Viver a Vida ... Real – Impedimento Matrimonial.
É óbvio que devemos saber separar a vida real da ficção, mas também é claro que na atualidade, vivemos em um mundo globalizado e faz-se necessário esclarecer, principalmente aos leigos da impossibilidade de copiar o que se passa na ficção.
Em horário nobre, no folhetim escrito por Manoel Carlos[i], nos deparamos com um romance entre a “madrasta” (Helena) e seu “enteado” (Bruno). Estes, apaixonados se decidirem contrair núpcias, terão a surpresa de encontrarem-se impedidos, por força de lei.
O casamento é um ato formal, revestido de exigências e formalidades para que possa ocorrer.
Há de se observar antes de qualquer coisa se os noivos possuem capacidade e legitimidade para casar. No caso em estudo nos deparamos com ilegitimidade dos nubentes, que embora sejam capazes, não possuem legitimidade, o que quer dizer que ambos encontram-se impedidos de casar.
No código civil de 2002 faz-se mister analisar as espécies de impedimentos contidos no art. 1.521, qual sejam:
a) O impedimento de parentesco, seja este natural ou civil;
b) Impedimento de vínculo;
c) O impedimento de crime.
Nas lições de Silvio Rodrigues, os impedimentos visam a impedir casamentos incestuosos, preservar a monogamia e evitar uniões baseadas em crimes graves anteriores.[ii]
É o que diz o art. 1.521, I, do Código Civil de 2002.
Art. 1.521. Não podem casar.
I – Os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
Baseado neste inciso, o legislador quer dizer que não podem casar os afins em linha reta, o que decorre do parentesco por afinidade; este vínculo não se rompe jamais, mesmo que ocorra o divórcio, sogra é pra sempre, assim como no caso, madrasta também.
Por tanto, para exemplificarmos, não podem casar sogra e genro, sogro e nora, padrasto e enteada, madrasta e enteado, e assim por diante.
Este vínculo não se dissolve mesmo que a relação anterior seja uma união estável, inovação esta que nos trouxe o código civil de 2002, disciplinado pelo art. 1.595, § 2⁰.
Art. 1.595 - “cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade”.
§ 2⁰- “Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável”.
Temos então como justificativa, uma questão moral.
Caio Mário da Silva Pereira, observa que “o incesto constitui um dos mais profundos tabus da Humanidade”.
A base da psicanálise Freudiana, em especial em seu Totem e Tabu, defende que a proibição do incesto nada mais é do que uma reação cultural que decorre da necessidade de refrear o poderoso desejo de praticar o incesto[iii].
O mestre da psicanálise, Sigmund Freud diz que: “onde existe uma proibição tem de haver um desejo subjacente...”
Por tudo já exaustivamente demonstrado, fica a dúvida e a pergunta que não quer calar: Como irá resolver tal imbróglio nosso tão inventivo novelista? Creio que somente saberemos assistindo as cenas dos próximos capítulos. Mas torcendo para que a ficção não atropele a realidade, confundindo pessoas de boa fé, que se acharão com direitos inexistentes.
[i] Viver a Vida, novela de Manoel Carlos, atualmente, exibida pela Rede Globo äs 20: 00 horas.
[ii] RODRIGUES, Silvio, op. cit., p. 40.
[iii] FARIAS, Cristiano Chaves e ROSENVALD, Nelson, em Dir. das Famílias, 2ª Ed. 2010, p. 137 e 138.