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DIREITO À VIDA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ABORTO E DA EUTANÁSIA


Autoria:

Kerlly B. M. Dos Santos


Formada em Direito pela Fundação Educacional do Município de Assis.

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Resumo:

Este trabalho versa sobre o direito à vida, mais especificamente tratando do aborto (trazendo a classificação e discussão sobre o aborto do feto anencefálico) e da eutanásia, fazendo uma abordagem do que seja vida e a evolução dos direitos humanos.

Texto enviado ao JurisWay em 26/09/2013.



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INTRODUÇÃO
 

Os Direitos e Garantias Fundamentais, objeto de estudo do Direito Constitucional, por serem natos ao ser humano já são merecedores de análise. Quanto à vida, para alguns o máximo dos direitos, pois somente com ela é que podemos conceber todos os demais, os debates acerca têm sido constantes, pois tem havido grande mudança no posicionamento geral sobre o que é vida e sobre até que momento ela existe, partindo para o olhar da dignidade da pessoa humana.

Neste diapasão, o objetivo desta pesquisa foi trazer argumentos a respeito do início e fim da vida e momento em que a vida parece indigna de ser vivida a ponto de permitir-se a agressão a este direito com base no senso de humanidade.

Para melhor contextualizar com argumentos empíricos sobre o tema, elucidamos duas situações-limites do direito à vida, uma evidenciada na frustração de qualquer viabilidade de vida externa por meio do aborto e a outra no abreviamento do sofrimento causado pela vida externa com a eutanásia, discutindo conceitos, analisando princípios sociais, a legislação e fazendo uma comparação com as legislações comparadas.

No primeiro capítulo, trataremos sobre a conceituação de vida, além de analisar a evolução dos direitos humanos até chegarmos ao que temos hoje, bem como as dimensões de direitos e a evolução do conceito de dignidade da pessoa humana.

No segundo capítulo, discorreremos sobre o aborto, trazendo sua classificação, e adentrando mais especificamente no caso da anencefalia e no voto da ADPF 54, que versava sobre a autorização judicial às gestantes que tivessem o diagnóstico de anencefalia de seus filhos. Além disso, teremos, ainda, um breve relato sobre os pontos de vista de cada uma das religiões (dentre as mais comuns).

No terceiro capítulo, cuidaremos da eutanásia, tema também atual e deveras polêmico. Faremos uma conceituação e sua classificação, além de analisar a questão do suicídio assistido, prática proibida no Brasil, assim como o aborto e a eutanásia.

Discutir o começo e o fim do ser humano talvez seja o mais sensato meio de alcançarmos a mais plena humanidade, e criar uma sociedade eticamente melhor.

Sem a fabulosa e inalcançável pretensão de responder, este trabalho é uma humilde incitação à reflexão do ser humano como princípio e fim de tudo o que faz, e com isso do próprio direito.

 

1.   DIREITO À VIDA

 

1.1. DOS DIREITOS DO HOMEM AOS DIREITOS HUMANOS

 

Tem-se uma diferenciação doutrinária entre os Direitos do Homem, os Direitos Fundamentais e os Direitos Humanos.

Os ditos Direitos do Homem são aqueles apontados pelo jusnaturalismo como aqueles inerentes à condição humana. Não se fala em um direito que foi criado pelo homem e para o homem, mas um direito que não foi trazido por ninguém, mas sim os direitos naturais atávicos, como o direito à vida, à propriedade, à liberdade, à igualdade e à segurança, conforme Norberto Bobbio (apud CASTILHO, 2010, p. 20).

Fábio Konder Comparato traz em seu livro “A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos” a diferenciação entre os Direitos Humanos e os Fundamentais:

 

É ai que se põe a distinção, elaborada pela doutrina jurídica germânica, entre os direitos humanos e direitos fundamentais (Grundrechte). Estes últimos são os direitos humanos reconhecidos como tais pelas autoridades às quais se atribui o poder político de editar normas, tanto no interior dos Estados quanto no plano internacional; são os direitos humanos positivados nas Constituições, nas leis, nos tratados internacionais. Segundo outra terminologia, fala-se em direitos fundamentais típicos e atípicos, sendo estes os direitos humanos ainda não declarados em textos normativos. (GOUVEIA, apud COMPARATO, 2003, p. 57-58).

 

Assim, temos clara a distinção entre as três nomenclaturas, sendo que o Direito do Homem se refere ao direito natural, o Fundamental é aquele que consta de normas, leis, constituições e os Direitos Humanos seriam aqueles reconhecidos em tratados internacionais.

Juntamente com a evolução dos Direitos Humanos, podemos traçar uma linha de evolução, também, do reconhecimento da Dignidade da Pessoa Humana, e, consequentemente, do direito à vida.

O direito à vida é um direito natural do ser humano, sendo esta a acepção aceita pelo jusnaturalismo. Mas nem sempre foi visto assim pelos governantes e legisladores.

Em “A Era dos Direitos” (1992, p. 59-61), Noberto Bobbio faz referência a dois momentos históricos dos direitos humanos: o individualismo e o contratualismo.

Thomas Hobbes, importante teórico do século XVI, descreve em seu livro “O Leviatã” uma época em que houve uma convivência em seu estado natural, anterior à existência do Estado como instituição de controle social. Nesta época, a vida era totalmente disponível, sendo que os conflitos eram resolvidos segundo a Lei de Talião – olho por olho, dente por dente. O autor afirma que o homem teria seus direitos intrínsecos, quais sejam o direito à vida, à propriedade, à liberdade, à igualdade e à segurança, mas que, consoante a desorganização daquele povo, não havia outro meio de garantir todo e qualquer direito senão por meio da violência (apud CASTILHO, 2010). Tal descrição cabe exatamente ao período dito como do individualismo.

Ao admitirem a instituição de um órgão que visasse a organização social e a possibilidade de uma convivência pacífica, passou-se então à segunda fase, em que se tem o chamado “contrato social”. Esta fase, posteriormente trabalhada por John Locke e por Jean-Jacques Rousseau, foi caracterizada pela assunção das pessoas que participassem daquela sociedade de um pacto, que não tinha natureza formal, mas sim tácita, em que todos deveriam respeitar-se uns aos outros. Assim, as pessoas abriam mão de seus direitos – de forma absoluta ou em parte – para que todos tenham seus direitos fundamentais assegurados.

Mas a evolução da Dignidade da Pessoa Humana, bem como do reconhecimento do que seja a pessoa que tenha direitos vem de tempos atrás, e merece uma explanação mais detalhada.

A elaboração do conceito de pessoa passou por cinco importantes fases.

Durante o período chamado de Axial, iniciado no século VIII a.C., refere-se a um período em que se enunciaram os grandes princípios e diretrizes fundamentais à vida, que estão em vigor até hoje.

Foi no século V a.C. que surge a filosofia, quando o ser ousa a utilizar-se de sua razão e sua crítica para analisar as situações da vida. O homem se torna o centro dos estudos e indagações, e há uma forte contestação dos mitos religiosos tradicionais. É desenvolvida uma forma de racionalização do viver e das crenças. É, em suma, a partir deste período que o ser humano passa a ser considerado como ser dotado de razão e liberdade, em sua igualdade essencial, mas sem deixar de lado as diferenças de cor, sexo, raça, religião e costumes (COMPARATO, 2003, p. 8-12).

Mas tal igualdade veio surgir com uma sociedade organizada, que se submeta a regras de um “ser superior”, o Estado. As regras universais, os Direitos Humanos atávicos e primordiais eram aqueles que não necessitavam de leis escritas, pois, se são anteriores até à própria existência humana, então não há que se falar em reconhecimento destes para que tenham validade.

Nesta primeira fase, a pessoa era somente a parte física, independentemente de sua personalidade. Era seu exterior quem ditava quem era a pessoa.

A segunda fase veio com Boécio, no início do século VI. Surge uma nova discussão com a ideia de “substância individual da natureza racional”, em que o homem não é a sua exterioridade, mas sim a união do espiritual e do corporal, conforme também adotado por Santo Tomas (apud COMPARATO, 2003, P. 20). Todos são iguais em suas essências, e é essa igualdade que pautou a ideia de isonomia à época.

Os Direitos Humanos então seriam processo de algo natural, e toda e qualquer lei que contrariasse a natureza, havia de perder a vigência. Assim concluíram os escolásticos e canonistas medievais.

A terceira fase é marcada pelos ideais kantianos, no qual houve uma separação entre homens e coisas. O homem, dotado de racionalidade, autonomia; existe como um fim em si mesmo, não havia o seu emprego como meio para algo. Já as coisas, irracionais, são os meios para atingir um objetivo, podendo ser empregados pelo ser humano para tanto.

O conceito de que o homem não é um meio implicaria em dois deveres: um positivo e um negativo, sendo este o de não interferir visando a prejudicar ninguém, e o positivo seria o de trabalhar no sentido de contribuir para a felicidade alheia.

A quarta fase veio com a descoberta do mundo dos valores. O ser humano é aquele que cria as leis, e ao fazê-lo utiliza-se de uma valoração de preferências, e ao mesmo que se submete a elas.

A quinta e última fase se resume com a filosofia da vida e o pensamento existencialista, onde se reconhece que a pessoa é pessoa porque é, e não pelo papel que tem dentro de uma sociedade. Assim, temos o significado de pessoa que é utilizado até hoje.

Foram feitos ao longo do tempo diversos documentos visando um reconhecimento dos direitos Humanos, os quais passariam, então, a ser chamados de Fundamentais, devido ao reconhecimento formal.

A Magna Carta, de 1215, foi a primeira, seguida de tantos outros como o Habeas Corpus Act e a Bill Of Rights.

Foi somente em 1787, com a vinda da Constituição dos Estados Unidos, que se ouviu falar, pela primeira vez, em uma constituição que afirmava o direito à vida como inalienável. Trazia, em suas Emendas V e XIV, a proibição de privar alguém do seu direito à vida sem o devido processo legal.

 

1.2. AS DIMENSÕES DE DIREITOS

 

Ao falarmos nesta divisão trazida por Bobbio, é necessário que notemos que a sua divisão vai além, trazendo os Direitos Humanos segundo as chamadas dimensões de direitos. O termo anteriormente adotado, “gerações” de direitos, dava uma ideia de finitude aos direitos que pertencessem às gerações passadas, o que não ocorre. Assim, a nomenclatura atualmente adotada é de dimensões, por haver uma convivência entre ambos durante todo o tempo. Ressalta-se que as dimensões de direito têm ampla ligação com os ideais da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade), já que foi nesta ordem que se estabeleceram as chamadas dimensões de direito.

Teve origem, o direito à vida, nos direitos de primeira dimensão, que são os ligados à liberdade. Liberdade no que concerne às liberdades individuais, públicas, aos direitos civis e políticos. Alguns documentos podem ser citados como exemplificação de tal momento histórico: a Magna Carta (1215), a Paz de Westfália (1648), o Habeas Corpus Act (1679), a Bill of Rights (1688), a Declaração Americana (1776) e a Francesa (1789).

Como direitos de segunda dimensão, temos os direitos sociais, culturais e econômicos, movimento influenciado pela Revolução Francesa. Isto significa dizer que foram reconhecidos direitos aos trabalhadores, por exemplo. Grande prova disto foram a Constituição de Weimar (1919) e o Tratado de Versalhes (1919). Os direitos de segunda dimensão são também chamados direitos de igualdade.

Os direitos de terceira dimensão talvez sejam os mais complexos de serem explanados, já que eles tratam dos direitos de solidariedade ou fraternidade, que são os direitos de todos, de caráter positivo e negativo. Positivo, pois, todos têm direito, e negativo, porque todos têm a obrigação de respeitá-lo. Os maiores exemplos trazidos em livros são os direitos ao meio ambiente, à paz e do consumidor.

Paulo Bonavides, Norberto Bobbio e Ingo Sarlet trazem, ainda, uma quarta dimensão de direitos, o qual para os dois últimos se referiria à manipulação genética e ao direito do homem de ter sua existência protegida em face de pesquisas, já para o primeiro estariam relacionados ao movimento de globalização institucional, tratando principalmente da mudanças ocorridas no âmbito da democracia, informação e do pluralismo jurídico, bem como tratando do afrouxamento dos laços clássicos do conceito de soberania.

No âmbito acadêmico também se defende a idéia de uma quinta geração de direitos fundamentais, os quais estariam relacionados aos avanços tecnológicos da cibernética, como avanços com próteses que poderiam transformar o homem em parte cyborg e questões relacionadas à internet. Para Paulo Bonavides, todavia, os direitos de quinta geração/dimensão estariam realcionados ao atentado terrorista de 11 de setembro em solo americano, que teria passado a a dar nova configuração ao direito à paz. Todavia a grande maioria da doutrina entende a paz como um direito de terceira geração/dimensão.

 

1.3. O QUE É VIDA?

 

A palavra vida, do grego vita, tem duas divisões feitas para se diferenciar o sujeito de quem se fala. A primeira divisão seria zoé, referente à vida de forma geral, se aplicando a todos os seres vivos. E bíos, que seria especificamente aplicada ao ser humano.

Seguindo um padrão de conceituação do que seja vida, tem-se a ideia de que é vivo aquilo que tem capacidade de nascer, se desenvolver e morrer.

O Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa traz a seguinte conceituação:

 

1.             Conjunto de propriedades e qualidades graças às quais animais e plantas se mantêm em contínua atividade; existência.


 

Necessário se faz uma conceituação jurídica. Conforme se pode extrair em sentido contrário à Lei 9.434/97, que afirma que há morte com o encerramento da atividade cerebral, pode-se concluir que a vida é a existência de atividade cerebral – que se aplica à pessoa humana.

Uma das questões polêmicas a serem levantadas a esse respeito seria a questão do feto anencefálico e a retirada de órgãos. Sobre a primeira trataremos no item 2.

 

1.4. CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO À VIDA

 

No ordenamento jurídico brasileiro, embora seja evidente que a proteção à vida sempre existiu, no tocante à constitucionalização de tal direito de modo expresso, podemos dizer que esta é relativamente nova.

As Constituições de 1824, 1891, 1934 e 1937 nem ao menos citavam o direito à vida. Elas traziam, cada uma a seu tempo, inovações para a sociedade brasileira, mas a respeito deste direito, tardaram em conhecê-lo formalmente.

Considerando que a Constituição de 1946 foi a primeira a trazer de forma expressa este direito, dentro do ramo do Direito, isto é bastante recente.

Esta Constituição foi feita à época da Segunda República, em meio a um governo populista, e trazia em seu Capítulo II, artigo 141, caput, a descrição:

 

Dos Direitos e das Garantias individuais        

Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

 

Posto isto, podemos considerar que a Constituição brasileira, começou, a partir deste momento, a passar por um processo de humanização, influência trazida tardiamente pelo Constitucionalismo (movimento no século XVI,visando a inclusão dos preceitos e garantias fundamentais para as constituições). Temos, portanto, a mudança do foco, do patrimônio para a pessoa. Mas vale lembrar que esta priorização não foi absoluta neste momento.

Já a Constituição Federal de 1967, trazia em seu artigo 150 os mesmos direitos já elencados pela anterior, ou seja, o direito à vida, à liberdade, à segurança (que acabou perdendo o termo individual, pois a segurança passou a ser vista de forma coletiva, no âmbito mais amplo, que abrange a sociedade como um todo), e também à propriedade.

Mas foi somente na Constituição Federal de 1988, também chamada de Constituição Cidadã, que houve uma verdadeira priorização ao Direito à Vida, e foram trazidos princípios para esta que garantiam a sua proteção, como a Dignidade da Pessoa Humana, intimamente interligada.

O caput do art. 5º da Carta Magna assim traz:

 

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 

Podemos falar que, a partir de então, a Constituição passou a dar o devido valor à Pessoa Humana.

  

2.   ABORTO

 

2.1. CONCEITUAÇÃO

 

Se buscarmos uma conceituação etimológica da palavra aborto, encontraremos a expressão “ab-ortus” (ab, privação e ortus, nascimento), que traz a ideia de “privar o nascimento”. Provém, a palavra aborto, do termo latino “aboriri”, que significa “separar algo do lugar adequado”, e é trazido para nós como sendo “a interrupção da gravidez antes de seu termo normal, seja ela espontânea ou provocada, tenha havido ou não expulsão do feto destruído” (DINIZ, 2009, p. 30).

Em entrevista, o médico Mário Burlacchini, especialista em Medicina Fetal, conceitua, de acordo com o ponto de vista médico, o que é considerado aborto[1]. Vejamos:

 

Considera-se abortamento a interrupção da gravidez até a 20ª, 22ª semana, ou seja, até o quinto mês de gestação. Além disso, é preciso que o feto esteja pesando menos de 500 gramas para definir o episódio como aborto espontâneo ou provocado.

 

Partindo de tal explicação, vale clarear um ponto: a partir da vigésima ou vigésima segunda semanas da gestação, em que ocorrer o aborto, não mais deverá receber este nome – de acordo com a nominação dada pela medicina. O nome adequado a esta situação é parto prematuro, pois entre as semanas 22 e 36 da gestação, o feto encontra-se em situação de prematuridade, podendo ser este parto espontâneo ou eletivo (caso em que o médico precise interromper a gravidez por algum motivo). Entretanto, Maria Helena Diniz, doutrinadora na área do Biodireito e de reconhecido renome, contesta este posicionamento, ao argumentar que deve ser admitida a ideia de que a interrupção do parto a qualquer tempo é aborto (DINIZ, op. cit., p. 30-31).

A lei não traz especificamente uma conceituação de aborto, apenas trazendo a proibição expressa à sua realização no Código Penal (artigos 124 a 127), salvo nos casos em que a lei permite (artigo 128 do mesmo Diploma Legal).

Estamos diante de um crime comum, que pode ser comissivo (agir) ou omissivo (não agir), tendo sempre como característica subjetiva o dolo. Portanto, inexiste a sua tipificação quando o fato vier a ocorrer na modalidade culposa. O que pode acontecer é que a conduta que será dolosa venha a resultar, por exemplo, em lesão corporal culposa, ou até mesmo a morte culposa da gestante, mas este é um tópico que mais adiante será melhor analisado.

A consumação do crime de aborto se dá com a morte do feto e a interrupção da gravidez. No caso, pouco importa se a morte deste se deu ainda dentro da mãe ou fora. O que importa é a interrupção da gravidez que resulta na morte do feto. Para que seja tipificado, exige-se a consciência do agente acerca da gravidez, para que reste comprovado dolo em cometer tal conduta (CUNHA, 2008, p. 37).

Este crime comporta a hipótese de tentativa, sendo que esta será caracterizada quando houver a interrupção da gravidez, mas sem o resultado morte do feto (MAGALHÃES NORONHA, apud CUNHA, 2008, p. 37). Se, por motivo sem nenhuma ligação com os meios empregados para alcançar o resultado aborto, o feto vier a morrer – ex: se o agente, ao notar que o feto continua vivo, utiliza-se de outro meio, como uma faca, para cometer o homicídio/infanticídio, estaremos frente a um caso em que há a tentativa de aborto cumulada com o homicídio ou infanticídio (dependendo, neste caso, de quem foi o sujeito ativo). Vale lembrar que na tentativa os atos são totalmente aptos a produzir o resultado, mas este não ocorre em razão de alguma circunstância alheia à vontade do agente (art. 14, inciso II, do Código Penal).

A respeito do ato de abortar, tem-se grande discussão em nosso país. Por exemplo, podemos citar a recente decisão sobre tomada na ADPF 54, que versava sobre a possibilidade de abortar em caso de feto anencefálico.

A mulher tem assegurado por lei o seu direito de abortar nos casos trazidos no artigo 128 do Diploma Penal, sendo estes o aborto necessário e o humanitário. No entanto, aquela que pretende abortar no Brasil ainda encontra muitas dificuldades.

Primeiramente, ressalte-se que a busca pelos meios abortivos se dá, na maioria das vezes, em locais nada higiênicos e com instrumentos não próprios ao procedimento, e observa-se, de acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, que cerca de 2010 mulheres morreram nos últimos 15 anos em razão deste tipo de procedimento. Mas estes dados são os que chegam ao conhecimento do setor público, sendo certo que as demais, que não procuram os hospitais públicos para serem cuidadas, morrem e acabam não fazendo parte das estatísticas oficiais. Estudos apontam que a cada 33 segundos uma mulher aborta, e por conta desta prática, uma brasileira morre a cada dois dias.

Os casos de morte materna em razão de aborto vêm diminuindo em nosso país nos últimos 30 anos, e conforme dados fornecidos pelo Sistema Datasus, a mortalidade de mulheres na idade fértil, sendo considerada para fins de pesquisa a faixa etária compreendida entre os 15 e os 49 anos, tem-se uma queda de quase 70% no número de mortes de 1980 a 2002. Isto é, provavelmente, um reflexo das melhorias na área da saúde e no acesso a esta, por parte dos brasileiros.

Há uma tendência mundial que caminha para a diminuição dos casos de aborto. Um dos fatores que influenciaria é o acesso da população aos meios contraceptivos, como também pode ser o resultado de uma educação mais abrangente, que conscientizaria as pessoas a como agir para evitar uma gravidez indesejada.

Nota-se, segundo o trecho abaixo do dossiê “A realidade do aborto inseguro: O impacto da ilegalidade do abortamento na saúde das mulheres e nos serviços de saúde do estado do Rio de Janeiro”, sobre tal tendência a essa diminuição no número de casos de aborto no mundo:

 

Um artigo recente publicado no Lancet (Sedgh et al, 2007) estima que o número de abortamentos no mundo diminuiu de 46 milhões em 1995 para 42 milhões em 2003. Neste período, as taxas de aborto induzido diminuíram de 35 para 29 por 1000 mulheres de 15 a 44 anos. Estas taxas foram menores na Europa Ocidental (12/1000) em 2003. No Norte da Europa era de 17/1000, de 18/1000 no Sul da Europa e de 21/1000 nos Estados Unidos e Canadá.

 

O dossiê supramencionado foi confeccionado pelo Grupo Curumim em parceria com o Ipas Brasil, sendo ambas organizações não governamentais, cujo objetivo é realizar pesquisas na área da saúde da mulher, visando melhorias na saúde, bem como conscientizar dos riscos e evitar que cresça o número de casos de mortalidade materna em decorrência de realização de aborto inseguro (aquele realizado fora de locais adequados e sem o acompanhamento de profissionais da área). Por conta da realização de procedimentos de risco, como o aborto inseguro, cerca de 70.000 mulheres no mundo vêm a óbito por ano, por complicações decorrentes de tal processo.

A pesquisa supra, veio com o intuito de influenciar na criação de políticas públicas tanto para informar as mulheres quanto aos seus direitos quanto para que haja mudanças dentro do Estado, no sentido de oferecer um espaço apropriado às mulheres que optem por fazer o aborto nos casos permitidos em lei. Vários são os casos de relatos de pessoas que optaram por realizar o aborto nos casos permitidos, e ainda assim ouvirem a recusa do médico em realizá-lo.

Nos casos em que as mulheres optem por fazer o aborto legal, ou seja, aquele enquadrado no art. 128 do Diploma Penal, esta não necessita recorrer ao Poder Judiciário para obter a autorização, pois a própria lei já traz embutida em si tal autorização. Ainda assim, há casos em que o médico se recusa, e então esta mulher se vê obrigada a optar pela clandestinidade e por métodos perigosíssimos para que alcance o seu objetivo, que é a interrupção da gravidez.

Alguns dos meios utilizados, através dos métodos clandestinos de aborto, por sua própria forma de realização já demonstram potencial agressivo à vida e saúde da gestante. Vejamos alguns destes métodos:

         A inserção de caule de planta, agulha de tricô, raio da roda de bicicleta e outros objetos;

         A utilização de soluções químicas ou ervas tóxicas, através da ingestão ou aplicação por meio de ducha vaginal;

         A overdose de medicamentos; e

         Através de socos no abdômen ou massagens violentas no ventre, lançando-se escada a baixo.

Nota-se o desespero de alguém que se vê em uma situação indesejada e impedida de tomar as devidas providências para ver o fim de seu sofrimento, em razão da inexistência de uma estrutura em nosso país que comporte uma legislação liberal.

Para tal crime, o Direito Penal traz a pena de 1 até 10 anos, sendo certo que a ADPF 54 trará seus reflexos para dentro do ordenamento, influenciando num aumento de pena para a mulher que cometer tal fato sem uma “fundamentação razoável”, assim como causará a modificação nas possibilidades de admissão do aborto dentro ordenamento nacional. Há a possibilidade de, juntamente com a inovação quanto à permissão do aborto em caso de anencefalia, que haja também uma extensão aos demais casos de doenças graves que tornem inviáveis a vida do nascituro.

 

2.2. INÍCIO DA VIDA E INÍCIO DA GRAVIDEZ

 

A discussão acerca do início da gravidez é doutrinária, e deveras complexa. Não há um consenso sobre, e o maior problema que encontramos a esse respeito é a questão de que o nosso país não adota uma teoria sobre o assunto. Há doutrinadores que costumam afirmar que todas as doutrinas são adotadas no país, ao mesmo tempo em que nenhuma. A explicação é a de que, como o Brasil não adotou formalmente nenhuma teoria, e como cada decisão ou texto de lei adotam um ponto de vista diferente, então não há que se falar em predomínio de uma e nem de exclusão de outra.

Senão, vejamos quais são as quatro principais teorias, conforme elencado por NOVELINO (2010, p.388-389):

A.   Concepcionista: esta teoria conceitua que há o início da vida com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide. O Pacto de San José da Costa Rica adota esta teoria.

B.   Nidação: considera que mereça proteção a vida a partir do momento da fixação do zigoto no útero materno. Desta forma, os zigotos não implantados não teriam proteção, o que possibilita a pesquisa com células-tronco. Não há a negativa de vida, neste caso, mas apenas uma permissão para o uso destas células para contribuição no desenvolvimento humano.

C.   Sistema nervoso central: para esta teoria, a vida do feto inicia-se com o desenvolvimento neurológico, seguindo a ideia da Lei 9.434/97, que trata da retirada de órgão de pessoa em que for constatada morte encefálica (art. 3º da referida lei). Assim, considera-se com vida o feto a partir do desenvolvimento da sua “placa neural”. Conta-se o tempo médio de 14 dias, a partir da concepção.

D.   Pessoa humana em potencial ou pessoa humana tout court: é a teoria adotada pelo Comitê de Ética da França. Seria considerado a vida a partir da 24ª a 26ª semanas, sendo que este é período em que o bebê tem uma maior possibilidade de vida extrauterina. Então, até este período, poderia a gestante efetuar o aborto.

E.   Natalista: considera que a vida merece proteção e só produz os seus efeitos a partir do nascimento.

 

2.3. ESPÉCIES DE ABORTO

 

Dentro de uma classificação dos tipos de aborto, temos a seguinte divisão: aborto natural, acidental, criminoso, permitido ou legal, eugênico e econômico-social (DINIZ,2009, p.31 et seq.).

 

2.3.1.  Aborto Natural

 

O aborto natural é caracterizado pelo fato de ocorrer sem que haja a contribuição nem da mãe e nem de terceiro para que ocorra, sendo que concorrem para tal fato circunstâncias externas, podendo ser alguma doença da mãe, bem como incompatibilidade de Rh, por exemplo[2].

Este tipo de aborto não é penalizada em nosso ordenamento, já que inexiste o dolo, necessário à sua caracterização.

 

2.3.2.   Aborto Acidental

Também chamado de vulnerandi animus, é aquele em que o agente que causa o aborto não o pretendia. Age, portanto, com culpa, e não com dolo, e novamente tem-se descaracterizado o crime[3].

Este resultado – aborto – pode ser alcançado através, por exemplo, em crime preterdoloso, em que o agente pretendia causar lesão corporal na gestante (dolo), e acaba causando o aborto. Como se sabe, o crime preterdoloso é aquele em que o agente age com dolo na conduta inicial e a culpa no resultado, e como o crime de aborto somente é aceito na modalidade dolosa, não há que se falar em crime.

 

2.3.3.   Aborto criminoso

 

O aborto criminoso consta no Código Penal, dos artigos 124 a 126, sendo que o artigo 127 traz a forma qualificada de tal delito. Passemos à análise dos referidos artigos de lei:

 

Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.

 

Nesta hipótese, temos o caso em que a gestante age provocando o “autoaborto”, como é conhecido ou, aceita a ajuda de outrem para que o faça. A capitulação legal deste crime é o “aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento”, e, segundo a explicação de Rogério Sanches Cunha:

 

As duas condutas trazidas pelo tipo só podem ser praticadas diretamente pela mulher grávida. Admite-se a participação de terceiro, porém não a coautoria (crime de mão própria), respondendo o terceiro provocador nas penas do art. 126 do CP, excetuando-se, desse modo, a teoria monista ou unitária trazida pelo art. 29 do CP. (2008, p. 36)

 

Ou seja, a teoria monista, adotada pelo Código Penal Brasileiro, é posta de lado neste caso, em que temos a criação de uma tipificação específica àquele que participa do crime de aborto com a autorização da gestante.

Como a gestante consente em fazê-lo, e consentir significa concordar, permitir, o sujeito passivo de tal crime somente pode ser o feto ou embrião. Mas, para alguns, o feto não é portador de direitos senão os ditos “direitos do nascituro”, como citado no art. 2º do Código Civil, sendo, por exemplo, o direito de pleitear alimentos gravídicos. Está-se diante de direitos virtuais do nascituro, considerando que este ainda não adquiriu, segundo a teoria natalista, a personalidade civil, que somente restará caracterizada com seu nascimento. Assim sendo, se o nascituro não sendo titular efetivo de direitos, quem seria o sujeito passivo deste crime? O Estado. Sim, pois ele é o sujeito passivo constante de todo e qualquer crime, figurando, neste caso, como único. Rogério Sanches Cunha (2010, p. 36) traz que tem prevalecido o entendimento de que o produto da concepção figuraria também como sujeito passivo.

Já o artigo 125 traz hipótese de aborto provocado por terceiro. Assim traz a lei:

 

Art. 125. Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:

Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.

 

Neste caso, tem-se, então, o aborto provocado (também chamado de aborto sofrido), sendo este o ocorrido sem que a gestante tenha concordado com tal prática. Assim, podemos afirmar que a gestante se enquadra como vítima, juntamente com o feto, neste caso. Isto porque ela, consoante a sua não concordância em fazê-lo, sofre os danos da perda de um filho, juntamente com os problemas de saúde que um aborto pode causar à mulher que o realiza.

Senão vejamos o artigo 126:

 

Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante:

 

Neste trecho do artigo 126 do nosso Código Penal, percebemos que o legislador pune o aborto provocado com o consentimento da gestante, uma resposta à situação em que as gestantes buscam meios de se verem livres daquela situação, assim como no art. 124, mas o que difere uma situação da outra é que, no artigo 124, comente pode incorrer a mãe, posto ser aquele crime de mão própria, e no artigo supra enquadra-se aquele que, com a concordância da gestante, age como partícipe do crime, mas que responde diferentemente daquela.

O parágrafo único do referido artigo 126 traz que a pena de 1 a 4 anos é igualmente aplicada se a gestante não for maior de 14 anos ou é alienada ou débil mental, bem como nos casos em que o consentimento para o aborto foi conseguido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Mais uma vez, o Código Penal se preocupou em proteger a dignidade da pessoa menor, e em proteger a todos quando se tratar de grave ameaça ou violência contra a pessoa, tratando-se, em certos casos, de agravante de pena.

Temos, ainda, uma forma qualificada, trazida no art. 127 do CP. Ele nos diz que:

 

Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

 

A pena citada no início do artigo é a referida no art. 126, qual seja, reclusão, de 1 a 4 anos. Assim, no caso de o agente, ao utilizar-se de métodos abortivos, vir a causar à gestante lesão corporal de natureza grave, sua pena terá um aumento de 1/3. Já se sobrevier a morte desta, então a pena será duplicada.

Isto porque o agente poderia ter agido de forma diferente, não tendo contribuído ou ter agido visando a impedir que o aborto fosse realizado.

 

2.3.4.   Aborto permitido ou legal

 

No artigo 128, temos as espécies de aborto legais. São elas:

a.    Aborto necessário, que se caracteriza por a gestação estar trazendo risco de morte à gestante, e não haver outro meio de lhe salvar a vida.

b.    Aborto humanitário que ocorre no caso de gravidez resultante de estupro, caso este a gestante é vítima de estupro, e, querendo, poderá abortar o feto para não ter que conviver com uma criança fruto de um trauma de tamanha proporção a ela. Tal autorização para a realização de aborto deve ser dada pela gestante, ou, em caso dela ser pessoa incapaz, deve advir de seu representante legal.

Em ambos os casos, temos autorização expressa para que possa ser realizado o aborto, independentemente de autorização judicial. No entanto, há posicionamentos que defendem que o médico, a fim de se cercar de certezas de que não será penalizado pela prática, deve colher documentos e declarações tanto da gestante como de seu parceiro.

Há uma discussão doutrinária sobre o fato de tal autorização de aborto não ser uma descriminalização desse tipo, mas sim um delito que não possui pena se for praticado (MORAES apud DINIZ, 2009, p. 58). Ao se considerar este ponto de vista, temos que ponderar a cláusula pétrea a que estaria desrespeitando um artigo de lei que autorizasse que fosse tirada a vida de uma pessoa em favor de outra. Analisemos o artigo 5º, caput:

 

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, (...)

 

Ou seja: o direito à vida é inviolável. Mas seria justo com a gestante que corresse risco de morte em razão de uma expectativa de vida? O nascituro tem, sim, direito à vida, mas este se delimita no momento em que a sua existência ou prosseguimento da gestação importe risco à vida de sua genitora. Parece bastante razoável que se dê prioridade a uma vida já existente que a uma probabilidade.

 

2.3.5.   Aborto eugênico

 

Eugenia é uma tentativa de melhora biológica da raça humana, mediante seleção de indivíduos portadores de características reputadas em determinado momento histórico como favoráveis ou melhores que a dos demais. Isto significa afirmar que neste caso teríamos o aborto realizado em razão de algum tipo de anomalia física ou psíquica que o feto viesse a apresentar. Caberiam, nesta hipótese, por exemplo, a anencefalia, assim como vários tipos de síndromes.

Por alguns autores este ato é comparado ao Holocausto, prática nazista na Alemanha de Hitler. Isto porque visaria uma refinação das pessoas, descartando aquelas que tivessem algum tipo de “defeito”. Alguns especificam, dizendo que é o caso em que torne a existência do feto extrauterina inviável. De fato, tal autorização ainda não consta de nossa legislação, mas há diversos casos práticos em que juízes vêm autorizando. Vejamos a seguinte ementa, que trata de hipótese de aborto eugênico:

 

Habeas Corpus Preventivo. Pedido de interrupção de gravidez. O feto padece de “Trissomia do Cromossomo 18” ou “Síndrome de Edwards”. Relatório de Acompanhamento Genético aponta para inviabilidade de sobrevida ao feto, classificando o caso como emergência obstétrica grave diante do risco à vida da gestante. Presente a hipótese legal de aborto terapêutico ou profilático. Ordem concedida, referendada a liminar[4].

 

Não só se tem reconhecida, no caso acima, a questão do aborto eugênico, mas também do necessário, ante o risco de morte da gestante. Como é possível notar, há jurisprudência sendo formada no país nesse sentido.

Tem-se pendente no Senado Federal o Anteprojeto para alteração do Código Penal Brasileiro, vigente desde 1940. Em havendo a sua aprovação, haverá mudanças no que diz respeito ao aborto, conforme segue trecho do referido Anteprojeto:

 

(...) quando houver ‘fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais’. Ad cautelam, ‘deve ser precedido de consentimento da gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro’, além da não oposição justificada do cônjuge ou companheiro. (Projeto de Lei do Senado 236/2012)

 

Ou seja: quando a mãe, ao fazer o acompanhamento da gravidez, souber que seu filho tenha algum tipo de anomalia grave de natureza física ou mental, poderia proceder ao aborto, se assim optasse e tivesse a concordância do cônjuge. Estaríamos diante do citado aborto eugênico.

Esta prática é ainda proibida no País, mas a questão dos anencéfalos foi levada mais adiante, por importar numa discussão do mesmo tema, mas de um prisma diferente. Sobre a anencefalia trata o tópico 2.4.

 

2.3.6.   Aborto econômico-social

 

Este é caracterizado pela prática do aborto com alegações de que a gestante não possui condições econômicas para manter uma condição mínima de existência àquela criança. Não é autorizado no ordenamento jurídico brasileiro.

 

2.4.       ANENCEFALIA

 

A anencefalia ou meroanencefalia é uma patologia descrita por Volange Oliveira Carvalho em artigo publicado em meio eletrônico[5], no qual cita:

 

Consiste na ausência parcial ou completa da abobada craniana, bem como da ausência dos tecidos superiores com diversos graus de má formação e destruição dos rudimentos cerebrais. Em suma, anencefalia significa ‘sem encéfalo’, sendo encéfalo o conjunto de órgãos do sistema nervoso central, contidos na caixa craniana. (apud CARVALHO)

 

Assim, podemos compreender que em matéria de anencefalia, trata-se de um feto que não teve o desenvolvimento completo do tubo neural (parte do sistema nervoso), não ocorrendo seu fechamento.

A criança que é anencéfala, ao longo de seu desenvolvimento, não produz os chamados “cérebro” e o “cerebelo”.

O cérebro é a parte mais desenvolvida de todo o sistema nervoso humano. Pesando cerca de 1,3kg, ele está localizado na cabeça, protegido pela calota craniana. É o centro de controle dos nossos movimentos, do sono, da fome, sede e tem também a função de interpretar as informações captadas pelo corpo através dos cinco sentidos (paladar, olfato, tato, visão e audição).

Já o cerebelo é o responsável pela coordenação dos movimentos voluntários e manutenção do equilíbrio. É a parte do encéfalo (porção do sistema nervoso que compreende o cérebro, cerebelo, protuberância e bulbo raquidiano), e dependemos dele para toda e qualquer atividade motora que venhamos a desenvolver.

Como já foi mencionado, a criança anencéfala não desenvolve nem o cérebro e nem o cerebelo, o que faz com que ela não tenha movimentos voluntários. O recém-nascido geralmente é cego, surdo, inconsciente e incapaz de sentir dor, já que a parte responsável por tais sensações é o cérebro. Sua expectativa de sobrevida é de horas, sendo que 1 a cada 1.600 crianças têm constatada esta anomalia, e destes, aproximadamente a metade nascem com vida. Apenas 8% sobrevivem por mais de uma semana, e 1% sobrevive de 1 a 3 meses.

A Lei 9.434/1997 estabelece que para a retirada de órgãos é necessário que seja atestada a morte encefálica da pessoa, fato este que determinaria a morte do paciente. O Conselho Federal de Medicina vem a reafirmar isto através de sua Resolução 1480/97. No caso do anencéfalo, o argumento mais utilizado é de que ele, por não ter desenvolvido seu sistema nervoso e, consequentemente, não possui cérebro. Desta forma, seria este considerado sem vida.

Novamente, vê-se a atuação do CFM em trazer na Resolução 1.752/04 a chamada “autorização ética do uso de órgãos e/ou tecidos anencéfalos para transplante, mediante autorização dos pais.”. Temos, também, a recente Resolução deste mesmo órgão, de nº 1.989/2012, em que trata sobre o procedimento para diagnóstico de anencefalia, visando a antecipação terapêutica do parto.

Como se vê, a situação de um anencéfalo é extremamente complexa, tendo em vista a sua inviabilidade de vida extrauterina, sem falar nas duras consequências à mãe.

Uma mãe, ao receber a notícia de que seu bebê é anencéfalo, começa a viver uma situação de luto e de incertezas. Não saber se o seu filho vai nascer vivo, se vai sobreviver e quanto tempo ele viverá é ínfimo.

No último mês de abril, no dia 12, teve fim uma discussão iniciada em 2004: a ADPF 54, que tratava sobre o direito de mulheres que tivessem o diagnóstico de anencefalia de seus filhos em poder proceder ao aborto. A decisão foi favorável, e a mulher agora pode optar por realizar o aborto nesses casos.

A polêmica maior gira em torno da possibilidade de vida extrauterina do bebê, e também da questão dos diagnósticos feitos detectando a anencefalia, que pode não ser exato.

A revista Época, em sua edição 727, trouxe um impressionante caso, o da bebê Vitória. Ela foi diagnosticada anencéfala às 12 semanas da gestação – sendo que, no caso dela, havia a formação de um cérebro, mas não de uma calota craniana, o que acarretaria o desfazimento da massa encefálica pelo líquido amniótico. Nascida em 2010, à data da reportagem contava com 2 anos e meio. Não fala, ainda engatinha. Seu diagnóstico foi o de “anencefalia incompleta”.

Assim como Vitória, Marcela também se tornou um símbolo daqueles que lutam pela proibição da prática do aborto em caso de anencefalia. Marcela sobreviveu por 1 ano e 8 meses, tendo falecido em 2008. Sua mãe, Cassilda Ferreira, chegou a participar de uma audiência no STF, da ADPF 54, onde afirmou “Eu acho que [quem interrompe a gravidez] mata uma criança, não dá oportunidade de nascer.”[6].

Tem-se notícias de vários exemplos de crianças que sobreviveram durante certo período após o parto, de forma inexplicável para a medicina. A expectativa é de que o bebê morra em horas.

Os médicos consideram, ao efetuar o exame, a inexistência de cérebro para que seja confirmada a anencefalia. No entanto, dentro do crânio da criança pode haver algum tipo de tecido rudimentar que lhes permitam viver.

 

 

2.5.       PONTO DE VISTA RELIGIOSO

 

É basicamente impossível falar da questão do aborto – seja ele de anencéfalo ou não sem tocar na questão religiosa. Basicamente, o que motiva as reações nas pessoas em relação a esta questão é justamente a sua formação filosófico-religiosa.

A religião, de forma geral, não comanda o que o Direito vai decidir a respeito, mas acaba influenciando, já que quem faz o Direito são as pessoas, e cada uma possui um posicionamento pessoal que acaba interferindo.

Vale ressaltar que traremos aqui, de forma sintética, o posicionamento de algumas religiões, mas de forma neutra, tendo em vista que não tomaremos partido a problemática trazida não será analisada do ponto de vista religioso.

 

2.5.5.   Catolicismo

 

A igreja católica desde sempre se posicionou contrariamente à prática do aborto em qualquer situação, mesmo naqueles enquadrados no art. 128. Condena os procedimentos que atentem contra a vida do feto, porém, não condena a morte do feto que venha a ocorrer de forma indireta para salvaguardar a vida da mãe.

 

O catecismo atual da Igreja Católica em seu cânone 2.270, afirma que “A vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da concepção. Desde o primeiro momento da sua existência, o ser humano deve ver reconhecidos os seus direitos de pessoa, entre os quais o direito inviolável de todo ser inocente à vida.”. . Diz ainda o catecismo:  Cânone 2.272:. O direito inviolável de todo indivíduo humano inocente à vida constitui um elemento constitutivo da sociedade civil e da sua legislação (nº 2.272) (...) Visto que deve ser tratado como pessoa desde a concepção, o embrião deverá ser defendido em sua integridade, cuidado e curado, na medida do possível, como qualquer ser humano.” (nº 2.273). (MOSCHETTO, 2009, p.21)

Em 1995, o Papa João Paulo II escreveu a Carta Encíclica Evangelium Vitae, na qual afirma que “a vida possui, portanto, um caráter sagrado e inviolável, no qual se reflete a própria inviolabilidade do Criador.” [7]

Uma outra preocupação, além da proibição ao aborto cirúrgico, é aquela provocada através de pílulas (como  a pílula do dia seguinte, Cytotec etc), que são os meios do chamado aborto químico.

Quem pratica o aborto acaba sofrendo a excomunhão, bem como aquele que colabora. Já a pessoa que facilita, como os legisladores, não devem receber a Eucaristia.

 

2.5.6.   Protestantismo

 

As igrejas protestantes, de forma geral, são mais flexíveis em relação ao catolicismo, por admitirem o aborto terapêutico, mas nunca como forma de controle de natalidade. Esta questão deve ser resolvida entre pastor, médico e paciente, dando sempre grande valoração à vida da mãe[8].

 

2.5.7.   Judaísmo

 

Para o judaísmo, o aborto em caso de risco para a saúde da mãe, este é permitido, e não é posto em comparação com o crime de homicídio. Esta religião considera o feto que oferece risco à sua genitora como um “rodef” (agressor).

Para eles, o feto só se transforma em ser humano quando nasce, e se torna pessoa após um mês do seu nascimento.

Esta prática não deve ser comum e muito menos deve ser tomada a decisão somente pela mulher. A gestante deve ser acompanhada por um rabino, ao qual ela outorga poderes sobre si e então é decidido sobre qual atitude a ser tomada, levando em conta o seu bem-estar.[9]

 

2.5.8.   Islamismo

 

Para os islamitas, o nascituro passa por diversos estágios até que se torne humano, sendo fixado o prazo do 4º mês de gestação para que ele receba a sua alma. Enquanto não possui alma, enquanto não está revestido em carne e osso, não é humano, portanto, pode ser abortado.

Se o aborto ocorrer antes de o feto se tornar “humano”, então a indenização a ser paga é leve. Mas se ocorrer após o feto se tornar um ser animado, o aborto é punido com o assassinato do que o causou.

O Corão condena qualquer ato de matar, mas em caso de risco à vida da mãe, ela é a detentora da vida principal, e deve ser mantida.[10]

           

2.5.9.   Espiritismo

 

Para o espiritismo, concordam, de maneira geral, que aborto é um crime. O feto desenvolve um laço fluídico com seu corpo, que se solidifica com seu nascimento e só se rompendo com a morte. Os seguidores de Allan Kardec acreditam que aqueles que privarem o feto de seu nascimento sem uma motivação justa, terão naquela alma um inimigo para aquela ou futuras encarnações.

Em caso de risco para a vida da mãe, é preferível, assim como nas demais doutrinas, que seja mantida a vida da mãe. Já em relação ao aborto, desaprovam, considerando que a alma do feto que está sendo gerado não deu causa àquele episódio, sendo que o trauma existirá independentemente do nascimento ou não daquela criança.

Para eles, o direito à vida está acima de um “ilusório” conforto psicológico da mulher[11].

 

2.5.10.Budismo

 

No site Budismo Primordial HBS[12], tem-se uma nota a respeito da questão do aborto:

 

Somos contra. Também somos contra condenar de modo religioso quem cometeu. O budismo prega a consciência. Devemos rezar para que as pessoas tenham consciência da importância da vida e que sejam responsáveis pelos seus atos. Oramos por todos os falecidos abortados e suas respectivas mães, que não encontram orientação adequada para superarem a dificuldade de conviver com este peso.

 

Em linhas gerais, o budismo é contra o aborto, mesmo porque uma de suas diretrizes é a rejeição à violência, e tirar a vida do feto poderia ser uma forma de violência.

Vale salientar que as escrituras budistas não mencionam o aborto.

O budismo traz que devem ser rejeitadas as “três raízes do mal”, quais sejam a ambição, a má-intenção e a ignorância, transformando-as em generosidade, compaixão e sabedoria. Em casos de aborto legal (art. 128 do CP), bem como nesta prática não houver presente nenhuma das “raízes” supra, então as consequências são minimizadas, inclusive para o médico.

  

2.6.       PONTO DE VISTA JURÍDICO

 

2.6.5.   O aborto no mundo

 

O aborto é visto, genericamente, como algo uma conduta que deve ser analisada e refletida com bastante cuidado, pois para os religiosos se estará a mexer em prerrogativa exclusiva da divindade e para os homens em potencialmente estar a se agredir o direito alheio.

Por estes entraves histórico-religiosos ou mesmo ético-legais, poucos países autorizam tal prática, sendo que a maioria opta por não autorizar ou por autorizar, mas com várias restrições. 

Nota-se que não há uma linearidade na distribuição dos países que permitem ou proíbem o aborto, sendo que não prevalecem em uma só região do mundo.

O Irã é um exemplo de país que permite a execução do aborto, desde que seja feito até o 4º mês da gestação e que esta traga risco à saúde da mãe ou em casos de má formação fetal. Para eles, após a 17ª semana de gestação a criança possui alma, e então a prática é proibida[13].

Na Espanha é permitido o aborto que seja realizado por médico, nos casos em que a vida da gestante corra risco, quando for proveniente de aborto ou em casos de má formação[14].

Já na Austrália, país em que o aborto é permitido desde a década de 1970, cerca de 100 mil crianças são abortadas anualmente, e tem havido uma busca por medidas para redução de tais números[15]

 

2.6.6.   Julgamento da ADPF 54

 

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) é uma forma de controle concentrado de constitucionalidade. Trazida no art. 102, §1º, da Carta Magna, é utilizada em no ordenamento jurídico brasileiro objetivando a evitar ou a reparar lesão a preceito fundamental que tenha sido causada por ato do Poder Público.

A competência para seu julgamento é do Supremo Tribunal Federal, caso em que, com a sua propositura, ter-se-á um rito diferenciado, tendo em vista seu objeto.

Vejamos as hipóteses de arguição, elencadas na Lei 9.882/1999, em seu artigo 1º:

 

Art. 1o A arguição prevista no § 1o do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público.

Parágrafo único. Caberá também arguição de descumprimento de preceito fundamental:

I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição; (GRIFO MEU)

 

Ou seja, a arguição poderá ser feita quando houver a lesão ou iminência de que esta venha a ocorrer em face a um preceito fundamental.

A interpretação que tem sido feita a respeito do termo “preceito fundamental” é que a palavra “princípio” teria sido substituída por “preceito” visando a não limitação ao Título I da CF. Assim, o objeto da ADPF pode ser até mesmo ato já revogado. Sobre isso, traz Gilmar Mendes:

 

(...)a arguição de descumprimento poderá ser utilizada para solver controvérsias constitucionais sobre a constitucionalidade do direito federal, do direito estadual e também do direito municipal.

Diferentemente do que ocorre com o controle abstrato de normas, a ADPF poderá ter por objeto direito revogado, desde que subsista interesse jurídico no pronunciamento judicial. (2008, p. 56)

 

Desta forma, até mesmo normas pré-constitucionais, como são chamadas, poderão ser objeto de ADPF.

Desde a sua publicação, em 1999 a dezembro de 2005, 86 ADPFs haviam sido ajuizadas. Destas, algumas tiveram pedido de liminar, sendo que algumas foram indeferidas, outras deferidas de plano, e outras ainda encontram-se em aberto.[16]

Uma delas, que foi resolvida em abril deste ano, foi a ADPF 54. Tratava da questão da possibilidade de aborto de feto anencefálico, tendo em vista a inviabilidade de vida extrauterina.

Uma liminar foi concedida em 02 de agosto de 2004 neste caso, em que foi determinada a suspensão dos processos ainda não tramitados em julgado que tratavam deste mesmo tema, assim como reconheceu o direito às gestantes de se submeterem ao procedimento de aborto quando fosse constatada a anencefalia.

No mesmo ano, em 20 de outubro, foi negada a liminar, no sentido de não mais conhecer o direito às grávidas.

A ADPF foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), no ano de 2004. O relator foi o Ministro Marco Aurélio. O objeto de impugnação foram os artigos 124, 126 e 128, I e II, do Código Penal.

Com 8 votos a favor e 2 contra, a ADPF foi julgada procedente. Assim, temos a decretação do direito à gestante que tiver em seu ventre feto anencéfalo de proceder ao aborto, se assim achar conveniente.

Isto não implica em nenhuma obrigação à gestante. Pelo contrário, constitui uma faculdade, a qual deixou aberto o caminho para a escolha daquela.

 

2.7.       VIDA DO ANENCÉFALO X DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA DA MÃE

 

Muito se fala, ao argumentar contra ou a favor o aborto, nos efeitos do aborto à mãe. Uns alegam a possibilidade de risco à vida da gestante, enquanto outros alegam que estes inexistem, sendo que sua manutenção pode acarretar uma depressão. Senão, vejamos os argumentos utilizados na audiência de julgamento da ADPF 54.

Durante o julgamento, a Dra. Elizabeth Kipman Cerqueira expôs os efeitos do abortamento na mulher.  Defendeu a existência de riscos, trazendo, por exemplo, a questão de que a antecipação do parto é mais demorada e pode trazer processos infecciosos.

Expôs que em a mãe insistindo em manter a gravidez, o que poderia acontecer seria o surgimento de polidrâmnio (que seria o acúmulo do líquido amniótico no interior do útero), e até mesmo vir a sofrer com uma hipertensão arterial, problemas estes facilmente resolúveis.

Em caso de aborto, a mulher pode vir a ter doenças circulatórias e cerebrovascular, além de aumentar o risco de vir a contrair o câncer de mama.

Vejamos um trecho em que a Dra. Elizabeth fala a respeito da questão psicológica da mãe:

 

(...) quando existe o diagnóstico de má formação fetal, os problemas psicológicos de culpa, de identificação com o feto que está sendo gerado, sentimentos de regressão e de fragilidade são potencializados, e que é preciso tempo e condições pra enfrentar o problema e elaborar o luto. Então, a interrupção da gravidez e depressão: o fato de saber que tem uma gestação anencefálica realmente pode gerar uma depressão. Mas a interrupção da gravidez ou a consciência de ter sido ela a abreviar o tempo de vida do filho pode trazer maior sentimento de culpa, e, esse sentimento de culpa, ainda que inconsciente, tenderá a aumentar a angústia e a possibilidade de depressão.

 

Já o renomado advogado Luís Roberto Barroso fez a defesa da descriminalização do aborto de feto anencefálico.

A tese utilizada foi a de que inexiste crime de aborto, tendo em vista que o feto anencefálico não é um ser com vida, pois, o nosso ordenamento não especifica o início da vida, porém, especifica o momento da morte, qual seria o fim da atividade cerebral. Como o feto anencefálico sequer chega a ter funcionalidade encefálica, então se está diante de ser se potencialidade de vida extrauterina.

Foram utilizadas outras três teses: a primeira, de que, ainda que constituísse o crime de aborto, a situação seria cabível nas exceções do Código Penal, e então não haveria punição; a segunda, de que ainda que fosse aborto, o Código Penal Brasileiro não poderia punir a mãe que procedesse o aborto em razão de estar paralisado pelo Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; e a terceira, de que tal punição violaria os direitos reprodutivos da mulher.

 

3.        EUTANÁSIA

 

3.3.        CONCEITUAÇÃO

 

A palavra eutanásia, do grego euthanasía, significa “boa morte” ou “morte apropriada”. Para a conceituação atual que temos deste termo, temos a ideia de morte provocada com objetivo a cessar uma dor ou sofrimento.

Francis Bacon, em 1623, em sua obra “Historia Vitae et Mortis”, a define como sendo o adequado tratamento às doenças incuráveis.

Trata-se de um assunto bastante polêmico, tanto na ótica jurídica quanto social. É um tema que deve ser analisado em todos os aspectos possíveis – jurídico, médico, filosófico, moral.

No entanto, consoante a existência de tamanha discussão, inexiste legislação a respeito em nosso país.

A humanidade passou por um boom de desenvolvimento nos últimos 100 anos, e foram desenvolvidas novas áreas do conhecimento, como o Biodireito. Este novo ramo de estudo busca meios para colocar em prática estes novos conhecimentos, sendo que estes encontram-se em constante atrito com religiões e outras culturas.

O objetivo primeiro de tais descobertas deve ser sempre a melhora na qualidade de vida das pessoas, não podendo estas vir a ser utilizadas no sentido contrário, seja violentando o corpo humano ou a sua dignidade.

Mas, afinal de contas, a vida é um bem disponível? É possível decidir o momento em que se deve encerrar a vida de outrem, a fim de lhe evitar o sofrimento?

O argumento utilizado a favor da eutanásia é o direito à morte digna, que seria o ideal de que o uso de meios artificiais para manter alguém vivo atentaria contra a sua dignidade e retiraria sua subjetividade.

A Constituição Federal de 1988 traz em seu artigo 1º os seguintes dizeres:

 

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III – a dignidade da pessoa humana

 

Ou seja, o respeito à dignidade da pessoa humana constitui um dos fundamentos do nosso país em seus atos e relações.

A dignidade da pessoa humana encontra, em Marcelo Novelino (2010), uma classificação na qual possui

 

(...) tripla dimensão normativa, sendo ao mesmo tempo:

I.       Um postulado normativo interpretativo, quando atua como diretriz a ser observada na criação, interpretação e aplicação das demais normas;

II.      Um princípio, por impor aos poderes públicos a proteção da dignidade e a promoção dos valores e bens e utilidades indispensáveis a uma vida digna (mínimo existencial); e,

III.     Uma regra, a qual determina o respeito à dignidade, seja pelo Estado, seja por terceiros, no sentido de impedir o tratamento de qualquer pessoa como objeto, quando decorrente de uma expressão do desprezo por aquele ser humano. (p. 342)

 

Consideremos o conceito de dignidade da pessoa humana como um princípio, já que este figura como uma das bases do ordenamento jurídico brasileiro, que tem toda a sua legislação visando a não feri-lo.

Ingo Wolfgang Sarlet esclarece que:

 

(...) Immanuel Kant, cuja acepção de dignidade parte da autonomia ética do ser humano, considerando esta (a autonomia), como fundamento da dignidade do homem, além de sustentar que o ser humano (o indivíduo) não pode ser tratado – nem por ele próprio – como mero objeto (SARLET, 2004, p. 112).

 

Se, segundo Kant, o homem é o fim em si mesmo, pode-se falar em que o Estado tenha como finalidade as pessoas que nele vivem e ele compõem, e não as pessoas são usadas como meios para as finalidades do Estado.

Trata-se, pois, de hipótese de homicídio privilegiado. O artigo 121, em seu parágrafo primeiro, expõe que “se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, (...) o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço”.

Neste caso, estamos diante de uma das hipóteses de atenuantes (art. 65, III, alínea a), a qual não vai fazer com que o fato se torne atípico, mas vai influenciar na pena a ser aplicada.

A diferenciação entre motivo de relevante valor social e moral se faz necessária.

Para Damásio (1996, p. 55), a diferença está no fato de que o “motivo de relevante valor social ocorre quando a causa do delito diz respeito a um interesse coletivo”, enquanto que “o motivo de relevante valor moral diz respeito a um interesse particular”. (GRIFO MEU)

Pode-se então aferir que o direito à vida é inerente ao ser humano, mas não é dado ao ser humano o direito sobre a vida, sendo que ele não pode dispor sobre ela. Se assim o é, então não pode ser praticada a eutanásia, por caracterizar crime em nosso ordenamento jurídico.

 

“A Constituição consagra o direito a uma vida com dignidade, razão pela qual não se justifica a manutenção da vida humana a qualquer custo. Isso não significa o direito subjetivo à morte, mas a necessidade de se considerar, ainda que em hipóteses excepcionais, a vontade do paciente e as circunstâncias fáticas do caso concreto.” (NOVELINO, 2010, p. 392).

 

No mundo todo, apenas três países não consideram a eutanásia como um crime, quais sejam os Estados Unidos da América, a Holanda e a Colômbia. Nestes três países, tal ato pode ser praticado sem nenhuma restrição.

A Argentina recentemente aprovou a chamada Lei da Morte Digna, uma lei que autorizaria a eutanásia em casos de doentes terminais, ou seja, a realizar a distanásia. A liberação foi impulsionada pelo caso da menina Camila Sánchez, em que sua mãe enviou uma carta à presidenta Cristina Kirchner pedindo uma mudança na legislação para que sua filha tivesse direito a uma morte digna. Após a aprovação da lei, o aparelho que mantinha a criança viva foi desligado, e ela veio a falecer depois de duas horas[17].

No Brasil, o Código de Ética Médica traz em seu Capítulo V, artigo 41, a proibição de agir no sentido de “abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.”. E acrescenta:

 

Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.

 

Desde o seu Capítulo I, tal Código já faz menção da ideia de antecipar a morte de paciente, posto que isto seja considerado atentado contra a sua dignidade e integridade.

 

3.4.        CLASSIFICAÇÃO

 

3.4.5.   Eutanásia Ativa

 

A eutanásia ativa é caracterizada pelo agir no sentido de abreviar a vida de outrem. Também chamado de benemortásia ou sanicídio, este procedimento é assim descrito:

 

(...) não passa de um homicídio, em que, por piedade, há deliberação de antecipar a morte de doente irreversível ou termina, a pedido seu ou de seus familiares, ante o fato da incurabilidade de sua moléstia, da insuportabilidade de seu sofrimento e da inutilidade de seu tratamento, empregando-se, em regra, recursos farmacológicos, por ser a prática indolor de supressa da vida.” (FERRAZ et al, apud DINIZ, 2009, p. 376)

 

Diferencia-se da eutanásia passiva em razão do agir. Trata-se de uma ação positiva, e não de uma abstenção.

Juridicamente, não há distinção entre ambas, motivo pelo qual constantemente encontramos a denominação comum “eutanásia”.

 

3.4.6.   Ortotanásia

 

Chamada de eutanásia passiva trata-se de uma omissão ante uma situação em que o paciente somente continua vivo em razão de aparelhos ou medicamentos.

Novamente trazemos Maria Helena Diniz para conceituação:

 

Suspender os medicamentos ou medidas que aliviem a dor, ou de deixar usar os meios artificiais para prolongar a vida de um paciente em coma irreversível, por ser intolerável o prolongamento de uma vida vegetativa sob o prisma físico, emocional e econômico, acatando solicitação do enfermo ou de seus familiares (DINIZ, 2009, p. 383).

 

É a ajuda dada pelo médico ao processo natural da morte, considerando que ele procede ao desligamento de aparelhos ou deixa de utilizar dos medicamentos que mantinham viva a pessoa.

Importante anotação traz a Resolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina, que autoriza tal prática, sendo que o médico responsável deverá fazer constar tal decisão no prontuário do paciente, e tê-lo informado (ou a seu representante legal) das modalidades terapêuticas adequadas. Vejamos sua ementa:

 

Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal.

 

Desta forma, apesar da proibição de atos que venham a caracterizar a prática de eutanásia, o Conselho Federal de Medicina dispõe no sentido de entender que seja ética a prática da eutanásia nos casos em que a vida da pessoa esteja sendo prolongada artificialmente.

 

3.4.7.   Distanásia

 

Trata-se do prolongamento da vida através de meios artificiais, mas desde que isso venha a causar maior sofrimento ao paciente. É o “prolongamento exagerado da vida de um paciente terminal ou tratamento inútil”, segundo Maria Helena Diniz (2009, p. 391). O caso supramencionado da criança Camila Sánchez é um exemplo.

 

3.4.8.   Mistanásia

 

Também chamada de eutanásia social, encontra conceituação em DINIZ (2009, p. 390):

 

(...) dentro da grande categoria de mistanásia quero focalizar três situações: primeiro, a grande massa de doentes e deficientes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não chegam a ser pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de atendimento médico; segundo, os doentes que conseguem ser pacientes para, em seguida, se tornar vítimas de erro médico e, terceiro, os pacientes que acabam sendo vítimas de má-prática por motivos econômicos, científicos ou sociopolíticos. A mistanásia é uma categoria que nos permite levar a sério o fenômeno da maldade humana.

 

Tal conduta deve ser repelida, mas acaba ocorrendo em razão da falta de estrutura existente para que haja um atendimento eficaz a todos.

 

3.5.       SUICÍDIO ASSISTIDO

 

Como vimos, a eutanásia tem o objetivo de abreviar a vida de alguém, no intuito de encerrar o seu sofrimento por conta de doença incurável ou impossibilidade de uma vida digna.

Diferencia-se, basicamente, do suicídio assistido – o qual veremos abaixo – pelo fato de o ato praticado ser feito pelo próprio paciente. No caso da eutanásia, a pessoa pede a alguém que interrompa o método que a tem mantido viva ou até mesmo deixe de utilizar os medicamentos adequados para reduzir o sofrimento.

O suicídio assistido é a hipótese em que o paciente, orientado ou por terceiro ou por médico, pratica ato que o leva a morte.

No mundo, poucos são os países que permitem o suicídio assistido. São eles: Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Suíça e o estado americano de Oregon. Em todos, a legislação a respeito é bastante restrita, permitindo somente o procedimento aos doentes em estado terminal ou que sofram contínua e insuportavelmente com doença incurável.[18]

No ano de 1992, na Califórnia, houve um projeto de lei – que aliás foi rejeitado – e que tinha os seguintes dizeres:

 

O direito de optar pela eliminação da dor e do sofrimento e de morrer com dignidade no temo e no lugar de nossa própria escolha, quando nos tornamos doentes terminais, é uma parte integral de nosso direito a controlar nosso próprio destino. (apud DWORKIN, 2003, p. 253)

 

Nesse caso, estabelecia uma diretriz que um doente terminal poderia assinar, pedindo ajuda para morrer no tempo e no lugar de sua livre escolha sempre que dois médicos testemunhassem que, de qualquer modo, a morte seria inevitável dentro de seis meses.

Vê-se um movimento que caminha para a existência da pessoa enquanto possa desfrutar de uma vida digna.

Ronald Dworkin enumera em seu livro “Domínio da Vida: Aborto, Eutanásia e Liberdades Individuais” (2003) três situações passíveis de ocorrer com os pacientes, quais sejam:

a.    Consciente e competente: a pessoa tem uma doença que pode levá-la a morte em determinado prazo, mas, objetivando não chegar ao ponto do extremo sofrimento em razão desta, opta por morrer. Seria o caso do aidético, que pode, se fizer o uso correto de todos os medicamentos necessários, viver por mais longos anos, mas opta pela morte.

b.    Inconsciente: a pessoa está inconsciente e não tem um prognóstico de sair daquela situação. Pode ter feito um testamento anterior que fale sobre tal situação, ou o próprio hospital adota medidas específicas para esses casos. Pode ser, por exemplo, o caso de a pessoa ter uma parada cardíaca, e, em sabendo que se a ressuscitarem ela somente sobreviverá por poucos dias ou horas, não o fazem. Eles evitam o prolongamento da vida em situação indigna. No entanto, alguns pacientes chegam a fazer documentos alegando que não desejam tal situação, pedindo para que sempre que for possível, que sua vida seja prolongada, através de todo e qualquer meio.

c.    Consciente mas incompetente: é o caso da pessoa com o Mal de Alzheimer – ela tem consciência, mas não tem condições de agir por si própria, ou pretende evitar a chegar num estágio avançado da doença, caso em que estará incompetente para decidir ou para agir para encerrar a própria vida.

Em nossa legislação, a pessoa que viesse a auxiliar ou a fornecer meios para o suicídio assistido estaria agindo conforme o disposto no artigo 122 do Código Penal, que dispõe “induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio”. A pena seria de 2 a 6 anos se o suicídio se consumir.

Na Suíça, a clínica Dignitas, defende a ideia de autodeterminação. O ser humano, segundo consta em sua página, “tem o direito à saúde e à dignidade”, sendo que aquele que não possa mais gozar de tais direitos, tem sim a prerrogativa de optar por morrer. Apesar disto, a clínica apenas aceita pacientes cujo caso é extremo, pois a doença não tem cura, não há outros meios de tratamento e a eles já não mais aguentam o sofrimento.[19]

O procedimento utilizado na Dignitas é o do veneno, em que o paciente toma o veneno e em poucos segundos deixa de receber oxigênio, vindo a falecer.

Um dos pacientes que por ali passaram foi Hugo Claus, famoso escrito belga que foi acometido pelo mal de Alzheimer. Ele optou morrer que viver sem poder fazer o que mais gostava: escrever.[20]

Polêmico, Jack Kevorkian ficou conhecido mundialmente como Doutor Morte. Médico estadunidense, criou a “máquina do suicídio” – uma máquina em que o paciente tinha uma agulha colocada em sua veia e por livre e espontânea vontade pressionava o botão que acionava o dispositivo que injetava a substância que a mataria. Por conta do suicídio de um homem que foi filmado e apresentado em rede aberta, o Doutor Morte ficou preso por mais de 8 anos. A história de Jack é tão famosa que acabou virando um filme, “Você não conhece Jack”.[21]

Outro famoso caso que veio a virar filme foi o do espanhol Ramón de Sampedro, tetraplégico desde os 26 anos, que, após 29 anos de tetraplegia e 5 de luta judicial, conseguiu o suicídio assistido com a ajuda de amigos, mas sem autorização judicial. O caso ganhou repercussão mundial, vindo a servir de roteiro ao filme “Mar Adentro” [22].

Sobre o tema, Dworkin (2003) traz três importantes questionamentos:

a.    Autonomia: a pessoa tem a plena liberdade de escolha no que tange ao direito à vida? A pessoa tem o direito de escolher o momento de sua morte? A autonomia da vontade é ilimitada?

b.    Interesses fundamentais: por razões paternalistas, sempre os que estão analisando de fora o caso vão entender que a pessoa que optou pela morte não sabe o que é o melhor para ela.

c.    Santidade: o valor intrínseco da vida, dito como sagrado, seria violado.

Isto posto, não é possível ainda delimitar quais os limites da liberdade da pessoa em poder decidir sobre o fim de sua vida. O Estado impõe um direito e  uma obrigação ao mesmo tempo, então, já que a pessoa tem o direito de ver sua vida respeitada, e a obrigação de não atentar contra a própria vida visando a pôr termo nesta.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Conforme fora demonstrado ao longo da presente pesquisa, o direito à vida deve ser sempre respeitado, em observação ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Ambas as questões – do aborto e da eutanásia – são muito polêmicas, e não há uma expectativa que deixem de sê-lo, já que são temas inerentes ao nosso dia-a-dia a vida e a morte.

Sobre o aborto, pode-se concluir que há uma mudança ocorrendo na legislação nacional, que virá a modificar as questões relativas aos fetos anencefálicos, e conforme seja aprovado o Anteprojeto do Novo Código Penal, teremos incluído em nosso ordenamento uma nova redação do capítulo que cuida dos crimes contra a vida. Assim, haverá uma maior liberdade de escolha à mãe, em poder decidir se quer prosseguir com a sua gravidez (nos casos de anencefalia), e nos casos em que houver atestado por dois médicos, o risco de o bebê ter outros tipos de anomalias físicas e psíquicas. É um avanço, mas tem-se que trabalhar para uma informação a essas gestantes para que não se tenha um aumento desordenado no número de abortos.

Vale ressaltar, que não se trata de uma liberação a tal prática, mas a existência de uma legislação que autoriza que a mãe possa decidir sobre a sua vida e a do feto que carrega em seu ventre.

Sobre a eutanásia, é causa de contradição em território nacional, tendo em vista que o Código de Ética Médica proíbe a sua prática, mas o Conselho Federal de Medicina o entende como sendo ético. Isto não se aplica a todas as modalidades, mas sim quando a vida da pessoa apenas esteja sendo mantida através de meios artificiais.

Nossa legislação prevê a prática do homicídio por relevante valor moral como sendo causa de diminuição de pena, mas, com o advento do Novo Código Penal, haverá uma modificação, e esta passará a ser tipificada, com pena de três a seis anos.

O que se pode afirmar, neste momento é que estamos passando por um período de grandes mudanças na legislação nacional, e principalmente na consciência social, visto que esta sempre foi mais conservadora e tem aberto o caminho para a aceitação das mudanças que vêm ocorrendo. Não temos ainda os limites dos direitos de liberdade individuais, já que podemos dispor dos direitos que não sejam os personalíssimos, mas temos, em ambos os casos – aborto e eutanásia – evidente conflito entre a vida e a dignidade da pessoa humana. Porém, até quando viver é admitido como bem humano? E quando morrer deixa de ser repugnante e passa a ser forma de expressão de amor ao próximo?

Só o amadurecimento ético do ser humano e o bom senso poderão dar boa conclusão a estas perguntas.

 

 REFERÊNCIAS

 

A.   FONTES

 

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Agências Internacionais. Jack Kevorkian, o “Doutor Morte”, morre aos 83 anos nos EUA. Disponível em <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/06/jack-kevorkian-o-doutor-morte-morre-aos-83-anos-nos-eua.html>. Acesso em 18/08/2012.

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B.   PERIÓDICOS

 

BONELLA, Alcino Eduardo. Pela Defesa das Pesquisas com embriões humanos. Revista Filosofia, número 70, maio, 2012, p. 25-31.

PINHO, Ângela. O aborto além da anencefalia. Revista Época, número 727, abril, 2012, p. 66-70.

 

C.   LIVROS E MONOGRAFIAS

 

BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, 5ª Ed. Rio de Janeiro, Renovar, 2001.

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro, Campus, 1992.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 24ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2009.

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CASTILHO, Ricardo. Direitos Humanos: Processo Histórico – Evolução no mundo – Direitos Fundamentais: constitucionalismo contemporâneo. São Paulo, Saraiva, 2010.

COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos, 3ª Ed. São Paulo, Saraiva, 2003.

CUNHA, Rogério Sanchez. Direito Penal: Parte Especial, 2ª Ed. São Paulo, RT, 2008.

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ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. São Paulo, RT, 1999.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário Aurélio: o Dicionário da Língua Portuguesa, 8ª Ed. Curitiba, Positivo, 2010.

MENDES, Gilmar Ferreira. Arguição de descumprimento de preceito fundamental: comentários à Lei n. 9.882, de 3. 12. 1999 , 1ª edição. São Paulo: Saraiva, 2007.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, 2ª Ed. São Paulo, Saraiva, 2008.

MOSCHETTO, Maria de Fátima Paulino. A não Descriminalização do Aborto em vista ao Direito do Nascituro. 2009. 57 p. Monografia – Departamento do Curso de Direito – Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis, São Paulo, Assis, 2009.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 4ª Ed. Rio de Janeiro, Forense; São Paulo, Método, 2010.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais, 4ª Ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado Editora, 2004.

VERARDO, Maria Tereza. Aborto: Um direito ou um crime? São Paulo, Moderna, 1987.



[1] VARELLA, Dráuzio. Abortos Espontâneos. Disponível em <http://drauziovarella.com.br/saude-da-mulher/gravidez/abortos-espontaneos/>. Acesso em 15/07/2012.

[2] DINIZ, opus cit, p. 31.

[3] Id., 2009, p. 31

[4] Tribunal de Justiça de São Paulo, Habeas Corpus 0045924-20.2012.8.26.0000, 1ª Câmara de Direito Criminal, julgado em 23/04/2012, publicado em 27/04/2012. Disponível em <http://cjo.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=5853132&vlCaptcha=TidWQ>. Acesso em 11/05/2012.

[5] CARVALHO, Volange Oliveira. A anencefalia e o princípio da dignidade da pessoa humana no regime neoconstitucional brasileiro. Disponível em <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10385>. Acesso em 22/08/2012.

[6] RODRIGUES, Lorenna . Mãe diz que filha anencéfala foi "presente divino"; médicos acusam erro de diagnóstico. Brasília. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u437962.shtml>. Acesso em 10/08/2012.

[7] PAULO II, Papa João. Vaticano. Disponível em <http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_25031995_evangelium-vitae_po.html>. Acesso em 15/08/2012.

[8] MOSCHETTO, Maria de Fátima Paulino. A não Descriminalização do Aborto em vista ao Direito do Nascituro. 2009. 57 p. Monografia – Departamento do Curso de Direito – Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis, São Paulo, Assis, 2009.

[9] Id., opus cit., p.21 et seq.

[10] MOSCHETTO, opus cit. p. 21 et seq.

[11] Informação pessoal conseguida através de Renata Arnaut, estudiosa da filosofia espírita.

[12] Budismo Primordial HBS. Qual é a visão budista sobre: Aborto, perdão, casamento,doença, Jesus Cristo? Disponível em <http://www.budismo.com.br/faq/faq.php?q_id=28>. Acesso em 13/08/2012.

[13] Ministério da Saúde. Parlamento do Irã aprova lei do aborto. Disponível em: <http://www.aids.gov.br/noticia/parlamento-do-ira-aprova-lei-do-aborto>. Acesso em 20/08/2012.

[14] Aborto.com. Aspectos Jurídicos do Aborto. Disponível em <http://www.aborto.com/legisla%C3%A7ao.htm>. Acesso em 16/08/2012.

[15]AQUINO, Felipe. Número de abortos aumenta com a legalização. Disponível em <http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=9452>. Acesso em 13/08/2012.

[16] MENDES, Gilmar Ferreira. Arguição de descumprimento de preceito fundamental: comentários à Lei n. 9.882, de 3. 12. 1999 , 1ª edição. São Paulo: Saraiva, 2007.

 

[17] Agência Efe. Morre menina que inspirou lei argentina da morte digna. Disponível em <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2012/06/morre-menina-que-inspirou-lei-argentina-de-morte-digna.html>. Acesso em 30/07/2012.

[18] GOLDIM, José Roberto. Suicídio Assistido. Disponível em <http://www.bioetica.ufrgs.br/suicass.htm>. Acesso em 14/08/2012.

[19] Dignitas. Disponível em <http://www.dignitasinternational.org/>. Acesso em 07/08/2012.

[20] YOUTUBE. Terry Prachett: Choosing to Die (2011) Full Documentary. Disponível em  <http://www.youtube.com/watch?v=slZnfC-V1SY>. Acesso em 18/08/2012.

[21]  Agências Internacionais. Jack Kevorkian, o “Doutor Morte”, morre aos 83 anos nos EUA. Disponível em <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2011/06/jack-kevorkian-o-doutor-morte-morre-aos-83-anos-nos-eua.html>. Acesso em 18/08/2012.

[22] GOLDIM, José Roberto. Caso Ramón Sampedro: Suicídio Assistido. Disponível em <http://www.bioetica.ufrgs.br/sampedro.htm>. Acesso em 20/08/2012.

 

 

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