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 Sala dos Doutrinadores - Monografias
Autoria:

Isabela Britto Feitosa
Advogada atuante nas áreas Cível, Trabalhista, Previdenciária e Administrativa.

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Monografias Direito Administrativo

O PODER DE POLÍCIA COMO INSTRUMENTO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE DA LEGISLAÇÃO

a intervenção estatal da Administração Pública é tão relevante para a manutenção da ordem social, visto que umas das ações exercidas por ela são determinantes para o controle público, como também da fiscalização.

Texto enviado ao JurisWay em 16/06/2011.

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1 INTRODUÇÃO

O “Poder de Polícia”, tema do presente trabalho, não deixa de ser uma forma de expressão do Direito na sociedade, principalmente porque o objetivo do poder de polícia é atingir o bem comum. Por esse motivo, o estudo apresenta discussões pertinentes à realidade social; além de ser um assunto debatido pelos doutrinadores do ramo jurídico, o mesmo está voltado aos anseios e dificuldades vivenciados pela sociedade.

É prudente visualizar esse poder, inerente à Administração Pública, sob o ângulo da legislação, a qual é, sem dúvida, o alicerce de todos os atos e funções estatais. Assim, o tema foi delimitado com o título “O Poder de Polícia como instrumento de fiscalização e controle da legislação”.

A este cenário, é pertinente questionar: o exercício do poder de polícia age como um instrumento de fiscalização e controle da Administração Pública? As normas que dão suporte a esse poder estão sendo aplicadas de acordo com os parâmetros constitucionais? A aplicabilidade das taxas corresponde às exigências determinadas pela legislação? Enfim, são alguns questionamentos como estes que propiciaram a elaboração deste trabalho.  

É de fundamental importância estabelecer os objetivos a serem alcançados na pesquisa, tendo como intuito principal, analisar os aspectos que possibilitam o poder de polícia agir como instrumento de fiscalização e controle da legislação. Da idéia geral, propulsora dessa iniciação científica, surgem outros desdobramentos que são: identificar os fatores que permeiam o poder de polícia frente à atividade estatal; apresentar os principais pontos que levam o poder de polícia a intervir na esfera tributária; investigar a questão dos limites individuais em prol da coletividade que está inserida na conjuntura do poder de polícia e verificar a influência que os demais poderes da Administração Pública exercem sobre a legislação.

O poder de polícia foi escolhido como tema de monografia em decorrência da diversidade de assuntos que estão interligados a ele, e da sua repercussão no ordenamento jurídico, por ser ainda uma expressão da nossa realidade. Além do que, favorece o desenvolvimento do espírito crítico da sociedade principalmente quanto à percepção dos interesses públicos e do bem-estar geral, possibilitando que a sociedade tenha conhecimento da atividade administrativa e dos limites impostos ao Poder Público e, conseqüentemente, aos seus agentes.

Não é demais abordar matérias de ordem pública, visto que faz transparecer o funcionamento da Administração Pública e dos demais órgãos que a compõem, em específico sobre as Agências. Levando-se em consideração o interesse em aprimorar os conceitos e formar novos pensamentos a respeito do que seja o poder de polícia, foi relevante a afinidade com a área em meio às mais variadas disciplinas do curso de Direito, pois se mantiveram interligadas as áreas de Administrativo, Tributário e Financeiro.

Não houve dificuldades na coleta de materiais, o conteúdo da pesquisa é bastante amplo e discutido pela doutrina, como também, os artigos científicos retirados da internet e as jurisprudências com decisões dos Tribunais do Estado de Sergipe e do Rio Grande do Sul, além, é claro, do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, que serviram para enriquecer a elaboração do trabalho. Foram consultados autores como Meirelles, Di Pietro, Mello, Gasparini, Figueiredo, e outros de representatividade no Direito Administrativo; já no Direito Tributário e Financeiro, Machado, Harada, Amaro são alguns dos autores pesquisados.

A toda realização de uma pesquisa científica pressupõe uma contribuição para a sociedade, do contrário não teria sentido sua existência e, portanto, descaracterizaria sua natureza. A ciência tem um papel a desempenhar, não apenas incentivar a pesquisa, mas tirar dela proveito, interagindo com as novas descobertas, especialmente a ciência jurídica, fruto de uma dinâmica social.

Durante toda a extensão do trabalho a bibliografia foi preponderante, não sendo preciso fazer uso de entrevistas ou mesmo visitas; o coletado na pesquisa de cunho bibliográfico foi o suficiente para um resultado satisfatório. Ficou, portanto, dividido em 3 (três) capítulos: o primeiro intitulado “Origem e Evolução Histórica da Expressão Poder de Polícia”; o segundo "O Poder de Polícia e o seu papel frente aos órgãos da Administração Indireta”, e o terceiro, “Aplicação do Poder de Polícia sobre as Taxas”.

A partir desses capítulos, foram desenvolvidos alguns tópicos a fim de tornar mais nítida a compreensão sobre os aspectos que norteiam o poder de polícia, as Agências Reguladoras e Executivas como órgãos da Administração Indireta, e também os reflexos do poder de polícia na aplicação das taxas públicas. De todo o exposto, espera-se que a construção desse trabalho possibilite a troca de idéias no campo científico e na sociedade, capaz de ensejar a criação de um pensamento crítico quanto à máquina administrativa.

 

2 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EXPRESSÃO PODER DE POLÍCIA

 

2.1 Considerações Iniciais

 

Para compreender a extensão de qualquer tema de estudo, faz-se necessário traçar alguns pontos do seu histórico e da sua evolução no decorrer dos tempos. Então, não poderia deixar de citar o poder de polícia nesse contexto, pois é elemento crucial da Administração Pública, e merece atenção por estar relacionado ao interesse público.

É de bom alvitre conceituar o que seja Administração Pública, com base num texto mais técnico, capaz de englobar os aspectos objetivo e subjetivo, sob o prisma jurídico de Moraes (2006, p. 73):

 

A Administração Pública pode ser definida objetivamente como a atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve para a consecução dos interesses coletivos, e subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado.

 

 

É relevante destacar o aspecto objetivo do conceito, pois é nele que se concentra o objeto do estudo; assim, pertence à Administração Pública neste contexto: o fomento, a polícia administrativa, o serviço público e a intervenção. Em virtude da Administração Pública seguir pautada sobre uma atividade concreta e imediata, cumpre aqui especificar os poderes emanados por ela a fim de que a finalidade maior seja atingida, que é a satisfação do bem comum; o ordenamento jurídico concedeu-lhe os chamados poderes administrativos, que são: o poder regulamentar, o poder disciplinar, o poder hierárquico e o poder de polícia.

O poder regulamentar, previsto no art. 84, inciso IV da Constituição Federal, é exclusivo do Presidente da República, quanto à expedição de decretos e regulamentos a fim de promover a execução das leis, sem cogitar de possíveis obstáculos em sua aplicação. Tal poder tem como princípio constitucional a Separação de Poderes, uma vez que em situações relevantes e urgentes, caberá ao Legislativo e não ao Presidente estabelecer normas criadoras de direitos.

O poder disciplinar possibilita a Administração Pública apurar faltas e aplicar penalidades aos servidores públicos, mas salvo os particulares, pois estes não estão sujeitos às sanções de caráter administrativo. Já o poder hierárquico diz respeito à função coordenadora da Administração entre seus órgãos e os servidores que a ela pertencem.

Sem desprezar os demais poderes, uma vez que todos os demais exercem papéis fundamentais na realização das atividades administrativas, é preciso atentar para o objeto do trabalho que é o poder de polícia ou polícia administrativa, no qual é possível visualizar elementos bastante discursivos, sob o prisma das limitações ao exercício da liberdade e propriedade.

Assim, quando se fala em poder de polícia, deve-se analisar o vocábulo polícia, que não se confunde com a polícia judiciária, comumente conhecida por todos; a polícia retratada por esse poder é a polícia administrativa, que nada tem a ver com o poder repressivo.

Para Filho (2005), não há como confundir polícia-função com a polícia-corporação, no qual aquela está atrelada à atividade administrativa; já esta última, diz respeito aos sistemas de segurança pública, em prol da prevenção dos delitos e das condutas que causem ofensa à ordem pública.

 A expressão polícia, para o Direito Administrativo, vem do grego politeia, que significa organização política, governo. Segundo Sidou (2001, p. 650), quer dizer: “O conjunto de serviços organizados pela administração para assegurar a ordem pública e garantir a integridade física e moral das pessoas, mediante limitações impostas à atividade do agente que as possa molestar”.

Para Medauar (2005), assim como Di Pietro (2003), existem ponderações sobre a evolução histórica do poder de polícia, considerando que houve nesse traçado a influência dos ideais da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) incidentalmente sobre a valorização dos direitos individuais e das várias concepções de Estado, adquiridas no decorrer dos tempos como o Estado de Polícia, o Estado de Direito e o Estado Liberal.

O Estado de Direito, a partir da decadência do poder absoluto, passou a ter como sustentáculo os princípios da Legalidade e o da Separação de Poderes, previstos na Declaração Universal de Direitos. Com isso, o exercício do poder de polícia, já com o Estado Liberal, adquiriu, além da sua característica preponderante de limitar direitos individuais, a característica de polícia de segurança.

As declarações de direitos, as normas constitucionais ou normas-princípios, não importa o teor organizativo ou restritivo que possam ter, se volvem basicamente para a Sociedade e não para o indivíduo; em outros termos, buscam desesperadamente reconciliar o Estado com a Sociedade, intento cuja conseqüência imediata estampa o sacrifício das teses individualistas. Logrou-se esse sacrifício numa batalha doutrinária travada por duas teses constitucionais: uma, a do Estado liberal, em decadência; outra, a do Estado Social, em ascensão (BONAVIDES, 2003, p. 231).

 

A partir do momento que as Constituições, de um modo geral, passaram a admitir o fim do absolutismo nos poderes do Estado, que despontou em 1789 com a Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, ficou nítida a presença do exercício da liberdade e dos direitos individuais, porque ao livre exercício desses direitos surge um contraponto, que é o respeito também à liberdade individual do outro, nascendo assim o poder de polícia, em atendimento ao dever de não perturbar a ordem pública. Por esse motivo, atender esse dever constitui limitar e disciplinar direitos individuais a serviço do bem comum.   

De acordo com Di Pietro (2003), essa evolução começa a ganhar contornos na Idade Média, no período feudal, na qual o príncipe e a autoridade eclesiástica detinham poderes para a boa ordem social; porém, ambos com atribuições diversas; enquanto um cuidava das questões do Estado, o outro cuidava de assuntos morais e religiosos. Este cenário veio sofrer mudanças no final do século XV, onde o poder do príncipe denominado de jus politiae passou a preencher tanto a atividade do Estado, quanto a ordem moral e religiosa dos cidadãos.

É nesse momento que a polícia e a justiça são demarcadas em pólos distintos: a primeira, relativa à própria Administração, e a segunda relacionada às normas aplicadas pelos juízes, que ficavam fora da seara do poder do príncipe. É perceptível, nessas transformações ocorridas, que aquele poder centralizador sobre todas as questões, em que o poder do príncipe interferia em tudo, foi reduzindo, chegando ao ponto dessa polícia estar atrelada somente à atividade interna da Administração.

No entanto, o significado do poder de polícia sofreu críticas nesse ínterim, principalmente nos séculos XIX e primórdios do século XX, quando se tinha a idéia de garantidor da tranqüilidade, ordem e salubridade pública, todavia, à medida que foram ampliadas as funções do Estado, o poder de polícia aumentou seu campo de incidência, nas esferas econômica e social. Paulsen (2002) afirma que foi a jurisprudência americana a primeira a utilizar o nome poder de polícia (police power), e a responsável por sua expansão nos mais diversos campos do Direito, desde que voltadas para o interesse público; isso no ano de 1827, pelo governo Marshall.

Contudo, é com o Estado Democrático de Direito que a idéia de legalidade ganha força de princípio básico; não se cogita mais um príncipe não se submeter às leis; se ele as cria, também lhe deve ser aplicável. Di Pietro (2003) destaca dois momentos no Estado de Direito: um inicia com o liberalismo que assegura a isonomia plena e o desfrute das liberdades individuais em face do Estado, e um outro momento quando esse Estado Liberal passa a ser intervencionista, que além da segurança colocada pelo liberalismo, preocupa-se com a ordem social e econômica.

Sob essa ótica, estampada pelo panorama histórico, é visível que o poder de polícia sempre esteve voltado para o interesse público e à boa ordem social; entretanto, não se pode camuflar que a aplicação desse poder sobre as pessoas gera uma limitação em sua liberdade, em razão da supremacia que a Administração Pública possui sobre os administrados, já que o fundamento do poder de polícia reside nessa supremacia.

A polícia administrativa, também chamada poder de polícia, é fruto da fiscalização e do controle da Administração Pública. Esta tem o poder e dever de zelar pelo interesse público, em prol do bem-estar social, ação que se pauta pelo vínculo existente entre a própria Administração e as pessoas que a ela se submetem.

Por isso, o princípio da supremacia do interesse público é inerente à atuação do Estado, uma vez que, para atingir esse fim colimado, é preciso que o interesse particular se curve diante do interesse coletivo, desde que seja legítima a lei que lhe serve de suporte.

 

2.2 Limites do Poder de Polícia

 

A maioria dos doutrinadores conceitua o poder de polícia como uma faculdade do Estado em limitar o exercício dos direitos individuais a favor do interesse geral, o qual engloba tudo o que se refere à segurança pública, à ordem, à economia, à moralidade e à justiça. O Código Tributário Nacional, conceito legal do Direito Brasileiro, traz a definição do poder de polícia em seu artigo 78:

 

Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

 

Embora o Poder Público tenha o comando nas ações dos seus administrados, vale salientar o parágrafo único do mencionado artigo, citado por Di Pietro (2003), que enfoca a legalidade na atividade administrativa, pois a ausência de tal princípio desnatura a força da lei, dos preceitos da Carta Magna; o poder de polícia, além de pertencer ao regime jurídico-administrativo, está delimitado pelo caráter impositivo da lei; Moraes (2006, p. 81), ressalta que: “esse princípio coaduna-se com a própria função administrativa, de executor do direito, que atua sem finalidade própria, mas em respeito à finalidade imposta pela lei e com a necessidade de preservar-se a ordem jurídica”.

Portanto, verifica-se que tudo relacionado ao mundo da Administração Pública depende de lei; não se concebe, no Direito Brasileiro, criação de algum dever ou obrigação se não estiver pautado em norma ou ato normativo. Qualquer passo dado pelo Poder Público necessita de aprovação da lei; o oposto não é digno nem de discussão, pois fere totalmente o princípio da legalidade, princípio que vela pela aplicação do poder de polícia de forma justa, concomitante com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Por essa razão, quando se pensa em legalidade, logo é feito menção ao art. 5º, inciso II, da Constituição Federal que diz: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.  O artigo mencionado reflete a imagem do princípio da legalidade, porém, não pode ater-se a ele exclusivamente, pois matérias de ordem pública e de interesse público estão intimamente ligadas ao cerne da legalidade, e como tal, pertence a este plano o poder de polícia; ou melhor, todos os atos da Administração Pública.

 

Este princípio, juntamente com o de controle da Administração pelo Poder Judiciário, nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais direitos em benefício da coletividade (DI PIETRO, 2003, p. 67).

 

O regime jurídico-administrativo situa-se naquelas normas de Direito Público que identificam a Administração, numa posição privilegiada na relação jurídica. Assim, é fundamental citar os Princípios da Supremacia do Interesse Público e o da Indisponibilidade do Interesse Público, classificados pela doutrina como princípios infraconstitucionais da Administração Pública, traduzidos em duas expressões: privilégios e sujeições.

Pode-se perceber claramente estes dois pólos do regime-jurídico, privilégio no sentido de algo que a Administração faz e o particular não pode fazer, por exemplo, a imunidade tributária prevista no art. 150, inciso III, alínea a, da Constituição Federal; o privilégio processual, uma vez que o particular tem prazo de quinze dias para contestar e a Administração tem o dobro, e para recorrer o quádruplo, com fulcro no art. 188 do Código de Processo Civil; pode intervir na propriedade privada, segundo decreto-lei 3.365/41. Por outro lado, tem algo que a Administração faz, mas com menos liberdade que o particular, isto é, trata-se da sujeição, como no caso das regras de licitação pública (lei 8.666/93).

 

Esse objetivo, em relação à norma existente no art. 37, XXI, da Constituição Federal, é obrigar o Poder Público a licitar, sempre que houver possibilidade de concorrência e de escolha da melhor e mais vantajosa oferta ao Poder Público, sem prejuízo ao interesse público (MORAES, 2006,  p. 153).

 

 

O princípio da Supremacia, também conhecido como da Finalidade Pública, tem como pressuposto o interesse público, busca a efetivação do bem comum. Está previsto no art. 3º, IV, da Constituição Federal, e reforçado no caput do art. 37; trata-se de um princípio orientador, seja na elaboração da lei, seja na execução dos atos administrativos; no entanto, atrelado a essa supremacia está o princípio da eficiência. Já o princípio da Indisponibilidade significa a sobreposição do interesse público sobre o individual, isto é, até para a própria Administração Pública são disponíveis aqueles interesses públicos conferidos à sua guarda e realização.

A Constituição Federal de 1988, conhecida inclusive como Constituição-Cidadã, trouxe a garantia dos direitos sociais e individuais, na qual o exercício de tais direitos deve ser compatível com o bem-estar coletivo e, conseqüentemente, com os interesses do Poder Público.

Contudo, o que leva o poder de polícia a ser considerado um ato administrativo é o objeto a que ele se predispõe a atingir, ou seja, a liberdade e a propriedade dos administrados, isto é, mesmo que o objetivo seja pugnar pelo interesse público, este jamais deve aniquilar os direitos individuais dos administrados, pois existem limites a serem observados. O poder de polícia não serve como pretexto para invadir o campo dos direitos fundamentais positivados pelo ordenamento jurídico pátrio. Segundo Meirelles (2003, p. 129):

 

As liberdades admitem limitações e os direitos pedem condicionamento ao bem-estar social. Essas restrições ficam a cargo da polícia administrativa. Mas sob a invocação do poder de polícia não pode a autoridade anular as liberdades públicas ou aniquilar os direitos fundamentais do indivíduo, assegurados na Constituição, dentre os quais se inserem o direito de propriedade e o exercício de profissão regulamentada ou de atividade lícita.

 

 

Os limites do poder de polícia mantêm uma conexão expressiva com o interesse social e com os direitos individuais, e espera-se que estejam em contínuo equilíbrio, para que o poder administrativo possa ser aplicado com eqüidade, sem excessos. Por essa razão, o poder de polícia, na atualidade, é bastante extensivo no modo de atuação, uma vez que, desde a Constituição de 1946, já se condicionava o uso do direito de propriedade ao bem-estar social.

Vale destacar que a polícia administrativa tem o papel preventivo (e não repressivo como o faz a polícia judiciária) de coibir, de impedir atividades particulares que prejudiquem os interesses sociais, pois apesar dessas pessoas terem o seu direito de liberdade e propriedade, não podem suprimir o direito coletivo. Assim, cabe à Administração Pública prevenir para que o caos e a desordem pública não se estabeleçam e formem raízes na sociedade.

Entretanto, esse uso da Supremacia pelo Poder Público lhe confere limites a serem respeitados, uma vez que a atividade de polícia, nos dizeres de Gasparini (2005), ora é discricionária, ora é vinculada, estando sujeita à regra legal, e qualquer excesso proveniente da Administração cabe o controle judicial.

Tanto é assim, que o autor do ato de polícia, do agente público, passa a ser responsabilizado, seja com culpa ou dolo, nas esferas administrativas, civis e criminais. Embora a discricionariedade seja uma característica preponderante no poder de polícia, não pode confundi-la com a arbitrariedade, pois esta ultrapassa os limites permitidos em lei, seja como abuso ou desvio de poder, o que não se admite ao Poder Público.

É neste sentido que Sidou (2001, p. 6) define tão bem o que seja abuso de poder, sob o prisma do Direito Administrativo, recepcionado inclusive pela Carta Magna no artigo 5º, XXXIV e LXIX:

 

Abuso de poder é a exorbitância de atribuições de agentes do poder público, ora quando obra em nome da lei, mas não autorizado por ela (abuso, propriamente dito), ora quando extralimita as funções que a lei traça (excesso), ora quando, dentro dos limites da lei embora, atua em distorções de seus intuitos (desvio).

 

 

Como meio de defesa aos cidadãos é permitido utilizar, para esses casos de abuso ou desvio de poder cometidos pelo Estado, a ação popular amparada constitucionalmente. Qualquer ato ilícito proveniente do Estado, que cause ofensa à ordem pública, necessita lançar mão de medidas legais como esta; como também é válido o Poder Legislativo, mesmo que indiretamente, exercer seu poderio de vigilância sobre a Administração Pública, apurando práticas ilícitas e ilegalidades de autoridades ligadas ao Poder Público.

Contudo, o que se pode afirmar de forma categórica é que a polícia administrativa apresenta tanto atos discricionários como atos vinculados; na percepção do autor supra somente atos discricionários não são suportados pela Administração Pública. Disto infere-se o citado por Mello (2004, p. 732):

 

Basta considerar que, enquanto as autorizações, atos típicos da polícia administrativa, são expedidas no uso de competência exercitável discricionariamente, as licenças igualmente expressões típicas dela são atos vinculados, consoante entendimento da doutrina. Basta a consideração de tal fato para se perceber que é inexato o afirmar-se que o poder de polícia é discricionário.

 

 

O autor ainda pontua que o poder de polícia, embora seja discricionário, não deve ser levado em consideração na íntegra, porque, na ótica das leis limitadoras e condicionadoras da liberdade e propriedade em prol do bem comum, a assertiva é verdadeira, porém, o quadro muda quando se analisa o Estado de Direito que, por sua própria natureza, inexiste um poder tipicamente discricionário.

 

2.3 Características e Competência do Poder de Polícia

 

É insustentável uma sociedade que não esteja sob o controle do Poder Público, estaria assim perpetuando para a estagnação do desenvolvimento social e para a desvalorização da ética e da moral. Por isso, é imprescindível que os atributos do poder de polícia estejam definidos, denominados assim pela doutrina: a coercibilidade, a discricionariedade e a auto-executoriedade.

Um ponto discursivo sobre o tema e de divergência de alguns autores é a respeito da auto-executoriedade do poder de polícia, qualificado por Di Pietro (2003) como atributo desse poder, enquanto Gasparini (2005) afirma que a auto-executoriedade existe em outros atos administrativos, e não é privilégio somente do poder de polícia.

O fato é que a auto-executoriedade é uma medida que o Poder Público dispõe de se valer dos seus próprios meios, sem a necessidade de recorrer a qualquer outro poder. A obediência que os administrados devem à Administração Pública é suficiente para que ela se imponha, sem a exigência de prévia autorização judicial; basta que o poder se pronuncie, embora responda por qualquer abuso cometido, segundo preceitua o artigo 37, §6º da Constituição Federal de 1988. De acordo com Meirelles (2003, p. 137): “a desproporcionalidade do ato de polícia ou seu excesso equivale a abuso de poder e, como tal, tipifica a ilegalidade nulificadora da sanção”.

Meirelles (2003) afirma que a auto-executoriedade apesar de ser uma faculdade da Administração executar e direcionar suas próprias decisões sem a intervenção do Judiciário, salienta que não deve ser confundida com punição sumária e sem defesa, visto que tais sanções só podem ser aplicadas desta maneira naqueles casos urgentes, que colocam em risco a segurança ou saúde públicas. Vale dizer que não pertencem a este rol da auto-executoriedade as multas, executáveis somente por via judicial.

De acordo com Gasparini (2005), aliada a essa auto-executoriedade existe a proporcionalidade, que não deve passar despercebida da atividade administrativa, visto que é a proporcionalidade que vai oferecer o uso adequado da coação; por isso, chega-se a considerar a proporcionalidade como um atributo do poder de polícia, mas parte da doutrina diverge sobre a questão.

Não é permitida a autoridade pública empregar medida mais severa para alcançar o que se pretende; deve-se prezar pelo equilíbrio na adoção das medidas e o que está previsto em lei. Para Filho (2005, p. 74):

O princípio da proporcionalidade deriva, de certo modo, do poder de coerção de que dispõe a Administração ao praticar atos de polícia. Realmente, não se pode conceber que a coerção seja utilizada indevidamente pelos agentes administrativos, o que ocorreria, por exemplo, se usada onde não houvesse necessidade [...]. Não havendo proporcionalidade entre a medida adotada e o fim a que se destina, incorrerá a autoridade administrativa em abuso de poder [...].

 

 

Convém destacar algumas decisões dos Tribunais acerca do exercício abusivo do poder de polícia:

 

EMENTA:   Reexame Necessário. Sentença Concessiva de Mandado de Segurança. Exercício abusivo do poder de polícia municipal. Extrapolação das atribuições do Dr. Procurador do Município; desproporcionalidade entre a alegada infração administrativa (localização de um pequeno carro-lanche) e a sanção; coação administrativa como forma de satisfação de interesses meramente patrimoniais dos cofres públicos. Decisão confirmada por seus próprios e jurídicos fundamentos. (Reexame Necessário Nº 70012195723, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 19/04/2006).

 

EMENTA:  Apelação Cível. Mandado de Segurança. Medida Administrativa. Interdição. Falta de Procedimento Administrativo e Possibilidade de Ampla Defesa. Exercício Abusivo do Poder de Policia. A Medida Administrativa de Interdição de Atividades, sem prévio procedimento administrativo e possibilidade de ampla defesa, mostrou-se Exercício Abusivo do Poder de Policia. O Ato Abusivo desgarrou da Orientação traçada pela própria Assessora Jurídica do Município que, ausente Norma Legal Autorizadora da Medida de Interdição, recomendou a Instauração de Procedimento Administrativo próprio à Cassação do Alvará. Ato Ilegal da Autoridade Impetrada Violando Direito Líquido e Certo da Administrada ao Devido Procedimento referente à Possibilidade do Exercício da Atividade Autorizadora, permitindo-se a Ampla Defesa. Apelo desprovido. Mantida a Sentença em Reexame Necessário. (10FLS.) (Apelação Cível Nº 599480019, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Armando Bezerra Campos, Julgado em 10/05/2000).

 

 

Assim, quando se fala em auto-executoriedade, remete-se à coercibilidade, atributo este munido de força mandamental, que a Administração faz uso através da exigibilidade própria da sua estrutura funcional, exigibilidade essa movida de meios indiretos de coação tais como: a multa ou a não liberação do veículo quando do não pagamento das multas de trânsito.

Quanto ao atributo da coercibilidade, Filho (2005, p. 73) expõe:

 

Essa característica estampa o grau de imperatividade de que se revestem os atos de polícia. A Polícia Administrativa, como é natural, não pode curvar-se ao interesse dos administrados de prestar ou não obediência às imposições. Se a atividade corresponder a um poder, decorrente do ius imperii estatal, há de ser desempenhada de forma a obrigar todos a observarem os seus comandos.

 

Alguns doutrinadores do Direito Administrativo, tais como, Mello (2004) e Di Pietro (2003), consideram como atributo do poder de polícia o fato de ser uma atividade negativa, contrapondo-se ao serviço público, qualificado como uma atividade positiva.

Para Mello (apud DI PIETRO, 2003), o poder de polícia é visto como uma atividade negativa no sentido de que impõe ao particular uma abstenção, um não fazer (non facere). O particular se vê impossibilitado de agir livremente, conseqüentemente, ou até mesmo forçosamente, abre mão da sua liberdade individual, para o Poder Público assim sanar alguma nocividade que porventura poderia existir com sua pretendida ação.

Em detrimento dos principais atributos do poder de polícia, surge a faculdade que a lei concede a alguém ou a algum órgão de realizar tais atividades administrativas; logo, cumpre vislumbrar a quem cabe a competência de exercê-las. Desse modo, a Constituição Federal outorga esse poder de legislar, correspondendo às matérias pertinentes a cada ente da Federação: União (art. 22), Estados-Membros (art. 25, §1º), Municípios (art. 30, I) e Distrito Federal (art. 32, §1º).

No tocante à competência para o exercício do poder de polícia, destaca que tem competência para policiar o bem público a entidade que dispõe do poder de regular a matéria. Todavia, como certas atividades interessam simultaneamente às três entidades estatais (v.g. saúde pública, trânsito, transportes), o poder de regular e de policiar se difundem entre todas as Administrações interessadas, provendo cada qual nos limites de sua competência territorial.

Na visão de Meirelles (2003), existem dois tipos de poder de polícia: o originário e o delegado ambos com nuances relevantes. O poder originário surge como nascedouro das leis e atos normativos; o poder delegado nada mais é do que um complemento do originário, visto que o Estado incumbe determinadas pessoas de exercerem tais funções públicas, ou seja, quando a lei é proveniente do originário, confere a alguém ou a alguma entidade administrativa tal poder, aí está se falando do poder delegado. Contudo, é relevante destacar que tal delegação não se aplica às pessoas de caráter privado em virtude de não possuírem o ius imperii, isto é, o direito de império, imprescindível para a estrutura e formação da atividade de polícia.

E sob esse prisma que a polícia administrativa posiciona seus variados meios de atuação, seja mediante ordens e proibições, seja mediante normas limitadoras e sancionadoras; assim, tem a presença do alvará como forma de licença ou autorização concedida pela Administração para a realização de determinada atividade ou exercício de algum direito, como também tem a fiscalização, mais uma forma de atuação estatal que está direcionada ao controle de tal atividade, se está sendo executada dentro dos parâmetros permitidos pelo Poder Público.

Seguem jurisprudências do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe e do Rio Grande do Sul, ambas referentes ao fechamento de estabelecimento comercial, por estarem funcionando em desacordo com as normas de segurança:

 

EMENTA: Apelação Cível - Mandado de Segurança - Decisão Concessiva - Bar e Restaurante - Notificação para retirada de Proteções de Madeira da Lateral e Frente do Estabelecimento Comercial - Poder De Polícia Administrativa - Invasão, Fechamento e Isolamento de Espaço Público (Passeio) - Reforma Que Se Impõe.I - Inexiste direito líquido e certo à ocupação, em benefício próprio, de bens de uso comum do povo, como sejam as calçadas públicas, as quais são destinadas exclusivamente ao trânsito de pedestres. II - A ocupação nestes termos é clandestina e deve ser coibida pela Municipalidade, que tem o poder de polícia administrativa para fiscalizar a ocupação irregular do solo urbano, dentro das destinações estabelecidas pelas Leis Complementares nº43 e 44/2000 (Código de Urbanismo do Município de Aracaju). Recurso que se conhece, para lhe dar provimento.

Relator: Des. José Artêmio Barreto 
Julgamento: 12/12/2006.

 

EMENTA: Agravo de Instrumento. Constitucional, Administrativo e Processual Civil. Município de Porto Alegre. Estabelecimento Comercial. Alvará de Localização e Funcionamento como Loja de Bebidas e Minimercado. Desenvolvimento de Atividade em Desacordo com a Licença Concedida. Entretenimento Noturno. Cancelamento e Interdição. Administração Pública no Exercício do seu Poder de Polícia. Legalidade e Legitimidade do Agir Administrativo. Recurso a que se nega Provimento. (Agravo de Instrumento Nº 70014889455, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Wellington Pacheco Barros, Julgado em 06/09/2006).  



 

Em decorrência desses variados meios de propagação do poder de polícia na sociedade, a doutrina vem estabelecendo distinções em algumas conotações, quais sejam: as medidas de polícia e as sanções de polícia. Para Filho (2005), as primeiras são aquelas medidas de cunho administrativo, decorrentes da prática de uma infração. As sanções pertencem ao campo das punições em relação à pessoa que houver infringido alguma norma administrativa. Entretanto, estas últimas devem atender ao devido processo legal, em cumprimento ao art. 5º, LIV e LV da Constituição Federal.

 

As sanções espelham a atividade repressiva decorrente do poder de polícia. Estão elas difundidas nas diversas leis que disciplinam atividades sujeitas a esse poder. As mais comuns são a multa, a inutilização de bens privados, a interdição de atividade, o embargo de obra, a cassação de patentes, a proibição de fabricar produtos, etc. São sanções, na verdade, todos os atos que representam a punição aplicada pela Administração pela transgressão de normas de polícia (Op. cit., p. 76).

 

 

O que se busca na aplicação dessas sanções é que elas sejam proporcionais à infração cometida; para Meirelles (2003, p. 137): “os meios devem ser legítimos, humanos e compatíveis com a urgência e a necessidade da medida adotada”. Outros autores, em especial os argentinos e os norte-americanos, utilizam o termo razoabilidade. 
O poder de polícia assim não seria, caso não pudesse aplicar sanções para aqueles que fogem à norma legal, perderia sua natureza, caso implicitamente não tivesse seu poder coercitivo, como: o fechamento de estabelecimentos comerciais, o embargo de obras, a demolição de construções, a proibição de venda e fabricação de produtos ou, até mesmo, em penalidades mais corriqueiras, como a aplicação de multas. Contudo, todas essas ações próprias do poder de polícia são para resguardar a segurança e prevenir que ocorram riscos à saúde e à vida da coletividade.
 

3       O PODER DE POLÍCIA E O SEU PAPEL FRENTE AOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA

 

3.1 Das Agências

 

No cenário onde o poder de polícia é o protagonista das ações e funções do Poder Público, compete salientar um outro componente que está diretamente atrelado ao tema e que seria indispensável ao enriquecimento científico: as Agências Executivas e Reguladoras.

Assim como o poder de polícia é, pode-se dizer, a essência da atuação estatal, as Agências são os órgãos da Administração Indireta, assim como as fundações, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e, mais recentemente inseridas no contexto jurídico, as associações públicas, estas regidas pela Lei nº: 11.109/00.

Todavia, é preciso esclarecer que, as Agências acima especificadas são dotadas de um regime especial, diferentemente das demais entidades, ditas “comuns”; aquelas são qualificadas por deterem um regime próprio, com normas atinentes à sua formação e estrutura.

Entretanto, é importante lembrar que os princípios que regem o poder de polícia são os mesmos que regem o da Administração Pública: a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e a eficiência, previstos constitucionalmente no caput do artigo 37: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”

O princípio da legalidade é aquele que é aplicado de modo especial e mais rigoroso quando o assunto é a Administração Pública, porque o administrador somente deve executar suas funções administrativas com base em lei, pois não lhe é autorizado dispor de sua vontade subjetiva ou impor vontade própria em atos administrativos; nada deve passar do que a lei determina.

Por esse motivo, mantém conexão com o princípio da finalidade na qual atribui a prática de algum ato para atingir um fim legal, de forma impessoal. O Supremo Tribunal Federal já determinou a aplicação do princípio da finalidade a todos os poderes do Estado. É notório que todos os princípios que regem a Administração Pública possuem conexão entre si, e estão intimamente ligados.

A moralidade situa-se no campo da ética, além do administrador cumprir a ordem da lei, deve estar orientado nos caminhos da ética e da justiça, para que atos desonrosos não maculem a imagem da Administração Pública. Moraes (2006, p. 84) acentua sobre o princípio da moralidade que:

 

A conduta do administrador público em desrespeito ao princípio da moralidade administrativa enquadra-se nos denominados atos de improbidade, previstos pelo artigo 37, §4º da Constituição Federal, e sancionados com a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível, permitindo ao Ministério Público a propositura de ação civil pública por ato de improbidade, com base na Lei nº 8.429/92, para que o Poder Judiciário exerça o controle jurisdicional sobre lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público.

 

O princípio da publicidade atende à publicação de atos administrativos veiculados no Diário Oficial ou em locais próprios através de editais. A transparência administrativa deve ser resguardada e vem reforçada também no artigo 5º, XXXIII da Constituição Federal. A eficiência foi inserida como princípio pela emenda constitucional nº 19/98, além do que não só o artigo 37 faz referência, como também o artigo 74, II da Carta Maior em relação à eficácia e eficiência das gestões orçamentária, financeira e patrimonial.

 

Assim, princípio da eficiência é aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia, e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e garantir maior rentabilidade social (MORAES, 2006, p. 90).

 

 

As Agências foram introduzidas no Direito Brasileiro em decorrência da globalização e das transformações econômicas ocorridas na sociedade, influenciadas, principalmente, pelo direito norte-americano e inglês; a partir de 1834, na Inglaterra foram surgindo e sendo criadas pelo Parlamento, com caráter decisório, para dirimir controvérsias nos textos e nas medidas previstas em lei.

 

3.2 Agências Executivas

Antes de adentrar ao campo das agências reguladoras, é relevante tratar das agências executivas que surgiram no Direito Brasileiro, através do decreto 2.487/98 e 2.488/98, cuja representatividade, no âmbito federal, é o Instituto Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial (INMETRO).

Tal decreto atribui às autarquias e fundações um regime especial, que por iniciativa do Ministério supervisor celebram um contrato de gestão entre si. A Agência Nacional de Energia Elétrica (lei 9.427/96) e a Agência Nacional de Saúde (9.961/00), segundo suas respectivas legislações, são consideradas agências executivas, que na opinião de alguns doutrinadores como Mello (2004) e Meirelles (2003), em nada acrescenta a denominação “executivas”, é apenas mais uma nomenclatura.  

Gasparini (2005, p. 327) conceitua as agências executivas de forma primorosa e bastante completa:

 

É autarquia ou a fundação governamental assim qualificada por ato do Executivo, responsável pela execução de certo serviço público, livre de alguns controles e dotada de maiores privilégios que as assim não qualificadas, desde que celebre com a Administração Pública a que se vincula um contrato de gestão.

 

Esse contrato de gestão está disciplinado no art. 5º da lei 9.649/98, e constitucionalmente no art. 37, §8º, sendo assim considerado como uma modalidade de ajuste onde um determinado órgão público atribui a uma empresa especializada o desempenho de certo setor de sua atividade administrativa, ou seja, transfere uma atividade que seria da competência do Poder Público para uma empresa especializada realizá-la. Poder-se-ia chamar de Terceirização, legalmente prevista no art. 177, §1º da Constituição Federal. Depois de firmado o contrato, a qualificação da agência é feita mediante decreto.

Vale conferir o texto da Carta Magna no art. 37 § 8º:

 

A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo a lei dispor sobre:

I – o prazo de duração do contrato;

II – os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade de dirigentes;

III – a remuneração do pessoal.

 

 

Ainda sobre o contrato de gestão Moraes (2006, p. 156) acrescenta:

 

Contrato de gestão, portanto, é aquele avençado entre o Poder Públicp e determinada entidade estatal, fixando-se um plano de metas para essa, ao mesmo tempo em que aquele se compromete a assegurar maior autonomia e liberdade gerencial, orçamentária e financeira ao contratado na consecução de seus objetivos.

 

 

Foi após a Emenda n.19/98 que o contrato de gestão ganhou força constitucional; embora não esteja mencionada no texto a expressão “contrato de gestão”, é considerado pelo ordenamento jurídico como uma forma de ajuste entre a Administração Pública Direta e a Administração Pública Indireta (entidades privadas), podendo também ser celebrado com os dirigentes da própria Administração Direta. A tais entidades privadas, a celebração do contrato de gestão lhes possibilita maior autonomia frente aos demais que não possuem essa qualificação de agências executivas.

Caso aprovado o plano de reestruturação e desenvolvimento institucional, passará ao contrato onde juntamente com o Ministério supervisor exercerá o controle administrativo; por outro lado, se descumprido o presente contrato, a entidade deixará de ser agência executiva; para Di Pietro (2003, p. 401):

 

[...] nesse contrato são definidas, entre outras coisas, as metas a serem atingidas, a compatibilidade dos planos anuais com o orçamento da entidade, os meios necessários à consecução, as medidas legais e administrativas a serem adotadas para assegurar maior autonomia de gestão orçamentária, financeira e administrativa, as penalidades aplicáveis em caso de descumprimento de metas, as condições para revisão, renovação e rescisão, e a vigência.

 

 

Enfim, o que se busca é a eficiência nas atividades da Administração Pública, pois se trata de um princípio constitucional que é essencial para a reestruturação do modelo administrativo brasileiro. Recentemente, a lei 9.637/98 qualificou como entidade as organizações sociais; todavia, o contrato de gestão aqui celebrado não tem como intuito conceder maior autonomia como o vislumbrado nas agências, mas o contrário, restringir sua autonomia, pois estarão sujeitas às suas exigências.

 

As organizações sociais são pessoas jurídicas privadas, sem fins lucrativos, cujas atividades, no âmbito federal, são dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos os requisitos previstos na Lei 9.637/1998 (FIGUEIREDO, 2004, p. 153-154).

 

 

A lei 9.649/98, que alterou a lei de licitações, nos art. 24, I e II, trouxe benefícios para, apenas, esses órgãos qualificados como agências executivas, visto que aumentou os valores para dispensa de licitação, como também estabeleceu o dobro desse valor designado para compras, obras e serviços contratados por empresas públicas e sociedades de economia mista, inclusive autarquias e fundações sob o regime especial.

 

Portanto, para haver dispensa da licitação, dois são os fundamentos exigidos pela Constituição Federal: saber se o fato se ajusta à previsão taxativa da legislação ordinária ou se presente à urgência e, uma vez existente a citada adequação, se há conveniência e oportunidade da Administração para o afastamento do procedimento licitatório (MORAES, 2006, p. 154).

 

 

Na visão de Mello (2004 apud COELHO, 2004), essa titularidade conferida às fundações e autarquias é um “mero qualificativo”, tal regime especial somente possibilita alguns privilégios no que diz respeito ao aumento de percentuais de dispensa de licitação da lei 8.666/93 no art. 24. O autor, na verdade faz uma crítica, e complementa que essa qualificação para agência executiva é mais uma forma de fugir dos processos licitatórios, mesmo porque a Administração Pública precisa fazer valer o princípio da eficiência, e não criar nomenclaturas para driblar procedimentos administrativos.

 

EMENTA:   APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO. I  ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. Diante da responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios à parte cabe o direito de escolher contra quem pretende propor a demanda. II  MÉRITO. - Ao Estado cabe o dever de fornecer gratuitamente tratamento médico a pacientes necessitados, inteligência dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal. - A observância das normas constitucionais garantidoras do direito fundamental à saúde corresponde ao verdadeiro alcance do conteúdo político das disposições constitucionais, bem como à efetivação do Estado Democrático de Direito, descabendo considerá-las a título de meros programas de atuação. - A própria Carta Constitucional impõe ao Estado o dever de proceder à reserva de verbas públicas para atendimento à demanda referente à saúde da população, havendo, portanto, previsão orçamentária. - Não infringência ao princípio da independência entre os Poderes, posto que a autoridade judiciária tem o poder-dever de reparar uma lesão a direito ¿ artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. - Lei nº 8.666/93 que autoriza a dispensa da licitação, tendo em vista a urgência no atendimento (art. 24, inc. IV). Limitação do montante da multa ao valor necessário para a compra da medicação pelo período de quatro meses. REJEITARAM A PRELIMINAR E, NO MÉRITO, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70014297790, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 26/10/2006).

 

 

Diante do exposto, nota-se que as agências executivas, sejam elas autarquias ou fundações, assumem nesse diapasão, uma categoria diferenciada, sobretudo quando se refere à autonomia de gestão, por estarem submetidas a um regime jurídico especial.  

 

3.3 As Agências Reguladoras e o Modelo Norte-americano

 

A palavra Regulação tem origem inglesa “regulation”, e foram as mudanças no setor econômico responsáveis por esse diferencial, gerando assim um aumento no número de privatizações, com a transferência da atividade estatal para o setor privado. No entanto, o termo regulação pode ser associado às atividades das agências reguladoras, seja para a edição de normas e fiscalização, imposição de sanções, seja para atribuição de habilitações.

Entretanto, para que haja uma compreensão nítida do contexto das Agências, até mesmo do ponto de vista histórico, é preciso destacar o fenômeno da Regulação que despontou no século XX, em específico na década de 1990, como uma nova expressão que trouxe mudanças para o mundo do Direito Administrativo. Com a regulação, outros vocábulos expressivos para o Direito foram surgindo, por exemplo, a privatização e a reforma do Estado.

Nos Estados Unidos, a Administração Pública se resume nas agências, diferentemente do que existe no Brasil em que o Presidente da República, juntamente com os Ministros, detêm a direção maior do Poder Público. Aliás, desde 1887, com a criação da Interstate Commerce Comissions, as agências reguladoras vêm sendo instituídas nos Estados Unidos.

É importante ressaltar que durante o governo de Roosevelt foram criadas muitas agências, no período do New Deal, uma vez que se exigia da parte do poder estatal uma posição mais forte nas áreas econômica e social. De acordo com o Presidente Roosevelt, as agências eram um instrumento para solucionar conflitos, pois assim o poder Executivo se tornaria mais forte perante o setor econômico, e com isso as questões não seriam apreciadas pelo poder Judiciário.

De acordo com o modelo norte-americano, as agências somente podem ser criadas pelo Poder Legislativo, a participação do Executivo é meramente política, contudo a Suprema Corte Americana, de início, não concordou com tais delegações, declarando-as inconstitucionais em razão da ausência do Executivo nas decisões. Por isso, em 1932 foi criado o legislative veto, ou seja, o veto legislativo, no qual houve algumas divergências quanto à participação do Congresso no problema das agências e, conseqüentemente, da intromissão do Legislativo no Poder Executivo.

Disto pode-se concluir que, as agências no modelo americano são uma matéria controvertida, que trouxe polêmicas e discussões para o cenário administrativo. Com a Lei de Procedimentos Administrativos, Administrative Procedure Acta (APA), as agências dividiram-se em dois blocos: as agências executivas (executive agencies), nas quais o Presidente podia agir livremente, e a independente regulatory agency or comissions, onde as deliberações ficam a cargo do Congresso, sem nenhum poder para o Presidente. Em virtude dessa divisão, é que a questão torna-se discursiva, pois as agências indiretamente diminuíram o poder presidencial e sua interferência neste setor.

Um aspecto que levantou discussões sobre as agências nos Estados Unidos foi com relação à captura, no qual os dirigentes sobrepõem o setor regulado ao interesse público, deixando de lado uma das características mais marcantes das agências que é a autonomia. A quarentena é uma forma de mecanismo utilizado pela legislação para dificultar a captura, impedindo inclusive do dirigente atuar após o final do mandato, sendo imprescindível por parte deste que relate, por escrito, suas ações no setor regulado, bem como as reuniões feitas com os representantes.

Em princípio, constata-se que, nos dia de hoje, vem crescendo em ritmo acelerado o número de agências, tanto é assim que, pode-se dizer, já é um fenômeno mundial, em face da proliferação do modelo norte-americano, que na sua maior parte a Administração Pública se resume nas agências reguladoras.

No Brasil, esse aumento também é acentuado, sobretudo em razão do movimento de globalização, que influencia na propagação desses órgãos. É o que Di Pietro (2003) chama de Agencificação.

 Portanto, quanto às agências, o que mais atrai neste grupo da Administração Indireta, é a sua maior independência em relação ao Poder Executivo, além da sua função reguladora.

Contudo, é interessante notar que não apenas agências, mas existem outras entidades com um nível de independência superior, como a Ordem dos Advogados do Brasil e as Universidades Públicas, ou mesmo entidades que admitem função reguladora como o Banco Central e o Conselho Monetário Nacional. No tocante ao grupo de inovação das agências estão a Agência Nacional de Telecomunicações, Agência Nacional do Petróleo e a Agência Nacional de Energia Elétrica, na qualidade de concessionárias e permissionárias de serviço público.

As autarquias universitárias, com a lei 5.540/68 responsável pela reformulação da Lei de Diretrizes e Bases - LDB, atribuíram a essas entidades a condição de autarquia de regime especial ou fundações. Ganharam força constitucional no art. 207 da Constituição Federal, sob o respaldo da autonomia; atualmente, a nova LDB não menciona nada sobre esse aspecto, contudo, são revestidas por uma liberdade de agir maior do que as demais autarquias. A prova disso é que seu estatuto e regimento são elaborados pela própria universidade; além disso, outros dados comprovam sua autonomia, aliás, o STF já se pronunciou na Súmula 47, que diz: “Reitor de universidade não é livremente demissível pelo Presidente da República durante o prazo de sua investidura”.

As agências reguladoras são pessoas jurídicas de direito público, classificadas como autarquias e fundações, sob o regime especial, que intervém na economia a fim de prestar serviços públicos de qualidade sob o prisma do bem-estar social. Realizam atividades que seriam desempenhadas pelo Estado e o mesmo transfere tal dever em função da livre iniciativa, tudo a favor para suprir as exigências do interesse coletivo. Entretanto, não podem deixar o vínculo com os princípios constitucionais que regem a Administração Pública.

Em virtude da crescente modernização do Estado administrativo, pode-se perceber um redirecionamento na prestação dos serviços públicos, gerando assim uma nova política adotada pelo Estado, no sentido de atribuir a certos órgãos regime de administração autônoma, sob o pilar da Descentralização. Esta nada mais é do que a transferência pelo Estado das atividades a terceiros, atividades que eram exclusivas do poder público, as quais foram sendo distribuídas a setores alheios às estruturas administrativas. Convém destacar:

A ação da regulação varia de acordo com o modelo do Estado que a desenvolve, intervencionista ou regulador, porém deve sempre ter em mente o mercado a ser regulado, os princípios da autonomia e da especialidade, a transição dos monopólios, e principalmente, o interesse público (CARVALHO, 2002, p. 54).

 

 

Vale dizer que o princípio da especialidade norteia alguns pontos das agências, principalmente se for entidade da Administração Indireta, pois é a lei que atribui a matéria pertinente, ou seja, segundo a especialidade de cada ente.

De acordo com Di Pietro (2003), as agências reguladoras possuem dupla função: seja quando o Estado regula a atividade econômica, concedendo ao particular a prestação de serviços públicos e regula sua utilização, seja quando impõe as regras no exercício do poder de polícia administrativo. Na ótica de Coelho (2004, p. 60): “Por esse princípio, os entes estatais não podem abandonar, alterar ou modificar os objetivos para os quais foram constituídos: sempre atuarão vinculados e adstritos a seus fins ou a seus objetos sociais”.

A segunda dessas funções diz respeito ao poder de polícia, que sob o aparato da lei, confere limitações administrativas, com o intuito de fiscalizar e repreender qualquer atitude destoante da ordem social; é o que prevêem a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a Agência Nacional de Saúde Pública Suplementar (ANS) e a Agência Nacional de Águas (ANA). Para Di Pietro (2003, p. 406): “Quanto às agências que atuam no exercício do poder de polícia, as atribuições são aquelas inerentes a esse poder, tais como as de normatizar a atividade (nos limites legais), fiscalizar o cumprimento das normas, aplicar sanções”.

A Agência Reguladora é um tópico na doutrina que ainda causa controvérsia, em relação à função reguladora que ela emana e justifica a razão de ser da agência. A ela está sendo ofertado o poder de ditar normas com a mesma força de lei, pautado sob fundamentos indeterminados e desconhecidos pelo Direito Constitucional Brasileiro; primeiro porque as duas únicas agências que estão disciplinadas pela Constituição com caráter regulador e com função normativa são a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) e a ANP (Agência Nacional do Petróleo), como preza os artigos 21, XI e 177, §2º, III.

 

Por isso mesmo, a função normativa que exercem não pode, sob pena de inconstitucionalidade, ser maior do que a exercida por qualquer outro órgão administrativo ou entidade da Administração Indireta. Elas nem podem regular matéria não disciplinada em lei, porque os regulamentos autônomos não têm fundamento constitucional no direito brasileiro, nem podem regulamentar leis, porque essa competência é privativa do Chefe do Poder Executivo e, se pudesse ser delegada, essa delegação teria que ser feita pela autoridade que detém o poder regulamentar e não pelo legislador (DI PIETRO, 2003, p. 407).

 

 

Assim como o exercício do poder de polícia, as agências reguladoras devem ser previstas por lei, em atendimento ao princípio da legalidade; por essa razão é que existem aquelas agências fundadas na concessão e permissão de serviço público, tais como: a ANATEL, ANP e a ANEEL, regidas por leis esparsas, baseadas na exploração de atividade econômica monopolizada.

Figueiredo (2004) tece algumas considerações sobre as agências ANATEL e a ANP, que merecem ser destacadas, visto que são aquelas legalmente previstas pelo texto constitucional. Assim, a lei 9.472/97 cuida da Agência Nacional de Telecomunicações, órgão vinculado ao Ministério das Comunicações; entretanto, a autora citada afirma que a dita lei apresenta inconstitucionalidades e contradições em seu conteúdo, como no art. 22, onde é concedida ao Conselho Diretor a competência para aprovar as normas de licitação e contratação, no entanto, o texto constitucional não expressa nada sobre o assunto.

O regime especial endereçado à ANATEL serve para quebrar as amarras com a Administração Pública, no entanto, não podem fugir à função administrativa desempenhada por ela, independente de ser denominada de agência. Isso fica evidenciado no art. 59 da lei 9.472/97, quando contrata pessoal especializado para realizar atividades de sua competência, diferenciando-se da entidade autárquica.

Já a Agência Nacional do Petróleo (ANP) foi criada pela lei 9.478/97 e modificada algumas vezes por outras leis, a última foi a lei 10.453/02; porém, existem outras agências reguladoras que não estão previstas na Constituição, como é o caso da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Segue jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

 

EMENTA: CONSUMIDOR. ENERGIA ELÉTRICA. CÁLCULO DE RECUPERAÇÃO DE CONSUMO EM VIRTUDE DE IRREGULARIDADES CONSTATADAS NO MEDIDOR. Decisão judicial que reduziu um pouco o valor decorrente do cálculo de recuperação, impondo à concessionária a cobrança parcelada do mesmo. Justiça e eqüidade como parâmetro, nos termos do art. 6º da Lei nº 9.099/95. Ausência de nulidade da sentença, que decidiu em conformidade com a jurisprudência remansosa das Turmas na matéria recorrente, a qual exclui rubricas consideradas abusivas ou que impingem excessiva onerosidade ao consumidor. Observa-se, por fim, que as agências reguladoras não podem se sobrepor aos princípios do CODECON. Inviável ao autor pretender a modificação do julgado em sede de contra-razões recursais. Demais argumentos de recurso que não superam os fundamentos da sentença. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. (Recurso Cível Nº 71001083427, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em 20/12/2006).

 

 

3.4 O Regime Especial das Agências

 

Com a Reforma Administrativa, tanto as agências executivas, citadas anteriormente, quanto às agências reguladoras, como é sabido, diferenciam-se das demais, por apresentarem privilégios, um dos quais se refere ao modo de licitar; fogem às normas de licitação, previstas em lei (8.666/93). Razão esta que levou à criação de novas figuras no processo licitatório, isto é, o “pregão” e a “consulta”, as quais surgiram inicialmente no art. 54 da lei da ANATEL (lei nº 9.472/97).

 

Pregão é a modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns, qualquer que seja o valor estimado da contratação, em que a disputa pelo fornecimento é feita por meio de propostas e lances em sessão pública (DI PIETRO, 2003, p. 329).

 

 

O pregão era apenas realizado pela União, porém, a medida provisória 2.182/01, autorizadora de tal restrição, foi considerada inconstitucional; a lei 10.520/02 superou essa determinação e hoje tem uma maior abrangência na sua aplicação. O decreto 3.555/00 estendeu o pregão aos demais órgãos da Administração Direta e Indireta.

No caso da ANATEL, a lei de licitação impõe que para a contratação de obras e serviços de engenharia, é obrigatória a observância às normas pertinentes a licitação e contratação para a Administração Pública; não se encaixando nesta espécie de contrato, pode-se utilizar o “pregão” (lei 10.520/02) e a “consulta” acima mencionados.  A doutrina até hoje não elaborou um conceito sobre o que seja consulta, porém, sabe-se que a mesma é destinada nos casos em que não seja possível o pregão.

De acordo com Rolim (2005), em artigo publicado, a lei que regulamenta a ANATEL, Lei Geral de Telecomunicações (lei nº. 9.427/97), já foi alvo de discussões por partidos políticos, tais como o Partido Comunista do Brasil e o Partido dos Trabalhadores, que ingressaram no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, a fim de retirar a eficácia de parte do texto da lei, especialmente nos artigos 54 e 55 a 58. O Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade da lei em face dos artigos supra, considerando o pregão e a consulta como modalidades legais de licitação.

 

Art. 54 – A contratação de obras e serviços de engenharia civil está sujeita ao procedimento das licitações previsto em lei geral para a Administração Pública.

Parágrafo único. Para os casos não previstos no caput, a Agência poderá utilizar procedimentos próprios de contratação, nas modalidades de consulta e pregão

 

 

A introdução de novas modalidades de licitação pela Agência Nacional de Telecomunicações não deixa de ser um aspecto positivo para os serviços da Administração Pública; na visão de Rolim (2005), a criação do pregão e da consulta pela lei 9.427/97 decorrente da emenda constitucional nº. 08/95, trata de matéria específica e não atinge a lei 8.666/93.

Para Mello (2004), a licitação é uma forma de melhorar a qualidade dos serviços ofertados pelos órgãos, tanto é que a Constituição prevê, no art. 22, XXVII, lugar privilegiado ao tema, inclusive com legislação específica. Acontece que a criação dessas agências tidas como “especiais” serviu para mascarar a atividade administrativa que é da competência destas, destoando assim, das normas constitucionais, sob a égide do art. 37, XXI, CF, e também dos princípios que regem a Administração Pública.

Além dessa questão envolvendo a licitação nas agências, existe um outro assunto também considerado bastante discursivo e que afronta os preceitos constitucionais; tal tópico abrange a ANP, ANVISA, ANA, ANEEL, nas quais em suas legislações autorizam a admissão de pessoal técnico, sem concurso público, em caráter temporário por até 3 anos. Ocorre que, aceitando essa brecha nas legislações específicas, invade o terreno constitucional, precisamente o art. 37, II, Constituição Federal:

 

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei de livre nomeação e exoneração (VADE MECUM ACADÊMICO-FORENSE, 2006, p. 51).

 

 

Como se vê, embora essa contratação contrarie o inciso supracitado, no caso das Agências Reguladoras, elas entendem estarem pautadas no inciso IX do mesmo artigo da Constituição Federal; todavia, Mello (2004) afirma que, a partir do momento que essa admissão é temporária, não há porque falar num prazo de 36 meses, prazo este muito longo, sendo inconcebível tanto tempo para aplicar um concurso público. Em virtude disso, percebe-se que essa admissão de pessoas sem concurso é mais uma forma de burlar o art. 37, II, Constituição Federal. Mello (2004, p. 167) destaca:

 

Se tal despautério já não bastasse, foi ainda ampliado pela citada Lei 9.986, de 18.7.2000, cujo art. 26 estabeleceu: ‘As agências reguladoras já instaladas poderão, em caráter excepcional, prorrogar os contratos de trabalho temporários em vigor, pelo prazo máximo de vinte e quatro meses, além daqueles previstos na legislação vigente, a partir do vencimento de cada contrato de trabalho.

 

 

Entretanto, as agências reguladoras, embora exalem uma certa independência, não podem fugir aos preceitos do Regime Constitucional Brasileiro, uma vez que a independência para com o Poder Judiciário e o Poder Legislativo quase não existe, em ambos os limites lhes são aplicados pela lei, quaisquer atos praticados pelas agências podem ser apreciados por tais poderes; estão sujeitas inclusive ao controle do Congresso Nacional, com fulcro no artigo 49, X, da Constituição Federal e do Tribunal de Contas no artigo 70 da Lei Maior.  Desta forma, pode-se dizer que independência maior existe com relação ao Poder Executivo, mesmo assim com disposições de limites, variando caso a caso.

É pertinente ressaltar que embora as agências sejam tratadas pela lei como autarquias de regime especial, elas gozam de privilégios idênticos às demais autarquias: possuem autonomia administrativa, ou seja, suas decisões são de cunho decisivo perante a Administração Pública Direta, não cabendo inclusive recurso; possuem autonomia financeira; têm poder de regulamentação, e seus dirigentes possuem estabilidade, mediante mandato fixo, óbvio que sob o liame do artigo supramencionado da Constituição Federal.

Tendo em vista tais privilégios, é oportuno demonstrar a forma como é feita a nomeação dos dirigentes das agências, que como informado acima, gozam de estabilidade, segundo preceituam os arts. 5º, 6º e 9º da lei 9.986/00. Por essa legislação os cargos da diretoria foram qualificados a cargos comissionados de direção, com a vantagem de que, se demitidos, sejam submetidos a um procedimento formal e motivado, ou seja, uma demissão fundamentada.

Assim, a escolha e nomeação são feitas pelo Presidente da República, após aprovação do Senado Federal; entretanto, possuem mandato fixo com prazo determinado; apesar disso, não podem ser exonerados discricionariamente. 

Caso ocorra algo que favoreça a perda do cargo antes do término do prazo, ficam vinculados ao processo administrativo disciplinar. Interessante notar que o Supremo Tribunal Federal levou questão a julgamento no sentido de decidir se seria ou não possível limitar o poder do Presidente de exonerar cargo não proveniente de concurso.

De início, o Pretório Excelso entendeu que seria inconstitucional, com fulcro na Súmula 25 sob o regime da Constituição Federal de 1946; porém no regime em vigor, decidiu por constitucional, desde que a demissão seja motivada, de acordo com a ADIN 1.949-0. Vale salientar a opinião de Figueiredo (2004, p. 146):

 

Acreditamos que, se não houver empeço constitucional, tal seja, a atribuição à agência de competências que não lhe possam ser outorgadas, não parece que seja atentatório à independência dos poderes limitar a atuação do Chefe do Executivo, obstando-lhe a possibilidade de fazer e desfazer a seu talante. Até seria muito salutar para que não houvesse troca de favores, mas sim, total independência.

 

 

Do ponto de vista de Mello (2004), apesar das agências gozarem de um regime especial, nomenclatura esta que não diz nada ao nível de Direito, somente possuem uma autonomia mais acentuada do que as demais autarquias e fundações. O único foco relevante deste regime diz respeito à investidura e mandato fixo dos dirigentes destes órgãos. Todavia, é bom salientar que, apesar desses dirigentes terem alguns privilégios, cumpre acentuar que seus mandatos só se operam dentro do período governamental em que foram nomeados; com um novo Governo, eles podem ser exonerados.

Quanto à arbitragem (lei 9.307/96) no âmbito das agências, pode-se dizer que elas não possuem, visto que arbitrar tem como enfoque solucionar pendências entre os concessionários e os usuários, se houver dispositivo legal que o assegure. Para as agências, esse poder não lhes é autorizado, seja o Poder Público federal, estadual ou municipal. O máximo permitido a elas é contornar controvérsias que porventura existam entre as próprias empresas concessionárias.

A competência regulamentar diz respeito às relações de serviço entre prestadores e concessionários, assim, diferentemente do que ocorre com as agências norte-americanas, o Direito Brasileiro só cria e extingue obrigações mediante lei; logo, a lei não confere às agências brasileiras o papel normatizador, muito menos o poder complementar que é de alçada exclusiva do Presidente. Coelho (2004b, p.94) aponta, de maneira geral, as funções destinadas às Agências:

 

A elas compete, em arremate, exercer as funções que o Poder concedente exerce nos controles de concessão ou permissão ou atos de autorização, regulando os serviços, traçando os parâmetros dos contratos, aplicar sanções, intervir nas empresas concessionárias, encampar o serviço público, decidir o valor da tarifa, seu reajuste e revisão e, finalmente, em face do princípio da eficiência, zelar pela boa prestação do serviço público, inclusive instituindo ouvidorias para que o usuário tenha canais institucionais onde possa manifestar seu desagrado, fazer denúncias e reclamações.

 

A doutrina traz diferenciações sobre o poder regulador e a competência regulamentar, que na visão do autor não se confundem, pois o poder regulador é aquele exclusivo do Presidente da República, com base no art. 84, IV da Constituição Federal.

 

4       APLICAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA SOBRE AS TAXAS

4.1 Noções sobre Taxas

Em decorrência da extensão do tema poder de polícia, cumpre ressaltar sua incidência no Direito Tributário e Financeiro, pois está presente no dia-a-dia das pessoas, quando do pagamento das taxas públicas, principalmente na forma como são exigíveis a título de tributação no país.

Como dito anteriormente, o conceito do poder de polícia adquiriu contexto legal a partir do Código Tributário Nacional, mais específico no artigo 78, parágrafo único. Assim, parece prudente pensar como ponto de partida que o Direito Tributário mantém íntima relação com o Direito Administrativo, assim compreendido por estar atrelado pela arrecadação dos tributos, pela fiscalização e funcionamento dos órgãos arrecadadores, e pelas obrigações dos contribuintes.

A referência feita pela doutrina estrangeira sobre as taxas teve início com Adam Smith, apontado como o primeiro a distinguir taxas (fees) de impostos. Esse fato foi relevante para a formação da teoria das taxas, ganhando forças no século XIX, sendo expandida uma noção desse tributo que até nos dias de hoje os autores clássicos e modernos aceitam, que é um fim especial de ordem pública a ser realizado.

Inserido ao conceito de taxa, na visão de Machado (2003, p. 401), é visível a presença do poder de polícia: “Taxa, em síntese, é espécie de tributo cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia, ou o serviço público, prestado ou posto à disposição do contribuinte”.

Contudo, o autor supra esclarece que a definição do Código Tributário Nacional, a respeito do poder de polícia, nada mais é que uma atividade de polícia, exercida mediante o poder autorizador conferido ao Estado. Em outras palavras, o poder de polícia é um poder do Estado. Baleeiro (2001) prefere dizer taxa sobre serviço, visto que o poder de polícia é na verdade, uma espécie de serviço púbico.

Observe o explicitado por Moraes (apud PAULSEN, 2002, p. 569):

 

Com base no poder de polícia utilizado, o Estado exerce uma atividade estatal manifestadora desse poder: fiscaliza, controla, vistoria, inspeciona, licencia, etc. Tal atividade estatal (em razão do exercício do poder de polícia) é que será custeada pela taxa. Caso contrário, não há o que justifique uma despesa e a respectiva receita tributária [...] Inexistirá o que é essencial para a existência da taxa, certa atividade estatal dirigida ao contribuinte.

 

 

Cabe destacar que as taxas se revelam de modo diverso dos preços públicos, em virtude do seu caráter compulsório e por necessitar de prévia autorização orçamentária, segundo já reforçou a Súmula 545 do Supremo Tribunal Federal, utilizando com bases nos princípios da anualidade e da legalidade. Machado (2003, p. 410) acentua:

 

À liberdade que tem o Poder Público na fixação do preço público corresponde a liberdade do cidadão de utilizar, ou não, o serviço correspondente. Se o cidadão não tem essa liberdade, o Poder Público deve estar igualmente limitado pela ordem jurídica no pertinente aos critérios para fixação do valor a ser cobrado, que será um tributo.

 

 

Assim, se a atividade estatal está atrelada ao Estado, esta receita corresponde uma taxa; caso adentre ao setor privado, corresponde a um preço e, sobressaindo a dúvida pode a lei considerar a receita como taxa ou preço; contudo, é preciso saber que, para definir taxa de preço público há de sempre verificar a compulsoriedade para a primeira, e a facultatividade para o segundo. A taxa, conforme o art. 3º do Código Tributário Nacional, é um tributo compulsório que está vinculado a um regime jurídico tributário, portanto, não condiz com o ordenamento brasileiro aplicar uma taxa facultativa.    

 

 

4.2 Fato Gerador e Poder de Polícia

 

As taxas têm seu fato gerador direcionado a uma atividade estatal específica, logo, é um tributo vinculado. Podem ser cobradas por todos os entes da Federação, como também se diferenciam dos demais impostos por não terem a mesma base de cálculo ou o mesmo fato gerador, conforme art. 145, §2º da Constituição Federal, e parágrafo único do art. 77 do Código Tributário Nacional; neste sentido são classificadas as taxas pelo exercício regular do poder de polícia ou pela prestação de um serviço público específico e divisível.

Coêlho (2002, p. 536) admite que: “A taxa não pode ter base de cálculo nem fato gerador de imposto, pelo simples argumento de ser a taxa a medida de um agir estatal: serviço público específico prestado ao contribuinte”.

 

Tem-se, portanto, que o fato gerador da taxa envolve sempre os conceitos de poder de polícia e de serviço público, que se situam no âmbito do Direito Administrativo. Aliás, não poderia mesmo ser de outro modo, pois ao Direito Administrativo cabe o disciplinamento das atividades estatais, e não há dúvida de que tanto o exercício do poder de polícia como o serviço público, constituem atividades tipicamente estatais (MACHADO, 2003, p. 401).

 

 

Segue entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito do fato gerador das taxas:

 
EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL - TAXAS DE LIMPEZA - FATO GERADOR.
As Taxas têm de Fato Gerador. O Exercício Regular do Poder de Polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial de serviço publico específico e divisível, prestado ao Contribuinte ou posto à sua disposição.
A Recorrente está sujeita às Taxas de conservação de ruas e logradouros públicos e de Limpeza - Coleta de Lixo, porque ela usufrui os serviços de Conservação e Limpeza, Inclusive Coleta de lixo. Recurso Provido. Ministro Garcia Vieira. Julgado em 02/12/1992 pelo Superior Tribunal de Justiça.
 
 

Tendo em vista esta consideração, é perceptível a relação mantida entre o Direito Administrativo e o Direito Tributário, visto que apesar das taxas serem matéria de ordem tributária, de alçada do Código Tributário Nacional, cumpre verificar que a ênfase maior situa-se no desdobramento das taxas sob os ângulos do poder de polícia e do serviço público, recepcionados pelo Direito Administrativo. Logo, ambos estão interligados pelo laço do interesse público e da manutenção da ordem social. No que diz respeito à base de cálculo, Baleeiro (2001, p. 551) expõe:

 

Base de cálculo de um tributo é a ordem de grandeza que, posta na conseqüência da norma criadora do tributo, presta-se a mensurar o fato descrito na hipótese, possibilitando a quantificação do descer tributário, sua graduação proporcional à capacidade contributiva do sujeito passivo e a definição da espécie tributária.

 

 

Sob essa ótica, é notório que o poder de polícia não deve passar despercebido desta relação, visto que todos os fins propostos pelo Direito Tributário têm como fonte o interesse público e, para alcançá-lo, é necessária a sujeição do direito individual ao coletivo.

 

Artigo 145, CF/88: A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

II: taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.

 

 

Por ser um tributo de caráter vinculado, seu fato gerador está atrelado a uma atividade estatal; dessa forma, está autorizada a pessoa jurídica de Direito Público a competência para instituir e cobrar o tributo. No que diz respeito aos impostos cabe à União Federal a competência residual, segundo preceitua o art. 54, I, da Constituição Federal. No entanto, na seara das taxas cabe aos Estados arcar com essa responsabilidade residual, art. 25 §1º, da Constituição Federal; o Código Tributário Nacional prevê no art. 80 essa distribuição de competências para os entes da Federação.

 

Art. 80, CTN – Para efeito de instituição e cobrança de taxas, consideram-se compreendidas no âmbito das atribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios aquelas que, segundo a Constituição Federal, as Constituições dos Estados, as Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios e a legislação com elas compatível, competem a cada uma dessas pessoas de direito público.

 

 

Não é permitido que a União interfira nos assuntos da competência dos Municípios ou vice-versa, ou dos Estados, cada ente tem sua atribuição; invadir terreno alheio incide em inconstitucionalidade. Assim, a União não pode decretar taxa de limpeza de ruas do Município, como este não pode instituir taxas de carnes destinadas à exportação porque são de responsabilidade da União.

 

4.3 Classificação das Taxas

 

Classificam-se as taxas sob duas ordens: as taxas de polícia e as taxas de serviço público. Interessante notar que, para a caracterização deste tributo exige-se uma contraprestação, ou seja, o pagamento do contribuinte ao Estado por certa atividade ou serviço realizado; nesse ponto concorda Baleeiro (2001); entretanto outros entendem, como Machado (2003) que, ela assim não deveria ser conceituada, posto que não se trata de uma contraprestação porque para o autor não é necessário que a atividade estatal proporcione vantagens ao obrigado.

 

Art. 77, CTN – As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição (VADE MECUM ACADÊMICO-FORENSE, 2006, p. 961).

 

 

As taxas de polícia têm caráter de cerceamento da liberdade individual, isto é, exigem que antes do Estado autorizar qualquer atividade da competência do poder de polícia, preste a realização de exames, perícias e vistorias, a fim de prevenir que problemas futuros apareçam e gerem a desordem social. Sob esse prisma, Baleeiro (2001, p. 561) entende as taxas de polícia:

 

Assim, taxas fundadas no exercício regular do poder de polícia devem ser entendidas, em primeiro lugar, aquelas com finalidade extrafiscal, como a de impedir ou restringir atividades que ameacem o interesse da comunidade; em segundo lugar, as taxas para custear serviços com essa finalidade.

 

Neste sentido, tudo que diz respeito ao poder de polícia pressupõe uma base legal, sem a qual não será possível sua manifestação perante os administrados; porém, verifica-se também que o poder de polícia é inerente à prestação de um serviço público, pois é inadmissível a existência da lei se não tiver um órgão devidamente constituído para realizar a atividade. Com isso, a maioria dos doutrinadores entende que o poder de polícia se materializa mediante a realização de atos administrativos.

O Poder Público, como é sabido, detém o poder de polícia que lhe foi conferido pela Supremacia do Interesse Público sobre o particular; assim, as atividades de particulares que dependam da autorização de atos administrativos realizam-se mediante prévia concessão de licenças, alvarás ou decretos que determinem a liberação para que tal atividade se estabeleça.

Na doutrina, circulam divergências sobre o assunto, pois muitos autores, entre eles, Machado (2003) e Harada (2006), afirmam que aí se concentra o exercício do poder de polícia, quando da efetivação das taxas que autorizam essa fiscalização por parte do Estado.

Observe algumas decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

EMENTA: Taxa de Renovação - Licença de Funcionamento - Poder de Policia - Fato Gerador. A Autorização para funcionar, no Território do Município, e a Licença de Localização e Funcionamento. O Exercício do Poder de Policia não se efetivou nos anos subsequentes ao de instalação.
Recurso Provido para declarar Ilegal a Cobrança da Taxa de Fiscalização e Localização.
Por Unanimidade, dar Provimento ao Recurso.
Ministro Garcia Vieira (1082).
 
EMENTA:   Agravo de Instrumento. Direito Público não especificado. Mandado de Segurança. Restrição de Horário de Estabelecimento Comercial. Exercício de Poder de Polícia. Não há que se falar em irregularidade do ato administrativo que impôs restrição de horário (das 22h às 07h) a estabelecimento comercial, devidamente amparado em normas das Constituições Federal e Estadual e do Código de Posturas (Lei Municipal n. 2044/1979). Exercício do poder de polícia pela autoridade municipal que visa a manutenção do sossego e da tranqüilidade pública, inexistindo, no caso concreto, qualquer indicação de desvio de finalidade do ato administrativo. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70013610357, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogério Gesta Leal, Julgado em 30/03/2006).
 
 
EMENTA:   Indenização. Abuso de Poder. Município. Inocorrência. Poder de Polícia. Interesse Público. Não age com Abuso de Poder O Município Quando Apreende e Remove Banca de Comércio em situação irregular e em mau estado de conservação, mormente em tendo a autora sido regularmente noticiada no intuito de encerrar suas atividades. O Ente Público age no interesse da população, devendo direcionar todos os seus atos para esse objetivo. Assim que, muitas vezes, a fim de preservar o bm comum e o interesse da comunidade, faz uso do Poder de Polícia. Apelo Improvido. Sentença Mantida. (Apelação Cível Nº 598331650, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio dos Santos Caminha, Julgado em 18/03/1999).
 
 
É pertinente fazer menção ao poder originário e poder delegado, em especial a este último, que se destina aos atos de execução da Administração. No tocante ao poder de polícia delegado, não se percebe a imposição de taxas, isto é de competência do Poder Público, previsto constitucionalmente; logo, é intransferível essa tributação. Ao poder delegado compete aplicar sanções aos infratores e não determinar taxas.
A lei 9.873/99 fixou o prazo prescricional em cinco anos da Administração Pública Federal direta e indireta, no exercício do poder de polícia, com o propósito de apurar infração, tendo início essa contagem da data da prática do ato ou da infração, que pode ser permanente ou continuada, do dia que tiver cessado. 
Segundo Mello (2004), esse excesso praticado pela Administração Pública revela-se de dois modos: um, quando a medida adotada for maior do que pede a situação, e o outro, quando essa medida ganha proporções maiores do que o necessário para se atingir o resultado desejável.  
Enfim, é preciso que os atos administrativos sejam norteados de extrema cautela, sob pena de incorrer em vícios que maculam a imagem do Poder Público e de seus administradores.
Cabe à Administração fiscalizar, para que seja feita dentro dos parâmetros legais; por exemplo, a construção de um estabelecimento comercial é uma atividade lícita, contudo, é preciso que se obedeça às regras da construção civil, não ultrapassando os limites da sua área, nem colocando em risco os pedestres que por ali passam. De acordo com o exposto, segue decisão da Justiça Federal sobre a questão:
 
Ementa: DIREITO DE CONSTRUIR. 1) - Assegurando-o, o art. 572 do C.C. condicionou-o ao respeito aos direitos dos vizinhos e aos regulamentos administrativos. 2) - Não e lícito, porém, a autoridade o desvio do poder de polícia, nem a desídia e a protelação na aprovação das plantas de alteração de seus planos urbanísticos ou no despacho dos pedidos de alinhamento para obras já licenciadas, segundo traçados anteriores. A cominatória pode obrigá-la a atender aos reclamos legítimos do proprietário nessas condições.  3) - Todavia, nega-se provimento ao agravo pela Súmula, n.s 279 e 288.

Origem: STF - Supremo Tribunal Federal
Classe: AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO
Processo: 38984 UF: GB - GUANABARA Órgão Julgador. Relator: Aliomar Baleeiro.

 
 
A atividade de polícia se expressa de diversas maneiras, não só naquelas elencadas no art. 78 do Código Tributário Nacional, a enumeração não é taxativa, mas também incluem outras, tais como, a taxa de licença para publicidade, de licença para localização e funcionamento de atividade empresarial; pois sua abrangência se mostra de forma ilimitada, podendo ser revelado o poder de polícia desde que um interesse público esteja sendo protegido.
O Superior Tribunal de Justiça tem decidido sobre a taxa de licença para localização e funcionamento de atividade comercial:
 
EMENTA: Tributário e Processual Civil - Recurso Especial - Taxa de Licença para Localização, Funcionamento e Publicidade - Anualidade Ausência de Previsão Legal - Divergência Jurisprudencial. Precedentes Stj.
- É ilegítima a cobrança, pelo município, da taxa para licença de localização, funcionamento e publicidade se ausentes a contra-prestação de serviços e a materialização do poder de polícia, capazes de justificar a exação. - Ausente a previsão legal da periodicidade é incabível a exigência anual das referidas taxas. - Divergência jurisprudencial não comprovada.
- Recurso não conhecido. Relator Francisco Peçanha Martins. 20/06/1994.
O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou sobre o assunto na súmula 80, referindo-se por ilegítima a cobrança quando da renovação de licença para localização de estabelecimento comercial ou industrial. Assim diz a súmula em questão: “Para a retomada de prédio situado fora do domicílio do locador exige-se a prova da necessidade”.

As taxas de serviço público não foram recepcionadas pelo Código Tributário Nacional, como o fez em relação ao poder de polícia, sendo que conceituar serviço público ainda é uma tarefa árdua e doutrinariamente discursiva, porém, não deve confundi-lo com o poder de polícia. O aludido Código não diz quais são as taxas de serviço público, apenas expõe os serviços considerados como públicos.

Numa tentativa conceitual Machado (2003) entende que, toda e qualquer atividade prestada pelo Estado visando satisfazer necessidade coletiva é tida como serviço público, não só o Estado pode prestar esta atividade como qualquer outro órgão ou pessoa. Sidou (2001) conceitua serviço público como: “universo de atividades do Estado, por ele diretamente empreendidas ou desempenhadas por particular, mediante autorização, permissão, concessão ou delegação”.

Pertencem ao conceito supra alguns vocábulos relevantes para a análise das atividades estatais, que são a permissão e a concessão. Não se deve confundi-las, pois a concessão não tem natureza contratual, enquanto a permissão é ato discricionário no qual o Poder Público repassa a execução de um serviço público para que outro o execute em seu próprio nome. Tem-se com isso, previsão constitucional no art. 175 da Constituição Federal: “Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.

 

 

EMENTA:   TELEFONIA. COBRANÇA DE TARIFA BÁSICA DE TELEFONE FIXO. POSSIBILIDADE. Não há ilegalidade na cobrança pela empresa de telefonia de uma tarifa básica mensal, que nada mais é do que a contraprestação de um serviço que concretamente está sendo disponibilizado e utilizado, gerando custos para sua manutenção. É importante consignar que esta tarifa básica cobrada é a contraprestação pela utilização efetiva, e não apenas potencial, de um serviço. Daí porque não há qualquer problema em enquadrá-la dentro do conceito de preço público, afastando-a do enquadramento como taxa. Tal constatação é significativa, porquanto os preços públicos, ao contrário das taxas, que são tributos, são fixados por contrato, independentemente de lei. E no caso dos autos pode-se verificar que tanto no contrato de concessão de serviço público (e seus anexos) celebrado entre a ANATEL e a ré, como no contrato celebrado entre esta e os autores, há previsão de pagamento de tarifa de assinatura mensal¿. Assim, há que concluir que a cobrança da chamada tarifa básica é perfeitamente cabível, estando perfeitamente de acordo com o regramento jurídico e com as estipulações contratuais que envolvem as partes. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70019089374, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi). Julgado em 25/04/2007.

 

 

Dessa forma, é preciso que o serviço público seja específico e divisível, para que o fato gerador da taxa esteja atrelado à sua natureza; logo, a participação do contribuinte na formação desse serviço público é imprescindível. É o contribuinte o responsável pela existência do serviço público, porque a cobrança da taxa se configura com o efetivo funcionamento do mesmo, então, a utilização do serviço pelo contribuinte é condition sine qua non para a aplicação da taxa, seja de uso compulsório ou não.

A palavra contribuinte, se empregada no contexto adequado, simboliza o nascedouro de todo esse processo, porque ele é a pessoa que provoca a atuação estatal, assim caracterizado no exercício do poder de polícia. Em contrapartida, a atuação fiscalizadora do Estado visa a coletividade, e não um indivíduo isoladamente; para Amaro (2006), esta é a razão de se impor as taxas.

Paulsen (2002, p.567) entende que deve ser aplicado proporcionalmente o valor da taxa com a atividade estatal:

 

Mais acertada, porém, parece-nos a posição de que, sendo a taxa instituída em razão do exercício do poder de polícia ou de serviço específico e divisível colocado à disposição do contribuinte, deve servir ao custeio destas atividades, guardando com elas proporcionalidade.

 

 

Em decorrência disso é que restringe um direito individual em prol da coletividade. Quanto às taxas de serviço público, estas visam somente fornecer uma utilidade pública, por exemplo, taxa de fiscalização e inspeção de bebidas alcoólicas (federal), taxa de porte de arma (estadual), taxa de licença para construir (municipal).

O Supremo Tribunal Federal proferiu algumas decisões neste sentido:

Taxa de Localização e Funcionamento de estabelecimentos comerciais e outros. Constitucionalidade. São constitucionais taxas que abarquem a localização e autorização anual para funcionamento e permanência de estabelecimentos comerciais e similares, desde que haja órgão administrativo que exercite essa faceta do poder de polícia do Município, e que a base de cálculo não seja vedada (RE 115.669, Rel. Min. Moreira Alves – DJ 17/6/88).

Só em último caso deve ser utilizado o emprego da força pública, isso quando o poder de polícia encontra resistência por parte do administrado; do contrário, não é autorizado que a Administração Pública atente contra a propriedade de forma destrutiva, muito menos, que use de coação física para impedir o exercício de profissões regulamentadas. Os atos administrativos, para serem válidos, precisam ser coerentes e pertinentes com a situação, sem ferir os princípios basilares da legalidade e proporcionalidade. 
 
Superior Tribunal de Justiça
EMENTA: ADMINISTRATIVO – SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA – PAGAMENTO À EMPRESA CONCESSIONÁRIA SOB A MODALIDADE DE TARIFA – CORTE POR FALTA DE PAGAMENTO: LEGALIDADE.
1. A relação jurídica, na hipótese de serviço público prestado por concessionária, tem natureza de Direito Privado, pois o pagamento é feito sob a modalidade de tarifa, que não se classifica como taxa. 2. Nas condições indicadas, o pagamento é contra prestação, aplicável o CDC, e o serviço pode ser interrompido em caso de inadimplemento, desde que antecedido por aviso. 3. A continuidade do serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o princípio da isonomia e ocasiona o enriquecimento sem causa de uma das partes, repudiado pelo Direito (interpretação conjunta dos arts. 42 e 71 do CDC). 4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, improvido. Ministra Eliana Calmon. Julgado em 04/05/2006.
 
                    
Tomando como base a Constituição Federal, é preciso enfatizar que o serviço público deve ser prestado ao contribuinte de modo efetivo e potencial, como também esse serviço não pode ter aplicação genérica, uma vez que é inconstitucional a realização de certa atividade sem especificar ao contribuinte sua natureza, sem especificar sua espécie, ou seja, cobrar taxa sem dizer o fim a que ela se destina desnatura o serviço a ser tributado. Assim, por exemplo, se determinada localidade quiser instituir uma taxa municipal sem dizer sobre o que ela vai incidir, fere a legislação pátria.

 

 

EMENTA:   Lei Municipal. Taxa de Servicos Urbanos (TSU). Serviço de Conservação de Vias e Logradouros. Serviço de Coleta de Lixo. Serviço de Limpeza Pública. Serviço de Iluminação Pública. Aos Municípios é Vedado Instituir e Cobrar Taxas com Inobservância dos Princípios Constitucionais. (Resumo) (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 591056205, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adroaldo Furtado Fabrício, Julgado em 05/10/1992).

  

EMENTA:   Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal que Institui as Taxas de Limpeza Pública e de Coleta de Lixo. A) Constituindo-se, a Taxa de Coleta de Lixo, em Serviço Público Regular, Prestado Individualmente, Não é Inconstitucional sua Cobrança, Prevista no Inc-I, Art-124 da Lei Municipal N-1105 do Município de São Marcos; B) Ausentes os requisitos da especificidade e da Divisibilidade na Taxa de Limpeza Pública, Resta Vulnerado O Art-140, PAR-1, Inc-II da Carta Estadual, pelo que e declarada sua inconstitucionalidade. Unânime. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 596011684, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eliseu Gomes Torres, Julgado em 09/12/1996).

 

 

Havendo o fornecimento de água, esta se configura como taxa, uma vez que o contribuinte, por lei, está obrigado a pagar, independente de usar ou não o serviço; por exemplo, se ele é dono de uma propriedade e nela tiver um poço artesiano, o proprietário deve pagar pela água que é fornecida ao bairro. A legislação possibilita a cobrança de vários tipos de taxas, desde que venham caracterizadas na sua instituição como proveniente de um serviço efetivo, potencial, específico e divisível. Logo, estarão preenchidas as condições de exigibilidade da cobrança.

De acordo com o imperativo constitucional, é válido destacar a proporcionalidade com que é feito a distribuição e o uso de determinado serviço, pois para ser caracterizado como tributo passível de cobrança, é preciso que esteja presente o sentido de “divisível”, isto é, que o custo da atividade destinado aos vários usuários seja executado na medida em que for utilizado, ou até mesmo quando não utilizado, mas que esteja à disposição.

 

5       CONCLUSÃO

Diante das considerações feitas no decorrer da presente pesquisa, pode-se inferir que é inquestionável a relevância do exercício do poder de polícia nas atividades da Administração Pública, uma vez que é através desse poder administrativo que o Estado promove a manutenção da ordem social. Em todos os atos e funções emanados do Poder Público, é visível a presença do poder de polícia ou polícia administrativa, pois além de ser um instrumento de fiscalização da Administração sobre os administrados, também possibilita o controle das ações dos agentes públicos, para que não ultrapassem os limites permitidos em lei, o que descaracterizaria o poder de polícia, e configuraria o abuso ou desvio de poder.

Neste sentido, o poder proveniente da Administração, em especial, o poder de polícia, é possível graças à autoridade dos atos públicos, isto é, à Supremacia que é inerente ao Poder Público, principalmente porque não se percebe uma atividade administrativa sem que ela atenda a um interesse público, vez que o poder de polícia propicia restringir direitos individuais em prol da coletividade, com o único propósito do bem-estar geral. Os princípios norteadores da Administração Pública são os mesmos que disciplinam o poder de polícia; contudo, o princípio da legalidade se destaca por caminhar pari passu com o poder de polícia, e por atuar, de forma incisiva, na máquina administrativa, como bem acentua o artigo 37, caput da Constituição Federal, no qual são citados também os princípios da impessoalidade, da publicidade, da moralidade e da eficiência.

Pode-se dizer que é a legalidade a mola propulsora do exercício do poder de polícia, visto que é ela quem autoriza determinadas ações e ao mesmo tempo é ela quem também limita sua aplicação, seja quando tenha como foco as Agências, seja quando incida sobre as taxas de polícia. O poder de polícia se desenvolveu ao longo dos tempos e foi aperfeiçoando a sua forma de aplicação, em virtude, conseqüentemente, da evolução da legislação pátria na elaboração das normas, como também do regime jurídico-administrativo, que ofereceu uma nova dimensão ao funcionamento e estrutura da Administração Pública. 

Quanto às Agências Reguladoras e Executivas o poder de polícia exerce papel fundamental, uma vez que, apesar de serem dotadas de um maior grau de independência do que as demais autarquias e fundações, não podem fugir aos preceitos legais, mesmo que vinculadas a um regime especial, devendo obediência aos princípios constitucionais e infraconstitucionais. Entretanto, no que se refere às licitações, devido aos privilégios que cercam tais agências, cabe ao legislador atentar para que esse mecanismo não sirva para driblar as normas gerais de licitação previstas na Lei 8.666/93, bem como não cause ofensa à Constituição Federal.

Quanto à aplicação das taxas, o exercício do poder de polícia incidiu mais na cobrança e no pagamento do tributo, desmembrado em taxas de polícia e taxas de serviço público. A cobrança de determinado serviço realizado pelo Estado deve preencher os requisitos de exigibilidade previstos pelo Código Tributário Nacional; assim, para ser exigível, o serviço deve se apresentar como específico e divisível. O contribuinte paga pelo serviço, independente de utilizá-lo ou não, pois a taxa é resultado de um serviço prestado à coletividade, que está à disposição do indivíduo a qualquer momento que ele precisar; logo, o contribuinte, mesmo não usufruindo do serviço, está obrigado ao pagamento.

Enfim, todos os setores da sociedade necessitam da vigilância da Administração Pública mediante o exercício do poder de polícia, para que a ordem e a segurança jurídica prevaleçam nas relações sociais, e para que cada vez mais se busque o aperfeiçoamento de um Estado comprometido com o interesse público.

 

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Comentários e Opiniões

1) Warley (15/03/2014 às 15:19:54) IP: 179.230.229.191
belo trabalho e bem pesquisado


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