos as palavras expendidas neste texto, que reflete de forma clara e objetiva as condições tratadas, e como fazer “calar, suscitar, incitar”, estão em alta. Urge a necessidade de se obrigar a perceber como se chega a esta situação de molde social, através deste controle bem usado como “mecanismos de repressão e dominação”.

No seguimento da sociedade é quase certo que há pessoas que ao perceberem este tipo de ação realizada pelo governo, reage, e muitas vezes de forma a se fazer entender, combatendo força com força. Parece que este é o caso dos Black Blocs.

O que tem sido difícil de entender é o porquê de tanta destruição, se a revolta surge exatamente pela expropriação que o sistema trás a população? Se isto é o que se tem em mente, destruir passa a ser o mesmo processo empregado pelo poder central, e desta forma pouco ou nenhum resultado prático, ou pelo menos pedagógico se pode extrair. A destruição pela simples destruição, nada mais é do que uma revolta sem controle, o que torna ineficaz qualquer apelo ao senso comum, qualquer manifestação digna de nota. Ora quando se destrói patrimônio público que é construído a duras penas como dinheiro de impostos, o conserto será mediante o mesmo imposto com uma diferença, se pagará duas vezes por uma única coisa. Pouco inteligente é agir desta forma.

A lei como se pode ver é bem positiva neste aspecto, manifestações pacíficas, sem armas, e com ordem podem e devem ser realizadas. Este é o limite, razoável, uma vez ser desejo de todos, quem se manifesta ou não, poder usar deste exercício com o mínimo de segurança e com tornando este ato legitimo e coerente.

Considerações finais

Longe de ser um estudo sociológico ou antropológico, o texto procura trazer reflexões e evocar dentro de pensamentos dos mais diversos doutrinadores e pensadores, uma ponderação sobre os fatos ocorridos nesta estratégia Black Blocs.

Estas ponderações passam por analisar o Estado Democrático de Direito e a tentativa desenfreada desta estratégia em impor; pelo menos é o que se transparece; a anarquia como justificativa para seus atos. Ora há um sistema de governo e prática em nosso país, se este precisa de reforma, de mudanças, de uma nova leitura, os meios para se fazer isto certamente não será quebrando e espantando as pessoas que querem manifestações pacificas para exigirem seu direito.

Muito se tem falado nas redes sociais; e é bom que se traga a lume esta ideia; que estes agentes mascarados com esta estratégia, são pessoas infiltradas para esvaziar as ruas e, descaracterizar o caráter pacífico das manifestações. Se for assim, se isto for comprovado, aí sim, a legitimidade, embora constipada do governo federal, estará em xeque, uma vez ser esta uma prática antidemocrática. Nada seria mais estranho a democracia do que um poder central que evoca a Constituição, o direito e a justiça agir de forma imponderada a ponto de botar tudo a perder, no que tange a respeito, seriedade e lisura; e particularmente, a lei que jurou defender e pelo contrário fazer dela um simulacro. Seria péssimo, o pior dos mundos.  

Cumpre observar, e isto é de suma importância, o que a lei diz, mesmo que se discorde da condução que o governo está tomando, é vital para manutenção da conquistas até agora atingidas manter o ideal de Estado Democrático de Direito, e se for necessário se fazer manifestações, que se faça dentro dos limites estabelecidos pela lei. Só assim, se ganha com o mínimo de perda possível.

Referências Bibliográficas:

 

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional 6ª Ed. Coimbra: Almedina, 1995.

FONSECA, Márcio Alves, Michel Foucault e a constituição do sujeito, São Paulo: EDUC, 2003.

 MULLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão Fundamental da democracia. Tradução: Peter Naumam, revisão: Paulo Bonavides, São Paulo: Max Limonad, 1998.

SANDEL, Michael J., Justiça – o que é fazer a coisa certa, 10ª edição, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira: 2013.

SARLET, Ingo W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre : Livraria do Advogado Editora, 4ª. Edição, 2006.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 28ª Ed. Brasil: Malheiros, 2007.

https://www.facebook.com/notes/

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/corrida/135821-frase-do-dia.shtml

http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/policias-do-rj-e-sp-ignoram-discurso-do-black-bloc-e-buscam-lideres

http://port.pravda.ru/cplp/brasil/15-10-2013/35425-black_bloc

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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