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 Sala dos Doutrinadores - Artigos Jurídicos
Autoria:

Jose Vital Brigido Nunes Junior
Advogado, formado pela Universidade de Fortaleza no curso de Direito, especialista em Processo Civil Individual e Coletivo.

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Monografias Direito Processual Civil

SENTENÇA E COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS

Coisa julgada no âmbito da tutela coletiva, Os limites subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas, Seus efeitos nos direitos difusos, Coletivos stricto sensu e individuais Homogêneos.

Texto enviado ao JurisWay em 15/12/2011.

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ARTIGO

 

 

 

Coisa julgada no âmbito da tutela coletiva, Os limites subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas, Seus efeitos nos direitos difusos, Coletivos stricto sensu e individuais Homogêneos.

 

RESUMO: O presente trabalho tem como principal objetivo analisar a relevância da coisa julgada nas ações coletivas, demonstrando aspectos gerais e particularidades capazes de torná-la um dos maiores diferenciadores do processo coletivo em relação ao individual. Para tanto, serão utilizadas doutrinas clássicas bem como autores modernos que buscam, através de lições clássicas e jurisprudência recente, escrever uma doutrina aprofundada sobre diversos temas. A coisa julgada, como meio de garantir a estabilidade das decisões judiciais que põem fim à relação processual, será relacionada ao processo coletivo, estabelecendo-se seus limites subjetivos, bem como sua forma de produção.

 

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO – REGRAMENTO DA COISA JULGADA NO ÂMBITO DA TUTELA COLETIVA; OS LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS; COISA JULGADA E SEUS EFEITOS NOS DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS STRICTO SENSU E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS; CONCLUSÃO.

 

INTRODUÇÃO

O regramento da coisa julgada no âmbito da tutela coletiva

A evolução da sociedade, com o aparecimento de novos interesses e questões complexas, influenciou fortemente a ciência do Direito, em especial o Direito Processual Civil, que teve seus institutos adaptados a essa nova realidade social e jurídica. Aos poucos, instrumentos legais isolados passaram a formar um sistema, tendo em vista suas mesmas características e objetivos. Houve o surgimento de um Direito Processual Coletivo, com princípios, regras e institutos próprios, podendo-se destacar, entre esses últimos, os institutos da legitimidade, competência, litispendência, liquidação e execução de sentença e coisa julgada. A proteção aos direitos coletivos lato sensu, constitucionalmente afirmados desde 1988, integra a função jurisdicional do Estado, de forma a aproximar o poder público da sociedade como um todo titular de direitos reivindicáveis.

Mas é a formação e o alcance da coisa julgada nesse microssistema processual coletivo que interessa analisar no presente estudo. Trata-se de instituto que, diversamente do que ocorre no processo individual, quando relacionado ao processo coletivo assume diversos atributos especiais, como a extensão de sua eficácia e seu modo de produção, os quais variam conforme a de direito coletivo posto em causa. O regramento diferenciado da coisa julgada nas ações coletivas rompe com a idéia individualista presente do Código de Processo Civil, na medida em que seus efeitos atingem pessoas que não participaram diretamente do processo, mas que são as principais interessadas pela decisão judicial.

Os artigos 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor estabelecem regras específicas sobre a coisa julgada, indicando o caput do artigo 103 que as regras ali disciplinadas referem-se às ações coletivas previstas para defesa do consumidor em juízo. Porém, como explica o autor Pedro Lenza, o artigo 117 daquele mesmo Código acrescentou o artigo 21 à lei 7.347/1985, estabelecendo aplicar-se o Título III do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe sobre a defesa do consumidor em juízo, à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos de que trata a lei da ação civil pública. E o artigo 90 do CDC permite a aplicação, no que couber, das normas previstas no Código de Processo Civil e na lei da ação civil pública às ações coletivas do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, as regras a respeito da coisa julgada e seus limites previstas no Código de Defesa do Consumidor, na lei da ação civil pública e nas demais leis que formam esse microssistema processual coletivo servem para todas as ações coletivas que busquem a proteção de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

O Código de Defesa do Consumidor, com aplicação em qualquer ação civil pública ou coletiva que trate de direito metaindividual, disciplinou de forma coerente e integrada a formação e os efeitos da coisa julgada nas ações coletivas, assim expondo em seu artigo 103, “caput”:

“Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este Código, a sentença fará coisa julgada:

I – erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos temos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III – erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81”.

O parágrafo primeiro do artigo em questão ainda menciona que no caso de ação em defesa de direitos difusos e coletivos stricto sensu, a coisa julgada não prejudicará os direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe. E o parágrafo segundo do mesmo dispositivo diz que quando se tratar de direitos individuais homogêneos e houver improcedência da demanda, só não serão atingidos pela coisa julgada aqueles que não participaram do processo como litisconsortes.

Outro dispositivo legal acerca da matéria é o artigo 16 da lei da ação civil pública – lei7.347/1985, cuja redação será referida mais adiante em estudo próprio, tendo em vista tratar-se de dispositivo que traz norma irrazoável e inconstitucional ao estabelecer limite territorial à coisa julgada formada no processo coletivo.

 

Os limites subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas

Quando falamos em limites subjetivos da coisa julgada referimo-nos, na verdade, a quais pessoas ficarão submetidas à imutabilidade do comando jurisdicional. Esse vem a ser um dos aspectos mais importantes do regime da coisa julgada nas ações coletivas, visto não haver limitação às partes da relação processual, estendendo-se àqueles substituídos que tiveram seus direitos defendidos por outra pessoa.

Cumpre lembrar que o artigo 472 do Código de Processo Civil dispõe que a coisa julgada atinge apenas quem foi parte no processo, não beneficiando nem prejudicando terceiros. Trata-se de coisa julgada inter partes, pois apenas quem participou da relação processual sofrerá os efeitos da coisa julgada, a qual será formada apenas quando houver decisão de mérito. Assim, a regra geral do Código é puramente individualista, não havendo extensão da coisa julgada para terceiros, exceto nas situações em que figurem no processo substitutos e sucessores processuais, existindo, contudo, discussão na doutrina a respeito dessas hipóteses.

O Código de Defesa do Consumidor consagrou a eficácia erga omnes para as decisões que contemplem a procedência ou improcedência, salvo por insuficiência de provas, das demandas envolvendo interesses ou direitos difusos e eficácia ultra partes para as demandas que versem sobre interesses ou direitos stricto sensu. Em relação aos interesses ou direitos individuais homogêneos, o Código também contemplou a coisa julgada erga omnes. No que tange à expressão erga omnes, cumpre mencionar a observação feita pelo professor Antônio Gidi acerca da distinção entre eficácia de sentença e imutabilidade dos efeitos da sentença. A sentença, como ato de império do Estado, estende a força de seu comando perante toda a sociedade, produzindo, dessa forma, sempre efeito erga omnes. Mas o Código, quando utiliza a expressão erga omnes, se refere à extensão da imutabilidade dos efeitos da decisão judicial, pois a eficácia da própria sentença atinge a todos indistintamente, seja a ação coletiva, seja a ação individual.

Apesar de erga omnes e ultra partes serem expressões que, isoladamente consideradas, não se distinguiriam, tendo em vista que ambas transmitem a idéia de que a imutabilidade da sentença ultrapassa as partes do processo, a realidade é que o legislador tratou de forma diversa seus efeitos. Explica o autor e promotor de justiça Hugo Nigro Mazilli que, ao estipular as regras informantes de uma e outra das hipóteses (art. 103, incisos I a III do CDC), o legislador mostrou que quis efetivamente diferenciá-las: com coisa julgada erga omnes, quis alcançar a imutabilidade da decisão em relação a todo o grupo social, e com a coisa julgada ultra partes quis alcançar mais do que as meras partes da ação coletiva, mas menos do que todo o grupo social, porque limitou a imutabilidade ao grupo, categoria ou classe de pessoas atingidas.

Imperioso se faz expor a crítica realizada por Antônio Gidi a respeito da terminologia adotada pelo Código de Defesa do Consumidor. Diz o autor que a expressão erga omnes não significa exatamente ‘contra todos’, como poderia parecer, porque limitada à comunidade titular do direito supraindividual e, na eventualidade de procedência, aos titulares dos correspondentes direitos individuais homogêneos. Para o autor, o CDC poderia ter utilizado a expressão ultra partes nas três hipóteses previstas em seu artigo 103, pois a coisa julgada nas ações coletivas não atinge todos os seres humanos existentes no planeta, mas tão só e exclusivamente a comunidade lesada, o grupo, categoria ou classe lesados e as vítimas e seus sucessores.

Mas não concordamos, em parte, com a crítica supramencionada realizada por Antônio Gidi, pois os direitos difusos possuem como titulares pessoas indeterminadas e indetermináveis, cuja esfera jurídica individual poderá ser modificada pela ocorrência de um dano muito abrangente. Assim, diferente do que ocorre com os direitos coletivos stricto sensu, os direitos difusos não podem, devido a sua natureza, ser restritos a um grupo, categoria ou classe, sendo acertada a terminologia coisa julgada erga omnes utilizada pelo CDC. No entanto, no que tange aos direitos individuais homogêneos, mais adequada seria, realmente, a expressão ultra partes, ao invés de erga omnes, pois a defesa desses interesses ou direitos abrange apenas os integrantes do grupo, categoria ou classe de pessoas lesadas, da mesma forma que acontece com os direitos coletivos stricto sensu. Ainda que o grupo seja indeterminável, a imutabilidade da decisão não ultrapassará as pessoas lesadas ou seus sucessores.

Em sede de direitos individuais homogêneos, a norma contida no inciso III do artigo 103 do CDC garante a eficácia da coisa julgada apenas na hipótese de procedência da demanda, fugindo à regra do esquema tradicional, em que a decisão, não importa o seu conteúdo, se estende ao substituído no caso de substituição processual. Por conseguinte, a decisão desfavorável não prejudicará os substituídos em seus direitos individuais (ao menos que tenham ingressado na demanda coletiva como litisconsortes, nos termos do artigo 94 do CDC), restringindo seus efeitos entre as partes do processo.

Interessante lembrar que as normas referentes aos limites subjetivos da coisa julgada nas ações coletivas existiam antes mesmo da entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, com a regência da lei da ação popular e da lei da ação civil pública. A inovação trazida pelo CDC foi a coisa julgada ultra partes no caso de ação cujo objeto seja interesse ou direito coletivo stricto sensu.

O sistema processual coletivo brasileiro inseriu a coisa julgada secundum eventum probationis para a defesa de direitos difusos e coletivos stricto sensu. Assim, se o pedido for julgado improcedente com insuficiência de provas, não ocorrerá extensão da coisa julgada aos substituídos na relação processual. A ação poderá ser reproposta, inclusive pelo mesmo autor da demanda julgada improcedente, desde que amparado em novas provas. Contudo, se o direito controvertido for individual homogêneo, o julgamento com insuficiência de provas não autorizará a repropositura da ação coletiva, tanto para seus legitimados, quanto para os titulares desses direitos que ingressaram como litisconsortes.

Ainda, conforme explica o autor Roberto Carlos Batista, a doutrina, partindo de uma interpretação sistemática, constata que a extensão subjetiva do julgado em estudo se opera não apenas quando a sentença for condenatória, mas quando contemplar obrigações de fazer ou não fazer. Isso acontece pelos seguintes motivos: por natureza, a ação civil pública se destina à recomposição do bem lesado (obrigação de fazer ou não fazer) e somente na inviabilidade real dessa medida impõe-se a condenação em dinheiro. O artigo 3º da lei 7.347/1985 contempla a possibilidade de que o objeto da ação seja a condenação em dinheiro ou a obrigação de fazer ou não fazer.

Por fim, a eficácia da coisa julgada opera-se secundum eventum litis, ou seja, os titulares dos direitos coletivos serão atingidos pela imutabilidade do julgado somente quando a ação for procedente. A coisa julgada em si é formada independentemente do resultado do processo, no entanto, os substituídos não serão atingidos por uma decisão desfavorável aos seus interesses.

 

Coisa julgada e seus efeitos nos direitos difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos

Ainda que estejamos falando em direitos metaindividuais que podem atingir, de acordo com o interesse social presente na demanda, milhares de pessoas, é imprescindível a formação da coisa julgada como imperativo da segurança jurídica e instrumento contra a perpetuidade das controvérsias. Exatamente por serem tratados direitos coletivos, o julgado produz uma eficácia social maior, na medida em que estende seus efeitos pra muito além das partes envolvidas na relação processual.

Grande entendimento sobre a amplitude da coisa julgada nas ações em comento nos traz Rodolfo de Camargo Mancuso:

“Existe uma íntima correlação entre três pontos nevrálgicos do processo civil: o pedido, que, por sua vez fixa os limites da sentença (arts. 2º, 128 e 460 do CPC), os quais, na seqüência, irão circunscrever a extensão e a compreensão da coisa julgada (arts. 468 e 472 do CPC). Vista dessa forma, a coisa julgada nas ações coletivas apresenta-se como um posterius, em relação ao binômio formado pela natureza do interesse e pelo contingente de sujeitos aí subjacente. É dizer, a coisa julgada não é uma realidade autônoma, mas apenas ganha concreção à medida que se agrega, como qualidade (imutabilidade), aos efeitos de uma decisão de mérito; logo, para se compreender até onde vai a coisa julgada coletiva, deve-se começar indagando qual a projeção espacial por onde se estende o interesse metaindividual em lide e quais sujeitos lhe são concernentes”.

O regramento da coisa julgada na tutela coletiva foi inovador em vários sentidos, propiciando várias observações a serem realizadas. Podemos falar, em um primeiro momento, que as decisões proferidas em ações coletivas atingem um número indeterminado de pessoas, beneficiando todos os lesados. Isso ocorre porque os fatos que ensejam a propositura de demandas coletivas violam bens ou direitos metaindividuais, cuja maior característica é a própria indivisibilidade. Ainda que seja uma defesa coletiva de direitos individuais homogêneos, a decisão final abrangerá todos aqueles que foram substituídos no processo20. Embora o artigo 16 da lei 7.347/1985 imponha limites territoriais à coisa julgada, questão anteriormente abordada, a autoridade da coisa julgada se dá em todo o território nacional, havendo que se falar somente em limites objetivos (o que exatamente transitou em julgado) e limites subjetivos (quem está sujeito à autoridade), nunca em limites territoriais.

Outra observação importante a ser feita diz respeito à coisa julgada secundum eventum litis. A maioria dos autores concorda em dizer que a coisa julgada nas ações coletivas é, assim como no processo coletivo, pro et contra, ou seja, tem sua formação independentemente da demanda ser procedente ou improcedente22. É a sua extensão aos substituídos no processo coletivo que ocorrerá segundo a procedência ou improcedência da ação (secundum eventum litis) e não a formação da própria imutabilidade do conteúdo da sentença. Sobre o assunto, trazemos à colação uma explicação presente na obra do professor Fredie Didier JR.:

“O CDC determinou a ocorrência da coisa julgada material entre os colegitimados e a contraparte, ou seja, a impossibilidade de repropor a demanda coletiva caso haja sentença de mérito (pro et contra), atendendo, assim, aos fins do Estado na obtenção da segurança jurídica e respeitando o devido processo legal com relação ao réu que não se expõe indeterminadamente à ação coletiva, ficando, dessa forma, respeitada a regra tantas vezes defendida pela doutrina: ‘A coisa julgada, como resultado da definição da relação processual, é obrigatória para os sujeitos desta’. Nos processos coletivos ocorre sempre coisa julgada. A extensão subjetiva desta é que se dará ‘segundo o resultado do litígio’, atingindo os titulares do direito individual (de certa forma denominados substituídos) apenas para seu benefício”.

Existem fortes argumentos contrários a essa extensão subjetiva da coisa julgada segundo o resultado do processo. O principal deles tem respaldo no cumprimento do princípio do devido processo legal ao réu, tendo como seu maior defensor o processualista Mauro Cappelletti.

Para o autor, se a parte representa adequadamente os membros de um grupo, então não se poderia distinguir entre efeitos favoráveis ou contrários, devendo a coisa julgada estender-se a todos os representados. Não se deve pensar exclusivamente no lado coletivo, pois o indivíduo-réu não pode estar eternamente sujeito à angústia, aos riscos e ao elevado custo decorrente de um sem número de processos, apesar de já ter saído vencedor em uma demanda coletiva24. A crítica é relacionada à proteção dos direitos individuais, pois o réu, como parte no processo, não pode ter suas garantias desrespeitadas. Além disso, se uma primeira demanda coletiva for julgada improcedente, tendo em vista que no processo coletivo existem instrumentos e profissionais técnicos que proporcionam uma adequada discussão, será muito pouco provável atingir a procedência em uma segunda demanda.

O Código de Defesa do Consumidor introduziu uma nova forma de produção da coisa julgada nas demandas que discutirem sobre direitos difusos ou coletivos stricto sensu, conforme os incisos I e II do seu artigo 103. Trata-se de situação em que somente haverá a formação da coisa julgada quando a procedência ou improcedência da ação se der com suficiência de provas. A sentença desfavorável fará coisa julgada de acordo com a prova produzida. A prova nova, a ser produzida por qualquer legitimado, autoriza a propositura de nova ação coletiva baseada em idêntico fundamento. Alguns autores, como Rodolfo de Camargo Mancuso e Arruda Alvim, entendem que o juiz deve ser expresso ao julgar por insuficiência de provas, mas outros, como Antonio Gidi, consideram apenas a demonstração da existência de prova nova um requisito indispensável para a repropositura da mesma ação coletiva. Para este último, ao contrário do que ocorre com necessidade de apresentar documento novo nas ações rescisórias, não é necessário demonstrar que a prova era pré-existente, ou que se ignorava a sua existência ou que não se pôde fazer uso dela no processo original. A mera apresentação da nova prova é suficiente para a reabertura do processo.

Ada Pellegrini, por ocasião da elaboração do Anteprojeto de Código Modelo de Processos Coletivos para a Ibero-América, estudou a coisa julgada secundum eventum probationis com certa profundidade, concluindo o seguinte:

“(...) a fórmula que possibilita ao legitimado ativo ajuizar nova ação com o mesmo fundamento, quando a demanda coletiva for rejeitada em virtude da insuficiência de provas, pode ser interpretada como consagradora da coisa julgada secundum eventum probationis, permitindo a repropositura da ação, com base em novos elementos probatórios, não existentes à época do primeiro processo, ainda que o juiz não tenha, explicita ou implicitamente, se referido à improcedência por insuficiência de provas”.

Como visto até então, a coisa julgada sempre será formada nas demandas coletivas, exceto naquelas que versarem sobre direitos difusos ou coletivos stricto sensu julgadas improcedentes por insuficiência de provas, caso em que a prova nova, aquela que não pôde ser produzida no processo, ensejará a repropositura da ação por qualquer legitimado. Além disso, a extensão subjetiva da coisa julgada aos substituídos no processo ocorrerá sempre em seu benefício, ou seja, só serão atingidos pela imutabilidade da sentença coletiva se essa for procedente, caso contrário não serão atingidos, podendo demandar seus direitos em ações individuais. A coisa julgada produzida em demandas coletivas julgadas improcedentes somente vinculará subjetivamente os legitimados à propositura dessas ações.

Mas cabe ainda uma terceira observação a ser feita. Diferente do que ocorre na defesa dos direitos difusos e coletivos stricto sensu, quando a demanda versar sobre direitos individuais homogêneos, sendo procedente ou improcedente, mesmo que a improcedência seja por insuficiência de provas, a coisa julgada sempre alcançará todos os co-legitimados. Mas quanto aos substituídos, a extensão subjetiva da coisa julgada ocorrerá in utilibus, de forma que o pedido julgado improcedente não prejudicará a esfera individual de nenhum interessado que não compôs a lide como litisconsorte. Cada interessado poderá demandar individualmente, desde que não tenha intervindo na ação coletiva. Em se tratando de ação para defesa de direitos individuais homogêneos, o artigo 94 do Código de Defesa do Consumidor permite o ingresso dos titulares desses direitos na relação processual. Ainda estabelece o artigo 103, § 3º do CDC que as vítimas e seus sucessores poderão aproveitar a procedência das demandas coletivas em suas ações individuais por danos pessoalmente sofridos, procedendo à liquidação e execução individual e buscando o ressarcimento de seus prejuízos individuais.

Por fim, quanto à concomitância de ações coletivas e ações individuais ajuizadas anteriormente e os efeitos da coisa julgada sobre essa situação, o artigo 104 do CDC estabelece que para que os autores das ações individuais possam se beneficiar dos efeitos erga omnes ou ultra partes da coisa julgada nas hipóteses dos incisos II e III do artigo 103 do CDC deverão, no prazo de 30 dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva, requerer a suspensão da ação individual. Na hipótese de não terem requerido a suspensão da ação individual, cientes da existência de ação coletiva, não poderão se beneficiar da extensão subjetiva do julgado secundum eventum litis, em caso de procedência da ação coletiva. Por outro lado, caso tenham requerido a suspensão da ação individual haverá extensão subjetiva do julgado in utilibus.

 

Conclusão

Buscando aperfeiçoar a tutela coletiva, os instrumentos processuais têm tratado de forma mais específica e detalhada os institutos do denominado Processo Civil Coletivo. Os mecanismos inseridos no processo individual não servem ao cumprimento do objetivo visado pelas ações coletivas: atender interesses de pessoas indeterminadas ou determinadas, mas ligadas entre si por circunstâncias de fato, relação jurídica base ou origem comum.Em relação à mudança processual ocasionada pelo surgimento da tutela coletiva, a coisa julgada aparece como um instituto que assumiu nova regência. Essa autoridade, capaz de tornar a sentença coletiva imutável para o futuro em face de todos os envolvidos no processo em que foi pronunciada, tem uma particularidade: atinge os titulares dos direitos coletivos sem que tenham participado diretamente do processo.

 

REFERÊNCIAS:

 

 

Agravo de Instrumento. Processo n. 2008.04.00.019149-7, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, julgado em 22/10/2008. In: http://www.trf4.jus.br, acessado em 03/03/2008 e Apelação/Reexame Necessário. Processo n. 2005.72.00.003846-9, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, julgada em 03/12/2008. In: http://www.trf4.jus.br, acessado em 03/03/2008.

 

ALVIM, Eduardo Arruda. Coisa julgada e litispendência no Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, in GRINOVER, Ada Pellegrini. MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. WATANABE, Kazuo (coord). Direito Processual Coletivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

 

BATISTA, Roberto Carlos. Coisa Julgada nas Ações Civis Públicas: direitos humanos e garantismo. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2005.

 

DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. V.4. Salvador: Editora JusPodivm, 2007.

 

GIDI, Antonio. Coisa julgada e litispendência em ações coletivas. São Paulo: Saraiva, 1995.

 

GRINOVER, Ada Pellegrini. O Processo: Estudos e Pareceres. São Paulo: Editora Perfil, 2006.

 

LENZA, Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 243.

 

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação civil pública: em defesa do meio ambiente do patrimônio cultural e dos consumidores . 9ª ed. São Paulo: Revista do Tribunais, 2004.

 

NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado: e legislação extravagante. 10ª ed. Rev. Ampl. Atual. São Paulo: Rev. dos Tribunais, 2008.

 

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